Certa manhã Rufino, o caseiro, nos avisou de que havia um papagaio no terreno, parecia estar perdido. Era robusto e bem cuidado, todavia voava pouco. Uma característica típica desta ave, apesar de ser a que mais fala, é a que menos voa. Intercalava-se pousando sobre muros e cercas. Decidimos cuidar dele, supondo-o estar sem rumo e a possibilidade de seus donos surgirem.
Com muito jeito, o caseiro aproximou-se evitando espantá-lo. Conduzindo um saco de tecido, Rufino rapidamente o encobriu levando-o para o interior da casa.
A ave foi retirada de dentro do saco e demos migalhas de pão embebidas no leite, ele demonstrou estar com fome e fartou-se.
Locomoveu-se desengonçado sobre a mesa, arrulando como se quisesse pronunciar algo. Chamamos o papagaio dizendo: “Rico fale alguma coisa” – ele não reagiu.
Insistimos e finalmente respondeu:
- Buenos dia, que passa?
Suas palavras nos fizeram atinar, ele não era brasileiro, falava em espanhol. Surgiam duas alternativas: ou tentarmos a comunicação em castelhano, ou ensiná-lo a falar o português até que fosse encontrado seu proprietário. Resultou que está conosco e aclimatando-se com facilidade.
O fato é que estávamos abrigando um estrangeiro ilegal, sem identidade ou passaporte. Foi construída uma casinhola com vista para o mar, onde passava os dias. Num destes dias, surpreendeu-nos ao assoviar um tango desde o início ao final. Parecia ser sua canção preferida, pois repetia com freqüência. Rufino passou a treinar palavras em castelhano para consolidar a amizade com Pablito, nome que optamos dar-lhe.
A amizade entre o caseiro e Pablito estreitou-se e surgiu um dueto. Ambos assoviavam tangos.
Um dia destes, sob a porta da casa encontramos um bilhete escrito em “portunhol” no qual alguém com o nome de Juan comunicava o sumiço de um papagaio. Assinou e colocou um número de telefone. Como temos cães de estimação, sabemos o significado de perdê-los, então decidimos telefonar para Juan, cuja felicidade estampou ao saber de seu papagaio e não tardou para surgir. Não necessitamos comprovar ser dele, pois ao vê-lo Pablito voou pousando em seu ombro.
Rufino se apegara à ave e demonstrou a tristeza por perder o parceiro, sequer assistiu a devolução. Tomamos uma decisão, adquirimos outro papagaio filhote, que ele está criando todo animado. Um belo dia surpreendeu-nos ao perguntar em sua ingenuidade:
- É possível acasalar com Pablito, já que o filhote é uma fêmea,
Explicamos ser impossível, pois era apenas um filhote. Conformado ele passa horas tentando fazer sua ave a quem batizou de Chiquita, falar. Ela inicia a dizer vogais “ru-fa” para orgulho do caseiro, que de Chiquita se ufana.
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