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Contos-->QUANDO AMOR É CRIME -- 09/02/2001 - 13:22 (Mario Jacoud) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


A música toca em volume alto, samba-canção cantando tristezas de amor e ciúme. Nestor carrega lá dentro de si o que a música canta. Quer deixar seus sentimentos no bar, esquecer no copo, ou no corpo de alguma zinha. Quem pode dançar assim, rosto colado? Quem pode namorar em mesas de bar? Carne e sangue, sobras de amor e ciúme. Amor é crime, o castigo é o ciúme.
“Moça bonita, quer namorar comigo?” A moça bonita tem a voz rouca, as pernas brancas como os dentes e um relâmpago em cada olho. Dançou quadrilha na quermesse e quer namorar com Nestor. Comeu pipoca que ele comprou e ganhou um beijo no rosto. “Se meu pai deixar, namoro”. Ganhou maçã do amor e segurou na mão dele. Ganhou lenço de seda, para os cabelos, no quiosque dos peixinhos, e um beijo na boca. Andaram abraçados até a casa dela, em cada escuro uma parada. “Minha mãe espera na porta”. Vai levar e buscar na escola. Menina linda não pode andar sozinha, se falou sim para um, fala para outros. “Só falo sim para você”. Um beijo, o coração aperta, a boca seca, arrependimento não é desculpa. E o garoto que olhou? “Ele olhou e eu nem vi, só olho para você”. Mais um beijo, o rosto queima. Fantasia da tela para as mãos, o escuro convida. Gostou do filme, o ator é bonito. ”Mais do que eu”? Ganhou balas e beijos, é o mais bonito.
Quer sentar e conversar, falar de coisas que ouve no samba-canção. Vai beber na mesa e dançar de rosto colado, apertar a cintura e beijar o pescoço. Se quiser mais, tem um quarto nos fundos. Pode até dormir, se tiver mais dinheiro.
“Moça bonita, quer casar comigo”? A moça, agora, é mais bonita do que antes. Tem medo do ciúme mas quer casar com Nestor. Lugar de mulher é em casa, cuidando do marido. Horas de leitura, televisão, cozinha e quarto. Ele quer a moça bonita quando chegar do trabalho. Ganhou aliança de ouro, um beijo na boca, à noite tremeu, mais de medo do que desejo. Gritou ais, para ele de prazer, para ela de dor. Mãos que machucam, para ele carinho. “Mãezinha, me espera na porta”?
Tudo o que Nestor quiser, a zinha faz. Dança agarrada no salão, bebida com namoro na mesa, ouve lamentos, quarto dos fundos, por baixo, por cima. Meu bem, meu amor, que bom, mais forte, vem, assim, volte sempre, espero semana que vem, não falte, gostei muito de você.
A mãe, velha megera, não ensinou os serviços do lar. Deixou emprego e estudo para casar, o dia todo em casa e não aprende a cozinhar. Que homem vive com essa comida? A roupa suja acumulada ao lado da máquina de lavar. O dedo esfregado nos móveis denuncia a limpeza mal feita. Tem todo o tempo do mundo e não aprende. Má vontade. Romances empilhados na estante. Não consegue telefonar para casa, sempre ocupado. Com quem fala tanto? A mãe, velha megera.
Quer dormir no quarto dos fundos, nos braços de uma mulher, só essa noite. Amanhã quem sabe onde vai? Despenteado, suado e sujo, o Nestor das roupas limpas, do cabelo aparado, delicado, educado, amoroso. Deixando tudo no copo e no corpo da zinha. É do álcool o torpor, ou é do coração?
O sorriso nos dentes alvos. Por que sorri? O vestido colado na pele, onde esteve? O doce de goiaba sem açúcar, o café fraco, carne mal passada, onde está com a cabeça? O dedo no nariz. “Fria”. Onde terá fogo nesse corpo? Fogo para ele, dor para ela. Mil vezes a boca, mil vezes as pernas fecham. “Fria”.
Quando chega o dia, o sol parece querer queimar a sujeira da noite. A língua mais suja, a alma imunda. O café fraco queima frio no estômago. Passos de pés grudados no chão, o quarto dos fundos longe. De onde a sujeira, se deixou na zinha? Quem dança de rosto colado? Quem namora em mesa de bar? Quase tudo, beijo na boca jamais. Na cama da fulana, o lençol é a toalha da alma.
Água morna, língua limpa. A mesa posta, toalha florida, pronta para o café da manhã, leite, queijo, pão. Sempre o olhar para baixo, a fria olhando o próprio pé, quase nua, calcinha cavada, para que? Para quem? Não há pergunta que tenha resposta, a traição é muda. Quando abre a boca para o beijo é prazer para ele, nojo para ela. Finge dormir, finge rezar. O que faz o amor brilhar nos olhos? A fria olha o relógio na parede, quer saber onde esteve, pergunta por perguntar, jogando toda a noite. Não quer saber, uma noite sem dor, sem nojo, de boca fechada. Ah, se guarda para o prazer de outro. Quem esquenta seu corpo, moça bonita que gosta de beijos? Comprada com pipoca, maçã do amor e lenço de seda. Ganhou beijo no rosto, pegou na mão e ganhou beijo na boca. Quem fala sim para um, fala para outros. “Mãezinha, me espere na porta”. A faca que corta o pão e o queijo, corta a carne. Fere, mata. Amor é crime, o castigo é o ciúme. Carne e sangue, sobras de amor e ciúme. (Mário Jacoud)







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