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Cronicas-->Balada do ano novo ... -- 02/06/2005 - 17:22 (Paulo Maciel) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Balada de ano novo para quem é só saudade



Fim de ano, festas, época de votos e confraternização, muita gente fica melancólica e outros acesos com a perspectiva de mudanças e de boas coisas no ano novo.
No meu caso, com esse jeito pragmático e realista, não sou dado a sonhos e fantasias. Tampouco me amarguro pelo que aconteceu no ano findo, até porque sempre há coisas positivas a lembrar. Por exemplo: se tenho que conviver controlando as células cancerígenas que restaram nos resíduos da próstata retirada descobri que esse fato me torna isento do pagamento do imposto de renda sobre as remunerações que recebo a título de aposentadoria, uma senhora vantagem que passei a desfrutar desde julho passado.
Mas, o que sobretudo me atingiu nesse fim-começo de ano foram lembranças de pessoas queridas de quem sempre tenho saudades e que fazem uma falta enorme.
Curioso é que, volta e meia, como que sem motivação aparente, estou a recordar algumas dessas figuras, sentimento que sempre é muito intenso..
Mas hoje, precisamente, e de modo surpreendente, vi-me pensando em várias pessoas, um mundo de gente que não está mais entre nós e de quem tenho recordações precisas. Achei isso tão positivo, gostei tanto dessa situação que registrei seus nomes no papel e decidi-me a escrever um pouco sobre cada uma delas.
A imagem que está sempre presente em minhas lembranças é a de minha mãe, morta há mais de 55 anos, aos 33 de idade.
Nunca foi difícil recordar dela, de seu belo e suave rosto de melancólica tristeza, uma postura estóica de quem sabia que não viveria muito, impedida pela doença então estigmatizada, de tocar nos filhos.
Minha mãe me inspirou tanta pena que, durante muitos anos, logo após sua saída de cena, às vezes chorava em surdina quando lembrava dela. E me diziam seus irmãos e irmãs, meus tios juazeirenses, que ela fora das moças mais alegres de sua geração, a mais bonita sem dúvida.
Outra figura que está sempre em minhas recordações, incluída agora no rol dessas lembranças de fim de ano, é a de Miguel Calmon, sempre associada à de meu pai, um juiz a vida inteira, que a encerrou como desembargador, na Bahia.
De um lado, essa associação resulta do fato de considerar essas duas pessoas as principais formadoras do meu caráter, pelo exemplo de retidão e desprendimento, ambos que possuíam grandeza .
De outro, pela circunstància de haverem pertencido a duas entidades que vieram a se degradar, a perder a respeitabilidade que possuíam perante nossa sociedade: de um lado, o Banco Económico, empresa a que dr. Miguel dedicou sua vida, moldando-o em conformidade com seus valores e sua cultura gerencial, desastradamente levado à falência por um de seus sucessores, por ironia, um sobrinho que leva seu aristocrático sobrenome.
De outro lado, a Justiça de nossa terra, representada principalmente pelo seu mais alto Tribunal, provavelmente hoje a mais desacreditada instituição da Bahia.
Se meu pai e Miguel Calmon ainda estivessem entre nós haveriam de preferir morrer a suportar a vergonha de assistir à derrocada das instituições a que estiveram ligados por toda a existência.
Outra pessoa de quem nunca me esqueço é Arnaldo Vitulli, um estupendo paulista que conheci em 1958, publicitário, neto de italianos, ligadíssimo à família e aos amigos. Arnaldo foi sempre um amigão, além de compadre, pois batizou minha primeira filha, Isabella, hoje às vésperas dos 40 anos de idade.
Pois bem, com Arnaldo há dois momentos que nos remetem a casos de premonição.
Nos idos de 1980, por motivos que compreendi mais tarde, Arnaldo, que sempre fora uma pessoa expansiva, alegre, afastou-se de todos e entrou em fase depressiva. Deixou São Paulo e recolheu-se à sua modesta casa em Praia Grande, no litoral santista. Durante vários anos, e apesar de procurá-lo vez por outra, perdi o contato com ele.
De repente, em fins de julho de 1992, quando retornei de férias passadas numa fazendinha do interior, encontrei um efusivo telegrama desse querido amigo, expedido às 16:31 horas, do dia 19 de julho, cumprimentando-me pelo aniversário de casamento, ocorrido quatro dias antes.
Estávamos a 31 de julho e a primeira coisa que fiz foi telefonar para Arnaldo, feliz com sua iniciativa. Atendeu-me a filha mais velha, Leninha, que foi logo me dizendo que o pai morrera, precisamente no dia 19, de um enfarte fulminante, lá pelas 7 da noite, ou seja, pouco depois de passar-me o telegrama.
