Num domingo você apareceu de tarde, coisa rara, e me chamou para passear.
Era verão e a possibilidade de passarmos uma tarde juntos me deixou tão alegre e com tanta vontade de te agradar, que não conseguia proferir nem uma palavra. Fiquei muda.
Saímos e eu, muito quieta. Você perguntava e contava e eu apenas sorria, embevecida.
A minha mudez foi deixando você cada vez mais irritado e a sua irritação me deixando cada vez mais nervosa, a ponto de não conseguir mais nem articular ou balbuciar qualquer som.
Você pediu mil vezes que eu falasse, chegou a ameaçar de me deixar no meio do caminho se eu não dissesse nada.
Em vão. Era como se eu não tivesse mais cordas vocais. O cerco da aflição gerada por mim em volta de mim mesma foi se apertando tanto, sufocando tanto que só me lembro de ter saído do meu corpo num momento de extrema coragem.
Voei por cima de tudo e, lá de cima podia ver minha aflição no mundo real.
Resolvi não voltar mais. Hoje só meu corpo faz parte do mesmo mundo em que você vive. A alma, assiste a tudo lá de cima.