Usina de Letras
Usina de Letras
60 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62243 )

Cartas ( 21334)

Contos (13267)

Cordel (10450)

Cronicas (22538)

Discursos (3239)

Ensaios - (10372)

Erótico (13571)

Frases (50641)

Humor (20033)

Infantil (5441)

Infanto Juvenil (4770)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140812)

Redação (3308)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1961)

Textos Religiosos/Sermões (6199)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
cronicas-->Naná Vasconcelos* -- 04/08/2004 - 13:03 (Lucas Tenório) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Naná Vasconcelos: O maracatu que bate no coração*

Filho de um violonista do Recife, Naná Vasconcelos - ou Juvenal de Holanda Vasconcelos - descobriu que queria ser músico logo na infància. De sua casa, no Sítio Novo, bairro da cidade de Olinda, ainda criança podia escutar a folia dos maracatus a quilómetros de distància. Ao ouvir, segundo ele mesmo, "o trovão vindo de longe...", correu para perguntar à mãe o que era e, maravilhado, voltou à janela para esperar o maracatu passar. Pouco tempo depois, aos 12 anos, já era músico profissional. E hoje, com 59, integra o time dos maiores percussionistas do mundo.

Naná Vasconcelos começou a carreira em sua terra natal, onde chegou a tocar na Banda Municipal do Recife, mas foi no exterior que alcançou reconhecimento profissional. Depois de uma temporada no Rio de Janeiro, onde conheceu Gilberto Gil e acompanhou Milton Nascimento, partiu para Paris. Foi quando lançou seu primeiro disco, Áfricadeus. Era início da década de 1970. De volta ao Brasil, cinco anos depois, uniu-se a outro importante instrumentista brasileiro, Egberto Gismonti, com quem produziu três discos ao longo de oito anos.

O percursionista deixou novamente o Brasil na década de 80, desta vez com destino a Nova York. Nesse período, que durou cerca de 25 anos, chegou a integrar o renomado grupo de jazz Codona, ao lado do trompetista Don Cherry; participou da banda do guitarrista Pat Metheny; e gravou com nomes que vão desde B.B. King, Paul Simon e Jean-Luc Ponty a Talking Heads.

Nesse meio tempo, voltou ao Brasil, em 1986, para participar da idealização do Percpan, festival anual de música experimental e de percussão, realizado até hoje, e acompanhar grandes nomes da MPB, como Gal Costa e Caetano Veloso.
O músico continua com seu posto em Nova York. Mas tem passado mais tempo no Brasil para tocar uma série de projetos pessoais. Quer ficar mais perto de sua terra e cuidar de seu xodó, a filha Luz Morena. Além disso, desenvolve dois trabalhos com crianças carentes do Recife, voltados para o ensino da arte como forma de inclusão social.

Nesta entrevista, ele explica como é esse trabalho, fala de seus próximos planos, relembra fatos de sua trajetória e ainda conta como será o seu show no Centro Cultural Banco do Brasil de São Paulo, que acontece dia 10 de fevereiro, dentro do Conexão África, evento complementar à exposição Arte da África. Confira!

Como será o show no CCBB?

Sempre que faço um show solo trabalho a idéia do "bater do coração". Parto do princípio de que o primeiro instrumento é a voz e o melhor de todos é o corpo. Então, o bater do coração tem essa idéia de contar histórias sem palavras, só com a música. Com a música, pretendo levar as pessoas para alguma floresta. Pode ser qualquer uma, a amazónica, a africana, todas têm o mesmo tipo de som.

E como a África estará presente?

Porque, há muitos anos, eu vim de lá (risos). A cultura afro-brasileira é muito forte em todo o meu trabalho. Meu primeiro disco, por exemplo, se chamou Áfricadeus. Além disso, a África está sempre presente onde tiver tambor e, para mim, todo tambor transmite o som da terra. É o corpo africano, a idéia da chegada, a primeira vez que o africano entrou no Brasil. E isso também tem a ver com a missão que tenho com o berimbau, de transformá-lo em um instrumento solista, fazer com que deixe de ser mero acompanhamento para a capoeira.

