Havia um tempo, na minha vida,
que era feito de ternuras
e da voz de meu pai.
Nesse tempo, que hoje é saudade,
havia o dobrar de um sino
que tocava de manhã, bem cedinho,
e de novo no fim da tarde.
Era um tempo diferente, na minha vida.
Eu não sabia por que tanto falava o meu pai.
Apenas escutava a sua voz, às vezes terna,
às vezes, agitada,
e fazia de conta que entendia
- como todos os filhos fazem de conta
que entendem os seus pais.
Era um tempo sereno, aquele.
Eu era criança, tinha um pai,
os cuidados de minha mãe,
e havia o som daquele sino
que tocava todos os dias,
de manhã e à tardinha.
Era bonito. Era reconfortante.
Dizia as horas? Tocava por tocar?
- Eu não sabia.
Mas um dia, meu pai falou com sua voz amiga,
que o sino anunciava a hora da Ave-Maria,
a hora do Ângelus.
Anunciava um momento de meditação,
de agradecimento pela vida.
- Um instante de espiritualidade,
lembrando-nos
que não estávamos sozinhos
na nossa caminhada.
Hoje, quando o dia amanhece
e quando chega a tardinha,
sinto uma certa nostalgia, quase uma dor.
Tudo está diferente.
Bem distante está a infância, o dobrar do sino
e a presença querida de meu pai.
Às vezes, sinto-me só... |