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Cronicas-->O batismo de um bamba -- 03/03/2004 - 23:16 (Manoel Carlos Pinheiro) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O batismo de um bamba

Para ser membro da Ala de Compositores da Portela, há todo um ritual que inclui a apresentação por um membro e a aceitação, por parte de outro membro, de parceria em um samba com o candidato.
Com Paulinho da Viola não foi diferente. Ao ser apresentado, Paulinho levou a primeira parte de um samba, feito para a ocasião. E a cantou.

Leva o recado
a quem me deu tanto dissabor
e diz que no passado
eu fui um sofredor

E cantou o refrão.

Agora já não sou,
o que passou, passou.
E agora já não sou,
o que passou, passou.

Nem bem cantou o refrão, de improviso, Casquinha emendou.

Vai dizer a minha ex amada
como é feliz meu coração,
mas que na minha madrugada
eu não esqueço dela não!

Estava selada a parceria e acabara de ingressar na Ala de Compositores aquele que seria escolhido como o afilhado da Velha Guarda que o consideraria o sucessor de Paulo da Portela.
O samba afirma na primeira parte o que nega na segunda. Casquinha estava com a razão, se o que passou, passou, por que o recado?

A guardiã

A Velha Guarda da Portela é considerada a guardiã da escola. Não foi casual a presença dela à frente do desfile, como não o foi no último carro. Mais que isto, enquanto todas as demais escolas procuram atrizes ou modelos famosas para serem rainhas de bateria, mesmo que precisem de aulas de samba nas semanas que antecedem o carnaval, na Portela a rainha de bateria foi Dodó da Portela de oitenta e três anos.
O respeito que se tem em Madureira pela Velha Guarda é tanto que houve um caso antológico.
Seu Rufino, sócio número um da Portela, com seus passos miúdos caminhava por uma calçada na qual estava ocorrendo um assalto. Alguém disse: - olha seu Rufino! O assaltante escondeu a arma, o assaltado baixou os braços e o assalto só prosseguiu após a passagem de Seu Rufino.

Um rio...

Mesmo acolhido pela Velha Guarda, Paulinho da Viola esteve mal durante algum tempo, consigo e com a Portela. Ele fizera uma melodia, ainda sem letra, mostrou a diversas pessoas. Hermínio Bello de Carvalho a levou e botou uma letra, incluído-a em um repertório de um espetáculo. Era simplesmente Sei lá Mangueira. Foi um grande constrangimento.
Amargurado e ressabiado, Paulinho compós Foi um rio que passou em minha vida, reconciliando-se completamente com toda a Portela.
É muito difícil alguém alcançar o significado pleno deste samba.

Os festivais.

Há inúmeros fatos curiosos com este samba de Paulinho. Um deles foi em festival. Cada rede de televisão fazia o seu próprio festival. Uma delas resolveu promover um festival de música tradicional brasileira; outra criou um festival que era um feira aberta às novas experiências musicais.
Paulinho da Viola pegou duas músicas suas: Foi um rio que passou em minha vida e Sinal fechado. Na hora de enviar as músicas, errou e trocou os envelopes. Resultado: primeiro lugar em ambos festivais. O que evidenciou a incompetência dos jurados, pois foi um absurdo tão grande aceitar Sinal fechado como uma música tradicional quanto aceitar Foi um rio que passou em minha vida como uma nova experiência musical.
Aliás, Paulinho já sabia disto, pois em um festival anterior, havia oito finalistas já escolhidas quando uma televisão concorrente exibiu o filme Rio Zona Norte de Nelson Pereira dos Santos, cujo tema musical era uma das classificadas no festival. O problema é que havia a exigência de todas as músicas serem inéditas. Isto causou a desclassificação da música de Zé Kéti. Os jurados se reuniram, às pressas, para escolherem, entre as preteridas, uma substituta. E encontraram exatamente Coisas do Mundo, minha nêga. Não a escolheram como campeã porque seria assinar a própria incompetência.

A primeira escola a gente esquece?

A primeira vez que fui a um ensaio de escola de samba foi na Mangueira. Achei tudo muito interessante, muito bonito, animado, um espetáculo digno de qualquer turista.
Resolvi ir a escolas menores: Tupi da Brás de Pina, Aprendizes de Lucas, Unidos de Padre Miguel, Unidos do Cabuçu. Na maioria delas, um ambiente mais descontraído, as pessoas sambando mais, mas não consegui entender a paixão pelo samba. Fui a blocos, à época com sambas em andamento diferente, de empolgação, uma vez que os sambas enredo das escolas eram mais cadenciados.
Um dia, fui ao Império Serrano e fiquei impressionado com a sua bateria mão-de-ferro. Até que finalmente fui à Portela, só então entendi o que significava o samba Foi um rio que passou em minha vida. Até aquele momento, no dizer de Paulo Freire, eu estava adaptado ao Rio de Janeiro; aquela sexta-feira marcou o início do meu processo de integração à cidade.
O fato de ser portelense jamais me impediu de frequentar outras escolas. Seu Geraldo, do Caxambu do Salgueiro, então presidente da velha guarda de lá, chegou a realizar jongo a meu pedido, inclusive quando levei membros da direção do Conselho Mundial da Paz. Também fui diversas vezes à casa de Vovó Maria Tereza e ao jongo no alto da Serrinha; à casa de Tia Maria Alice,da Cidade Alta, presidente ala das baianas; e, mais que isto, inúmeras vezes tive a honra de ser recebido às segundas-feiras, por Carlinhos Vovó, no próprio Império Serrano; numa delas, acompanhando alguns músicos angolanos, ri muito quando, entre dezenas de compositores que se apresentavam, um portelense apareceu e os angolanos disseram: este samba é diferente, mais gostoso; Carlinhos olhou para mim e disse: - o que diabo você anda fazendo? Quer converter todo mundo? E eu nada dissera... Apenas, rindo, respondi: - se fosse o caso, não teria trazido para a sua sopa, levaria para o feijão de Tia Vicentina.

Manoel Carlos Pinheiro
http://www.agrestino.blogger.com.br/index.html
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