Missão com o berimbau?

É, não sei porque eu. Não descobri nada, mas é que o berimbau nunca foi usado da maneira que eu toco. E tudo o que faço sai do berimbau. Transporto todas as idéias do berimbau para outros instrumentos. E foi estudando esse instrumento que descobri como utilizar a minha voz, sobre o processo da imigração africana para o Brasil, etc.

O berimbau é um instrumento tradicional africano?

Sim, você o encontra no Mali, Burundi, Moçambique, entre outros. Uma coisa interessante é que muito do que veio da África para o Brasil, hoje já não existe mais lá; foi perdido durante a colonização. Mas, o mais importante, é que muitas coisas que vieram pra cá saíram de partes diferentes da África e se encontraram pela primeira vez aqui. O berimbau veio de uma região, a capoeira de outra (Angola), e os dois se encontraram aqui. O samba também é resultado desses encontros: a cuíca vem do Congo, já o pandeiro não é africano. E hoje, o africano chega aqui e diz: "puxa esse instrumento é da África, mas nunca vi ser tocado dessa maneira ou nesse contexto". Quando dirigi o Percpan, pude perceber bem esse tipo de reação. Virou uma coisa muito brasileira. Hoje temos essa miscigenação. Cada Estado nosso parece uma África diferente.

Você é reconhecido pela capacidade de aliar elementos de jazz, música erudita e ritmos afro-brasileiros. A que se deve isso?

Sempre estou envolvido com esse tipo de experiência. Aqui em Pernambuco, por exemplo, estou trabalhando numa abertura de Carnaval, para a qual consegui juntar batuqueiros de 11 nações de maracatu (que vai reunir uma média de 400 batuqueiros) com a banda sinfónica do Recife, tocando Villa-Lobos. É um trabalho de mistura de nosso lado africano com o europeu. E isso é a minha vida. Afinal, sou um músico improvisador, fiquei 26 anos nos Estados Unidos, toquei com grandes nomes do jazz, do rock, da música eletrónica...

Como é o seu processo criativo?

É quando olho para dentro. E minha inspiração maior é o meu país. Conheço muito do folclore do Brasil e isso, inclusive, foi o que me segurou lá fora. Mas o que faço não é música folclórica. É pegar a música de raiz e tratá-la contemporaneamente, misturando as minhas experiências com músicos de jazz, rock, alternativos, da índia, do Japão, China... O Chico Science fazia isso. Nação Zumbi também é isso, é o maracatu vestido de Hip Hop. E esse é também o meu processo criativo. E o importante é que não perdi minha identidade, continuo um músico brasileiro. Quando faço meu trabalho é o Brasil que está lá. Agora, como experiência, morar no exterior foi sensacional para mim que sou instrumentista, pois acho que se tivesse ficado no Brasil teria sido difícil ter feito um trabalho de solista.

Por quê?

Porque, até hoje, é muito difícil trabalhar com música instrumental em nosso país. Isso acontece porque o Brasil precisa da palavra. Todos os movimentos musicais que aconteceram aqui foram muito mais poéticos, baseados na palavra. O tropicalismo deixou de falar de amor, para falar de problemas sociais. E a música ficou muito mais local que internacional. "O Rio de Janeiro continua lindo...., Aló, aló, seu Chacrinha...", quem conhece Chacrinha lá fora? Ninguém! Ficou uma coisa muito voltada para o local, o que foi muito importante para a conscientização, a abertura, o urbano e o social, mas a música instrumental ficou de lado.
Em compensação, ela é muito bem recebida lá fora.
Totalmente, porque temos grandes instrumentistas. O músico brasileiro possui algo muito importante que é a intuição, algo que vem justamente da mistura de raças. Ninguém dança como a gente, por causa da variedade rítmica que temos. Lá fora, as pessoas aprendem música no Conservatório. Aqui, o músico se descobre na rua; começa tocando com uma lata e depois já consegue passar para um instrumento. Cada um procura inventar e criar algo novo, não há regras.

