Tira as mãos do teclado, desliga o computador e levanta-se dando uma ajeitada no saco. Abre os braços e, respirando fundo, vai até a janela. A praça estava ali, numa criação de todas as horas, derramando verde. Impossível não deixar a imaginação vagar por entre quadros poéticos que se aglomeram. Risos e gritos das crianças levam Teteu para aquele tempo de existência informe e cruel, sua infância. Balança a cabeça e deixa vagar lentamente para um passado sempre presente. Eram meninos com cabelos cortados rente ao couro cabeludo, uma franja frontal emoldurava o rosto, deixando-os com expressão de safadeza incontida. As famílias tinham como ideal supremo levar um dos filhos ao sacerdócio. Mães e tias, com mãos postas, faziam preces para que isso viesse acontecer. E os meninos punham as línguas curvas e vermelhas para fora da boca em sinal de protesto inconsciente. Aos domingos, dias santos e feriados, lá estavam acolitando o padre nas missas. Vestidos à caráter, os assim chamados coroinhas, faziam uma coroa em volta do altar. Proibido chupar nariz, empurrar, olhar de um lado para outro, seriedade, concentração e respostas imediatas às interpelações do padre. Era o tempo do uso do latim nas missas. Sabiam eles o que significavam aquelas palavras? Era mágico responder com voz forte: “Et cum spiritu tuo”. Na imensa catedral um eco de vozes infantis fazia-se ouvir. Teteu, sete anos de idade, repetia de cor o que os ouvidos captavam, enquanto seus olhos riam ao responder: “E cuspiu u tutu”. O que ele desejava mesmo, é que aquela interminável missa chegasse ao fim. Queria brincar de trenzinho com seus colegas na sala ao lado da sacristia, não sem antes dar uma bebericada no vinho que sobrara na galheta. Os meninos corriam desembestados e, após tirar aquela roupa “santa”, enganchavam-se um atrás do outro. Começava a brincadeira. Enquanto o trenzinho corria, o pequeno pênis endurecia ao encostar no menino da frente. Era bom sentir aquela sensação de prazer proibido. Pairava no ar gritos de satisfação da libido inocente e inconsciente. Piuii, piuii, piuii... o trem corria, dando voltas na sala e, vez por outra, uma brecada. Era quando os meninos encarapitados uns em cima de outros aproveitavam para roçar o mais que podiam aquele órgão que parecia crescer e inchar de repente. Na porta, o padre olhava satisfeito, apoiando as mãos na imensa barriga. Um sorriso babento escorria da boca mole. Teria vontade de ser um vagão do trem?
Teteu, pisca os olhos sorri e volta para o interior da sala. Liga o computador enquanto ouve, como que por encanto, um apito longínquo, piuii, piuii, piuii.