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Contos-->Engano Teu! -- 09/08/2007 - 20:32 (paulino vergetti neto) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Engano Teu!










A rua estava escura e nem o assobio do guarda noturno eu ouvia; o solado duro do meu sapato, ao bater do passos no cimento da calçada, era quase o único barulho! Afora isso, só meu pensamento falava alto; um solilóquio apavorador consumia meu ego. Minha casa ainda estava longe; um quarteirão à direita e três à esquerda. Aqui e acolá é que havia uma lâmpada acesa nos postes. À sombra serenada das marquises, um punhado de pedintes se abrigava acolhendo os sonhos distantes da realidade, que seus sonos permitiam.
Alguma alma já se preparava para iniciar o laborão diário. A cidade, para muitos, acordava ainda quando a madrugada era alta, longe dos raios do sol, nas horas em que o crime passeia e o perigo fica bem próximo de nós.
Em casa ela deveria estar preocupada comigo. Levava uma desculpa bem elaborada para distraí-la do adultério. Eu bem que sabia que não daria certo amar as duas: a de colo fofo e a de
boca doce; meu egoísmo levava-me às raias da opressão. Uma não sabia da outra e eu maltratava as duas. As regras eram minhas.
Imaginava chegando em casa: batia na porta, o sono dela já deveria estar acordado, eu entrava com ar de cansado e culparia o excesso de serões na empresa. Mas apenas um beijo indelével a deixaria mansa e compreensiva; depois, a cama, nossas desenvolturas, tudo isso a levaria a crer que nosso amor era o mais puro do mundo. Coitada!
O que mais me incomodava era a aceitação das minhas explicações falseadas. Todas as noites fazíamos amor; nunca a vi com menos ou mais prazer – era estranho – , sentia-me um imprestável. Dizia para mim mesmo que tinha que salvar meu casamento antes que ela, em descobrindo tudo, o fizesse, sem chance de reconciliação.
Talvez por ela ter vindo de uma cidade de interior, moça religiosa, bons hábitos, obediente, legítima dona de casa, agisse assim. Eu era o diabo do outro lado da história e não me era confortável viver amancebado justamente com minha inspetora.
As madrugadas que tinha que varar, cruzadas nas ruas esquisitas, becos perigosos, eram bem menor do que o de ter-me descoberto frente à legítima – a mulher verdadeiramente amada.
_Cansado!
_Dou-te uma massagem já!
E punha ela minha comida na mesa; eu beliscava, já com a pança cheia do que a outra me obrigara, quase, a comer e deixava quase tudo.
_Está farto?
_Comi na empresa – deram-me um lanche reforçado.
_Está bem!
Era o seu convencimento que me intrigava e tudo parecia ser muito comum, muito fácil. Nada, absolutamente nada, apresentava difícil resolução.
Em maio, dia onze, se não me engano, briguei com Lívia e resolvi voltar para casa mais cedo. Minha consciência me mandava romper com esta e amar bem mais a outra, legitimamente merecedora.
Nunca havia sido assaltado em São Paulo, mas nessa noite dois rapazotes me levaram o relógio – vagabundo eu sei – e a aliança. Levei um tapão nas costas e uma ordem para caminhar depressa e nem sequer olhar para trás. Foi bom porque cheguei ainda mais cedo em casa.
Eram quase nove horas. A televisão estava acesa e com o volume bem alto. Bati à porta umas dez vezes e ela não veio abrir. O que não fazia, nessa noite fez:
_Quem é?
_Eu, amor!
_Você?
E vi o barulho dos seus passos apressados, cheios de medo, correndo na direção dos fundos da casa. Nada imaginei de maldoso. Pensei que se assustara ao ver-me chegar tão cedo em casa, logo numa sexta-feira quando costumava chegar quase com o raiar do sol.
Quando abriu a porta, estava diferente da que eu estava acostumado a ver. Trazia os cabelos assanhados, bem molhados, descalça e com o vinco da saia de banda, demonstrando que houvera pressa ao vesti-la.
_Que houve?
_Você quase que me via a fazer o que jamais entenderia.

_O quê?
_Estava em transe.
_Recebendo espírito?
_Não, um corpo, perfeito, humano, enganador como o seu.
_Queria estar lhe entendendo, mas, juro, nada do que me disse, eu entendi.
_É simples. Vá ao nosso quarto, tome seu banho e tudo saberá. Dir-lhe-ei tudo o que nem desconfia.
Quando ela fechou a porta, ainda ouvi dizer até. Para quem, não soube.
Disse-me – pasmem! – fazia comigo exatamente o que eu fazia com a outra. Traía-me com certo alguém que se deu ao luxo de ocultar de mim o nome.
_Sempre soube de você com ela. Deixei você enganar-se e resolvi pagar com igual moeda. Não me arrependo de nada do que fiz. Foi bom! Não se intimide com o que soube; respeitei-o tanto que o que fiz, foi fora de nossa cama e jamais saberá com quem. Ele lhe conhece, gosta de você, mas muito mais de mim. Quer continuar casado comigo?
Faz doze anos que vivo com Alice. Meu casamento recebeu uma injeção de ânimo enorme. Ela permaneceu ficando com o estranho antes que eu chegue, é claro. Passei a retornar com passos mais lentos para não ter que saber quem é o urso. Cidade grande permite certas estripulias. Não sei quem são meus vizinhos. Talvez, quem sabe, seja o dito cujo um deles?
Preferi permanecer com ela. Tenho-a como doméstica. Lava minha roupa, passa, cozinha o melhor feijão do mundo, só não sabe o quanto eu ganho, onde aplico o meu dinheiro, os planos para o futuro. Da outra tenho conseguido presentes generosos. Não sabem elas o quanto eu sou-lhes grato pelas quatro mãos que me servem diariamente.
“Deixa a vida me levar”, saber tudo, pra quê? Está tão bom assim...
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