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Teses_Monologos-->AS PERGUNTAS QUE KARDEC NÃO FEZ — II PARTE -- 24/05/2003 - 10:51 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Segunda Parte

58. Inevitavelmente, a primeira pergunta do médium há de referir-se ao processo que se criou para aumentar a área de informações espíritas. É verdade que irei obter o favor dos esclarecimentos além dos temas de meu interesse, como ainda poderei sustentar hipóteses alheias, para dar aos amigos do etéreo oportunidade de responder? Quanto à forma de redação, posso contar com o apoio dos que vêm inspirando-me, como acredito que esteja ocorrendo ainda com esta primeira questão, muito mais do interesse de quem redige o livro do que de quem apanha o ditado?

R. Não iremos permitir que o companheiro encarnado caia em digressões injustificáveis perante a qualidade das mensagens com que pretendemos retribuir o tempo e o esforço que nos dedica. Sempre que possível, apanharemos as sutis circunvoluções de seus pensamentos e transformaremos em rígidas composições com mérito suficiente para nos permitirem adiantar a programação. De resto, seria descabido que não déssemos aos encarnados a oportunidade das perquirições, uma vez que Kardec perguntou enquanto vivenciava o crescimento inicial da doutrina. Sendo assim, indague a respeito de tudo o que lhe venha com a chancela do interesse legítimo de quem imergiu em dúvidas e não sabe sair do enredamento silogístico das teses contrárias.



59. Pego de surpresa, penso apenas em interrogar os amigos sobre as influências que venho recebendo através da mediunidade, quer nos instantes em que me dôo à tarefa tardes adentro, quer nos momentos de decisão junto aos parceiros de existência terrena. Sei que em O Livro dos Médiuns posso achar todas as explicações, no entanto, gostaria de particularizar para o meu caso. É possível?

R. Você apanhou no ar o que desejamos que fizesse, ou seja, que elaborasse uma ponderação antes de sondar o etéreo. Isto é ótimo e pode orientar de forma bastante positiva os leitores preocupados em como atingir os espíritos beneméritos nas reuniões mediúnicas. Evite o mais possível fustigar os benfeitores com temas cediços, ou seja, com perquirições cujas respostas não possam ganhar em importância para o progresso no conhecimento da doutrina ou na configuração de sua educação espiritual de ordem emotiva ou sentimental. Pensamos ter dado resposta à primeira parte. Quanto à influenciação do dia-a-dia, fica mais por conta das impressões intuitivas, quando você imagina qual haverá de ser a melhor postura diante de cada situação. O preâmbulo reflexivo vai tornando-se cada vez mais expressivo, à medida que as experiências vão somando-se, como se dá com tudo na vida. Dessa forma, a melhor postura redunda na melhor participação dos parceiros desencarnados, porque se propicia mais tempo para que as diversas variáveis resultem em prévia apreciação dos atos, em função dos elementos evangélicos que se deixaram permear entre as atitudes habituais. Quando, intempestivamente, movido por algum apressuramento emocional, você não medita sobre a melhor resolução, investindo contra as pessoas ou as coisas pela afoiteza de quem se julga no inteiro domínio das reações, quase sempre ocorre de ver frustrado o objetivo admitido em termos filosóficos, morais ou doutrinários. — Isso é muito ruim? — haverá de nos perguntar, em seguida. Pois pode ser ou não ser, tendo em vista as resultantes espirituais dentro do ambiente em que se deu a abrupta participação. Se as pessoas estiverem aptas ao raciocínio lógico sobre a correlação entre as causas e os efeitos, extraindo lições úteis para o próprio proceder em semelhantes situações, apenas o causador da celeuma é que irá penar um pouco ao receber o impacto do sentimento de culpa a gerar aborrecimentos íntimos. Se, inadvertidamente, o grupo for imaturo e reagir mal, ou seja, se revidar à provocação com os mesmos ímpetos de rejeição, provavelmente exigirá esforço suplementar para o entendimento dos eixos psíquicos que provocaram todo o affaire. Resta esclarecer que, sempre que o amigo pedir que desenvolvamos algum ponto em seu interesse particular, haveremos de expor os argumentos de modo genérico, optando por oferecer diversas modalidades de procedimento, para maior proveito da oportunidade que nos é dada de manifestarmo-nos junto aos encarnados. Não é melhor assim?



60. Um fato que me preocupa e, acredito, a quantos se dedicam aos trabalhos mediúnicos, é saber o exato momento de parar. Às vezes, sinto-me muito cansado, julgando que a inspiração está a pique de esvair-se. No entanto, os textos vão sucedendo-se, sem que tenha consciência de aonde vão chegar, passando o tempo e preenchendo-se as folhas, como se se desse uma suspensão inapreensível da vontade de pôr termo ao momento mediúnico. É certo que aconteça por essa maneira o desenvolvimento dos trabalhos, mesmo que, em seguida, eu me sinta envergonhado por, de certa forma, haver duvidado da capacidade de transmissão pelos espíritos?

R. É natural que se aproveitem os do etéreo de todas as oportunidades para oferecer os seus conhecimentos e conselhos. Sendo assim, ainda que o parceiro encarnado esmoreça, prosseguem no sentido de cumprir ao que se haviam determinado. Embora estejam cientes de que nem tudo que venham ditando tenha imediata repercussão intelectual para o médium, é sempre mais conveniente deixá-lo meio atordoado, para não desfigurar os textos, atribuindo-lhes expressões não totalmente condizentes com a intenção com que foram elaborados. Se deixarmos o médium muito à vontade, permitindo-lhe refletir sobre cada palavra que registrar, ainda que um átimo de segundo, aí poderemos amargar alguns trechos em que seremos acoimados de irresponsáveis. Para correção de possíveis desvios de rota é que existem os instantes de recomposição através da segunda leitura, no dia seguinte. Se muito pouco se mexe nos textos, é sinal de que estamos alcançando os objetivos. Para encerrarmos, um último reparo a respeito desta novíssima situação em que colocamos o médium. Quando lhe solicitamos para que efetue as perguntas, não estamos querendo que pesquise no íntimo de si mesmo, conforme foi a tendência inicial, evidentemente conflagrada por ativa sugestão nossa. Queremos, sim, que busque, dentro da temática do mundo atual, pontos nos quais Kardec não poderia cogitar. Simplesmente isso.



61. Posso retroceder um pouco, para saber se estava bem certo o Codificador, ao final da vida, de pesquisar para a feitura de uma História do Espiritismo, preocupação que levou ao túmulo, tanto que, em mensagem psicográfica, insistiu sobre o assunto?

R. Queira, por favor, formular a pergunta subseqüente.



62. Não estaria centrado o interesse dele em fatos absolutamente materiais, ou seja, em algo de discutível importância para o desenvolvimento espiritual dos encarnados mediante os ensinamentos doutrinários cristãos? Melhor dizendo: a história dos eventos da humanidade não se restringirá ao campo em que existem os espíritos transitoriamente, apesar de os valores terrenos serem, segundo as perspectiva das grandezas subjetivas, de imprescindível necessidade para a formação do homem integral, isto é, do ser humano como entidade em desenvolvimento evolutivo agregada à sociedade em que vive e exerce o seu ministério de amor e justiça, conforme a programação cármica anterior ao encarne?

R. A questão se põe de maneira muito clara. O médium sabe que Kardec era um espírito encarnado e que durante boa parte da vida deu prioridade aos aspectos meramente humanos das realizações em que se empenhava. Mas era espírito voltado para os problemas filosóficos e teológicos, de maneira lúcida e racional, o que lhe propiciou desenvolver o pensamento, segundo a pureza das noções filtradas pelo crivo da verdade científica, tanto que buscou o conhecimento em todos os ramos do saber mais desenvolvido da época, em caráter, portanto, de isenção quanto aos dogmas e demais imposições da fé subjugada pela religião. Ora, era de esperar-se que o sentido igrejeiro do culto, aqueles filiados aos interesses do clero, vinculados à sobrevivência das corporações sacerdotais e correlatas aplicações no campo das empresas eclesiásticas, fossem ficar do lado de fora dos intentos do Professor Rivail, na expectativa em que se encontrava de decifrar o mistério da vida e da morte. Quando do advento do Espiritismo por suas próprias mãos, imprimiu à obra o cunho de sua espiritualidade sem compromissos outros senão com a verdade. Por isso, foi explorando todos os recursos que os do etéreo lhe proporcionavam, analisando meticulosamente todas as informações, formando o corpo doutrinário que erigiria sob a direta assistência dos espíritos de luz que lhe forneceram os conceitos e com ele discutiram as diretrizes a serem impressas ao trabalho conjunto. Dessa forma, suspeitar que o Codificador estivesse interessado em colocar todos os preceitos e estatutos dos cânones espíritas sob o guante do materialismo científico é reduzir a perspectiva do encarnado aos paradigmas psíquicos estruturados sob a tutela dos elementos culturais da civilização européia em que estava imerso. Simplesmente por respeitar a palavra dos informantes desencarnados, já não estaria incurso na pecha de materialista. Sendo assim, vamos restringir a pergunta do médium ao âmbito do interesse humano do Codificador em estabelecer critérios rigorosos, para que a gente do futuro pudesse conhecer as origens da ciência espírita, como assim toda a metodologia aplicada pelos espíritos, quanto ao sistema de transmissão das noções fundamentais da existência e correspondente período de vida corpórea, e assimiladas por ele mesmo, enquanto lente universitário comprometido com a verdade. A História do Espiritismo, portanto, é evidente, interessa aos encarnados, porque, para os do etéreo, os procedimentos de exame dos acontecimentos passados sempre haverão de ser os específicos de sua realidade. Pergunta o médium a respeito dos valores em jogo, se não seria preferível eleger a vida do espírito como referencial mais importante para o procedimento dos humanos. Mas afirma, também, que existe motivação própria para os que participam da densidade da matéria, segundo a capacidade individual de envolvimento nas ocorrências que se percebem através dos cinco sentidos ou sensações, por força da necessidade de aperfeiçoamento espiritual do intelecto ou do sentimento. Como o mundo das possibilidades se aproxima da infinidade, nada mais justo do que oferecer aos que se dedicarem prioritariamente à doutrina dos espíritos recurso válido de aproximação histórica das mensagens através das quais se organizou o cabedal de conhecimentos espíritas, que se encontravam, aliás, desde todos os tempos, espargidos por entre os povos, sob feições diferenciadas mas insofismáveis. Reaver todos os aspectos desse desenvolvimento não era desprezível e Kardec bem compreendeu as repercussões que traria para as gerações futuras. Que os homens se dediquem a explicar o que sabem aos parceiros menos sábios é o que se requer sempre, para que se processe a evolução de todos.



63. Sinto-me pequeno para o papel que me foi designado. Que tal se me dissessem qual a importância da elucidação dos problemas atuais, se, para a espiritualidade, as crises são de todas as épocas e o ser humano sempre haverá de lutar contra a tentação do poder, da glória, do comodismo e da falência final do corpo, pela degradação irreversível do organismo? Neste aspecto, não se encontra tudo registrado nas obras de Kardec?

R. Que tal mumificar o espírito humano pela realização passada, tornando os que existem agora apenas o reflexo muito pálido dos precursores em todas as áreas do conhecimento? Na verdade, as civilizações se extinguem e novos povos se organizam em sociedades que vão, num crescendo, aprendendo a conviver sob o império da lei e da ordem. Mas essa tendência, que é natural, não se observa a olho nu, senão através da lupa dos expoentes e sábios que levam a bandeira do ideal, esforçando-se eles mesmos por outorgar aos vindouros a herança de seus sacrifícios em prol dos semelhantes. Se o médium, quando instigado a partilhar do processo de investigação da realidade para superação dos problemas, se julga sem capacidade para a magnitude do evento, então, perder-se-á a oportunidade e restará aos do etéreo recolher-se ao seu tugúrio de amor e compaixão, para as fervorosas orações em que se inclui, necessariamente, a abertura das perspectivas mentais dos que se configuram os mais aptos à intermediação dos informes que trariam estímulo adicional à luta contra a pobreza espiritual dos que se prenderam à matéria, definitivamente segundo as leis cósmicas instituídas por Deus. Não há como influir sobre as decisões que redundam em males para as pessoas, sem a iniciativa da comiseração e o respeito ao direito de evolução de cada um. Uns trabalham de forma ativa, outros, de forma passiva, quando o objetivo é a mediunidade. Contudo, para a salvação, ou melhor, para o desenvolvimento espiritual, são indispensáveis o desejo de melhoria e o empenho em aplicar-se ao bem, por amor ao próximo, ou seja, a realização objetiva das recomendações morais e filosóficas de Jesus e dos egrégios espíritos que deslindaram para os encarnados os mistérios do plano em que emergirão após a morte.



