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Contos-->2072: Libido Tribal -- 22/11/2006 - 19:40 (Sereno Hopefaith) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Número do Registro de Direito Autoral:130951919050380200
Nikal olha pela terceira vez o relógio. Jarid está burlando outro contratempo, do contrário, como justificar meia hora no atraso? Detesta esperar e fazer-se zelar. Ele também. O lugar de difícil acesso, um bar de subúrbio escondido até para quem mora no bairro. Vai sair fora. Sessenta minutos, nada. Apreensiva, pergunta-se: “Terá saído da rota para despistar algum perseguidor?”

Pega a bolsa, chama o garçom, os lábios na tulipa para o último gole. Afinal vê-lo adentrar na pequena sala superior.

— Estava saindo fora, que houve?

— Seguiram-me, nada fácil burlar os zelotes.

— Você tem certeza? Pode ter sido apenas paranóia.

— Acho que não.

— Não devemos mais ser vistos juntos. É perigoso.

— Sim, olham-nos de modo suspeito, preventivo, como se fôssemos de outra espécie.

— Talvez sejamos mesmo. Mês passado pegaram Astrid e Morrison. É mais que nossa aparência, uma questão de vibração, vai saber.

— Muda tudo: o olhar, a fala, os gestos, a maneira de sentir, de pensar. Que aconteceu com eles?

— Estamos vivendo realmente em outra dimensão.

— Virtual, para eles.

Foram levados para o Departamento de Reprogramação Libidinal, serão submetidos a seções de recondicionamento bioquímicopsi. Redirecionamento motriz da pulsão instintiva. Sabe-se que rótulos mais.

— Deram sorte, outros reincidentes terão de permanecer numa colônia penal, por comportamento anti-social, para o resto das vidas.

Jarid olha pela janela, aponta o vidro:

— Aqueles dois agentes descendo a rua. São da Vigilância para o Bem-Estar da Libido Coletiva. Estão na captura.

— Tira a cara da janela, se te vidiam, vão te deter. E eu?

— Venha, vamos sair, estão vindo. Não há outro local por perto onde poderíamos ser encontrados. Aqui, logo, saiamos pela entrada de serviço, depressa, depressa. Depressa. Os zelotes são fanáticos.

— Sei, são chamados de coronéis da doutrina da libido do sistema.

O casal apressa-se escada abaixo rumo ao carro alugado com a falsa identidade de Nikal. Livram-se provisoriamente da perseguição. Na BR-3 Jarid liga o rádio. O DJ Nicanor, anuncia no programa musical As Cores da Amizade Colorida Universal, a suposta beleza de fazer parte da libido tribadista. A raça homosensorial toma conta da sexualidade planetária. Cada pessoa divide com todas as outras, tensões, sonhos, esperanças, neuras e prazeres.

Desliga o rádio, insere cdvídeo no DVD. Sem olhar as imagens sugeridas no miniécran, liga-se na letra da canção proibida:

Se te excluem do rebanho
És apenas um selvagem
Diga não, não siga
Se não quiser
A lei geral da libido
Dos deveres deste mundo
Não te excluas da fadiga de negá-los
A águia voa mais alto
Que os pássaros da praia
Um deles não sabe disso
E vence naturalmente
O Everest do vôo falconiforme
A seu modo salta sozinho fronteiras abissais
Vence a condição limite
Voa sobre nichos jamais alcançados pela águia
No voar mais alto
Abre as portas de praias longínquas
Despreza a coleira doméstica da paisagem tribal
Aceita o desafio das asas do anjo
Da insensatez. A paralisia
De não ficar nos limites do bando
Globalizado pela libido da tribo
Indomesticados pela lascívia
Os membros alados não são de cera
Objeto desse prazer solar
O bibelô coletivo lúbrico
Desconhece a força de ser livre
A liberdade de ir mais longe
De criar a vontade de seus passos
Não faz parte da programação
“Aldeia global padronizada”
Eleva-te do grande oceano vencido
Alado nas criptas do luar
Vê, afinal, o quanto é essencial
A desmemória dessa libido plugada
Na cultura calada, papai-mamãe
Obrigado, grande irmão zelote
Eu ainda me emociono
Com os membros de uma vaca
Estou bem, na trilha desse tesão formal
Da velha neurose conhecida
Fuque-fuque macho-fêmea
Sufrágio-serpente, gênese universal

