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Cronicas-->"Lembra de mim?" -- 07/07/2004 - 21:13 (Érica) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Eu estava meio apressada, tentando comprar umas bobagens numa loja cheinha de besteiras eletrónicas... um mini-video-game prum garotinho, uma não-sei-o-quê para outro garoto da família, etc. Apressada e confusa, porque entendo bulhufas destas coisas.

Estava eu meio atrapalhada nessa nobre missão de comprar um presente ou dois ... quando um vendedor da loja se posta diante de mim e me diz: - Oi, se lembra de mim?

Em bom e claro português. Foi um choque (pois moro num país onde não se fala português assim sem mais nem menos). Fiquei meio sem graça, pra dizer o mínimo. Balbuciei alguma coisa ou gaguejei, não saberia contar. Fiquei sem falar, melhor opção. Não me lembrava daquele rosto pra nada. Já refeita do choque de ouvir alguém falar minha língua, lhe disse:

-- Bom, pelo menos sei que você é brasileiro. De São Paulo? Vai me desculpar muito, mas não me lembro mesmo... Espera aí... De quando vc me conhece? Da Faculdade? De onde?

-- Você é a Érica, não é? Eu sabia que você estava aqui na cidade, mas não sabia onde. Sou o Artur. Fizemos o cursinho juntos.

Cursinho? Gente, isto é coisa antidiluviana... (Não exageremos, no entanto - tanto assim também não foi, mas muitas luas se passaram desde que saí do tal cursinho - que existia na Rua São Bento, lá no Centro de São Paulo, que agora é o Centro Velho...)

Quê dizer pro Artur? Que não me lembrava coisanenhuma dele? Fiquei com aquele sorriso cor de enxofre... amarelo pálido. Ele foi delicado:

-- Não se lembra mesmo, né? Sou o Artur, saí do cursinho pra estudar sozinho. Lembra? Você me emprestou umas apostilas. Acho que foi você. Seu nome estava na primeira página...

Vagamente, comecei a lembrar... Artur. Do interior de São Paulo. Estudioso. Cabelo escuro (agora estava com pouco e o que tinha era meio esbranquiçado). Olhos penetrantes, até um pouco tristes. Um tipo romàntico. Um dia... o Artur sumiu do cursinho. E por acaso nos encontramos na Praça da Sé, eu a caminho do terminal do meu ónibus. -- E comecei a lembrar. E decidi arriscar:

-- Olha, pode ser que seja você, pode ser que não. Lembro de alguém sim, acho que era você. Quando nos encontramos na Praça da Sé, você me perguntou se eu sabia como se dizia socorro em francês. Eu não sabia e inventei - socorró! - e você ficou uma fera com a brincadeira. Era você ou não?
-- Era. Eu mesmo. Eu precisava saber se tinha acertado uma tradução que fiz, num concurso. E pensei que você soubesse... - Mas que memória menina! Você lembra de detalhes!

Rimos muito. Dali da loja fomos tomar um refresco. E ele me contou a história da vida dele: era um sobrevivente. De càncer. Daí sua velhice prematura, a queda de cabelo, o grisalho que era mais branco do que cinza. O rosto vincado. Os olhos murchos. Não era em absoluto aquele garboso garotão que eu conhecera. Formou-se em engenharia. Teve um excelente emprego - onde havia metró no Brasil, pra lá ele ia e sempre se empregava bem. Casou-se com uma moça de origem indígena. Ela não tolerou a civilização e voltou pra Manaus. Ele ficou com o filho. Agora já um rapaz. E como o filho viera para este país e ficara, ele seguiu a trilha do filho e aqui estava.
.......................................
Este encontro não aconteceu ontem ou antes de ontem. Aconteceu há três anos e pouco. Neste período de tempo trocamos alguma correspondência, me apresentou o filho e a namorada, fui à casa deles, a uma hora e meia da minha casa. Também vieram me visitar uma vez, ou duas.

Hoje recebi a triste notícia - o Artur já não se encontra entre nós. Partiu pra sempre. Não gosto da palavra morreu . Partiu pra sempre. O Artur que não pediria mais "socorró!" - que me passou uma bronca na Praça da Sé pra me fazer rir da mesma bronca tão longe de lá, no tempo e no espaço! Eta vida...

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Érica Eye
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