64. Na verdade, não fui plenamente convencido dos méritos que este trabalho auferirá de minha contribuição. Mas, como é para o meu próprio bem e dos que me acompanharem nos raciocínios, vou querer saber como é que esperam os do Grupo das Perguntas atingir metas predeterminadas pelo inopinado da postura nem sempre coerente do interrogador ora oficializado. Será que, se perguntar a respeito de recente suicídio coletivo, estarei oferecendo valiosa oportunidade para que discorram sobre o fanatismo de determinadas seitas, que, enceguecidas pela ânsia de serem aceitas de imediato no Reino de Deus, propugnam a passagem para a esfera seguinte de maneira violenta?

R. Que os leitores avaliem a plena liberdade que demos ao médium é o que desejamos, de modo que as perguntas vão levando o cunho da improvisação, pelo menos neste início do questionário a ele afeto. Futuramente, poderá recorrer às obras modernas, psicografadas ou não, para levantar temas de interesse universal, segundo o prisma atual do saber humano. Eis que o nosso objetivo se alcançará e ficaremos satisfeitos com as dissertações que as questões irão propiciar. Quanto aos leitores comuns das obras mediúnicas, pouco temos a acrescentar aos textos que tratam das conseqüências trágicas para os espíritos que deram fim às suas vidas, sem consideração pelo tesouro existencial que lhes estava sob a responsabilidade. Se levaram a efeito o ato derradeiro com vistas a forçar o Senhor a aceitá-los, sob a hipótese de que o sacrifício foi extremo, apenas estarão a consignar a ingerência da criatura nos desígnios do Criador, ao contrário do ensino de Jesus, em cuja prece se recomenda aos humanos que se exortem a cumprir a vontade de Deus sobre a sua própria. O suicídio, nessas condições, é a expressão mais ignóbil da exacerbação do egoísmo, do orgulho e da vaidade. Contudo, cremos que as nossas palavras se perderão diante do fascínio desmesurado exercido pelos líderes desses cultos, em especial se já dominaram o espírito crítico dos seguidores e filiados, exatamente ao contrário do que aconteceu a Kardec, quando foi chamado a estabelecer o roteiro das questões e a examinar as respostas e demais mensagens que, em grande volume, lhe chegavam de todos os pontos do mundo, com o fito de caracterizar o que havia de melhor, em termos de conhecimentos espíritas, e o que havia de pior, na intenção dos mensageiros e dos mistificadores, os quais devemos simplesmente alcunhar infelizes. Eis que puxamos o fio da meada para a condenação desde logo do fanatismo religioso: a fé raciocinada. Mas isto foi exaustivamente explicado pelo Codificador. Leia-se O Evangelho Segundo o Espiritismo, onde os temas relativos à moral evangélica estão elucidados do ponto de vista espírita. Ou se procure, em O Céu e o Inferno ou a Justiça Divina Segundo o Espiritismo, os textos dos mensageiros espirituais, analisados com o fito de caracterização de seu nível evolutivo.



65. Tenho notado, depois que me foi atribuída a tarefa de perguntar, que muitas questões que julgo poder responder não se fixam para expor aos companheiros do etéreo. Não seria oportuno esclarecer-me quanto à falência de minhas hipóteses, permitindo-me que venha a redigir o que suponho ser perfeitamente compreensível, para dar oportunidade de ser desmentido, quando equivocado? Por exemplo, supus que, se perguntasse a respeito das teorias da doutrina de Saint Germain, iria obter como resposta o mesmo que eu mesmo diria, ou seja, que se trata de teses não totalmente definidas e que irão merecer desenvolvimentos, segundo os preceitos do espiritismo kardecista. Estaria certo?

R. Foi ótimo que o médium estimasse dessa forma, porque não hesitou em oferecer-nos ocasião para responder. Na verdade, muitos temas que vimos desfilar em sua mente são perfeitamente passíveis de esclarecimento, através da meditação arraigada aos ensinos passados a Kardec. Entretanto, outros existem que carecem de melhor desenvolvimento, apesar de tratados em obras, ao alcance dos leitores, mediúnicas ou não. Somos, portanto, a favor de que todas as questões se ponham, a fim de considerarmos da possibilidade de levar os assuntos aos campos de nosso interesse, sem, é evidente, desmerecer o estudo correspondente ao tema em si. Por exemplo, quanto à doutrina de Saint Germain, estamos convencidos de que existe completa, total e irrestrita capacidade dos espíritos encarnados de ascensão imediata a planos mais elevados; nem seria certo duvidar de que isso pudesse ocorrer, porque incorreríamos em declarar que Deus não é justo nem misericordioso. Na história da humanidade, encontram-se casos definidos de santificação, de purificação, de elevação moral, a ponto de se facultar a tais entidades passar para esferas superiores, sem novos estágios no Umbral, ainda que em seus círculos mais quintessenciados. O que será preciso para isso se encontrará consignado nos textos da doutrina referida? Certamente, muitos dos tópicos recomendarão que as atividades dos discípulos se coadunem com a ordenação que mereceram os espíritos que se caracterizam como ascensionados. Cumpridos os preceitos e recomendações, nada mais legítimo do que serem reconhecidas as pessoas como dignas do bem maior. Se existem meios eficazes para o efeito da melhoria mais significativa dos seres humanos, cuidarão os espíritos protetores de oferecê-los e de estimulá-los, uma vez que se enquadrarão, inquestionavelmente, na assertiva de Jesus, quando prometeu o reino do Pai aos que atingissem a perfeição. O Espiritismo também favoreceria a compreensão dos deveres superiores com a mesma finalidade? Não apenas o Espiritismo mas todas as religiões, em seus aparatos e leis de caráter estatutário, o que vale dizer, que os melhores hão de cumprir todos os preceitos, ou ficarão a dever alguma coisa que os prenderá ao círculo em que se encontram.



66. Seguindo um pouco nesta mesma linha de raciocínios, podemos dizer que os humanos não têm necessidade de sofrer a desdita dos sofrimentos alheios para obterem a regalia da passagem a planos mais elevados? Esclareço que estou pensando em que Jesus, em sua glória, deve ser uma entidade no gozo da plenitude da felicidade, embora ninguém, melhor que ele, saiba das dores que grassam entre os imperfeitos.

R. Desde que a atitude das pessoas não seja de insensibilidade, uma vez que não acreditamos que Jesus, na bem-aventurança, se esqueça dos pobres de espírito, sempre poderão ser guindadas a estágios mais felizes. A compreensão de que a dor alheia tem origem na necessidade de superação das imperfeições remete os socorristas à assistência esclarecedora, de preferência ao remediar dos efeitos sem o combate às causas. Mas este princípio se encontra inteiro nas explicações de Kardec. Ou não?



67. Então, posso suspeitar que todos devamos passar pelo crivo das expiações dos males que provocamos, inevitavelmente, orando aos protetores para que nos ajudem a ultrapassar a fase de sofrimentos, sem dar às nossas preces o cunho da súplica provocada pelo desespero, mas a harmonia possível dentro da perturbação em que nos encontrarmos?

R. É exatamente assim que se deve rogar a Deus e aos seus prepostos, sem eximir-se o culpado de sua responsabilidade, mas reconhecendo que de sua própria ação é que decorrerá a cura para os seus males. É de todo justo que se protejam os indivíduos de si mesmos, antes de requisitarem das forças etéreas o afastamento simplório das causas de seus sofrimentos. Explicando melhor, podemos dizer que, enquanto encarnados, os espíritos se vêem enclausurados na matéria, podendo receber o assédio imediato dos diferentes organismos que visam a se instalar em seu corpo, onde se desenvolverão. Para isso, possuem os humanos agentes naturais que obstam os ataques, impedindo o rompimento das barreiras orgânicas ou eliminando os elementos nocivos que lograrem êxito na investida. Esse é o sistema da carne. Mas os espíritos também são obsidiados, tentados, possuídos, conforme rigorosa descrição de Kardec em O Livro dos Médiuns, existindo meios poderosos de defesa, o principal deles contido no procedimento cristão mais elementar do amar, do perdoar e do oferecer dos próprios recursos para beneficiar os necessitados. Vamos dar o casaco também a quem nos pede a camisa ou acompanhar mais alguns quilômetros, além dos quinhentos passos requeridos. Tal princípio se encontra completo nos Evangelhos. Ou não?



68. Seria inócuo solicitar que se atualizem os roteiros para as preces, neste final de milênio, onde os povos se vêem mergulhados em sistemas políticos e econômicos em que o lucro, o benefício particular e o menosprezo pela dor e pelas perdas alheias insensibilizam as pessoas, apesar do forte aparato tecnológico, em todos os setores da civilização?

R. Não teríamos o que acrescer aos ensinamentos que se encontram na Codificação Espírita. Apenas, poderemos descrever o que ocorre de errado dentro dos corações insatisfeitos, mesmo quando têm a possibilidade de estar sob a luz dos conhecimentos doutrinários. Só o fato de não estarem contentes com o que têm ou com a vida que levam é motivo para a censura da consciência, o que nem sempre acontece, porque as realizações tidas como práticas caritativas se superpõem ao exame mais acurado das tendências da personalidade como repercussão do nível evolutivo dos espíritos. Ou seja, os que oram, muitas vezes, fazem-no sem fervor, descrentes desde o princípio de que vão merecer integral assistência dos protetores, sem a suspeita de que as solicitações serão atendidas, não segundo a vontade deles, mas à vista das necessidades. Não é porque o sujeito vive atendendo aos reclamos de trabalho dos centros espíritas que tem o direito de supor estar quite com a consciência, porque os resgates são extensos e pertinentes aos atos de desconsideração aos semelhantes, em todos os tempos, o que significa que os débitos anteriores à encarnação devem ser saldados, conforme a explicação de Jesus na parábola dos talentos, ou seja, Deus irá cobrar de cada um de nós as providências relativas ao tesouro de vida que nos deu, a uns mais que a outros, porque o nível de esclarecimento, em sendo mais elevado, gera maior responsabilidade. Eis que definimos o roteiro mais apropriado, qual seja, o de que a prece, sempre vise a agradecer a vida e todos os momentos agradáveis que a companhia dos entes queridos nos proporciona diariamente, como ainda busque interrogar a alma sobre quais as pendências que restaram a cada iniciativa de restauração através dos atos favoráveis ao bem-estar material e espiritual dos que sofrem ao derredor. E para o restante da humanidade? Que haja sincero condoer e sensível apreensão das vibrações angustiadas, a traduzir-se em ondas de amor e solidariedade constante, como atitude permanente de boa vontade e discernimento, conforme se espera, como se lê na pergunta de número sessenta e seis, relativamente a Jesus.



69. Kardec era um professor gabaritado, mestre emérito e autor de várias obras, antes de se ocupar com a implantação da doutrina espírita nos meios culturais franceses. Ora, é justo considerar os seus textos bastante trabalhados do ponto de vista da expressividade e da qualidade literária, não bastasse os conceitos de que tratou serem, freqüentemente, de complexidade bastante forte. Ainda que o Codificador se alinhasse entre os pedagogos e que facilitasse didaticamente todos os esclarecimentos, para as pessoas próximas do analfabetismo, os seus escritos permanecem muitíssimo carregados de eruditismo, sendo de difícil compreensão para quem não tenha, como diz um escritor, lustrado os bancos escolares com suas calças. Justificar-se-ia, portanto, que haja lugar, dentro da literatura espírita atual, para obras de vigor literário deficiente, para não declará-las completamente alheias ao campo do reto traduzir das comunicações doutrinárias? Por outra, não necessitaríamos nós mesmos reduzir as expectativas culturais, para produzir textos menos técnicos, ou seja, romances do tipo daqueles que agradam as mulheres, com diagramação dramática da chamada linha água com açúcar, com o fito de amenizar as decepções dos que abandonam as leituras por não se harmonizarem com a forma culta da mensagem, não tanto pelo favorecimento dos conhecimentos em si, mais pelo emprego de léxico e de construções sintáticas que exigem alguns refinos intelectuais? Não seria muito mais coerente que disséssemos apenas: ”Os livros, hoje em dia, devem ser simples para as mentes pouco adestradas, ainda rudimentares e não escolarizadas”?

