A reza do terço
Nossa família tinha um costume muito piedoso: o de, todos os dias, rezar o terço. Quando o relógio marcava 20h30min, ou 21h, nosso pai infalivelmente "puxava" o terço, acompanhado por todos nós. Podia até ser edificante ver as crianças ainda pequenas ( eu deveria ter uns 8 anos ou menos) chamando o pai para a oração do terço. Mas não havia aí nada de piedade ou convicção. É que estávamos com sono e sem as orações não poderíamos dormir. Às vezes, já rezávamos em cima da cama, porque depois do último "em nome do Pai" era só colocar a cabeça no travesseiro e "apagar".
Em uma dessas noites, quando rezávamos o terço de joelhos, na cama, aconteceu faltar energia elétrica. Continuamos a rezar, enquanto minha mãe foi à cozinha buscar uma vela.
Nesse instante, pensei em virar uma cambalhota(!) - eu amava virar cambalhotas - em cima da cama, pois com o escuro ninguém perceberia e eu não teria nenhuma censura por estar fazendo isto fora de hora. Se pensei rápido, mais rápida ainda foi minha ação. E lá fui. Só que errei a pontaria e caí no chão. Não vi mais nada. Quando recuperei os sentidos, eu já estava na cama, ouvindo meu pai me chamar e minha mãe me oferecendo um copo d´água. Minhas irmãs ficaram espantadas me vendo "desmaiada", mas logo fiquei boa e o terço foi terminado. Ninguém entendeu aquele súbito desmaio e só depois de muitos anos é que revelei o segredo.
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