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Contos-->Meu Jardim -- 25/02/2006 - 23:49 (wagner araujo da silva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Meu Jardim – 17.Janeiro.2006 – 03:11

A coisa que minha mãe mais gostava em nossa casa era o jardim. Com a sua partida para o Jardim do Éden, ficaram as flores, a vegetação, a saudade.
Não tenho tempo, nem jeito para cuidar de plantas, mas não queria destruir a lembrança da flor mais vistosa de minha vida. Então, contratei um senhor chamado Luiz para do jardim tratar.
Seu Luiz tinha a pele judiada pelo sol, rugas nas mãos e profundas marcas na face. Sinais de picadas de insetos nas ásperas e calejadas mãos denunciavam uma sofrida, perdida e batalhada vida.
Era a imagem de um homem para o qual as pessoas não teciam um elogio, nem sequer davam o devido respeito que todas as pessoas de bem merecem.
Confesso que eu mesmo era uma dessas pessoas. Embora dotado de um senso profissional acima do comum, seu Luiz não me despertava a menor ilusão de que alguma coisa me ensinar pudesse.
No entanto, em um desses dias adversos a que todos nós estamos expostos, seu Luiz veio comigo conversar enquanto eu caminhava de cabeça baixa pelo jardim.
- O que houve, seu Wagner? Porque esse semblante tão triste?
Pego de surpresa pela palavra semblante ter sido pronunciada por quem eu não esperava, fiquei atônito e olhei bem no fundo de seus olhos cansados e vazios para responder:
- Ah, seu Luiz, estou chateado por não conseguir realizar algumas coisas que sempre quis na vida.
Após um pesaroso suspiro, seu Luiz pousou a mão direita sobre meu ombro e disse:
- Patrão, faça como as flores, faça como as árvores.
Fiz uma cara de jumento de charrete e antes que pudesse confessar minha agnosia ele me explicou, com a voz pausada e revelando uma profunda sabedoria da vida.
- Diga 5 coisas que lhe incomodam, seu Wagner
- Não gosto de orgulho, seu Luiz.
- Pois aprenda com o carvalho, que na fábula de Ésopo ridicularizava o pobre junco por este ser fino e não resistente. Em uma forte ventania, o junco dobrou-se e o carvalho, por não ser flexível, foi arrancado. Essas pessoas orgulhosas, mais cedo ou mais tarde, serão arrancadas de seu caminho. Não se preocupe.
Confesso que fiquei mais besta do que já sou, e parti para a segunda coisa que muito me incomoda.
- Maldade para prejudicar as pessoas.
- Mas seu Wagner, não vê como eu aqui no jardim todos os dias tenho que arrancar as ervas daninhas para que elas não sufoquem as flores belas? As daninhas sempre existirão. Saiba eliminá-las de seu jardim. É só não deixar que elas cresçam. Se houvesse psicologia vegetal, com certeza classificaria as daninhas como espécies invejosas.
- Gente mentirosa, seu Luiz.
- Assim são as plantas carnívoras. São vistosas, bonitas e exalam um perfume incrível. Mas se fecham de forma fatal quando percebem que há uma vítima em potencial. Nosso fim, nelas pode estar.
- Também abomino ingratidão, seu Luiz. A gente cuida tanto de uma pessoa e, quando menos espera, ela morde a sua mão.
- Lembra daquele bonsai que o senhor comprou por cinqüenta mangos? Caro na época. E morreu em duas semanas. Mas o senhor fez tudo certinho. Água na hora certa, sol na medida exata, ambiente propício. Talvez, assim como as plantas, algumas pessoas não entendam o significado da palavra dedicação. Vai entender a natureza.
- Apego às coisas fúteis. Há tanta coisa besta que é tão valorizada hoje em dia.
- Sim, inclusive uma dúzia de rosas vermelhas custa mais do que tulipas negras na época do Dia dos Namorados, porque, dizem, o vermelho é a cor do amor. Amor não tem cor, seu Wagner. Ou melhor, tem todas as cores.
- Tulipas negras? Sim, raríssimas. Segundo uma lenda persa, uma moça chamada Ferhad apaixonou-se por um rapaz chamado Shirin. Vendo seu amor rejeitado, Ferhad fugiu para o deserto. Ao chorar de saudades e tristeza, cada uma de suas lágrimas, ao tocar a areia, transformou-se em uma linda tulipa.

Eu já estava me sentindo o verme do cocô do cavalo do bandido quando seu Luiz me disse:
- Cinco coisas que lhe agradam, seu Wagner.
- O sol.
- Pois seja como o girassol. O girassol sabe olhar para ele. Sabe ver as coisas belas que ele traz e sempre o busca, como se buscasse a felicidade. Busque as coisas que possam clarear sua vida. O que mais lhe agrada?
- Gatos. Na verdade, felinos em geral.
- Já reparou como eles vivem em harmonia com a natureza, sabem apreciá-la e se divertem com ela? O senhor já viu um gato no meio das flores, seu Wagner? É a mais pura expressão da felicidade. Saiba valorizar mais essas coisas simples.
- Família.
- É a flora. Um depende do outro. Um tipo de simbiose, comensalismo. Um ajuda o outro e, em certo ponto, não mais podem se separar.
- Música. As plantas, assim como os homens, têm reações positivas ou negativas a determinados tipos de música. É como o senhor, seu Wagner. Gosta de KISS e Elvis Presley. E sempre me critica quando eu toco meu pandeiro e puxo um pagodinho.
- Fiquei sem graça e emendei a última, de maldade, tentando imaginar como seria possível relacioná-la à uma planta.
- Ler.
- Ótimo. Leia sempre. Adquira sabedoria através da leitura para não cair em armadilhas. A vida é como um planta carnívora, lembra-se? Leia e aprenda a ser como a árvore chorão, que derrama lágrimas, mas não perde a pose e a altivez. Lembre-se que mesmo quando não parece haver solução, o cacto mandacaru é a salvação na caatinga na época de seca, por mais feio e infértil que ele pareça. E não se esqueça, seu Wagner, a jabuticabeira demora a dar os primeiros frutos, mas quando começa, não pára mais.
Ao ouvir o assunto frutos, não pude evitar que meus olhos ficassem marejados. Seu Luiz então me deu um abraço e disse baixinho:
- Seja como uma flor vermelha, pois o mais lindo pássaro, o beija-flor, é atraído pelas flores vermelhas.
Retribuí o abraço, agradeci pelas palavras e saí caminhando, pensando que é daquilo e daqueles de quem menos esperamos é que a felicidade pode vir.
Wagner -



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