R. Todo esforço de elevação do pensamento das pessoas será coroado de êxito no plano espiritual. A que não se deve dar prioridade é à falência das intenções de ver os irmãos progredindo. Kardec escreveu com o estilo de sua época e, pasmem os incrédulos, atemorizava os literatos com os seus lances de popularizar a escritura, tido que não foi como dono de propriedades particulares na formulação dos textos. Era tido, sim, como divulgador da doutrina, portanto, alguém que pelejava por fazer-se entender do grande público. Mas não cedia à ignorância, porque os temas desenvolvidos assim o exigiam, dado o apuro das teses e a necessidade das explanações fundamentadas na mais absoluta lógica. Para dispor de coerência, precisava ser fluente ao mesmo tempo que preciso; não podia ser prolixo, contudo, necessitava expor às minúcias cada pequenino avanço na teoria espírita. Também estava a enfrentar adversários doutos, como o sacerdócio estudado e os catedráticos da universidade. Hoje em dia, os méritos de exposição repousam na perspectiva da aceitação das obras, segundo a palavra mais abalizada dos dirigentes das entidades espíritas oficiais e que têm voz junto à imprensa especializada. Mesmo assim, à boca pequena, e pela influência da tese de que o número faz a diferença, muitas obras são reimpressas freqüentemente, porque de gosto popular, embora pessoas mais instruídas se torçam com o insucesso de trabalhos que recomendam. De passagem, podemos citar que Kardec aceitou o argumento do número contra a acusação de que o Espiritismo não iria vingar, afirmando que os milhões de adeptos estavam a comprovar que a doutrina viera para ficar. Hoje, perante a multidão dos crentes evangélicos das nascentes igrejas de tonalidade protestante, deveria resguardar-se, porque existe número muito mais significativo de seguidores dessas seitas do que de fiéis do kardecismo. E por quê? Através da palavra mais fácil e inteligível dos pastores, o povo é atraído pela promessa dos bens materiais e espirituais sem grandes sacrifícios, além dos do dízimo dos salários (que esperam ver de volta em pouco tempo) e do abandono dos vícios mais contundentes para a saúde, o que, se alcançado, não é de pequena monta. Não estamos criticando nem o povo, nem os pastores, nem os espíritas. Queremos, sim, que haja harmonia e paz entre os homens e que todos se entendam e se ajudem, perante o direito e a justiça, oferecendo a cada qual os recursos do progresso e os benefícios da educação. Em suma, ante este mesmo desenvolvimento, deve o esporádico leitor crer-se apaniguado por superior disposição psíquica para a assimilação dos conceitos expendidos. Mas isto não significa que estamos condenando a priori todos os trabalhos escritos e publicados sem a mesma chancela desta intricada argumentação e correspondente linguagem. Muitos textos singelos prestam relevantes serviços à causa espírita e nós, que almejamos equiparar-nos pretensiosamente a Kardec (veja-se o nosso título), não vemos dificuldade alguma na divulgação de tais livros, desde que reflitam a ciência espírita, não pequem contra o dialeto culto corrente entre os de desenvoltura escolar média e se apresentem íntegros quanto à honestidade de propósitos dos autores ou mensageiros.



70. Persistindo no assunto, seria possível comentar as produções modernas de poderosos médiuns, destacando-se Chico Xavier como expoente máximo desse tipo de cultura? Outros médiuns, como Divaldo Pereira Franco e Raul Teixeira, também são lidos por extensa faixa de pessoas vinculadas ao Espiritismo intelectual. Contudo, muitos de seus livros são extremamente complicados, tratando de temas científicos ou morais, quando não técnicos dentro da área espiritual, alguns de dificuldade de entendimento superior às obras da codificação. Cito, em particular, a obra inicial do médium mineiro, Parnaso de Além-túmulo, em que deixaram seus nomes representantes da mais lídima literatura em língua portuguesa. Não estariam fadados esses textos esplêndidos a submergir sob a onda das produções medíocres, apesar da imensa repercussão ao longo de alguns anos? Vejam que o risco que correm os deste Grupo das Perguntas é o mesmo, ou melhor, pior ainda, porque, do jeito que as publicações se dão, este livro vai quedar engavetado.

R. Um dia ou outro, cada um de nós passaremos pela porta estreita e, para fazê-lo, temos de demonstrar que aprendemos as lições. O conhecimento é imprescindível para o acesso aos círculos mais elevados, dado que os neófitos precisam desempenhar papéis para os quais devem aparelhar-se convenientemente. Entretanto, ninguém ultrapassa a metade do caminho sem dar o primeiro passo. As chamadas obras de cunho popularesco, as que abrem concessões ao vulgo, as que se contentam com pouco, estas vão sendo esquecidas pelos que progridem, mas sempre são aceitas com muito agrado pelos que principiam a caminhada. Todos temos funções a cumprir, segundo a capacidade desenvolvida por esforço de aprendizagem. Se não tivermos o prazer ou a honra de ver o nosso livro nas prateleiras das livrarias, nem por isso deixaremos de alegrar-nos com o fato de serem procurados aqueles outros a que se referiu o médium, porque as pessoas estão evoluindo e, à medida que se aperfeiçoarem espiritualmente, irão atrás dos conhecimentos que ali se contêm. Se esta explicação se delimitar ao âmbito familiar do nosso ajudante, ainda assim ficaremos felizes, porque teremos, de qualquer modo, feito algumas pessoas refletirem a respeito de nosso ponto de vista. É a este instigar intelectual que estamos dedicando-nos, o que se constitui no resumo de todas as mensagens psicografadas, que não passam de acicates para o estímulo à pesquisa doutrinária mais profunda. Graças a Deus que estamos tendo a oportunidade de expor o que pensamos! Para nós é suficiente este aspecto, uma vez que vamos testando a capacidade de elaboração teórica e transmissão organizada. Quanto aos arranjos lingüísticos mais propícios para atingir o grande público, teremos paciência para ver o tempo passando e as gentes irem, bem aos poucos, atingindo os resultados que se encontram incrustados no destino espiritual das criaturas. Para encerrar, temos a obrigação de lembrar que é exatamente assim que procedem conosco os nossos mentores, a nos ensinar a constância no dever e a moderação no anseio da perfeição alheia e própria. Se este trabalho não for aprovado por nenhum editor, não iremos reescrevê-lo, mas tenha a certeza, caro amigo, de que iremos reformular a nossa postura de escritores, para facilitar o acesso de mais pessoas ao nosso mundo referencial de conhecimentos, de atitudes e de sentimentos. E voltaremos à carga.



71. Nada é definitivo nos campos da matéria, a não ser o passado que se mantém nas lembranças individuais, porque os registros históricos, mesmo os mais perfeitos, são incompletos, quando não inexatos. Sendo assim, a hipótese da perda dos trabalhos executados através da soma dos esforços de tão grande grupo não poderá causar desânimo, embora se saiba que o aproveitamento dos realizadores é inconteste? A referência obrigatória é quanto à destruição, por exemplo, das obras-primas das artes. Este sentido material não afeta o procedimento dos espíritos pela relação possível entre valor e conseqüência não verificável? Faço-me entender: caso este mesmo roteiro não venha à luz do mundo, resignando-se a permanecer na obscuridade da minha gaveta, não estará extinto um dos aspectos mais importantes de qualquer objeto que vise à elucidação dos seres humanos necessitados, ou seja, a outra extremidade da corda?

R. Vemos que o insistente inquiridor desejaria que os resultados de seus momentos de mediunidade se valorizassem, dado que intui que o tempo poderia ser melhor aproveitado, uma vez que a sua vida é única sob o influxo desta personalidade, para a qual se soma o aparato físico aos recursos cerebrais. Nada mais natural do que tal preocupação, mas do ponto de vista dos encarnados. Como estamos adquirindo rapidez no deslindar das complexidades temáticas, pouco nos importa se o amigo está queimando energias à toa. É decisão sua oferecer-se à psicografia. Valorize a obra pela obra e deixe de lado a repercussão que possa obter junto à sociedade. Torne-se membro da nossa equipe, transitoriamente, e aguarde pelos instantes em que volver ao plano da espiritualidade, para se integrar em alguma turma de estudos ou de assessoria aos encarnados. Isto vale para todos os leitores e não apenas para quem está a nos interrogar. É preciso definir este aspecto lúdico da prestação de serviços socorristas, porque não é sempre que o assistido aceita o favorecimento de sua elevação por meios externos, preferindo refazer todos os experimentos, embora leve muito mais tempo e percorra muitos caminhos aleatoriamente. Em todo caso, chegará ao ponto, talvez até com muito mais ampla conexão dentro dos fatores da sabedoria, porque se dedicou a aspectos mais variados do que os que se incentivaram por meio das ponderações dos mais vividos. Em suma, as experiências não se transferem; apenas a noção de que devem ser levadas a cabo. De passagem, como o reparo que fizemos ao argumento numérico de Kardec, também temos de ressaltar que o nosso médium, quando pergunta, não facilita as coisas para os leitores comuns, conforme se pode verificar no texto que compôs para esta questão. Não vale reformular depois, porque era desse maneirismo que estávamos precisando para o exemplo. Muito obrigado pela compreensão.



72. Não estaremos incorrendo em bizantinismos para a finalidade do livro?

R. Primeiro precisamos reproduzir o que o dicionário registra para o verbete bizantinismo, ou seja, em sentido figurado, interesse por discussões frívolas ou insignificantes, sem resultado prático, como as questões tratadas pelos teólogos bizantinos. Não acreditamos que estejamos dispondo da boa vontade do leitor para temas supérfluos. Evidentemente, se os interesses das pessoas não se voltam para o que temos para dizer, tudo o que consignarmos irá representar muito pouco para o acréscimo de conhecimentos doutrinários. É como se dá, por exemplo, com as obras absolutamente técnicas, como quando se trata dos condutores da eletricidade, dos efeitos dos microorganismos sobre o sistema nervoso central, das regras gramaticais do sânscrito, da geomorfologia dos solos do Paquistão e assim por diante, assuntos que, para a maioria, está fora da área de atuação intelectual. Mas tratar das causas e conseqüências das atitudes, dentro do padrão evangélico, ainda que repetitivo ou cansativo, sempre haverá de apresentar a sua importância. Quais os resultados práticos? Simplesmente, à medida que os problemas vão surgindo, estarão habilitadas as pessoas à rememoração das explanações que aqui foram lidas, para saberem como agir. Talvez o que esteja um pouco a mais seja a expectativa da melhor realização, mas somos suficientemente esclarecidos para recomendar que se complementem as nossas discussões com a leitura de outros textos e com os debates entre amigos.



73. A primeira impressão é a que fica, dizem os que se põem a estudar a psicologia das reações. Entretanto, quanto se refira aos estudos propostos pelos espíritas, a imersão nos conhecimentos é paulatina, seqüencial, reversível, devendo seguir o caminho natural do crescimento da mentalidade, qual seja, o de aprender sempre segundo a capacidade de assimilação de cada um, o que se dá gradativamente, como na escala seriada dos ciclos escolares. Poderemos dizer que esta obra está um passo adiante das propostas de Kardec, porque se percebem certas críticas parciais ao acervo técnico do Codificador, embora se reconheçam nele méritos de gênio?

R. Um passo adiante e um passo atrás, porque não é desejo do grupo estabelecer comparações nem imiscuir-se nos temas exaustivamente tratados na codificação espírita. Não seríamos justos, se não víssemos no trabalho do Prof. Rivail o discernimento correto para impregnar as vidas de novos objetivos, abrindo o panorama para a visão mais generosa da misericórdia divina, como ainda para a compreensão mais exata dos ensinamentos de Jesus. Mas temos de considerar que é dele a assertiva de que o Espiritismo evoluiria no campo científico, acompanhando o desenvolvimento das idéias dos precursores das novas tendências, segundo as descobertas dos mistérios que se escondem no seio da natureza, como as invenções de novos recursos de aproveitamento das fontes de energia, para o bem-estar coletivo e adiantamento das civilizações. Mas é preciso estar atento para os movimentos de caráter filosófico, moral, social, econômico, político e demais com força e poderio para estabelecer os princípios da vida comunitária, quer dentro dos limites das nações, quer no intercâmbio entre elas. Foi pensando nesses aspectos das transformações humanas que tomamos a iniciativa de colaborar com as reflexões dos leitores modernos, trazendo-lhes considerações atinentes às novas perspectivas existenciais no mundo. Mas não devemos ir com muita sede ao pote, porque a precipitação das conclusões nos fará entornar a água, ou seja, as análises devem realizar-se segundo a realidade para cada região, conforme as estruturas que se mantêm inabaláveis, uma vez que os avanços evolutivos não atingem universalmente a todos os homens, pois existem pátrias inteiras que estão apenas emergindo da idade da pedra. Enquanto discutimos pontos de importância global, como a questão da poluição, em muitos lugares, a população sequer tem o que comer, vivendo obstinadamente dos frutos que conseguem arrancar do solo, segundo técnicas de cultivo que herdaram de tradições seculares ou até milenares. Como levar a tais setores da população mundial as sutilezas científicas fundamentadas na Física, na Química, na Matemática, na Geologia, na Genética, na Psicologia ou, no nosso caso, com perdão da impropriedade vocabular, na Parapsicologia? Contudo, tais criaturas também estão ameaçadas de ver desaparecerem os meios de sobrevivência, sem noção do que se passa com o planeta. Por outro lado, são tantas as culturas cristalizadas sob a tutela dos poderosos, que nem pensar se pode em levar-lhes as preocupações de caráter espiritual, para as definições programáticas da doutrina, porque as obras e as pessoas seriam escorraçadas desde a porta de entrada, apenas por se disporem a informar a respeito da necessidade da reencarnação, da possibilidade mediúnica, da natureza do mundo incorpóreo ao derredor do círculo material etc. Bizantinismos à parte, cremos que existem razões para agitarmos a mentalidade mais conservadora dos que visam a salvar-se simplesmente pela caridade, quando a definição de caridade está a requerer algumas reformulações pela maior abrangência dos conhecimentos que se disseminam entre a população melhor escolarizada.



