Fazia muito tempo que eu não visitava Candinha; soubera, através de um amigo comum, que ela estava doente. Disseram-me tratar-se da idade avançada. Quando entrei, sorriso entre lábios, palavras já à garganta, emudeci completamente; não esperava encontrá-la daquela maneira. O vigor se apagara, dando lugar a uma tristeza melancólica, porém dócil. Sentada numa cadeira também comum, seu corpo parecia uma vara verde esticada pelas extremidades. O olhar vagueava pelos cantos e a cabeça não mais levantava como antigamente, para fitar de quando em vez a imagem do Cristo pregada à parede. Os cabelos mal-arrumados, agora de uma vez totalmente brancos, estavam perfumados como em dias que se passaram. A verdade é que Candinha, de tão velha, tornara-se uma velhinha débil, puxando para esquelética. A voz saía-lhe qual o canto de um pássaro noturno abandonado, tímida na extensão, confortadora no timbre.
Estático, temia interromper aquela solidão em que a encontrei. Parecia-me consciente. Quando tentei, busquei entender em segundos o motivo pelo qual não havia estado mais vezes com Candinha. No momento era impossível, e minha presença, àquele momento, parecia tão comum que desconfiei interiormente não ser interessante, muito embora soubesse que o amor, especialmente àquela idade, era Universal, não admitindo particularidades.
De repente Candinha interrompeu o silêncio, dando-me enfim a certeza de que fui notado. Falou-me:
- Venha cá, filho, eu estou esperando - voz baixa, mas resoluta. Arrastou os pés fragilmente, a fim de melhor deslocar o corpo em minha direção.
Minhas pernas pesavam, como que punindo pelas vezes que deixei de empreender aquela caminhada. Mesmo assim, cheguei-me até ela, e nos abraçamos demoradamente, como se fosse a primeira ou a última vez que se abraça. Não percebíamos lágrimas, eu porque recostava meu corpo e principalmente o rosto à sua cabeça, ela, pelo fato de permanecer cabisbaixa, segurando-me as mãos com carinho. Depois, sentei-me a seu lado, tentando através de de rogos entrecortados, desculpar-me pela falta de atenção e carinho de que ela tanto necessitou e que lhe neguei. Nada, porém, dizia-me sobre isso, resumindo-se a perguntar sobre a vida daqueles que conhecíamos conjuntamente. Quando lhe perguntei se necessitava de alguma coisa, respondeu-me, quase silenciando:
- Volte sempre, se puder.
Candinha jamais poderá imaginar ou mesmo acreditar que sua ausência dói, e muito. São inúmeros os que querem voltar à sua presença, mas infelizmente não podem, pelo menos no momento. Todavia sabem que a única coisa capaz de alegrar Candinha era poder distribuir amor.
É por isso que todos ainda a amam.
|