Meninos têm dez sentidos, um direito, e nove perdidos.
1. Vê um pé de fruta carregado, olha, se esta madura, nem pensa, sobe bem lá no alto, depois, olha pra baixo e, vê que ele ta na última galha, a galha começa a envergar, ele, então, pensa – como que eu vou descer daqui? Se eu ficar aqui a galha vai quebrar, lógico? Barriga doendo de tanto comer manga verde. Gritar, nem pensar, quem que vai ter coragem para subir aqui? Começa descer da árvore, arranha daqui, machuca dali, e vai descendo, enfim chega no chão. Corre pro banheiro, com aquela dor de barriga e, escuta uma voz – você não tem juízo mesmo, eu não te falei que as mangas estavam verdes.
2. Chega em uma lagoa e, não pensa duas vezes, vai tirando a camisa e, pula, não imagina que pode ter uma cerca de arame em baixo da água. Não pensa em câimbra, em nada. Machuca o pé em algum caco de vidro e, escuta uma voz – eu cansei de te falar, mas não adianta avisar, parece que tem o demônio no corpo, vai ter que dar ponto, sabe de uma coisa “bem feito” agora você aprende.
3. Ganha uma bicicleta, de cara, depena ela toda, a cada dia vai tirando um pedaço, até chegar no freio, ai é que mora o perigo... arruma um amigo, põe na garupa e desce pedalando ladeira abaixo, o que está na garupa nem mexe, o corpo fica durinho, as mãozinhas agarradas no cilindro, só quando cai é que ele solta, então, levanta os dois, braço quebrado, cara arregaçada, bicicleta empenada e, escuta aquela voz – eu sabia, eu falei que ia dar nisso, ainda põe o filho dos outros na garupa, eu falei para não comprar essa porcaria!
4. Pelada na rua, começa chutando lata e pedra. Começa chegar menino de todo lugar, mas ninguém tem bola, então, chega o dono da bola, meião novo, camisa de time, caneleira, tornezeleira e, ruim de bola. Os dois melhores tiram par, ou impar, pra num ficar no mesmo time. O gordo ou o dono da bola, no gol. Ai vem a encrenca o dono da bola, fala – se for pra ficar no gol eu vou embora. Alguns meninos, então, resolvem que, cada goleiro que tomar dois gols vai pra linha. Começa a pelada, o primeiro goleiro toma dois gols rapidinho pra sair do gol, e assim vai até o dono da bola ir para gol, então ele mofa lá. Ele ameaça ir embora, e os meninos começam a enfeitar o “pavão” – você ta pegando bem, fica ai mais um pouco, você é bom goleiro. Alguém chuta a bola passa um carro, e fura. Acabou a pelada, - vem àquela voz – não adianta chorar, eu avisei, quem manda jogar bola com aqueles meninos que, parecem que não tem mãe.
5. Pique, quem vai bater o pique? O menor, ou o mais bobo. Começa contando até trinta e um devagar, depois, como ele nunca sai do “pegador”, ele já conta um, dois, três, trinta e um, então, começa a brigaiada – num vale, não deu tempo para esconder, eu vou parar, acaba a brincadeira e, escuta aquela voz – também fica brincando com marmanjão, fica igual bobo no meio deles, fica esperto!
6. Fase das mentiras, inventei um revólver legal, peguei um pedaço de pau, prendi um elástico daqueles de tiradeira (bodoque), colei um pedaço daquelas tiras de pólvora (caixa de fósforos) é só puxar o elástico que, os palitos, raspam na tira e saem acesos. Meu pai foi pescar e, pegou um peixe de uns trinta metros. Enchi a cara daquele “menino” de porrada, na saída da escola, mentiroso, eu estava com você na saída, então, foi outro dia, - vem àquela voz – vai fazer o dever agora seu safado, você falou que já tinha feito tudo, na hora que eu te der umas “boas” chineladas você vai ver!
7. Mexer com os outros, adora chamar os outros de apelido, independente, se é velho ou novo. Se a pessoa achar ruim, aí, é que ele mexe mesmo. Grita o apelido e esconde. Passa um senhor e ele grita “mula sem cabeça”, a pessoa não responde, aí, é que ele mexe mesmo, oh “mula sem cabeça”, oh “mula sem cabeça”, vem cá! A “mula sem cabeça”, então, resolve correr atrás dele, quando ele assusta, a “mula sem cabeça” já esta em cima dele, chama agora sua peste do que você me chamou – ele responde na maior cara de pau – não fui eu não, foi outro menino, - ele escuta aquela voz – mexe com os outros seu bobo, o dia que um te arrebentar a sua cara, eu vou achar é “muito bom”.
8. Carrinho de rolimã, começa brincando em um lugar reto, de preferência no passeio em frente de casa, um empurra o outro e vice x versa, mas a brincadeira fica chata e, brincadeira boa tem que ter perigo. Param com aquele negócio de empurrar e, descobrem que perto da igreja tem uma ladeira boa, um fica lá embaixo olhando se vem carro, dá o sinal e, outro desce igual doido. Capota, cai, até ai tudo bem, mas resolvem montar um atrás e o outro na frente, tiram o freio, e descem, quando chega lá embaixo é carrinho para um lado e, os pilotos pro outro, vem aquela voz – vocês tão ficando doido, e se vem carro, no mínimo vocês estariam num hospital, eu vou queimar essa porcaria!
9. Brincadeira de jogar pedra, começa com uma pedrinha, joga perto, mas não acerta, depois, o outro manda uma maior, e essa passa bem perto da perna, no final das contas, já esta voando pedra pra tudo quanto é lugar, até acertar a cabeça de alguém, ou quebrar uma vidraça e, vem aquela voz – estava demorando, deixa o seu pai chegar, hoje, ele vai te acertar, há muito tempo que ele ta te “prometendo”.
Autor: Marco Túlio de Souza
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