Agora, véspera do ano novo, ao recordar esse querido amigo, resolvi ligar para seu antigo telefone em São Paulo e, logo a seguir, para Praia Grande. Nem num e nem no outro, encontrei qualquer pessoa.
Tal era minha compulsão, que chamei o serviço de informações da Telesp. Forneceram-me um número registrado em nome de um Arnaldo Luiz Vitulli Cassetari. Liguei para a casa dele e a mesma Leninha, filha do Arnaldo e já agora mãe do Arnaldo Luiz, atendeu para mostrar-se admiradíssima de minha chamada. É que fazia dias que procurava meu telefone para pedir-me que procurasse seu filho, o tal Arnaldo Luiz, que se encontrava em férias aqui na Bahia, em companhia de três amigos.
Foi o que fiz a seguir, exatamente, à noitinha de 31 de dezembro, para convidá-lo e aos companheiros, para passarem o ano novo conosco, em casa.
Não póde vir, estava praticamente preso na Barra, no meio da festança à frente de seu hotel, mas prometeu aparecer no dia seguinte. Almoçou comigo, juntamente com seus colegas de trabalho, ele um rapagão que teria feito a felicidade de Arnaldo. Com grande emoção, falamos sobre o avó e seus familiares.
Outro de quem sempre me lembro é Jayme Villas-Boas Filho, dr. Jayme, como o chamava, e sua densa humanidade.
Foi um de meus primeiros chefes e além de apoio e orientações dava-me lições de decência, despojamento e simplicidade.
Enquanto trabalhei sob sua direção fazia questão de projetar-me perante seus superiores, destacando os trabalhos de minha autoria que ele lhes submetia.
Debaixo daquela pessoa simples estava um homem de grandeza, generoso e cheio de confiança nos semelhantes. Tenho muitas saudades dele!
E há Zitelmann de Oliva, radical, exigente, casmurro, briguento, mas também generoso, largo, descobridor e estimulador de talentos, o colega do dia-a-dia, no Económico e na reitoria da Universidade Federal da Bahia, um amigo inseparável de anos a fio, até quando a insidiosa doença o afastou definitivamente do nosso convívio. Com Rafael Felloni, nos últimos tempos, estivemos juntos no trabalho e durante os almoços quase diários e ainda em sua bela casa na Waldemar Falcão, rodeado de livros, da família e de amigos diletos, na mesa farta e nas manhãs de sábado, também com outro inesquecível amigo, José Calasans, que o seguiu depois. Bons tempos aqueles, com papos gostosos, às vezes barulhentos, sempre acompanhados de um bom vinho tinto.
É nesse ambiente, no da redação do Jornal da Bahia, na reitoria e no Banco Económico, para onde afinal o levamos, que recordo o "nêgo" Batista, um apelido desrespeitoso mas carinhoso para o nunca esquecido amigo João Batista de Lima e Silva, príncipe dos jornalistas de nossa terra, escritor de infinitos recursos, um homem pacífico de convivência mais do que amorável, cheio de compreensão e bondade, ilusionista da palavra escrita.
Sebastião Simões, paraibano de Taperoá, primo de Ariano Suassuna, é outro que frequenta minhas lembranças com frequência. Cabeça privilegiada, engenheiro químico que teve grande importància no cenário do Pólo Petroquímico da Bahia, fundador de empresas à base de tecnologias que inventava, Sebastião foi um brasileiro comprometido com nosso desenvolvimento, muito consciente de sua responsabilidade social e também uma pessoa fascinante, um gênio às vezes introspectivo, às vezes excessivamente loquaz. Homem da estirpe de um Rómulo de Almeida, Jesus Soares Pereira e outros que tentaram fazer deste um grande país, Sebastião foi um verdadeiro patriota!
Até a invenção de uma nova raça bovina ambientada no seu sertão paraibano ele estava tentando, mediante cruzamentos genéticos...
Este artigo, que já vai longe, está incompleto. A lista de pessoas que continuam a povoar minhas lembranças ainda abriga algumas que deixarei para cultuar em outra ocasião. Entre elas estarão presentes Salomão Carneiro, sábio e filósofo cearense, colega de escola de Dom Helder Càmara, velho amigo dos tempos pernambucanos e, sem dúvida, a prima Guiomar Barreto Meira, meus tios João, Lélia e Almerinda Melo e Olintho Muniz, o povo de Juazeiro que ajudou meus pais e avós a dar o formato cultural e moral que tenho hoje.

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Artigo iniciado em 31.12.99 e
concluído em 06.02.2002
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