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Cronicas-->Os 7 pecados capitais: a avareza -- 14/11/2000 - 12:37 (Luís Augusto Marcelino) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Tudo o que consegui até hoje foi graças a um esforço tremendo. Quem nasce pobre tem de contar com a astúcia, com o trabalho árduo ou com a sorte. Uma vez que o sujeito já não nasceu em berço esplêndido, fica mais difícil acreditar que ganhará a megasena. A astúcia é muitas vezes confundida com corrupção ou estelionato. E se o cara é pobre, ser astuto pode se transformar em sinónimo de presidiário. A astúcia nada mais é do que um privilégio dos que estão no topo daquela maldita piràmide social, que o meu professor de Geografia do ginásio fazia questão de exibir em suas aulas enfadonhas. Então o que me restou foi colocar a mão na massa - tal qual prometeu a nova prefeita de São Paulo, juntar uns trocados, colocar a família pra carregar cimento e construir um sobradinho sem acabamento lá nos confins da Zona Norte. Foram sete infinitos anos. Mas meu abrigo está lá, imponente, na esquina da José de Abreu com a Gustavo Loyola. Por falar nisso, uma das coisas que mais admiro são dos nomes pomposos das ruas da periferia. Diria até que ajudam na concessão de crédito nas lojas de eletrodomésticos.

- Endereço? - pergunta o auxiliar de crédito, com aquela cara de quem prevê o calote inevitável.

- Albuquerque Meneses de Guimarães, 187. Próxima à Praça François Dumond.

Nome francês também sempre dá aquela ajuda. Mal sabe ele que o lugar é uma tremenda "corticela" de fazer inveja à Rocinha... Mas isso não vem ao caso, agora. Como dizia, foi com muito sacrifício que ergui meu lar. Porém, fiz de tudo para não deixar de gozar dos pequenos prazeres da vida. Nunca cortei a "marvada" do orçamento. A patroa continuou fazendo as unhas de dois em dois meses na Helena Cristina, manicure de primeira linha, que chegou a dar um trato nos pés da Hebe Camargo nos bons tempos. Comprei um videogame para a molecada, que reclamava com frequência que só eles não tinham. Enfim, hoje vivo razoavelmente bem sem que, para isso, tivesse de me privar de algumas regalias de mundo de hoje. Cheguei até a ter TV a cabo. Pena que a operadora se rebelou contra a clandestinidade.

Meu tio Tonico é diferente. Muito diferente.

- Caderno é tudo igual!

- Mas a professora pediu capa-dura - retrucou tia Gilda.

- E o que ela pensa que eu sou? Milionário? Vai este aqui mesmo! Nem sei por que essa menina tem que estudar tanto... Só pra ficar dando despesa.

Tio Tonico só não colocava cadeado na geladeira porque não a tinha. Ou melhor, autorizou a esposa a comprar uma de terceira mão, faz uns três anos, época em que adoeceu. Fumou a vida inteira. Mas se comprou mais de cem carteiras foi muito. Além de guardar as bitucas era um serrote de primeira. Não que fosse má pessoa, o pobre. Só que tinha uma paixão pelo dinheiro além da compreensão do resto da família. Certa vez, extrapolou. No casamento da filha mais velha, ficou encarregado de organizar a festa - como era costume antigamente. Carregou meu pai e fui a tiracolo.

- São quantos convidados mesmo? - quis saber meu tio.

- A Gilda disse que foram 80 convites - respondeu meu pai.

- Vinte por cento não vêm... Os outros trazem mais convidados... Tem que dizer que não vai ter festa!

- Mas a Gilda já convidou de boca meio mundo.

- O pai do noivo que se vire então para encher a barriga do povo. Só vou comprar a tubaína. E ainda é muito!

Meu pai se calou. E não é que o tio não deu mais um tostão para a festa? Sorte que minha prima tinha juntado uns trocados e se livrou da humilhação de ter que "desconvidar" os amigos. Mas o ápice de sua mesquinhez aconteceu mesmo em seu leito de morte. Chamou minha tia para um particular.

- Gilda! Sei que não fui dos melhores maridos...

- É, não foi mesmo!

- Mas queria te contar uma coisa.

- Fala.

- Durante esses anos eu juntei um bom dinheiro. Tá tudo no Bradesco.

- Pelo menos um dia você pensou no bem-estar da família, né Tonico?

- Olha, queria mais uma vez que me perdoasse. Fala que me perdoa para eu descansar em paz!

- Deixa de bobagem, homem! Você ainda vai viver muito.

- Fala que me perdoa, por favor!

- Tá bom. Tá perdoado.

Poucas horas depois descansou. Passados os dias de respeito ao finado, minha tinha vasculhou todos os cantos da casa, procurando o número da conta no banco. Não achou até hoje, a coitada. Não é que o tio Tonico abrira uma poupança fantasma para vir tirar o dinheiro depois da morte?
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