74. É verdade que, na época de Kardec, a benemerência era particular, enquanto hoje muitos códices de leis nacionais estabelecem a cobrança de percentuais dos ganhos dos indivíduos para a manutenção do governo, que gera benefícios públicos nas áreas da educação, da saúde, do saneamento, da habitação, da segurança, através de um estado de direito que se interessa, primordialmente, pelo cidadão comum e não pela manutenção pura e simples da aristocracia, mercê da ascensão das classes sociais, muitas vezes através de movimentos revolucionários. Na época de Kardec, a civilização européia tivera já a experiência da Revolução Francesa, que pôs por terra o sentimento monárquico, redundando em ondas de substituições de valores, até a consumação da Revolução Russa, na segunda década do século vinte. Atualmente, a humanidade vive ainda a euforia das reformas, mas se vê sob o guante do poderio econômico paralelo dos que se encontram fora da lei, no comércio das drogas, das armas, da pornografia, ou seja, estabelecem-se diretrizes em que os conceitos de justiça, de ordem e de progresso ganham matizes muitíssimos estranhos para quantos vivenciam as ânsias da emancipação espiritual, dentro das comunidades tuteladas pelo cristianismo. Pergunto, para não descambar para digressão paralela, se as instruções do etéreo, de maneira geral, apesar de apresentarem especial caráter de advertência e de esclarecimento, não estão propondo aos filiados ao movimento espírita que se alienem da realidade do mundo em que vivem, principalmente porque a pregação doutrinária não subvenciona a integração política dos que participam das atividades dos centros, sociedades e federações, evitando o bulício das agitações mundanas, que pode constituir-se em elemento desagregador das personalidades.

R. Ainda bem que nos perguntou, porque temíamos ficar à deriva, navegando apenas nas águas doutrinárias. Pois é exatamente a preocupação com o momento presente cheio de perigos e de expectativas negativistas que nos trouxe para o debate dos temas referentes ao destino da humanidade. A vida estua em todos os setores, a ponto de haver movimentos de opinião pública firmando-se em organizações não-governamentais, para o efeito da reação que se pede contra a destruição da natureza, o que vale dizer, da vida. Enquanto uns se apóiam nas forças da legalidade constituída para se manterem à testa dos negócios que lhes oferecem lucros, à medida que exploram o trabalho da maioria, outros, sem considerarem o fato de que existem em desacordo com aqueles justamente porque a estrutura social e política é a mesma, extraem o que podem da população, para se manterem clandestinamente tão poderosos quanto os representantes oficiais dos segmentos da civilização que os elegeram às cegas, porque são mantidos na ignorância, sob o protecionismo paternalista dos mais espertos, no mau sentido. Como levar os espíritas a influenciar sobre esse clima de poder? Mantendo linha de transmissão direta entre os planos, para que possamos acusar os defeitos e onde se situam os erros de conduta evangélica; solapando, por assim dizer, as intenções sob a custódia da consciência, pelo despertar do intelecto e o sensibilizar para a dor e a miséria. Afirmamos, na resposta anterior, que o conceito de caridade deve adaptar-se ao campo de atuação de cada pessoa, isto é, se o sujeito for um capitão da indústria, deve atender à multidão que se encontra na dependência de suas deliberações, e não montar esquema de administração em que as responsabilidades se diluem e ninguém assume o compromisso da assistência e acompanhamento das necessidades dos empregados. Se ali se situar um indivíduo dado aos estudos espíritas, com a convicção de que as diretrizes doutrinárias estão certas e de acordo com a realidade espiritual, deve levar para a empresa o ideal cristão, trabalhando pelas pessoas e não pelo lucro ou pela produtividade. Se estivermos aparentando ser muito simplórios no desenvolvimento destas considerações, atemorize-se o caro leitor por acreditar em semelhante conceito, uma vez que as realizações humanas, segundo as leis universais, cósmicas ou divinas, irão confluir, necessariamente, para os atributos do espírito sobre os quais incidirão os acréscimos de benemerência do Senhor. Talvez estivesse faltando falar a respeito dos magnates, dos dirigentes e dos administradores; pois agora não falta mais.



75. É aceitável que a humanidade procure outros caminhos para ir ao reino de Deus, embora passe pelo Espiritismo, sem se deixar embalar pelas teses por ele defendidas?

R. A compreensão da doutrina espírita exige dos seres encarnados uma série de transgressões dos dados materiais, uma vez que a imersão na carne invoca, necessariamente, os esquemas de sobrevivência próprios da esfera terrena. Não é fácil extrapolar os costumes arraigados no pensamento prático ou imediatista da maioria. Existe, também, a faculdade da transferência de responsabilidade, nesse campo de transcendência das leis puramente corpóreas para as que se propugnam nos códices da espiritualidade, podendo estabelecer os humanos que pessoas dedicadas aos temas religiosos estejam melhor preparadas para a elucidação do que devem fazer para responderem aos anseios do Criador. O Espiritismo exige, por sua vez, que se conscientizem os que o procuram de que são almas em evolução, muito grosseiras para freqüentarem os domínios dos anjos ou espíritos de luz. Muitas vezes, as pessoas são atraídas pelas casas espíritas para assuntos de primeira instância, desejosas de reaver o domínio de si mesmas, por causa de sofrimentos advenientes de conjunturas inesperadas. Correm o risco da decepção, uma vez que nem sempre as pessoas ou os benfeitores espirituais estão em condições de lhes propiciarem o atendimento requerido. Palavras de soerguimento moral elas podem encontrar em qualquer outra seita ou religião, bastando demonstrar que estão a pique de se desesperarem. De resto, a ciência psiquiátrica oferece remédios tranqüilizantes e os psicólogos estão aptos a acompanhar o desenvolvimento das crises, obtemperando com sábios conselhos pertinentes às próprias regras do viver mundano. Muito recentemente, outros ramos do saber se despertaram para a ajuda mental, de sorte que recursos existem em muitos campos para a minoração da dor. Se for esse o caso das pessoas, é compreensível que se dêem melhor com uns do que com outros, passando batidas pelas explicações que remetem ao carma. Faça a pergunta que o traz hesitante, por favor.



76. Ouvi, recentemente, de um dos próceres da mediunidade, respondendo a perguntas do público, que as mortes das crianças também se explicam através da curta temporada na vida que lhes estava programada para complementar alguma passagem anterior que foi antecipada. Ora, a premissa da antecipação não se refutou. Então, não é justo suspeitar que muitas crianças perecem também antecipadamente?

R. Nada a objetar quanto à sua conclusão. Deveras, os acidentes existem, uma vez que os espíritos que cuidam dos reencarnantes não dominam o destino como se tivessem o poder integral nas mãos. É justo duvidar, portanto, que os pequenos que desencarnam estejam dando cumprimento à lei cármica, podendo, perfeitamente, estarem sob o efeito das leis materiais. Mas a sua pergunta ia mais longe.



77. Sim. Corolário da anterior, o mesmo palestrante referiu-se à necessidade, muitas vezes, de encarnações dolorosas, nas quais os aparatos corpóreos estariam prejudicados porque o perispírito não está incólume, ferido que foi pela própria pessoa em ato suicida. Não vejo falha na explicação. Parece lógica. Mas será psicológica? Será caritativa a pessoa que leva ao conhecimento de pais de filhos com aleijões físicos ou mentais que tais criaturas estão pagando por erros cujo conhecimento lhes é vedado pelas próprias injunções corpóreas? — Que crimes terei praticado nesta ou noutra vida? — perguntarão os pais angustiados, porque a explicação estende a eles a necessidade da expiação. Compreendo que a lucidez dos que se dedicam inteligentemente ao estudo da teoria espírita facilita a compreensão para os resgates de dor. Mas as pessoas que estão imersas nos problemas não se sentirão magoadas com tais raciocínios e não buscarão palavras de maior conforto imediato?

R. Está claro que o médium entende que todos os conhecimentos se encontram na obra espírita. Talvez o seu condoer pelos mais frágeis intelectualmente lhe dê esse sentido da sensibilidade da alheia estupefação. Também não agasalha o pensamento de que as pessoas possam perder-se para o Espiritismo, reconhecendo, embora, que o tempo é mestre da sabedoria. Todavia, quando se é bem acolhido e, apesar disso, a pessoa que se afasta da casa espírita não se constituirá em percalço para a divulgação da doutrina. Antes, poderá levar a simpatia do trato ameno e caridoso de que foi alvo. Nesse aspecto, tem o seu raciocínio razão de ser, porque não causa satisfação ouvir que o filho está pagando por supostas faltas, como ainda os pais. Unindo esta questão à anterior, vemos que o médium quer estabelecer correlação entre os fatos, ou seja, quer ver nas pessoas com males congênitos também seres humanos eventualmente em desvantagem física ou mental, tendo sofrido um acidente de malformação orgânica, porque, como dissemos, os engenheiros genéticos do etéreo não são deuses e não mantêm todas as variáveis da encarnação sob controle. De novo, temos de concordar com a dúvida relativa a que todos os casos se expliquem pelo proceder da lei de ação e reação puramente espiritual. Nesse caso, resta a saída do sofrimento como sobrecarga suportável, a que aludiu Jesus, porque, sabemos, Deus não permite a ninguém que carregue uma cruz severa demais para a condição humana. Contudo, a melhor explicação se encontra em tópico de caráter genérico, dentro das diretrizes fornecidas a Kardec pelos amigos da espiritualidade, qual seja, a de que este planeta acolhe espíritos bastante atrasados, mas capazes de vislumbres da verdade da própria condição inferior, ao mesmo tempo que, para muitos, se favorecem as luzes do conhecimento, conforme exaustivamente temos afirmado. Uma hora ou outra, todos passaremos, como já dissemos, pela porta estreita.



78. Dentre as pessoas que passam pelo Espiritismo, encontram-se aquelas que se decepcionaram, não com a teoria, mas com as pessoas. Teríamos algo a recriminar aos que deixaram escapar os adeptos em potencial?

R. A preparação para a próxima questão é evidente. Faça-a agora.



79. Muitos não entendem direito os aspectos filosóficos da doutrina, porque desejam aplicar diretamente aos seus organismos espirituais, vamos dizer assim, os fenômenos que sabem existir em relação aos médiuns. Por exemplo, gostariam de receber mecanicamente as mensagens dos protetores. Também se esforçam por conduzir experimentos na área dos efeitos físicos. Há quem se esmere para canalizar energias de um plano a outro, com a finalidade de cura ou de afastamento do mal-estar e dos pensamentos depressivos. Existe quem censure os dos centros espíritas por não permitirem o uso de talismãs. Serão essas pessoas recrimináveis por desejarem tornar a teoria o mais material possível, no âmbito de sua atuação energética ou vibratória?

