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Cronicas-->A. A. Silva -- 05/06/2005 - 13:17 (Paulo Maciel) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
" A. A. Silva "


Uma das decisões mais difíceis que tive que tomar em minha vida de dirigente aconteceu no Recife, pelos idos de 1969.
Aquela época, como gerente-geral de um Banco, eu tinha que fazer uma reunião semanal dos sete chefes de departamento que se reportavam a mim.
Embora devesse consultá-los sobre as principais deliberações que me cabia tomar, não era obrigado a atender aos conselhos deles, uma forma de direção, segundo me disseram, baseada na organização da ordem dos beneditinos.
Pois bem, numa das tais reuniões, o chefe dos Serviços Gerais apresentou um estudo segundo o qual a substituição dos 11 serventes empregados do banco por uma empresa especializada em serviços de zeladoria e limpeza resultaria numa economia mensal da ordem de 50%,visto que nossos serventes eram todos antigos, gozando de inúmeros benefícios e de salários profissionais conquistados pelo Sindicato dos Bancários.
Embora seja adepto da corrente que entende que as atividades permanentes das sociedades devam ser executadas por empregados de seus quadros, rendi-me ã evidente vantagem económica da proposta, assim como os demais membros do Comitê, e autorizei sua execução, ficando o próprio chefe do Departamento incumbido de demitir os funcionários e contratar a firma que apresentasse o melhor preço para prestação do serviço.
Se até aquele instante parecera fácil escolher a opção que resultava no desemprego de 11 pais de família, implementá-la de fato era outra história.
Nos meses seguintes, durante as reuniões do Comitê, cobrei da chefia responsável a solução do caso mas, a cada vez que o fazia, choviam motivos que justificavam o seu adiamento.
Ora, era uma firma de um cliente que pedira para participar da concorrência, depois de iniciado seu processo de seleção, ora era o período em que estávamos - mês de natal - que não comportava decisão tão drástica, o fato é que o assunto foi-se arrastando por tanto tempo que, num certo momento, eu próprio resolvi agir.
Afinal, desde a primeira semana em que discutimos a questão nosso projeto passou a ser conhecido no banco, especialmente pelos próprios interessados que, evidentemente, mostravam-se preocupadíssimos.
Desse modo, não havia como evitar os boatos e o disse-que-disse que perturbavam o ambiente de trabalho.
Avisei ao chefe, portanto, que eu mesmo falaria com os funcionários e pedi-lhe que os trouxesse ao meu gabinete.E, assim, vi-me cara-a-cara com 11 homens ansiosos, a quem comuniquei o fato sem maiores floreios.
Disse-lhes rigorosamente o que acontecera, de modo firme, mas um tanto paternal, destacando que a saída deles significaria uma grande economia para a empresa.
Foi quando um mulato baixo, troncudo, rosto marcado por forte determinação, adiantou-se dos demais e perguntou:
- Posso falar, doutor?
- Claro que sim, respondi. Como é o seu nome?
- Eu me chamo Amadeu, e trabalho com "seu" Osman, na agência, e queria dizer que se eu fosse o senhor tomaria a mesma decisão! Mas o senhor não pode fazer uma miséria dessa com a gente!
E, sem que eu pudesse interrompê-lo, continuou:
- Doutor, o senhor sabe quantos filhos cada um de nós tem? No mínimo 9, sendo que o Francisco aqui ao meu lado tem 13 e eu mesmo tenho 11!
- "Seu" Amadeu, eu já sabia, pois mandei fazer um levantamento da vida de vocês. E tenho uma solução para esse problema.
- Doutor, a solução é o senhor não demitir a gente e eu tenho uma proposta para fazer.
- Diga, "seu" Amadeu.
- O senhor demite a gente e depois contrata a gente outra vez com a metade do salário! Dessa forma o Banco vai fazer a mesma economia, mas conserva nós no emprego!
Tive que explicar a ele que esse procedimento não passaria de uma farsa, proibido pelas leis trabalhistas. E falei a todos, então:
- Vocês não precisam ficar muito preocupados, pois vamos arranjar emprego para todos nas firmas que são clientes do banco. Já estamos cuidando disso. E, virando-me para o Amadeu, disse:
- O senhor mesmo, "seu" Amadeu, e o Francisco, serão contratados pelo Condomínio deste prédio, que tem duas vagas. O banco é o síndico.
Com a tensão controlada, a reunião encerrou-se e todos saíram.
Eu estava arrasado. Não me lembro se realmente arranjamos emprego para todos aque-
les homens, mas nunca me esquecerei do dia em que o Amadeu pediu para falar comigo, alguns meses depois daquela entrevista.
Atendí-o prontamente, e ele não perdeu tempo. Foi logo falando do que lhe interessava. Perguntou-me:
- Doutor, se eu criar uma firma para fazer limpeza e entregar correspondência o senhor deixa eu entrar na concorrência quando acabar o contrato que o banco fez com a empresa que está lhe servindo?
- Sem dúvida, Amadeu, com muito prazer!
- Pois é, doutor, eu já fiz a firma, registrei na Junta Comercial, e no fim do mês eu vou sair deste emprego que o senhor me arranjou pra cuidar do meu negócio! Tenho muita fé em mim!
- Ótimo, Amadeu, fico muito satisfeito em ouvir isso. Você sabe quando acaba o contrato atual? .
- Sei, sim, Doutor! Daqui há 2 meses. E continuou:
- Sabe, dr. Paulo, no dia daquela reunião, enquanto o senhor falava eu comecei a pensar que o negócio não era ser servente. Era ter uma firma pra empregar serventes e fazer um bom trabalho pras outras empresas. E agora, tou com minha firma e duvido que outra trabalhe melhor e mais barato do que a minha. De limpeza eu entendo!
E assim foi, graças a Deus!
Ao julgar a concorrência que fizemos para renovação do contrato de prestação de serviços de limpeza, zeladoria e entrega de correspondência, constatei que o menor preço fora apresentado pela firma "A. A. Silva", afinal escolhida. "A. A. Silva" era o nome de Amadeu Alves da Silva.
Que eu me lembre, esse foi o primeiro contrato da firma "A.A. Silva" mas, anos depois, sua lista de clientes era enorme abrangendo vários bancos, inclusive o Banco do Brasil, e alcançando os estados de Pernambuco, Alagoas, Paraíba e Rio Grande do Norte. Amadeu dava emprego a centenas de pessoas.
Durante minha vida profissional, sobretudo como gerente e diretor de operações de banco, recebi inúmeros brindes de fim de ano, mas nunca nenhum me trazia tanta alegria como os que me mandava "A. A. Silva", principalmente os que chegaram à Bahia, muito tempo depois de eu haver deixado o Recife...
18.07.87
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