Em seu mais recente lançamento, Minha Lóa, você se aproximou um pouco da música eletrónica. Como foi a experiência?

Já tinha feito isso antes em Bush Dance, quando trabalhei com um grupo de dança dos Estados Unidos, nos anos 80, onde usava bateria eletrónica. E voltei em Minha Lóa. É interessante isso. Não tenho medo de errar, estou sempre procurando algo novo, novas experiências. Procuro o que não sei, pois o que sei eu já toco.

E qual o próximo projeto?

Acabei de fazer um disco chamado Chegada, que faz uma releitura dos anos 60 e 70. Hoje, posso reler isso com um comportamento diferente, apoiado nas possibilidades tecnológicas, que fazem com que eu possa ampliar a mim mesmo. Isso é importante. Hoje você vê jovens da Universidade tocando maracatu, algo que antigamente era feito apenas por quem morava nos bairros e periferia. A tecnologia está quebrando barreiras. E também existe um interesse muito grande do jovem em aprender a música de raiz e depois misturar tudo.
E a tecnologia está aí disponível para fazer essa mistura. De certa forma, com isso você resgata uma coisa que estava prestes a desaparecer, sem registro, e abre um leque para novas idéias.

Chegada também foi produzido pelo Fábrica Estúdios (gravadora independente)?

Sim, fiz questão disso, pois já existem condições tecnológicas aqui em Pernambuco para gravar com qualidade de nível internacional. Trouxe todos os músicos para gravar aqui. Não precisamos ir a Nova York. E agora estou vendo com alguns selos daqui, mas não fiz o disco para o Brasil, porque sei que a música instrumental é difícil de vender aqui.

Não acha que isso deveria mudar?

Já deveria ter mudado há muito tempo. Veja por exemplo o Hermeto Pascoal e agora esse jovem Yamandú Costa. Como pode músicos como eles terem de fazer um disco com uma gravadora independente? O público gosta, só que instrumental não toca aqui, porque a música popular brasileira ficou muito reciclável. Hoje, cada artista dura dois anos, depois é jogado fora e dá lugar a outro. A música popular está muito desgastada. Todos esses novos movimentos, axé, forró, são muito bem produzidos, mas as letras não levam a lugar nenhum. Claro que ainda tem Caetano Veloso e Chico Buarque - e não é todo dia que se encontra gente com tanta habilidade, dom e elegància -, mas, em geral, a música popular brasileira está muito pasteurizada. Você escuta uma música e é como se escutasse tudo.

Naná, existe algum público ou local em que prefere tocar?

Sinceramente, gosto muito de tocar em São Paulo, porque tem um lado de "consome, mas propaga". A música brasileira, de uma certa forma, está dominada pelo que vem daqui do Nordeste, mas ela tem que ir a São Paulo para se promover. O público daí é muito observador, curioso e sincero. Não existe aquele oba-oba, por exemplo, do Rio de Janeiro. São Paulo tem um lado mais construtivo. Acho que como a cidade é uma vitrine muito grande e possui uma enorme variedade cultural, as pessoas são mais exigentes. São Paulo é como Nova York, tem que mostrar trabalho.

Como é o trabalho social que realiza com crianças no Recife?

É um trabalho que realizo desde 1994 com crianças que estão paradas por falta de apoio - não são meninos de rua, e sim crianças que estão na rua. Chama-se ABC das Artes Flor do Mangue. Elas aprendem a fazer artesanato, muito rico aqui em Pernambuco. E também tem outro projeto que faço, de vez quando, o ABC Musical. Ensino as crianças a cantarem com orquestra sinfónica. O repertório é música folclórica brasileira e cada música vem de uma região diferente do Brasil, ou seja, a criança aprende sobre o país dela através do folclore. Estou tentado dar uma vida melhor para essas crianças do Brasil, que são o futuro do País. Quero me sentir útil.
_______________________________________________________________

*Fonte: http://www.bb.com.br/appbb/portal/bb/ctr/ent/index.jsp






Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui