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Contos-->Profissão: Fessor -- 03/12/2005 - 17:15 (wagner araujo da silva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Profissão: Fessor – 13.Novembro.2005 – 16:22

Arre égua! Até que enfim me aposentei. Após tantos anos lecionando Estudos Sociais e Ciências vem essa mistura incômoda de vazio e de obrigação cumprida.
Nos primeiros dias senti falta daquela algazarra, gritos e arroubos infantis e juvenis. Depois me acostumei à calmaria, tal qual um campesino que após viver tantos anos como um citadino, retorna ao seu pacífico vilarejo ao sopé da montanha. Vilarejo de verdes campos, bucólicos e paradoxalmente, aconchegantes.
No primeiro dia de descanso fiz um chazinho verde, me sentei em uma poltrona, estiquei as pernas e ao som do maravilhoso Jon Anderson comecei a divagar, o que acabou me arrancando lágrimas de saudades e nostalgia.
Lembrei-me da loirinha Vivian. Magrelinha, simpática, inteligente, linda e eloqüente, para não dizer tagarela. Perguntou-me porque nossa galáxia era chamada de Via Láctea e se ela tinha alguma relação com a Farinha Láctea. Irmãs? Primas? Mesmo que distantes? Expliquei-lhe que devido à sua aparência leitosa, assim fora batizada.
E para concluir, contei-lhe sobre como meu pai havia me ensinado a ordem dos planetas. Era só seguir a frase Minha Vó Tem Muitas Jóias, Só Usa No Pescoço. As primeiras letras das palavras da frase são exatamente as primeiras letras dos nomes dos planetas. Seu sorriso de satisfação iluminado com sua covinha na bochecha direita foi um prêmio. Exatamente como eu fiz quando meu pai me disse isso. Para mim, esse foi um dos super poderes revelados por aquele que até hoje considero meu maior super-herói.
Lembrei-me da Adriana, que era de Diadema, São Vicente e que hoje vive em Santos, no aprazível bairro do Gonzaga. Minha vizinha. Voz de taquara rachada, sorridente e desconfiada. Tinha severos problemas de ortografia. Perguntou-me porque os peixes sempre morrem de barriga pra cima. Disse-lhe que a grande maioria dos peixes possui um órgão chamado bexiga natatória, que é uma bolsa de ar que infla ou murcha. Quando o peixe morre, esta bexiga natatória fica com um pouco de ar, e como este órgão se localiza na barriga, faz com que o peixe fique virado.
Lembrei-me da Lígia, a quem carinhosamente chamava de Cléo. Uma fisionomia espantosamente parecida àquela da rainha do Egito, Cleópatra. Graças ao bom Deus nos encontramos sempre pela orla da praia. Seu pai, Ivo, continua bravo. Perguntou-me ela como o vinho poderia ser seco se ele é líquido. Expliquei-lhe com ar de enófilo de meia-pataca que um vinho é classificado como seco quando não possui açúcar residual (açúcar não transformado em álcool pela ação das leveduras). Caso tenha, o mesmo não é perceptível ao paladar. Do contrário seriam os vinhos doces ou semi-secos.
O que dizer do Pedrinho espalha-brasa? Acho que o moleque tinha parte com o tinhoso. Sardentinho, dentinhos pronunciados e língua de dragão de Komodo. Proprietário de um vocabulário vasto e colorido, freqüentemente fazia visitas ao diretor. Perguntou-me o danado uma vez se a Branca de Neve era mariposa, ou seja, moça fácil. Percebendo minha boca aberta de surpresa apressou-se em dizer que uma mulher que co-habitava com sete homens e que amava outro, a quem chamava de príncipe, só poderia ser uma quenga. A mente infantil, realmente, voa. Em um belo dia me questionou ele qual animal tem focinho de porco, orelhas de mula e cava tocas debaixo da terra. Fiz uma cara de “ai meu Deus, o que eu falo” e recorri à minha biblioteca mental. Na fileira 2B, prateleira C, neurônio 856 achei que esse bicho é o orictéropo, também conhecido como porco-da-terra pelos sul-africanos.

Dessas perguntas saí ileso. De outras nem tanto. Por que o reflexo de um vampiro não aparece no espelho, por exemplo, nunca descobri.
E no final da minha carreira veio a pergunta derradeira, para a qual , efetivamente, não há resposta. Nunca me esquecerei do dia em que veio Valtinho todo triste e chateado em minha direção. Indagado sobre o que lhe incomodava, deu de ombros, abaixou o olhar e me perguntou:
- Tio, por que as pessoas são tão falsas?



Wagner -
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