Jarid conduz a mão às coxas esguias de Nikal. Afagam-se. O infinito alimento da sensualidade hetero, flui dos pelos reluzentes da pele morena. Os poros ciciam segredos. O silêncio das ponta dos dedos adentra a calcinha pelo vinco entrepentelhos. Ela entreabre as pernas. Os artelhos afoitos, serpentes, alongam-se em direção ao ponto Z, enquanto Jarid cicia, de si para consigo:

“O preço para adaptar-se, não tem preço. Não vou comprar essa idéia, seja ou não o DJ Nicanor que a estiver vendendo. Vender a alma, seja pra quem for, para uma ideologia política ou emocional, jamais vai estar em meus planos. Não, obrigado, grande irmão da libido universal, propagandista do nivelamento perceptivo. Prefiro a velha conhecida ração da mãe maçã. Preservar a identidade da volúpia à antiga. Se essa política é avanço, serei sempre conservador, reacionário.”

Nikal acaricia o braço dele, o pulso a pulsar na entrada molhadinha da vagina. O carro segue na velocidade permitida pelo piloto automático. Parar e amar, o certo. Mas não podem arriscar-se, nem precisam. O computador de bordo, a visão noturna, a conexão via satélite, os freios antiderrapantes: o tecnodesigner garante a segurança da jornada. O sistema de controle ajusta a posição do veículo e a velocidade, de modo a mantê-lo numa distância segura de qualquer obstáculo.

A fotografia do casal encontra-se, on line, em todos os monitores do canal de tv informativo dos graves delitos contra o Programa de Proteção ao Bem-Estar da Libido Geral da Sociedade. Pelo vídeo são procurados na condição de perigosos e nocivos reincidentes: elementos ativos, ferozes, nocivos ao suposto bem-estar globalizado da libido comum. A parte superior dos bancos dianteiros, ao toque lateral, arqueia-se, até o encaixe no banco detrás, forma uma ampla e confortável cama.

Nikal ingere uma cápsula Linfax. Ela atua no sistema linfático, preenche os interstícios dos tecidos, atravessa, por diálise, as paredes dos vasos capilares, agindo principalmente no plasma sangüíneo. Causa na pele o efeito esponja. Muda o humor, a temperatura do corpo, como se os poros de Nikal, estivessem agora, a sugar, como lábios, os colóides dos orifícios da epiderme de Jarid, permeáveis apenas ao soluto.

A mudança de temperatura de um dos corpos, facilita a interação térmica entre eles. Como se, fisicamente, estivesse a atuar os efeitos da segunda lei da termodinâmica: dois corpos não conseguem transar energia entre si, se ambos estiverem à mesma temperatura. O Instituto de Farmacologia do Bem-Estar Social garante a segurança total no uso da droga: inexiste qualquer efeito colateral.

As palmas das mãos de Jarid aderem à pele da fêmea como se estivesse lambuzada da cola do cavalo marinho. Lábios e ponta da língua nos bicos arrebitados dos seios. Penetra o botãozinho rosa-choque pelo maior de todos. Enquanto o seu vizinho e o indicador fazem festa nos grandes lábios, valsam em seu interior com a sensatez e delicadeza dos casais românticos nos salões da Viena de Strauss Jr. “Danube Blue” ecoa em cada movimento.

Os corpos antropofagizam-se lenta, civilizadamente. As mucosas eriçam, abrem-se como comportas de estações espaciais orgânicas. Cada um representa a sexualidade remanescente. A fêmea molhada e quente, doa-se, cidadela de carne: penetração ritual em tempo ao mesmo tempo simultâneo, paralelo à tênue e perene atmosfera de imponderabilidade e mistério, das longínquas estações espaciais, onde a Terra é menos, muito menos, que uma saudade. E mais, muito mais, que todo o resto universal.

Estímulos naturais das glândulas e músculos predispõem-se ao entusiasmo de todas as fodas homéricas: as perpetradas e as apenas virtualizadas. Começa a disseminação das sementes: o gozo, não apenas localizado, abrange todas as moléculas do corpo.

A ternura animal com que doam-se do fundo do coração, faz com que permaneçam em estado virtual, entregues à mediunidade da libido do animal dos animais. Depois de três horas de viagens, pelos poros e pêlos em franca volúpia, o carro pára no acostamento, por ter terminado o período de autonomia do piloto automático. A ninfa Nikal, de shortinho sensual, vezes sem conta despede-se outra vez da blueblusinha e do sutiã adolescente. A calcinha, umedecendo-lhe as arfantes coxas. O mínimo suor aumenta os intensos efeitos afrodisíacos do linfax.

