Minha avó sempre me conta histórias. Esta ela contou-me esta semana:
"Edite era nossa vizinha. Tínhamos a mesma idade, frequentávamos a mesma igreja - a Matriz do Divino Espírito Santo que foi demolida para dar lugar à majestosa Catedral.
Mas havia uma grande diferença entre nós: ela era de uma família rica e nós filhas de um simples ferroviário. Mas brincávamos juntas e essa diferença a gente até esquecia.
Um dia, percebemos isso na pele. Edite levou-nos um convite para o batizado de sua boneca! Batizado de boneca? Sim, era isso mesmo. Ficamos ansiosas esperando o domingo para participar da inédita festa!
Na hora marcada lá estávamos nós, só as meninas, para o batizado. Parecia um clube da luluzinha. Aquelas mais "poderosas" até levaram presentes para a boneca.
A festa foi no quintal da casa, que era todo sombreado por velhas e imensas árvores frutíferas. Havia um enorme forro de mesa no chão, onde colocaram vários docinhos, balas, bolos e biscoitos. Nossos olhos cresceram! Nunca havíamos participado de um evento assim. Em nossas brincadeiras, era tudo "faz de conta". Os quitutes eram representados por pedrinhas, torrões, folhas, coisas assim.
Houve o batizado que quase ninguém deu importància. Nossa cabeça estava era na festa. Mal podíamos esperar a hora de saborear de tudo aquilo um pouco. E ali, havia um outro detalhe importante: estávamos longe dos olhares vigilantes de nossa mãe. Era raro acontecer de comparecermos em alguma festinha e aí podíamos pegar apenas um docinho e agradecer, quando a dona da casa insistisse para que a gente repetisse. Era uma loucura que eu não entendia.
Num instante, tudo foi devorado! Que beleza!
Na volta para casa só um pensamento fervilhava em minha cabeça: a minha boneca "Maria de Lourdes" bem que merecia ser batizada com essa mesma pompa.
A boneca está hoje com 55 anos! Será que em batizado de adulto também pode-se fazer uma festa? Vou pensar nisso!"