Eu nunca aprendi a ler o rio.
Os barqueiros sabiam lê-lo e escutá-lo, a ponto de não encalhar os barcos nas praias cobertas pelas águas e nem raspar os cascos nas pedras que existiam aqui e ali.
Tentei muitas vezes ler o que dizia. Mas a mim parece que não queria dizer nada. Para mim o rio estava mudo. Nada me contava.
Aqui e ali um peixe aparecia mas não havia como conversar.
Nas travessias eu olhava a água fixamente e jogava minhas perguntas, mas as respostas nunca vinham .
Porque só comigo o rio emudecia? Porque só a mim não dava as respostas?
_ Porque barqueiro, com você o rio conversa e comigo não? E porque eu, analfabeta de rio, não consigo ler? Me ensina barqueiro, me ensina por favor?
O barqueiro não sabia os porquês e disse que para mulher culta, não sabia ensinar. Nenhuma insistência fez com que mudasse de idéia.
Não, eu não sou culta. Culto só é quem sabe ler rios e eu nada sei.
Passo meus dias escrevendo invenções. Fingindo entender sobre sentimentos, tentando adivinhar o que me cerca. Nem mesmo um pequeno córrego eu consigo decifrar. Não, eu nada sei.
Vivo carregando minhas perguntas para todos os lados, procurando respostas.
E quando me arrisco a algum palpite, erro demais. Não há rio que me entenda e nem barqueiro que queira me ensinar.
_ Esta bem barqueiro, não me ensine. Eu tenho mesmo dificuldade de aprender e, para ler o rio, de nada serve o que aprendi até hoje. Não me ensine mas me leva, barqueiro? Só me leva? Prometo nada perguntar.
Concorda. Vou com ele.
Enquanto navegamos rio acima e rio abaixo, o barqueiro, com sua voz macia, me embala, me cuida e lê o rio para mim.
09/11/2006
TITA ANCONA LOPEZ |