R. Para utilizar o termo incluído nas perguntas, recrimináveis somos todos nós, por considerarmos os nossos pontos de vista inatacáveis. Quando a pessoa assusta os novatos com explicações mais ou menos aterrorizantes de carmas de suicidas ou de homicidas, de fato, deverá passar por treinamento de reciclagem no tratamento que deve dar aos que chegam ao movimento tangidos pela dor. Também os que não vêem méritos naqueles trabalhadores que se dispõem a administrar o centro, estão merecendo a increpação das desilusões precoces, porque ninguém é perfeito. Estes mesmos textos, se examinados com algum rigor, não oferecem níveis de resistência argumentativa muito fortes, a ponto de originar no leitor certa indisposição, caso requeira dos mensageiros preciosas noções, justamente aquelas que o colocariam extasiado. Não obstante, como referiu o médium, existem os que se decidem por outros princípios, criando expectativas muito pessoais, para cujo desempenho não estão preparadas as casas espíritas, de modo geral. Se preciso for que caminhem um tempo de ceca em meca nessa pesquisa particular, estarão exercendo o seu direito de livre-arbítrio. Para eles, temos a oferecer a nossa palavra de apoio, sempre que estiverem no legítimo gozo de suas qualidades mais preeminentes no campo da moralidade, tudo realizando em prol dos semelhantes, por amor a Deus. Não concluam, por favor, que estejamos censurando os que se afastam de nossas obras e explicações. Estamos, sim, orando por seus desempenhos cada vez mais próximos das realizações que os guindarão a círculos mais adiantados, no caminhar para Jesus. Que Deus nos proteja!



80. Muito embora a temática do tempo e do espaço tenha sido demoradamente discutida e esclarecida em outros ditados que recebi, gostaria de interrogar o Grupo das Perguntas, para dar-lhe a oportunidade de discorrer diretamente, sem os subterfúgios dos que inseriram as explicações em estruturas narrativas. É verdade que o tempo e o espaço não existem senão como resultantes do trabalho realizado pela aplicação da energia, fulcro da essência deste círculo existencial não totalmente desvendado pela inteligência humana?

R. Na pergunta, está, em primeiro lugar, o pensamento do médium, porque se interessa pela resolução do problema do ponto de vista especulativo, já que se prepara para o decesso. Evidentemente, sentem na carne os humanos o transcurso do tempo, que medem de variadíssimas maneiras. Da mesma forma, conseguem estabelecer padrões de referência para o espaço, macro e micro. A sensibilidade corpórea está codificada socialmente para a configuração desses parâmetros, tanto que existem as jornadas de trabalho e as dimensões das áreas. Sendo assim, dizer que não há o tempo nem o espaço como categorias existenciais autônomas é um pouco forte para a mediania do pensamento, tese muito mais acadêmica, para ser discutida entre filósofos ou cientistas. Mas os espíritas ganhariam muito se tentassem compreender como é que se constituem tais conceitos pelas teorias da Física Nuclear ou Quântica, porque, despertando no etéreo, de imediato poriam de lado as impressões terrestres, assimilando o modo pelo qual a eternidade se dispõe para o efeito da indissolução dos elementos fluídicos, característica imanente do espírito, que se reflete no perispírito de maneira ativa, porque a ação sobre ele, em não sendo jamais deletéria, já que não existe deterioração mas aperfeiçoamento e correção, se dá diretamente. A tese das alterações da organização corpórea, portanto, imprime ao cérebro do encarnado a noção do passar da idade, o que deve ficar esquecido no plano espiritual. Para entender os mecanismos íntimos de como se formam os relacionamentos energéticos dentro da estrutura molecular da matéria, preciso será que se descubram os ingredientes mais sutis dos átomos. Isso é ensinamento de base, que deve circunscrever-se aos encarnados. Para efeito da compreensão de como se inverte o processo no etéreo, ou seja, de como é que os elementos mínimos se conjugam para o arrefecimento da impressão do tempo e do espaço, estruturando no cérebro perispirítico a noção de grandeza global da esfera em que se existe, através dos recursos menos pragmáticos do imediatismo das realizações, preciso será que os seres doem de si mesmos para a instalação e manutenção de centros de aplicação dos ensinos evangélicos, como as colônias, em que se reúnem os espíritos em vias de serem chamados para ampliarem o seu nível de sabedoria. É a chamada harmonização vibratória, segundo o grau de desempenho dos indivíduos que compõem o conjunto de mesma expressão ou caráter. Aqui se iludem quanto ao conceito de tempo apenas os que se demoram em tomar a resolução do progresso, presos que se vêem às diretrizes impressas em sua personalidade desde a encarnação, pelas razões mais diversas, como venturosa estadia no planeta, como o complexo desejo de auxiliar os que se perderam durante a vida ou após o desenlace, como a renitente formulação dos preceitos e preconceitos religiosos que não se ajustam à realidade existencial em que se situam etc. Na maior parte das vezes, quando os companheiros partem para as aventuras mais perfeitas dos planos superiores, os que ficam para trás estimam que perderam tempo e buscam, em conseqüência de tal raciocínio, o principal feito desde que estabeleceram o princípio evolutivo como necessário: o conhecimento integral de si mesmos. Mas este dado não se escondeu dos mortais, tanto que, sempre que se pensaram os indivíduos seres conscientes, lhes veio a intuição de que, para avançarem, precisavam saber quem eram. Sendo assim, estamos fornecendo uma espécie de informação privilegiada de como atingir desde logo a condição mais legítima para a ascensão desde o corpo físico. Esclareça-se, para que se evitem dúvidas, que nos referimos à sede da alma como estrutura provisória, porque, como se disse a Kardec, o espírito é que vai adquirindo o saber e o sentir, adequando o seu aparato material, ou seja, o invólucro a que se deu o nome genérico de perispírito, para o enfrentamento do clima da próxima estação evolutiva. Se estas explanações têm o condão de estimular o leitor para as novas páginas, é sinal de que não vem notando que está aplicando energias de seu organismo ao trabalho de assimilar os conhecimentos. Perderá o seu tempo? Gastará, sim, enquanto vai dando-se o transcurso vital. Mas recuperará cada instante após a morte, porque tenderá ao desprendimento dos liames carnais com mais facilidade e presteza. Se esta informação não vier a ser útil para a vida, procure o amigo ou amiga catalogar quais os conhecimentos, segundo a sua natureza e a sua concepção filosófica ou religiosa, que se podem aproveitar no etéreo. É um desafio que será vencido por quantos aspirarem a não regressar mais à Terra, realizando desde já todos os atos da santidade ou da angelitude que se prevêem nos códices em que as virtudes se fundamentam no amor e no perdão, com todos os corolários da justiça, do trabalho, da caridade, da esperança, da fé, da perseverança, da honestidade, da humildade, da modéstia, da perfeita interpretação, enfim, das leis universais, que regem ou equilibram os macro e micro procedimentos em conformidade com a vontade de Deus.



81. É verdade que nem tudo são capazes de entender os humanos melhor dotados de inteligência, sendo essa a razão de que os espíritos nem tudo informam? Esclareço, por meu turno, que tenho imensas dificuldades na quase totalidade das áreas do conhecimento, segundo os desenvolvimentos científicos, técnicos ou filosóficos. Não estou, pois, perguntando no meu interesse. Caso a resposta venha a trazer à baila pontos de referência que ficarei sem entender, peço-lhes que a formulem mesmo assim, mas que o façam de modo a facilitar-me o trabalho. Aproveito a oportunidade para agradecer a atenção extraordinária que estão proporcionando-me.

R. Para nós é suficiente que o amigo trabalhe e se doe de corpo e alma à mediunidade. O mais virá a seu tempo, por acréscimo de misericórdia do Pai. Agradeça a ele. Quanto ao entendimento superior de muitos encarnados, nem mesmo nós, os que se manifestam através desta obra, somos capazes de acompanhar, porque também nos falecem as prerrogativas da inteligência mais abrangente dos espíritos que se situam em planos mais elevados. Se não temos os recursos intelectuais, precavemo-nos através de atitudes que elegem o bom senso como norma de procedimento e agimos com muita paciência, para a percepção gradual dos fenômenos em toda a sua amplitude física (material) ou psíquica (espiritual). Mas a palavra de Jesus, quando se referia ao fato de falar por parábolas, se aplica em toda a sua extensão e compreensão (termos da lógica formal) aos homens incultos, ou seja, àqueles que se recusam a ouvir e a ver. Ora, tendo em vista que a aplicação aos estudos, às pesquisas, às descobertas, ao conhecimento mais exato de cada elemento da natureza, pelos mais inteligentes, gera o saber científico, que se vai espraiando em ondas de comunicação, a partir dos centros especializados para os setores tecnológicos ou de transformação, posteriormente se aproveitam as comunidades dessa dedicação superior, para maior conforto de suas vidas. O mesmo se deu com as informações que se contêm nas respostas a Kardec, mais acentuadamente em O Livro dos Espíritos, de forma que as migalhas vão alimentando os pobres, até que criem forças para partilharem o pão da existência. Se não for nesta encarnação, será na seguinte, conforme o interesse que demonstrarem pelo agir evangélico. Solicitamos ao médium que se conforme com estas notícias e que se esforce por integrá-las ao rol de seus conhecimentos, para que o inconsciente possa trabalhar a matéria aqui exposta e venha a lhe propiciar, oportunamente, a alegria de verificar que as suas ações se coadunam com os ensinos que, por ora, ficaram na obscuridade. Para uns mais do que para outros, o processo de assimilação é mais dificultoso, o que se deve aprender a avaliar desde logo, para implementação das diretrizes a que nos referimos na questão anterior, quanto à utilidade dos procedimentos que visam ao progresso espiritual nos campos etéreos.



82. Aproveitando-me do gancho que se encontra na resposta acima, não seria mais conveniente falar a respeito de espírito ou de alma, em lugar de inconsciente e consciente, em clara referência às teorias psicológicas que se desenvolveram a partir das teses freudianas?

R. Caracterizemos, desde logo, que a ciência promanada das hipóteses psíquicas da primeira hora era rigorosamente materialista. Isto afirmado, podemos empregar, na qualidade de espíritos livres da matéria, todo e qualquer conceito, sem o perigo de sermos acusados do mesmo mal. Então, vamos assegurar que, na mente dos encarnados, em seu cérebro denso e fechado dentro do crânio, existem inúmeros dispositivos inteiramente dados aos eventos meramente psicológicos, sem as premissas das vidas anteriores ou os reflexos do carma. São os acontecimentos desta hora que repousam na memória e que causam problemas de ajustamento à realidade. Através das técnicas psicanalíticas e psiquiátricas, mesmo com o uso (sem abuso) dos medicamentos que afetam o sistema neurológico, podem-se suprimir os estágios de angústia, desespero, depressão, ânsia, fobia e demais esquemas propícios à esquizofrenia, à psicose, à neurastenia e demais afecções mentais. O acompanhamento afetivo que se possa proporcionar às pessoas dentro dos círculos espiritualistas somente irá integrar o conjunto das atividades saneadoras do mal, como nas doenças físicas se exige que haja assepsia e cuidados higiênicos. Nesse quadro, é possível encaixar os conhecimentos doutrinários espíritas, porque é sempre cabível o entendimento de que cada qual deva perpassar por provas que visem à regeneração dos males incrustados no espírito. Os meios que o Senhor encontra para pôr despertas as criaturas é de sua vontade, que prevalece sobre a nossa, embora tenhamos a sensação de agir livremente. Não queremos obstar o ímpeto com que o amigo médium pensou sobre a tese que acabamos de expor, mas a verdade é que as desgraças que nos atingem são o mero reflexo das atitudes que tomamos durante a existência, compreendida aqui em sua acepção mais universal. A Deus, o mérito de nos proporcionar os ingredientes bem dosados dos sofrimentos, como são, muitas vezes, desagradáveis os remédios ou as cirurgias que promovem a cura de nossos organismos perecíveis.



83. Outra sugestão para o meu questionar se encontra na assertiva de que, para cada esfera, existe um corpo mais ou menos sutil a envolver o espírito. Não se encontra embutida nessa idéia a perspectiva de se oferecer aos adversários do Espiritismo o argumento de que, mutatis mutandis, o que ocorre nos círculos ditos espirituais não passa de arremedo da vida na matéria, ou vice-versa, substituindo-se a figura do desenlace do corpo, a que chamamos de morte, pelo sistema de condução para outros planos, com a exigência de se deixar a vestimenta etérea condizente com a essência existencial antiga, para a assunção de outro perispírito?

