Há dias assim: você acorda bem, começa lendo msgs gostosas no e-mail, revela-se forte e segura. Faz suas abluções rituais, revolve a cozinha no preparo do café. Junta os ingredientes para o bolo prometido para a amiga: ovos, açúcar, farinha, baunilha, creme de leite.
O diapasão está ótimo, o pique subindo.
A ausência vai sendo empurrada para o fundo da consciência. A ausência. Inefável ausência. Sem dono.
O bolo está pronto, em toda sua majestade redonda: coberto de creme virginal, morangos espetados pela superfície. Bolo fálico?
Ato falho. Associação de idéias. Dis-associação de atos. Vontade de reler Apollinaire. Ele entendia de espontaneidade.
Dia chato, sem fim. Chove na planície. Céu cinzento.
A calha do rio interno é rasa. Os detritos se acumulam. O pique desce. Diapasão desafina.
Energia vital se afunila. Há algo no ar que não combina. Ausência inefável. De quê? De quem?
Só isto: ausência inefável.
Um estrilo fura o ar. O telefone chama.
Toca, toca telefone. Não há ninguém em casa.
Minha voz gravada responde: "Aló, aqui é a Érica. Deixe seu número ......" - Uma Érica bem sadia, bem de pique, em harmonia com o mundo. Ela que respondeu. Onde foi parar?
Tirou férias de um dia? Dois? Pra sempre?
Ausência inefável.
Que desagradável. |