RAÍZES DE UM RETIRANTE
Não é fácil deixar para trás
A terra em que nasceu.
Porque o coração é fértil
E cada coisa está ali enraizada.
É a velha casa de taipa,
O terreiro com algumas flores,
A cerca que serve de varal.
São os cantos estridentes do canário,
Monótonos da rolinha,
Melodiosos do galo-de-campina.
A roça destruída pela seca,
O gado pela fome,
O caprino pela sede.
E ainda os olhos tristes do cachorro
Que já não pode acompanhar o seu dono.
Mas, ele tem que partir!...
Precisa partir!... é obrigado a partir!
E olha tudo em volta.
Pela última vez ouve o chocalho da égua no baixio
E respira o ar puro da sua terra.
Naquele momento tudo se comprime na sua cabeça,
Fazendo rolar lágrimas dos olhos.
E ele sai dali como uma planta,
Perversamente, arrancada pela raiz.
Alguém está por trás de tudo isso!
É o “político” que lucra com o voto barato,
É o industrial que se fortalece
Com a formação dos exércitos de reserva.
Eles, os que governam, fazem tudo sob medida:
Controlam a fome,
As enfermidades,
O nível de emprego
E o grau de desespero.
Até a sede dos habitantes do semi-árido!...
Até o “rebanho” dos que devem partir.
Os que partem vão fazer parte do exército de reserva;
Das legiões de desempregados...
Mas, são reservas, também, os que ficam.
Enquanto houver alguma cacimba de água salobra,
Haverão de ficar ali...
Aguardando as ordens dos que governam.
Ordens essas que nem sempre demoram:
“O que?... os operários estão reclamando dos seus salários?...
Querem cruzar os braços?... protestar nas ruas?...
Tudo Bem!... isso é um direito deles!...
Afinal, nós vivemos em um país “democrático!...”
E virando-se para os seus colaboradores:
“Ministros, arrochem o semi-árido!... parem com as obras!...
Fechem as portas dos bancos!... executem os devedores!...
Precisamos dobrar a oferta de mão-de-obra!”
E sob efeitos da pressão e da ilusão,
E em busca de um “canaã” que não existe,
Muitos vão.
Mas, os políticos calculistas, maquiavélicos,
Também erram.
Por exemplo: eles jamais poderiam imaginar
Que, algum dia, entre esses retirantes
Pudesse estar alguém que os enfrentasse,
Que, com bastante firmeza, protestasse,
Que começasse, com convicção, a dizer não,
Como o “operário em construção” de Vinícius
Ao descobrir que tudo era fruto da sua mão.
Como eles iriam saber que no meios deles
Era capaz de surgir um nordestino,
Um retirante do agreste pernambucano,
Que pudesse, um dia, ameaçar-lhes o poder?
Luiz Inácio da Silva?...
Eles nunca tinham ouvido falar,
Nem desejavam!... afinal, para eles seria apenas
Mais um Luiz Inácio da Silva.
Que imprevisão imperdoável!
Pois, não é que o retirante,
Que se perdia na multidão,
É o nosso governante?
E todo mundo está com ele!...
Acreditando, firmemente,
Que as raízes das coisas,
Da sua terra e sua gente...
Continuarão dentro dele
Enquanto for presidente
(Esse trabalho passou por pequenas alterações da sua versão original)
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