R. Existe, sim, esse perigo, mesmo para muitos dos companheiros que se iniciam nos estudos mais avançados das teorias espíritas vigentes nas escolas das colônias do etéreo. Mas a simples informação de que o corpo terreno se desfaz em seus elementos primitivos, reintegrando-se na natureza, é suficiente para esclarecer que algo restou incólume no processo da passagem para este campo energético diferenciado. Ora, o perispírito que se deixa para a ascensão a níveis superiores de evolução espiritual não se desintegra, mas eteriza-se segundo as condições existenciais subseqüentes. O pensamento de que é outro o invólucro do espírito em função dos círculos seguintes é provisória para o espírito humano acostumado à carne que o mantém íntegro em seu ambiente material. O aperfeiçoamento que se sustenta intransigentemente como necessidade para o elevar-se à paz e à bem-aventurança eterna se reflete no tônus molecular, por assim dizer, que constitui o aparato físico da vestimenta espiritual. A tese do materialismo espírita cai por terra, quando se compreende que a entrada no reino de Deus só se dará quando houver completo quintessenciamento da criatura, porque, conforme já nos disse Jesus, precisamos ser perfeitos como o é nosso Pai celestial. Sendo assim, se for para argumentar contrariamente às acusações de que poderemos ser alvo por defendermos que a matéria se sutiliza até se desfazer em vibrações energéticas cuja natureza não somos capazes de definir ou caracterizar, que se aceitem, provisoriamente, as sugestões de que o bem que desejamos para nós deve ser exatamente o que deveremos pleitear e realizar para os outros, mantendo-se, com boa vontade e paciência, a perspectiva do respeito às convicções, ainda que postas em forma de polêmica, para a celeuma das controvérsias. Pleiteamos, com Kardec, que não haja nenhum dogma dentro da doutrina espírita e recomendamos que os temas relativos ao mundo subseqüente à morte não se constituam em pontos de afirmações peremptórias. Ao aqui chegarem, as pessoas terão de confirmar os seus pontos de vista pela realidade em que emergirem. Nesse caso, de imediato, muitas terão a sensação de estarem absolutamente corretas quanto à materialidade deste círculo, porque assim o desejaram veementemente, dentro de seus corações. Até desfazerem tal impressão, muito terão de perambular pelo Umbral, observando como se realizam os fenômenos no campo de atuação dos espíritos. Se carrearem para cá, com confiança nas palavras dos espíritos, os conhecimentos transcendentais que são transferidos para os humanos através dos desenvolvimentos mediúnicos, poderão ter a satisfação de confirmarem os raciocínios desenvolvidos com fundamento nas teses espíritas. Mas todos terão a oportunidade de saber a verdade, cada qual a seu tempo, e isto não é dogmático, mas fruto da certeza de quem vem observando os fatos em sua realização. Eis que confirmamos a nossa própria deliberação de nos mantermos absolutamente em paz com a consciência, porque estabelecemos, como princípio para os desenvolvimentos filosóficos, a fé, a esperança e a caridade, as três fontes de energia para a manutenção dos anseios de progresso.



84. Tendo como base que as impressões dos espíritos podem confirmar as teses materialistas que portavam em vida, não seria justo suspeitar de que muitos terão seus pontos de vista sustentados apenas porque continuam com a estrutura mental argamassada segundo os princípios que deixaram para trás, quando deveriam, de pronto, sentir-se modificados, segundo a natureza de seus perispíritos?

R. Caberia uma resposta risonha e franca, como chamar a atenção do médium para o fato de que a abóbora, se desse em árvores, poderia cair sobre a sua cabeça. Mas sabemos do interesse em se confirmar que as informações que prestamos não estão em desarmonia com a realidade. Não oferecemos conceitos próprios, mas todos os conhecimentos extraímos da realidade do campo em que existimos na qualidade de espíritos. É do saber espírita elementar que as criaturas são mais ou menos adiantadas. Sabe-se, também, que muitas habitam as furnas e cavernas das trevas, pela malignidade de seu comportamento, porque não são capazes de pensamentos moralizados. Deixam-se embalar pelo ódio, pelo rancor, pela vontade de vingança, por ambição, por orgulho, por vaidade, pela supremacia de si mesmas, no embalar egoístico de quem não pensa nos outros senão com o interesse de se aproveitarem deles. Como tais indivíduos serão convencidos de que apenas depende de si mesmos o arrefecer dos males, para a compreensão de que Deus é amor e de que algo mais existe além das suas próprias vibrações imperfeitas? Levar-lhes o conhecimento do quanto são inferiores não será obra pouco caridosa, dado que farão de si farrapos espirituais? Por outro lado, a complexidade do saber incide na necessidade da assimilação paulatina dos fatos e fenômenos, tendo em vista que, para cada causa, corresponde um efeito. Essa lei, dita de maneira direta, traz a dificuldade da aplicação no campo dos acontecimentos, tantas são as variáveis implicadas em cada mínimo ato de realização existencial. Em suma, valha-nos a comparação do infante que vai explorando o ambiente, sob o influxo dos interesses dos pais e familiares, para o aprendizado de como se deve portar em cada situação. Sendo assim também no etéreo, a melhor atitude é divulgar o mais possível o pensamento espírita, aguardando que o interesse das pessoas se desperte para a doutrina como sistema filosófico, como ciência e como religião, momento em que não se perderão mais para a apreciação imediata de como se configuram os padrões existenciais a serem dominados após o desenlace da vida.



85. Qual é a relação de inteligência entre os minerais e vegetais com o ambiente? Terão discernimento segundo a sua própria natureza ou se comportam pelas leis gerais da matéria? Haverá, por outro lado, o auxílio de seres espirituais elementares, com a função de organizarem a matéria bruta e de presidirem à formação e manutenção das espécies vegetais? Gostaria de citar o caso muitíssimo estranho, no mínimo curioso, de certas plantas que, para se reproduzirem, atraem determinados insetos através da forma e do odor, para que, incentivando-lhes a libido, possam incrustar-lhes nas costas o pólen da reprodução, que será depositado em outra planta preparada para a fertilização. Não está muito longe de atividade plenamente amparada por indícios de inteligência ou de profunda adaptação ao hábitat. Ou estarei concluindo equivocadamente?

R. Gostamos das perguntas que não escondem intenções e que explicam, com clareza, o ponto a ser evidenciado. Na verdade, existem os elementais que zelam pelos inorgânicos e pela vegetação (ver questão de número quinze). Podemos adiantar que os animais também possuem protetores. Contudo, o estímulo para o desenvolvimento das habilidades que caracterizam as espécies não corresponde completamente a todos os aspectos de seu desempenho dentro da natureza. Possuem os minerais e vegetais propriedades específicas de adaptação ao meio, de forma que podem ajustar-se plenamente aos problemas que vão surgindo, desde que a evolução deles não se dê ex-abrupto. Quando os homens interferem violentamente na paisagem, não há como os elementos ali existentes se defenderem à altura das provocações. No entanto, os seres humanos contêm em seus organismos os mesmos ingredientes que se encontram na natureza, segundo organização própria. Se não extraem os alimentos do solo através de raízes, utilizam-se de quem as tenha e se aproveitam dos trabalhos dos vegetais e dos animais. Essa cadeia existencial deveria induzir as criaturas aparelhadas de inteligência criativa de que a adaptabilidade se mantém dentro de limites, sendo perigoso ofender de morte justamente aqueles seres que oferecem o oxigênio imprescindível à vida animal. Os desertos criados pela ambição humana não param de crescer. Mais tarde, alguém poderá perguntar se houve a intenção do revide, da vingança, da retaliação por parte dos elementos. Cada um se defende como pode. No caso em tela, não há necessidade de inteligência ou de consciência: basta que se apliquem as leis da matéria. Então, para não irmos demasiado longe nas lucubrações que poderiam advir justamente da falta de inteligência humana, quando da destruição de suas fontes de vida, digamos que existe uma consciência universal, cuja natureza não estamos em condições de explorar, porque, como sempre afirmamos, não passamos de espíritos da mesma ordem dos encarnados. Aconselham-nos os mestres para termos para com os minerais, os vegetais e os animais a consideração da vida ou o respeito pela constituição adquirida pelos milênios decorridos desde as grandes transformações geológicas. Para levar o amigo a meditar, vamos fazer simples referência às espécies extintas em épocas anteriores ao aparecimento do gênero humano na face da Terra, sobre o que deixamos a seguinte interrogação: se não houver uma forma de inteligência ou de consciência procedendo ao emaranhado da vida, então, qual haverá de ser o objetivo de sua existência?



86. Posso concluir, pela explanação anterior, que Deus tem planos particulares para as entidades que categorizamos como simples base de atuação dos seres mais adiantados, os denominados reinos mineral e vegetal?

R. Ousamos afirmar que a lei do progresso não foi formulada especialmente para os seres humanos e os correspondentes espíritos do etéreo. A lei do progresso vale para tudo o que foi criado. Ora, sob esse aspecto, não precisamos buscar no âmago das criaturas o ponto evolutivo em que se encontram, porque algum deve ser, indiferente de sermos ou não capazes de compreendê-lo. Nisto a nossa inteligência se aplica às maravilhas, porque somos capazes de inferir e de deduzir, embora, muitas vezes, nos deixemos envolver pelos interesses da manutenção de certos pontos de vista que nos trazem a segurança momentânea do equilíbrio das concepções. Claro está que desenvolvimentos deste naipe somente são possíveis quando a linguagem está aperfeiçoada, o que não encontramos em nenhuma outra espécie dentro da esfera em que habitam os terrestres. Mas será que terão os demais seres interesse em especular sobre os objetivos do Senhor? Circunvagar em torno das idéias para retornar ao ponto inicial de que partem os seres para a compreensão de si mesmos não redunda em esforço inútil, mas está bem próximo disso. Filosofar é o espairecer do espírito desocupado, neste terreno cediço da tentativa de compreensão dos desígnios do Pai celestial. Melhor procedem os que vivem na confiança de que, se tudo fizerem de acordo com os ditames das leis naturais, sob a luz da sabedoria de Jesus, pelo amparo das teses espíritas, evangelicamente considerando as necessidades de todos pelo padrão comum de sermos filhos de Deus, merecerão progredir incessantemente, abrindo-se-lhes a inteligência para o conhecimento cada vez mais abrangente da existência. Todos chegaremos lá!



87. O tema propicia uma insistência, qual seja, a de que vale reproduzir uma pergunta de Kardec a respeito do passado da espécie humana. Se lhes pedir para explicarem se nós, encarnados e espíritos, já fomos minérios, plantas e irracionais, teremos a mesma resposta obtida pelo Codificador?

R. Leia o capítulo XI de O Livro dos Espíritos, onde as perguntas acima foram colocadas e respondidas. Fizemos questão de dar respostas que envolvam o procedimento humano que degrada a natureza, para trazer o tema à época atual. Quanto a termos passado pelos outros reinos, não resistimos à transcrição da pergunta de Kardec e da respectiva resposta, conforme se encontra em O Livro dos Espíritos. Perdoe-nos o amigo pela embutida advertência. “607. — Não pareceria, assim, haver possuído a alma o princípio inteligente dos seres inferiores da criação? — Nós não dissemos que tudo se encadeia na natureza e tende para a unidade? É em tais seres, a todos os quais vocês estão longe de conhecer, que o princípio inteligente se elabora, se individualiza a pouco e pouco e se prepara para a vida, como nós dissemos. Trata-se, de certo modo, de um trabalho preparatório, como o de germinação, em decorrência do qual o princípio inteligente sofre uma transformação e se torna Espírito. Eis que, então, começa para ele o período de humanidade, e com ela a consciência de seu futuro, a distinção do bem e do mal e a responsabilidade de seus atos, como após o período da infância vem o da adolescência, depois a juventude e, enfim, a idade madura. Não existe, aliás, nada, nessa origem, que possa humilhar o homem. Ficam os grandes gênios humilhados por haverem sido fetos informes no ventre de sua mãe? Se algo existe que possa humilhá-lo é sua inferioridade diante de Deus, e sua impotência para sondar-lhe a profundeza dos desígnios e a sabedoria das leis que regem a harmonia do universo. Reconheçam a grandeza de Deus nessa admirável harmonia que faz que tudo seja solidário na natureza. Crer em que Deus fosse capaz de fazer qualquer coisa sem um fito e criar seres inteligentes sem futuro seria blasfemar sua bondade, que se estende por sobre todas as suas criaturas.”



88. Devo sentir-me envergonhado por levantar um problema em desacordo com a proposição geral da obra?

R. Absolutamente, não. Pode acreditar que foi ao influxo de nossa magnetização que o amigo se deixou levar para esse campo. Interessava-nos propiciar à obra magna da Codificação Espírita a oportunidade de apresentar-se íntegra e associada aos mais legítimos anseios da humanidade, com o fito de asseverar que o nosso trabalho é mero complemento para os assuntos que se arraigaram no espírito tecnológico do povo, ao final do milênio. Não é verdade que foi magnífica a explicação acima transcrita? Não se nota nela a superioridade inconteste dos espíritos de luz? Precisa que enfatizemos o nosso desejo de proclamar a necessidade do estudo dessa obra, com olhos de ver e ouvidos de ouvir? Você, que tantas vezes perlustrou as páginas esplêndidas, não sentiu vontade de reler, com muito amor e prazer, cada capítulo dela?



89. Para a próxima questão, vou louvar-me no trecho acima transcrito: “Trata-se, de certo modo, de um trabalho preparatório, como o de germinação, em decorrência do qual o princípio inteligente sofre uma transformação e se torna Espírito.” A impressão que passa o texto é de que o espírito se forma a partir dos elementos primitivos da natureza. Sendo assim, não será justo concluir (ou, ao menos, suspeitar) que, uma vez que o perispírito vai sublimando-se em função do adiantamento do espírito, também a matéria que constitui o universo tangível pelos humanos irá quintessenciando-se, de modo a perder, finalmente, a condição de propiciar aos encarnados sua corporeidade, transformando-se em energia pura, vibração de nível arcangélico, até reintegrar-se ao Reino de Deus de onde deve ter-se originado, uma vez que Deus é o supremo e único criador? Guardadas as devidas proporções, finalmente, não terão razão os que pregam que os humanos irão ascender ao paraíso celeste com o mesmo corpo, agora com sua essência metamorfoseada?

R. Finalmente, chegou ao ponto desejado o nosso perquiridor. Mas, se prestar atenção ao que afirmamos à questão de número oitenta e cinco, irá notar que nos declaramos inoperantes para a formulação das teses filosóficas, preferindo limitar-nos à experimentação, sem, contudo, nos prendermos apenas à categoria dos empíricos ou apologistas de São Tomé. Qualquer tese que vislumbre a criação como ato absoluto de Deus tenderá, irrefrangivelmente, a aceitar que tudo quanto existe pertence ao Criador, em sua essência ou substância. Sendo assim, superadas as fases de purificação, o universo ou os universos tornar-se-ão perfeitos, o que redundará, logicamente, em dar razão à hipótese levantada pelo médium. Vamos dizer que, teológica ou filosoficamente, o pressuposto esteja coerente com o princípio enunciado na citação extraída da obra de Kardec. O que não estamos nós ou os humanos habilitados é para comprovar a teoria por meios científicos, o que nos daria o sentido da realidade. Se o amigo quiser pensar que ascenderá com o corpo físico até os páramos da eterna bem-aventurança, restrinja os seus conceitos ao campo da espiritualidade, o que significa argamassar a matéria, dando-lhe o cunho das energias mais sutis que compõem a organização dos espíritos, que, se existem, o que comprovamos nós, por algo devem ser formados. Eis o quid da questão: — O que é espírito? — pergunta de Kardec sob número vinte e três de O Livro dos Espíritos, que mereceu a seguinte resposta: — O princípio inteligente do universo. E a seguinte: — Qual é a sua natureza íntima? — Não é fácil analisar o espírito na vossa linguagem. Para vós, ele não é nada, porque não é coisa palpável; mas, para nós, é alguma coisa. Ficai sabendo: nenhuma coisa é o nada e o nada não existe. O mais haverá de ser, de nossa parte, simples especulação, porque o nosso intelecto não atingiu a compreensão e a extensão do termo inteligência, ou seríamos capazes de entender a noção que se passou aos encarnados em função da pergunta de número um de Kardec: — O que é Deus? — Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas.



90. Do ponto de vista intelectual, por conseguinte, atingir a perfeição será o entendimento da concepção de inteligência, ou seja, de espírito e de Deus?

R. Inquestionavelmente. Por isso é que, à parte todos os compromissos com o bem e demais virtudes que conduzem ao amor aos homens e ao Pai celestial, instigamos o leitor a que estude ferrenhamente os temas supremos da doutrina, para ir assimilando, fragmentariamente embora, os aspectos da verdade, até a definitiva e integral compreensão dela. É o que vimos fazendo sob as luzes dos mentores da Escolinha de Evangelização.



91. Sofrerão as definições de Deus e de espírito o percalço da pobreza intelectual da humanidade, exigindo dos mais adiantados na senda da espiritualidade novos conceitos e explicações, de forma que se tornem menos precárias as noções?

R. Pergunta cediça mas importante, porque remete o espírito humano à reflexão de que nem tudo pode nesse quadrante existencial em que se situa, por mais culto, douto, erudito, sensitivo, intelectual e puro possa ser. É que a capacidade do cérebro se prende a alguns bilhões, apenas, de possibilidades de conexões bioquímicas e biofísicas, longe, portanto, dos quatriliões de vínculos de que são capazes as mentes dos que se estabelecem no plano subseqüente ao nosso, conforme somos informados mediunicamente (em pálida comparação com o fenômeno metapsíquico de que temos domínio). Poderão alguns mais suscetíveis às frustrações relembrar que admitimos a possibilidade de as almas serem elevadas desde a carne ao nível da salvação, conforme a premissa de que a cada um segundo as suas obras. Ocorre, todavia, que os espíritos de escol, os que merecem a transferência para plano existencial mais requintado, logo reconhecem que foram guindados ao lugar mais adequado para o prosseguimento de seu avanço espiritual, agradecendo de pronto a graça recebida, obtendo a clara percepção da misericórdia do Criador. É a sua plenitude de felicidade.



92. Percebo que os meus amigos do Grupo das Perguntas, algumas vezes, procuram ir um pouco além nas explicações fornecidas a Kardec, enquanto não se desviam jamais do roteiro que deu vida aos códices espíritas. Facultam aos encarnados a prerrogativa de mais extensas informações, sem descoser nenhuma vestimenta com que se cobriram as idéias ali consignadas. Não estaria na hora de se encontrar um outro Kardec, para as reformulações necessárias, dado que muitíssimos conceitos novos se disseminaram em diferentes obras mediúnicas, alguns com claras divergências entre si?

R. Como gostaria o médium que respondêssemos? Se dissermos que sim, que há necessidade de se dar nova roupagem ao texto antigo, porque adquiriram os humanos novos conhecimentos nas áreas científicas e sociológicas, com as conseqüentes transformações políticas e econômicas, como se exige, inclusive, das próprias religiões cristãs, seríamos acusados de semear em terreno alheio, talvez espargindo joio, crendo espalhar trigo. Se dissermos que não, que não é preciso acrescentarem-se os ganhos esporádicos albergados nas obras mediúnicas, desde a confecção de A Gênese, os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo, ao acervo de informações doutrinárias da primeira hora, porque, essencialmente, os tópicos se mantiveram incólumes, alguém nos acusará de sermos cegos para as novíssimas revelações, por desdizermos o próprio Codificador, quando afirmou que o Espiritismo evoluiria com as ciências. Na verdade, não temos permissão para avançar nessa direção, porquanto não fomos convidados a partilhar das resoluções que vêm tomando os mensageiros da verdade, sob a sideral administração do Cristo.



93. Seria possível discorrer a respeito do riso no etéreo, tendo em vista a clara ironia impregnada na resposta anterior?

R. O que o amigo deseja saber não deve ultrapassar os limites da esfera em que atuamos, porque, em estando informado de que os espíritos são as almas dos homens, obrigatoriamente deve deduzir que todas as formas de risos, sorrisos e gargalhadas existem do lado de cá. Quanto à nossa turma, estamos sempre buscando agradar-nos com as realizações mais felizes, o que nos incentiva sadia rivalidade, sem competição, de sorte a favorecer o aprendizado das matérias através de jogos instrutivos, os quais provocam surpresas e situações de incrível jocosidade, especialmente se não nos deixamos amarfanhar mentalmente pelos fracassos, nas tentativas de colocar-nos em evidência. É desse companheirismo que nascem os mais sólidos relacionamentos, porque passamos a conhecer-nos mutuamente, através de nossos dramas e pungentes expectativas. No que respeita à pouco sutil ironia na resposta anterior, estávamos a evidenciar que a nossa pobreza nos faz mossa, mas, sobre ela, se dispõem a esperança de virmos a superar os problemas, a fé em que tudo se realizará sem sofrimento e a caridade que sempre estamos recebendo pela compreensão dos mestres, dos colegas e agora também dos leitores encarnados. É a ironia sempre uma crítica, mas a que fizemos está cheia de sugestões, inclusive para a formulação da pergunta seguinte e respectiva resposta. Não é melhor que os temas sejam tratados com alegria e boa vontade?



94. Estou prestes a afirmar que os meus tópicos se desvaneceram em sua importância, pelas respostas sempre voltadas para os pontos de vista dos primeiros tempos do Espiritismo. Não seria interessante que me abrissem o campo de visão, numa terceira parte da obra dedicada às perguntas motivadas pelos textos que leio ou por passagens que me seriam indicadas pelo grupo? Nesse aspecto, temo realizar perguntas demasiado técnicas, para as quais meu repositório de termos científicos não apresenta a riqueza ou a especialização devida. Daria para me esclarecerem a respeito, ainda que insista eu nas perguntas de caráter interno? Poderei depois suprimir perguntas e respostas demasiado intrínsecas ao trabalho em si?

