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Contos-->O Romance do Rio -- 09/08/2007 - 20:48 (paulino vergetti neto) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O Romance do Rio




O circo estava armado na Praça Onze. Passei com ela de carro e lembrei-me de Carmem. Tão longe estava eu dela! A sobrevivência me exigia um preço muito forte. Nem me lembrava, às vezes, quem realmente eu era. Pecava deliciosamente. O Rio de Janeiro espremia o meu corpo em cima de desejos que, lá de onde tinha vindo, impensáveis eram na civilização onde vivia. Faltava-me o ar, chegava-me uma ventania forte e, graças a Deus, conseguia respirar bem na maior parte do tempo.
Ela comprou nossos ingressos. Assistimos a um espetáculo medíocre. Importei-me bem mais em engolir as pipocas amanteigadas e o sorvete de creme russo, do que mesmo com o espetáculo circense. Como uma sanguessuga à procura de alimentar-se, ela punha suas mãos dentro de minha camisa semi-aberta e beijava-me com dúzias de beijos molhados de sorvete e de manteiga. Nem me repugnar com seus gestos eu podia. Dizia-lhe que a amava e pronto. Eram dois circos: o onde estávamos e o que fazíamos. Tantos palhaços famintos eu via. Apenas o espetáculo comprido não me era fácil tragar com satisfação. Queria ir-me, deixá-la só, sair do circo.
_Amorzão..., ah!..., já vai acabar.
Dei graças a Deus sair dali. Estava sufocado, angustiado e entupido de comida. Até náuseas sentia: dela, do sorvete e das pipocas. A manteiga, destas últimas, apenas seu cheiro alimentava as náuseas. Pediu-me que fosse dirigindo seu carro. Era quase meia-noite do sábado. Os carros pareciam correr mais. As ruas desertas ofereciam grandes espaços e eu não fiquei para trás: fi-lo correr também .
_Amorzão..., está correndo muito...
_Pra chegar em casa logo.
_Ah! Que horror! Vamos curtir a noite carioca. Leve-me para Copacabana. Por lá a festa está apenas começando. Vamos!
Mudei a direção e o sentido do carro. Lembrei-me novamente de Carmem. Minha consciência pesava como um fardo de pedras. Mas tudo aquilo me era bom. Fui então para a orla de Copacabana. Quase não encontramos um local seguro para estacionar o automóvel. Ficamos a uns cem metros do bar que escolhemos no calçadão desenhado de ondas alvinegras, símbolo do Rio.
_Cerveja?
_Não. Tomarei um suco.
_Ah! Não..., amorzão..., você só presta quente.
_Ultimamente tenho andado com um balde cheio de água fria.
_Amorzão..., não...
_Sim..., por que não?
_Você está estranho...
_Cansado!
Quando chegamos à casa dela, até o orvalho já se tinha ido. Os ônibus da Senador Vergueiro haviam saído de seus mágicos esconderijos e o barulho já nos ensurdecia. Domingo e a cidade não queria parar. Fomos dormir, esparramados sobre o tapete fofo da sala de televisão. Quando nos lembramos de ir para o quarto, já era o instante de levantarmos, comermos alguma coisa e mergulharmos na piscina de sua cobertura.
_Meu irmão lhe adorou. Quer sair mais vezes conosco. Perguntou quando nós nos casaremos. Eu disse que já nos havíamos casado.
_E ele acreditou?
_Claro que sim.
_Você é louca?
_Amorzão..., eu, louca?
_No meu mundo, casamento é uma instituição muito séria. Vai desde um namoro, passa por uma festa, filhos etc. Não é tão simples assim como você pensa.
_Como você é careta!
_Lá, pra gente, até o significado de careta é outro!
_Que horror!
Quando ela foi ao banheiro, apanhei o aparelho telefônico e liguei para o meu amor, que havia deixado há dois longos anos e com quem deveria casar-me.
_Carmem?
_Oi, Luiz, onde está?
_No intervalo do hospital. Trabalhei a noite toda
_Tadinho..., trabalhando tanto!
_Para garantir nosso futuro.
_Continue. E hoje vai sair?
_Acho que não. Vou aproveitar para estudar.
A bruxa gritou querendo saber com quem eu estava falando. Disse-lhe que era com minha mãe. Adivinhara o que estava tramando.
_ Ah! Deixe-me falar com minha sogrinha.
_Desligou...
_Liga novamente, vai...
_Não. Ela estava de saída.
Deu-me um trabalho imenso arranjar uma desculpa para ela sobre o porquê de ter desligado o telefone abruptamente. Consegui. Conveci-a após longas e tortuosas frases desconexas. Coitada, nem desconfiava de nada. Dentro de sua casa eu a traía.
Na segunda-feira, apanhei um ônibus, deixei-a dormindo e fui trabalhar. Meu apartamento estava uma bagunça. Tive que arrumá-lo , livrando-me da metade de sua sujeira. Só após fui até o ambulatório do hospital iniciar minhas atividades diárias. Ela chegou tarde ao hospital naquele dia. Como chefe da enfermagem, podia dar-se a esse luxo. Trabalhávamos em um mesmo hospital, local onde havíamos nos conhecido.
_Amorzão, estas flores são suas. Devem pagar o bem que você me fez nesses dois anos de namoro. Tenho uma bela notícia para lhe dar.
_Então que a diga logo!
_Estou grávida. Vamos ter um lindo filho.
Quando dezembro chegou e o Natal estava à nossa porta, conheci a outra manjedoura vazia de tudo. O aborto pode ter entristecido a gregos e troianos. Mas, para este alagoano cansado de representar no Rio o que seu coração jamais apoiava, foi uma notícia felicíssima que chegou em vinte e dois de dezembro de um mil e novecentos e oitenta. Que alívio! Estava agora livre... Acabei o romance e só aí me dei conta de que era tempo de voltar. Adeus, Rio; adeus, amor; adeus tudo! Casei com Carmem um ano após o meu retorno.
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