Jarid e Nikall agem interativa, simultaneamente. Sentem abrirem-se nichos sensitivos após os exercícios entremembros. Despertam do transe virtual para a virtualidade do tempo real. Sabem não mais ser possível circular pelas cidades, são procuradas como criminosos, pelos membros da mutação da raça gls. No início do século eram minoria, agora, querem-se maioria absoluta. Como toda a ditadura, a da libido gls proclamou suas convicções pessoais, como se pudesse sobreviver apenas com o apoio e a adesão de toda a humanidade. Toda tirania anseia por unanimidade.

Começaram no século XX querendo apropriarem-se do significado das cores do arco-íris, do símbolo triângulo. Os políticos, os executivos das grandes empresas, os editores, os cineastas, os religiosos, os policiais, os profissionais liberais, desembargadores e juizes, os policiais representados pelos coronéis zelotes, toda a superestrutura ideológica da administração social gls, foi se expandindo no poder, até estabelecer a lei globalizada, de que toda pessoa socialmente ascendente, tem de ser, obrigatoriamente, membro da química gls, representada pelo slogan: “siga a lei global da libido”.

O entardecer anoitece. No horizonte, nuvens muito brancas, como penugens supostamente angelicais, são trespassadas por linhas de cores da intensa luminosidade poente. Jarid olha para Nikal e sente, de forma individualizada, a tarde fundir-se nos poros da noite. O olhar de Nikal insere-se no dele. As percepções despadronizadas. A paisagem, uma extensão das sensações de independência das leis gerais que regem as libidorelações na década oitenta do Terceiro Milênio.

Passam por um “out-door”. Nele uma série de pessoas simpáticas e sorridentes convidam: “Sorria, você é um prisioneiro da segurança”. O cinismo da frase faz lembrar a Nikal a destruição gradativa mas inexorável da privacidade das pessoas após a data limite dos ataques terroristas às Torres Gêmeas em setembro de 2001 nos Estados Unidos. Nenhuma novidade, desde há mais de um século os e-mails são rasteados, os hábitos catalogados, tudo em nome da segurança de empresas públicas e privadas.

O domínio se afirmou feroz, assim como a autoridade e a prepotência dos que possuem capital e tecnologia, sinônimo de domínio sobre as demais pessoas, os consumidores de bens e serviços. Você está sendo filmado em todos os lugares. Investigadores humanos e eletrônicos trabalham “full-time” para as centrais de monitorição ambiental, desde o início do quarto quartel do século XX. Sabem de todas as coisas que você faz: a lista de mercadorias pagas, as pessoas com quem conversou, sua preferência sexual que a propaganda quer que seja única. Daí a vigilância truculenta dos coronéis zelotes.

Tudo acontece sob a justificativa de segurança e conforto. Empresas oferecem serviços para forjarem situações virtuais, que só aconteceram devido recursos técnicos com imagens obtidas em locais públicos e privados. Se o sistema não gosta de você, forja VTs virtuais com sua imagem. A situação de vigilância generalizada: empresas, famílias, vizinhos, curiosos de sua intimidade, usam sistemas de vigilância que funcionam de maneira semelhante ao Estado quando força o cidadão a se registrar oficialmente nas instituições de controle de dados pessoais. Tudo acontece de maneira “voluntária”. Entre aspas.

Nas ruas das cidades, em média existem 250 mil câmaras que monitoram as atividades de pedestres em prédios, parques lojas e calçadas. 90% dos locais em que você faz alguma compra, estão monitorados com micro objetivas com filmes supersensíveis, que filmam você de locais camuflados, até quando falta energia elétrica. Nada menos de 10 milhões de câmaras filmam tudo nas quatro maiores cidades dos Estados Unidos, baluarte da “democracia”. Essas câmaras possuem sensores especiais com formas diversas de monitoramento: reconhecem as pessoas pela face, pelos tiques nervosos, pelo modo de caminhar, através de gestos espontâneos ou súbitos.

Os radares fotográficos do trânsito, são mais de dois e meio milhões nas megalópoles. Seus sensores identificam se você está usando corretamente o cinto de segurança, fumando um baseado ou trocando certas idéias que possam questionar a ordem estabelecida pela linguagem oficial do sistema. Para não falar da placa de seu carro. Nos prédios do governo e de indústrias privadas de médio e grande portes, o sistema “body Search” (busca corporal) permite a identificação de qualquer objeto sob suas roupas, inclusive seus pentelhos.

100% das companhias exercem controle de métodos de vigilância de funcionários e clientes. Pessoas são demitidas de suas firmas por fazerem, via Internet, críticas em “chat” a seus chefes. Os governos dos “grupo dos oito” usa programas em monitores de tv, alegando serem apenas de verificação da eficiência da propaganda: literalmente são usados para perseguir e prender pessoas sem autorização judicial.

Nos Estados Unidos os materiais de engenharia de que são feitos os polimentos finais das obras de engenharia, prédios públicos e privados, estádios, escolas, museus, as obras de pintura, a decoração dos apartamentos e salas de reunião públicas, têm uma demão final, com elementos de construção magnetizados, que absorvem o fluxo de ar gerado ao redor do corpo das pessoas, para identificação, nelas, de porte de drogas, armas ou explosivos.

A patente está em nome da Gary Settles da Penn State Research Fundation. Empresas de observação como a “Space Imaging”, permitem que uma pessoa seja monitorada, em qualquer ponto da aldeia global, com fotografias diárias de satélites. Milhões de registros cinematográficos monitoram quase tudo que acontece nas ruas, praças, avenidas, empresas, cada “shopping center”, e lojas policiadas por controle informatizado.

Os governos “das oito” monitora todos os telefonemas internacionais, e quase 100% do tráfego da Internet. A tecnologia capta a emanação eletromagnética dos computadores e reproduz todas as imagens que aparecem nas telas.

O acordo entre aqueles países, denominado “Echelon” (Escalão), usa uma rede de satélites espiões que grampeiam os cabos de telecomunicações submarinas, aparelhos de escuta em embaixadas e aparelhos de rádio. As informações são trocadas entre esses países desde 1947, data da assinatura do acordo dos sete que na realidade eram oito. O “Echelon” monitora mais de 97% das ligações internacionais e a quase totalidade do tráfego globalizado da Internet.

Desde o século XX a “Raytheon” trabalhava na manutenção dos satélites do sistema “Echelon”. Ganhou a disputa da concorrência do projeto “Sivam”, sistema de vigilância de 1,4 bilhões de dólares, implantado na Amazônia no governo do “rei Mulatinho”. O monitoramento das fronteiras e do interior da Amazônia nunca será efetuado apenas pelos órgãos governamentais brasileiros.

Somente escritores de ficção científica poderiam desvendar parte do muito que há por trás das empresas privadas aliadas aos governos que controlam o planeta globalizado via satélite. Numa democracia, que merecesse esse apelido, as pessoas, os eleitores, teriam de ser consultados sobre se desejam ou não esse modelo de monitoramento. Ele acaba com a privacidade de qualquer cidadão do planeta visado pelas câmaras ocultas do sistema de dominação totalitária do capitalismo cromagnon.

O novo projeto da Microsoft, o “Hailstorm”, permite que pessoas façam compra na Internet utilizando uma senha única. Todos os documentos estão como que implantados em uma identidade apenas. Em termos de privacidade e cidadania, as pessoas estão cada dia mais fragilizadas.

Se as pessoas estão fragilizadas, adamadas, a sociedade também está. “Eles” os coronéis tirânicos, os cães de guarda do sistema, os zelotes dos governos que protegem, através da legislação que favorece sobremaneira o comando, a comunicação e o controle das companhias multinacionais, zelam pelo regime totalitário, voluptuoso, horizontalizado, da libido.

O projeto “Carnivore”, do FBI, herança do século XX, assim como o “Hailstorm” (chuva de granizo!), grampeia a Internet não apenas de pessoas suspeitas. Os agentes instalam um “box” no provedor de acesso que enumera o tráfico de e-mail e de sites.

Estes pensamentos flutuam interativamente de uma para a outra mente dos namorados. Agora, teriam de se refugiar numa das colônias selvagens, como são chamadas pelos slg, as comunidades de heteros que não podem ser vistos fora dos limites de suas reservas, sob pena de serem aprisionados e conduzidos aos campos de concentração de reprogramação virtual, onde a maioria deles são quimicamente exterminados. A lobotização agora não é cirúrgica, é química.


Parte do mapa guia da reserva, a direção do refúgio, está desenhado numa tatuagem no interior dos lados do vinco da região glútea de Nikal. De tanto olhar para ele, Jarid já sabe de cor todos os meandros da geografia amazônica. Esta paisagem dionisíaca, ponte para não poucos universos inexplorados da libido.
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