A Forma Sutil de Censura
(por Domingos Oliveira Medeiros)
A palavra é, por certo, o maior diferencial entre o ser humano e os ditos animais irracionais. Mas essa diferença, curiosamente, é também a que deles mais nos aproxima. Basta verificar aqueles que fazem mau uso da palavra. Assim acontece com o animal político, que é bem falante, mas, ao contrário do que manda o bom senso, nem sempre pensa o que diz e, por isso, quase sempre diz o que não deve. No afã de confundir, costuma distorcer os fatos para disso tirar proveito em benefício próprio ou de terceiros.
A invasão daquela fazenda de familiares e amigos do presidente é bom exemplo. Falou-se, com razão, da ilegalidade e agressividade da ação. Alguns viram, naquele gesto reivindicatório, manifesto interesse político. Outros, preocuparam-se com o excesso da repressão policial. E até o governador de Minas foi cobrado pela atitude passiva diante dos acontecimentos. Lembram-se?
Ninguém, no entanto, falou da Reforma Agrária. Que é bem mais antiga. Tem mais de 50 anos invadindo a paciência de todos. E, praticamente, até hoje, não foi resolvida a contento.
Semelhante a tragédia dos dois aviões direcionados contra as duas torres em Washington. Ninguém perguntou a causa de tamanho absurdo, de audacioso terrorismo. E nem estranhou que o fato tenha ocorrido logo contra os Estados Unidos. O país que é identificado, no mundo inteiro, como exemplo de Democracia. E o que fez e vem fazendo o governo Bush? No pressuposto de combater o terrorismo, e num gesto típico de exterminador do futuro, inaugurou uma era de ameaças e de guerras, invadindo países, sob o pretexto do combate ao terrorismo. À revelia das recomendações contrárias da ONU, da qual é um dos principais conselheiros.
O mais interessante é que as invasões têm sempre algo em comum:todos os países possuem poços de petróleo. Ramo de negócio principal da família Bush. E interesse prioritário dos Estados Unidos. Não se fala em combater o terrorismo na Espanha, na Colômbia, na Irlanda do Norte e na África. E, dizem as más línguas, a crise da Venezuela, que por sinal também é grande produtora de petróleo, tem o “dedo” e o interesse americano.
E a questão da omissão ou ação distorcida dos fatos - por conveniência - vem se repetindo. Ocorreu, guardadas as devidas proporções, com aquele inusitado fato relacionado às ações criminosas que teriam sido praticadas no Estado do Espírito Santo, envolvendo autoridades locais.
Relembrando: o ex-ministro da Justiça, Miguel Reale Júnior, afirmou ter apresentado ao presidente FHC a sugestão de intervenção federal no Espírito Santo, numa reunião ocorrida no Palácio do Planalto. Já o presidente Fernando Henrique, por sua vez, divulgou carta ao ex-ministro dizendo jamais ter recebido solicitação de audiência para discutir a questão.
Conclusão: a questão principal, os indícios de participação de autoridades daquele Estado com o crime organizado ficou para segundo plano. Apesar de a OAB local ter encaminhado o pedido com base nas investigações preliminares que foram até agora realizadas. Apesar, também, de Organizações de Defesa dos Direitos Humanos ter endossado o pedido da OAB-ES. Apesar da existência de vários processos, a respeito, que tramitam no Superior Tribunal de Justiça. Apesar dos homicídios havidos. Apesar das ameaças de morte que estariam ocorrendo, agora, com maior freqüência, após a desistência da intervenção pelo titular do Ministério Público.
A pergunta que fica no ar é a seguinte: O presidente Fernando Henrique não poderia, ele mesmo, solicitar ao Supremo a referida intervenção? Ou este assunto estaria restrito ao âmbito exclusivo do ministério Público?
A omissão é a pior forma de censura.
Domingos Oliveira Medeiros
08 de dezembro de 2002
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