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Cronicas-->O pacote de sua vida é pesado?Reflita. -- 24/06/2004 - 09:27 (sandra ethel kropp) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
A casa perfeita. Aquela , com um jardim lindo na frente, aquele que tem cerca viva de pinheirinhos, uma roseira vermelha e outra branca, anões no jardim, uma primavera enorme, que dá sobra deliciosa num fim de tarde também de primavera......Que inveja!
Toco a campainha. Abre uma moça simples,na faixa dos 35 anos, mas muito bem vestida, com o rosto descansado, os cabelos soltos mas muito bem cortados, em fio reto, um sorriso tranquilo, de quem acordou há pouco....Que imveja....
Entro na sala. Sofás em tons claros contrastam com uma mesa de centro marrom escura baixa, moderna, com livros de arte bem dispostos em uma ponta, e na diagonal duas peças em aço escovado.Só. Na mesa lateral ao sofá, vários portas - retratos de família, como se vê nas propagandas de margarina... Que inveja....
Porra! Mas será que tudo é tão perfeito?
- Sente-se, por favor....
E eu ali, paralisada com tamanha perfeição e calmaria, começo a pensar no meu lar- doce- lar, que de doce não tem nada..
- Obrigada, respondo eu depois de 2 minutos sem ação nem reação nenhuma. "Como pode tanta perfeição, pergunto-me eu, internamente" e quando vejo já esta uma copeira uniformizada com bandeja de café e bolachinhas, pronta para me servir.
Com as mãos tremulas, retiro meu café da bandeja e o coloco sobre a mesa de centro, procurando me acalmar para não cometer um desastre no sofá branco de chenile. "Imagina eu, estragar este filme tão perfeito que estou assistindo...."
- Como conversamos , a senhora me contou que presta serviços de buffet em domicilio e........
Eu, que já tinha esquecido para o que estava lá , rapidamente caio na real. "Vim para tratar de uma festa para o filho dela de 5 anos...."
Ela continua a falar em tom calmo, me contando do filho, de como ele é, loiro de olhos claros, me conta que não pode trabalhar, pois tem uma vida corrida com o menino, e continuamos a conversa por mais alguns minutos.
Também falei um pouco de minha família, de meus dois meninos, de 9 e 7 anos , de meu marido, minha casa.... e conforme vou contando, sinto que ela já não se sente tão a vontade comigo. Começo a notar uma certa tristeza em seu olhar, como se algo não fosse exatamente do jeito que ela desejou. Fico sem reação, pois eu mesma me pergunto onde está todo aquele ar de perfeição que antes tinha visto. Mas logo ela relaxa novamente, e percebo uma tranquilidade no ar. Mas não mais uma coisa imponente, um pouco constrangedora, até. Sinto agora como se nos conhecêssemos a muito tempo, e como se em poucos segundos de conversa, mesmo sem saber nada de sua vida pessoal, ela tivesse me contado algo especial, que me permitiu entende- la melhor. Vejo-a agora com um ar totalmente humano, até a admiro, mesmo sem saber nada. Mas algo me inspira admiração e até certa compaixão.Tudo isso em poucos minutos.
Volta a falar empolgada da festa, e pede para a Má, como chama a empregada, ir ao quarto buscar Gabriel, para que eu possa conhece-lo.
Enquanto isso , me mostra a casa. Realmente é linda. Há uma piscina na parte de trás, outro lindo jardim com alguns brinquedos de criança, uma bicicleta largada na varanda, um carrinho motorizado, e, lá no fundo, vejo a mesma empregada de braços dados com Gabriel, um menino lindo. Ele vem correndo, se aproxima da mãe, dando um abraço e um beijo, como nunca pude ver um dos meus meninos me dar.Usa um óculos de lentes grossas. O cabelo é liso, escorrido, cortado com uma franja muito delicada, e os olhos azuis , num tom de fundo de piscina. Mais parecem duas bolas de gude. Fala com certa dificuldade. A mãe delicadamente o interrompe, dizendo que ele perguntou quem era eu. Ela calmamente explica que vim falar sobre a festa dele, que será dentro de duas semanas, no jardins do fundo.
- Será linda , como você- digo para ele. Gabriel, assim como aquela casa, é um filho especial. Ele se despede e rapidamente some, indo para a cozinha.
Raquel continua a me contar sobre as intenções da festa, me mostrando onde pretende colocar as mesas, cadeiras, o som, etc. E ficamos lá por mais uma hora.
Quando vejo, a tarde passou, muito agradável, e digo que tenho que embora.
Ela ainda me mostra algumas fotos do marido, dos pais dele e dela, dos cachorros que estavam no pet - shop tomando banho, e de Gabriel. Estranho que não há nenhuma foto dele de bebê. Ela está parada, esperando eu acabar de olhar as fotos, e começa a me contar. Fala calmamente, me contando detalhe por detalhe do processo de adoção quando ele tinha 2 anos. Morava num orfanato ,e ela , assistente social acompanhou o processo de gravidez da mãe biológica desde o começo. Quando o bebê nasceu , a mãe o rejeitou, e ela , que não podia ter filhos, assumiu para si um compromisso de adota - lo e cria-lo. O marido a apoiou com carinho, e hoje esse menino, ela falando, é o maior tesouro de suas vidas. Ela termina com lágrimas nos olhos, dizendo.
-"Ele é tão especial que até esqueço que tem Down . E nós fui atrás de um sonho que era ter um filho. Deus colocou ele no nosso caminho, e o aceitamos de coração e braços abertos. O que será do futuro, só Deus sabe. O importante e o maravilhoso foi que ele nos devolveu a alegria de viver...."
Quando encerra a história, fico paralisada novamente. Desta vez, sinto-me fraca por dentro. Dou-me conta que todo aquele julgamento inicial que fiz dela, da casa, da empregada, mal passava de um problema meu comigo mesma.
Penso em mim, nos meus filhos saudáveis, em meu marido maravilhoso, em meu trabalho, na minha família. Tudo fica pequeno perto de tudo isso que vi e que ela me contou. Pequeno porque me dou conta que estou levando a vida através de coisas pequenas, preocupando -me em julgar o jardim dela, a empregada, os sofás, .....Quando devia estar agradecendo a Deus a cada instante pela felicidade de estar viva. Assim como ela.
Deus a colocou em meu caminho. O que será da festa, ainda não sei. Espero que ela tenha gostado das idéias. Eu posso dizer que gostei muito dela. De suas idéias. E da luz que me acendeu no fim do túnel, para que pudesse voltar a enxergar como é bom viver.
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