R. Sempre podem os médiuns exercer controle sobre a obra dos mensageiros da espiritualidade. Aliás, eles o fazem, inclusive, por influência de terceiros, quer pela debilidade dos textos, quer pela excessiva complexidade dos temas. Temos em Kardec um exemplo clássico de texto atribuído a Jesus, em O Livro dos Médiuns, e, depois, com alterações, ao Espírito de Verdade, em O Evangelho Segundo o Espiritismo.
Eis a primeira versão:
“Eu venho, seu Salvador e seu juiz; eu venho, como outrora entre os filhos extraviados de Israel; eu venho trazer a verdade e dissipar as trevas. Escutem-me. O espiritismo, como outrora minha palavra, tem de recordar aos materialistas que acima deles reina a verdade imutável: o Deus bom, o Deus grande, que faz germinar a planta e que levanta as ondas. Eu revelei a doutrina divina; como um segador, prendi em feixes o bem esparso na humanidade e disse: Venham a mim, vocês todos que sofrem!
Mas os homens ingratos se afastaram da via direita e larga que conduz ao reino de meu Pai, e eles se perderam nos ásperos atalhos da impiedade. Meu Pai não deseja aniquilar a raça humana; ele deseja, não mais através de profetas, não mais através de apóstolos, ele deseja que, ajudando-se uns aos outros, mortos e vivos, quer dizer, mortos segundo a carne, pois a morte não existe, vocês se socorram, e que a voz dos que não mais estão aí se faça ouvir para lhes clamar: Rezem e creiam; pois a morte é a ressurreição e a vida é a provação escolhida, durante a qual suas virtudes, sendo cultivadas, têm que crescer e desenvolver-se como o cedro!
Creiam nas vozes que lhes respondem: são as almas mesmas dos que vocês evocam. Eu não me comunico senão raramente; meus amigos, os que me deram assistência durante minha vida e à minha morte são os intérpretes divinos das vontades de meu Pai.
Homens frágeis, que crêem no engano de suas obscuras inteligências, não afastem o archote que a clemência divina coloca entre suas mãos, para iluminar sua rota e os devolver, filhos perdidos, ao regaço de seu Pai.
Eu lhes digo, em verdade, creiam na diversidade e na multiplicidade dos Espíritos que os cercam. Eu estou por demais movido de compaixão por causa de suas misérias, de sua imensa fragilidade, para não estender u’a mão de socorrista aos infelizes extraviados que, vendo o céu, tombam nos abismos do erro. Creiam, amem, compreendam as verdades que lhes estão sendo reveladas; não misturem o joio com o trigo, os sistemas com as verdades.
Espíritas: amem-se; eis o primeiro ensinamento; instruam-se; eis o segundo. Todas a verdades se encontram no cristianismo; os erros que aí criaram raiz são de origem humana; e eis que, do outro lado do túmulo, que vocês acreditavam o nada, vozes lhes clamam: Irmãos, nada perece! Jesus Cristo é o vencedor do mal; sejam os vencedores da impiedade.”
“Observação [de Kardec]. — Esta comunicação, obtida por um dos melhores médiuns da Sociedade Espírita de Paris, está assinada por um nome que o respeito não nos permite reproduzir senão com todas as reservas, tão grande seria o insigne favor de sua autenticidade e porque muito freqüentemente se tem abusado dele em comunicações evidentemente apócrifas; esse nome é o de Jesus de Nazaré (grifo nosso). Nós não duvidamos em absoluto de que ele possa manifestar-se; mas, se os Espíritos verdadeiramente superiores o fazem apenas em circunstâncias excepcionais, a razão nos proíbe de crer que o Espírito puro por excelência responda ao apelo do primeiro que chega; existiria aí, em qualquer caso, profanação em lhe atribuir uma linguagem indigna dele.
É por essas considerações que nós nos abstivemos sempre de publicar tudo quanto traga seu nome; e nós cremos que não se poderia ser excessivamente circunspecto nas publicações desse tipo, que têm autenticidade apenas para o amor-próprio, e cujo menor inconveniente é fornecer armas aos adversários do espiritismo.
Como nós afirmamos, mais os Espíritos são elevados na hierarquia, mais seu nome deve ser acolhido com desconfiança; precisaria ser dotado de uma bem grande dose de orgulho para se vangloriar de possuir o privilégio de suas comunicações, e para se crer digno de conversar com eles como seus iguais. Na comunicação acima, nós não constatamos senão uma coisa: a superioridade incontestável da linguagem e dos pensamentos, deixando a cada um o cuidado de julgar se aquele cujo nome ela traz não a desaprovaria.
Eis a segunda versão:
“Eu venho, como outrora entre os filhos extraviados de Israel, trazer a verdade e dissipar as trevas. Escutem-me. O espiritismo, como outrora minha palavra, tem de recordar aos incrédulos que acima deles reina a verdade imutável: o Deus bom, o Deus grande, que faz germinar a planta e que levanta as ondas. Eu revelei a doutrina divina; como um segador, prendi em feixes o bem esparso na humanidade e disse: Venham a mim, vocês todos que sofrem!
Mas os homens ingratos se afastaram da via direita e larga que conduz ao reino de meu Pai, e eles se perderam nos ásperos atalhos da impiedade. Meu Pai não deseja aniquilar a raça humana; ele deseja que, ajudando-se uns aos outros, mortos e vivos, quer dizer, mortos segundo a carne, pois a morte não existe, vocês se socorram, e que não mais a voz dos profetas e dos apóstolos, mas a voz dos que não mais estão aí se faça ouvir para lhes clamar: Rezem e creiam; pois a morte é a ressurreição e a vida é a provação escolhida, durante a qual suas virtudes, sendo cultivadas, têm que crescer e desenvolver-se como o cedro!
Homens frágeis, que compreendem as trevas de sua inteligência, não afastem o archote que a clemência divina coloca entre suas mãos, para iluminar sua rota e os devolver, filhos perdidos, ao regaço de seu Pai.
Eu estou por demais movido de compaixão por causa de suas misérias, de sua imensa fragilidade, para não estender u’a mão de socorrista aos infelizes extraviados que, vendo o céu, tombam nos abismos do erro. Creiam, amem, meditem sobre todas as coisas que lhes estão sendo reveladas; não misturem o joio com o trigo, as utopias com as verdades.
Espíritas: amem-se; eis o primeiro ensinamento; instruam-se; eis o segundo. Todas a verdades se encontram no cristianismo; os erros que aí criaram raiz são de origem humana; e eis que, do outro lado do túmulo, que vocês acreditavam o nada, vozes lhes clamam: Irmãos, nada perece! Jesus Cristo é o vencedor do mal; sejam os vencedores da impiedade.” (O ESPÍRITO DE VERDADE. Paris, 1860.)
Teriam os próprios espíritos recomendado a Kardec que suprimisse um trecho (“Creiam nas vozes que lhes respondem: são as almas mesmas dos que vocês evocam. Eu não me comunico senão raramente; meus amigos, os que me deram assistência durante minha vida e à minha morte são os intérpretes divinos das vontades de meu Pai.”), para dar direito a uma nova autoria, porque, do jeito que estava, é clara a referência ao nome abençoado de Jesus? Tendo em vista os rigorosos critérios do Codificador, ter-se-ia embaraçado no primeiro momento, a tal ponto que não ouviu os orientadores espirituais? Teriam estes deixado passar a ocasião, para oferecerem, posteriormente, a correção necessária, demonstrando que nem Kardec estava isento de enganos, justamente em ponto crucial da análise de tão importante mensagem mediúnica? Ou teria ele modificado a instrução do etéreo, ao influxo de novos argumentos subjetivos, por sentir que a observação anotada em O Livro dos Médiuns se contradizia pelo próprio teor do texto que se permitira ali incluir? De qualquer modo, ficaram as duas versões, a indicar a honestidade integral de quem assumira o compromisso de argüir a mentira e de oferecer aos adeptos da doutrina o que concluíra como sendo a verdade.
O longo exemplo de crítica textual aqui se colocou com o intuito do íntimo avaliar pelo amigo ou por seus editores, a respeito da necessidade de se preservar intocado o nome do Professor Rivail, para o que lhes facultamos o direito à supressão, mesmo porque de pouco valor se acha investida a nossa palavra em função da voluntariedade dos encarnados. Claro está que não estamos desejosos de fornecer armas aos adversários do Espiritismo; conduz-nos aquela mesma filosofia de somente dizer a verdade que obrigou Kardec a tornar pública a segunda lição do mesmo texto, arriscando-se aos libelos dos oponentes.
Quanto à inserção de perguntas sugeridas pelas leituras do médium, podem ser feitas desde logo, com a imprescindível anotação da fonte, como sabe o amigo ser de rigor. Boa sorte!



95. Tomando carona nas citações de mensagens atribuídas a Jesus, parece-me que a página que translado em seguida merece sérios reparos. Após dizer que extraiu a comunicação do jornal espírita Le Salut, de New Orleans (1.o de junho de 1868), Kardec, sob o título de Que fizeram de mim?, na Revista Espírita de setembro de 1868, reproduz o texto, comentando-o:
“— Filhos, eu lhes escrevi: ‘Quando sua boa união me chamar, virei a vocês’. E sua boa união me chamou; eis-me aqui.
“Ei-los agora como meus apóstolos de outrora. Façam como os bons e não façam como os maus; que ninguém renegue, que ninguém traia! Vão sentar-se à mesma mesa que reunia os amigos da minha fé e do meu coração; que ninguém seja nem Pedro, nem Judas!
“Ó meus bons filhos, olhem em torno de vocês e vejam! Minha cruz, o instrumento glorioso de meu vil suplício, domina os edifícios da tirania... e eu, eu não tinha vindo senão para pregar a liberdade e a felicidade. Com a minha cruz, afogaram os corpos no sangue e as consciências na mentira! Com a minha cruz, disseram aos homens: “Obedeçam aos seus senhores; curvem-se ante os opressores!’ E eu dizia: ‘Todos vocês são filhos de um mesmo pai, sem distinção, a não ser a de seus méritos, resultante da sua liberdade.
“Eu tinha dito aos grandes: ‘Humilhem-se!’ e aos pequenos: ‘Ergam-se!’ e exaltaram os grandes e rebaixaram os pequenos.
“Que fizeram de mim, de minha memória, de minha lembrança, de meu apostolado? Um sabre! — Sim, e há ainda os que se fizeram agentes desta infâmia!... Oh!, se se pudesse sofrer na morada celeste, eu sofreria!... E vocês, vocês devem sofrer... e devem estar prontos a tudo para a redenção que comecei, ainda que não fosse senão para arvorar sobre a mesma montanha o mesmo sinal de união!... Será visto e compreendido, e deixarão tudo para o defender, para o abençoar, para o amar.
“Filhos, vão para o céu com a fé, e toda a humanidade os seguirá sem medo e com amor! Logo saberão, na prática, o que é o mundo, se a teoria não lhes tiver ensinado.
“Tudo quanto lhes foi dito para a prática do verdadeiro cristianismo não é senão a sombra da verdade! O triunfo que os espera está tão acima dos triunfos humanos e dos seus pensamentos, quanto as estrelas do céu estão acima dos erros da Terra!
“Oh!, quando eles verão como Tomé! Quando tiverem tocado!... Vocês verão! Verão! As paixões lhes criarão obstáculos, depois os socorrerão, porque serão as boas paixões após as más paixões.
“Pensem em mim, quando forem partir o meu pão e beber o meu vinho, dizendo que arvoram, para a eternidade, a bandeira dos mundos... Oh!, sim, dos mundos, porque ela unirá o passado, o presente e o futuro a Deus.
Jesus.”
Kardec acrescenta:
“O jornal publica essa comunicação sem dar informação sobre as circunstâncias em que foi recebida. Parece, contudo, que deve ter sido numa festa comemorativa da ceia, ou qualquer ágape fraterno entre os adeptos. Seja como for, ela traz, no fundo e na forma dos pensamentos, na simplicidade junto à nobreza do estilo, um cunho de identidade que não se poderia desconhecer. Atesta, da parte dos assistentes, disposições de natureza a lhes merecer esse favor, e não podemos senão os felicitar. Pode ver-se que as instruções dadas na América sobre a caridade e a fraternidade não cedem em nada às que são dadas na Europa. É o elo que unirá os habitantes dos dois mundos.” (Op. cit., vol. 9, pp.283-5.)
Vocês sabem como penso. Queiram, pois, elucidar-me sobre as minhas opiniões.

R. Está claro que o objetivo de Kardec era ressaltar que o Espiritismo se desenvolvia por toda a parte, para o que buscou, dentre as mensagens estrangeiras, uma que pudesse servir de fundamento para a sagrada tarefa da doutrina, tendo em vista o nome venerando que assinava a comunicação. Uniam-se os homens pela palavra de Jesus e isso bastava para proclamar que o mundo todo estava sob as luzes dos espíritos superiores. Era a pretendida universalização teórica, porque os seus preceitos abrangiam a existência como um todo. Quanto a ser do próprio Messias o texto transcrito, este é problema que deve resolver-se através da exegese dos conceitos, porque a intenção pode ter vindo de muito alto, mas a execução esbarrou em crendices do médium, como é o caso de se colocar na mente de Jesus que Pedro e que Judas eram isto e mais aquilo. Perguntaríamos, com o nosso inquisidor, se não haveria nessas assertivas um pouco de falta de caridade, porque, afinal de contas, Pedro se redimiu completamente do fato de haver negado Jesus e Judas, pelo ensinamento espírita, através da lei de progresso, arrependido desde o primeiro momento, deve ter tido tempo para reformular os seus princípios morais nos dois últimos milênios. Quanto a Tomé, viu para crer, e tanto deve ter ouvido referências à sua atitude que, provavelmente, está refeito do susto de ter tomado conhecimento da célebre frase do Mestre, segundo a qual são bem-aventurados os que não viram e creram. Pois é bem este o ponto que gostaríamos de ressaltar, quanto à autenticidade do nome aposto à comunicação mediúnica. Se o nobre amigo julgar que o Cristo está acima das questiúnculas terrestres, o que o texto desdiz, porque afirma que se se sofresse etc., coloque-o nos campos etéreos de plena ventura e lhe atribua a santidade que comumente lhe é dada. Se acreditar que o teor do texto foi apenas deturpado, tendo sido emitido por Jesus com a intenção da sadia advertência dos que se iniciavam nos estudos doutrinários, ainda sob a categórica influência das religiões acusadas na mensagem de contraditarem os dispositivos do cristianismo, aceite o que de melhor se pode extrair dos pensamentos subjacentes, dispensando o demais por inútil, humano e imperfeito. Se estimar o conjunto da mensagem como de superior procedência, busque agir em consonância com as recomendações ali insertas, lutando por preservar da melhor maneira possível os elementos evangélicos assinalados, humilhando-se perante o conhecimento e ajudando as pessoas a suplantarem as dificuldades. Não nos peça para firmarmos um ponto de vista definitivo, porque desejamos manter-nos indiferentes quanto aos valores que reconhecemos situarem-se na alma muito mais do humano que apanhou o ditado do que no coração da entidade de luz a quem se atribuiu ele. Terá Kardec cometido um despropósito em aceitar e elogiar os dizeres que vemos como excessivamente piegas, romântico ou igrejeiro? Terá o Codificador esquecido de vistoriar cada pequenina passagem, para impedir que as idéias se desvanecessem em simples efeito emotivo, sem o correspondente critério científico que propugnou durante toda a sua caminhada espírita? Terá acreditado em que toda a humanidade seguirá sem medo e com amor a quem vai para o céu com a fé, o que nem o Cristo alcançou, apesar de, século após século, se pregar que ascendeu aos páramos da eterna beatitude? Fiquem as perguntas a alicerçar o roteiro da análise percuciente que se requer de todos para os escritos mediúnicos ou não, espíritas ou leigos, religiosos ou científicos. Mas que os sentimentos se coadunem com a necessidade de incessante melhoria em todos os setores existenciais, de sorte que os critérios do amor se solidifiquem no coração dos homens, ainda que ingenuamente se deixem engodar pelas falsas perspectivas dos que se querem superiores. Se os inocentes são úteis para os maldosos, um dia, todos nos encontraremos ante os tribunais da consciência, que é a assertiva mais contundente que se lê na mensagem: O triunfo que vos espera está tão acima dos triunfos humanos e dos vossos pensamentos, quanto as estrelas do céu estão acima dos erros da Terra!
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