Usina de Letras
Usina de Letras
271 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62176 )

Cartas ( 21334)

Contos (13260)

Cordel (10449)

Cronicas (22531)

Discursos (3238)

Ensaios - (10349)

Erótico (13567)

Frases (50580)

Humor (20028)

Infantil (5424)

Infanto Juvenil (4756)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140791)

Redação (3302)

Roteiro de Filme ou Novela (1062)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1959)

Textos Religiosos/Sermões (6183)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Contos-->O PASSADO QUE ENVERGONHA... -- 01/10/2007 - 08:16 (getulio silva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O PASSADO QUE ENVERGONHA...



Retornando ao passado, mais uma vez, me vejo em outra cidade que morei, no interior do Estado de São Paulo. A cidade agora é Ipuã e fica perto de Ribeirão Preto.
Nos anos de 1974, eu tinha mais ou menos 23 anos e começava a trabalhar no hospital daquela cidade. Lembro-me que o ambulatório do hospital tinha entradas que passavam
Por minha sala de trabalho. Então, um rosto me chamava atenção no meio das pessoas que iam procurar consultas médicas naquele estabelecimento de saúde. Era o rosto de uma senhora de uns cinqüenta e poucos anos, que não tinham sobrancelhas e com um aspecto leonino. A sua aparência era de cansada e suja, os pés tortos e as pernas com constantes curativos de gazes amareladas, mas nos seus olhos um brilho de esperança misturado com desilusão. Essa criatura estranha e enigmática era irmã de um dono do cartório local, pessoa de posses e muito autoritário... Família de classe média alta da cidade era tida pelos habitantes de Ipuã, como pessoas orgulhosas e de difícil convivência.
Como eu era novo naquele trabalho e não conhecia muito bem as pessoas que iam naquele nosocômio, comecei a tirar informações a respeito da moça suja e solteirona, que umas três vezes por semana procurava o ambulatório pra fazer os curativos de suas pernas... E aí, resolvi que iria fazer uma visita onde ela morava. A casa era caiada de pó xadrez na cor amarelado desbotado, o reboco das soleiras das portas e janelas caídos, as madeiras comidas pelo cupim, o quintal cheio de lixo e vários mamoeiros que resistiam ao matagal, sobressaindo do mato, como se estivessem pedindo ajuda... Os mamões ficavam podres aos pés das árvores, pois ninguém tinha coragem de comê-los, achavam que a terra e os frutos estavam contaminados pela lepra! Fiquei horrorizado com tamanho abandono, que vivia aquela criatura!Ali fiquei parado, durante uns dez minutos, muito indignado com a subsistência de um ser humano!Quis gritar para o mundo, que aquilo que eu via era o isolamento da morte... Mas calei e voltei ao meu trabalho! Aquela situação não me saia da cabeça, ora pensava em denunciar ora tinha medo, pois sabia que a família era importante na cidade e poderiam pedir minha demissão, sabe-se como é a política das pequenas cidades... O poder é o poder! Então, comecei a traçar um plano para amenizar o sofrimento daquela pessoa.
Duas vezes por semana, eu parava no portão de sua quase casa e conversávamos amenidades e coisas de sua intimidade como, por exemplos: Namoros na adolescência,
Amores, estudos, famílias tradicionais...
E num destes assuntos, fiquei sabendo que: O seu irmão, dono do único cartório local, havia a obrigado a assinar papéis passando parte de sua herança, para que ele pudesse cuidar dela até a morte. Nem a casa que morava estava em seu nome, tudo era uso e fruto. E que fruto? Uma tapera com o nome de casa!
Nos seus momentos de lucidez, ela gostava de falar de um seu namorado antes de ficar sabendo que era portadora do bacilo da hanseníase... Por várias vezes, ela abria uma lata vazia de bolachas, onde guardava suas recordações, e mostrava-me as fotografias amareladas do seu príncipe encantado. Ele terminou o namoro assim que soube da sua doença e casou-se com outra moça da cidade, ficando longe do estigma, mas talvez com uma cicatriz no coração!
Conta-se que os dois eram um casal muito apaixonados e que as famílias os obrigaram a se separarem. Eu nunca tive coragem de perguntar esse episódio a ela, o desenrolar desse romance deve ter sido muito doloroso, só a ouvia no que me era dito em seus momentos de devaneios e lucidez. Talvez pela doença ou solidão, trechos de sua vida ficaram esquecidos!
Por incrível que pareça, eu não via sua dor, estampada nos olhos, durante os relatos, era uma espécie de Dom Quixote de La Mancha em sonhos, acreditando que o ser amado estava lá dentro de sua casa a espera para almoçar, jantar... E que, quando eu fosse embora, ela retornaria ao aconchego do amado!
O motivo de estar contando esta história é que histórias como essa, não voltam a se repetir!
Getulio Silva
28/09/2007
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui