Estava à toa na vida, pois meu amor não chamou. Então fui tomar um sorvete, sabor marrom e branco, e em vez da banda passou um pingo. "Não é de sorvete não, parece suor", pensei. Era frio, com jeito de batata-brava, daquela que mata. E acabou a minha doce distração.
Pulei no meu alazão, na frente nada, atrás poeira, e galguei o morro do Morumbi, em S. Paulo, rumo ao hospital Albert Einstein que é o máximo. Aflito e, quem diria, medroso.
Quando cheguei não ajudavam meu socorro, falavam que aquilo não era jeito de ter enfarte, porque o "alazão" é minha moto. E fui levado aos que decidiam quem entrava ou não. Entrei, e disseram que eu subiria aos céus, como é entendido naquele lugar a UTI.
Onde minh alma, ali vulgarmente chamada de miocárdio, seria julgada. E eu não lembrava se era por enfarte ou enfarto , nervoso que estava com uma atendente anormal, que insistia em fazer o cadastro, perguntando coisas que não vem ao caso para quem já está sem roupa na maca. Paciente, nos dois sentidos, eu dizia que ali maquela hora, só tratava de sonhos e devaneios.
Parecia filme, se não tivesse notado, ainda lá embaixo, na terra, que eles chamavam andar térreo, a presença dos meus amores, que me encheram de felicidade, como sempre, dando tchau e beijo. Sem regras, só de amor. Doces amores.
Mas a subida continuava, e com o efeito da injeção aplicada no pronto socorro, eu me encafifava: térreo é masculino de terra? Áureo de areia? Será que eu estava com uma aura? Para testar, pedi uma coca-cola, e ao ganhá-la geladinha pude saber que ainda não virara santo.
Mas que eles estavam me olhando meio assim, estavam.
31 de março de 2001 - 05:06 horas
Hospital Albert Einstein - São Paulo.
No computador do Centro de Enfermagem da Cardiologia
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