ACUSO-ME
Tereza da Praia
Acuso-me de tantas vezes ser reles,
Tantas vezes vil, indesculpavelmente omissa.
Indiferente à humanidade e aos seus males.
Direcionando minhas ações pelas regras da cobiça.
A inveja e a arrogância vestindo-me como peles
Sobrepostas, maculando o meu ideal de justiça.
Acuso-me de carregar a soberba dentro de mim,
Orgulhar do meu modo de ser, apregoar em editais
Minhas pseudo virtudes, qualificando o outro como ruim.
Apontar o próximo como aquele que tem os pecados capitais.
Por quem tenho repúdio, de quem me envergonho enfim,
Cheia de falsos pudores, de falaciosos valores morais.
Nesta hora exatamente há uma criança na rua.
Há centenas de crianças que vivem na rua.
Acuso-me de indiferente, de não amar suficiente,
De atribuir ao governo a solução beneficente
Eximindo-me da responsabilidade consciente
De participar da construção de um mundo decente.
Acuso-me de não exercitar o amor ao meu próximo
De passar ao largo daqueles feridos a margem da vida.
Usar a minha língua como móvel de maledicência dorida.
Trago dentro de mim todos os pecados, ao máximo:
A avareza, a preguiça e a ira que alimenta desejo homicida.
A Luxuria, a gula e a vaidade, tudo mais de uma alma fingida.
Recuso-me a ver no meu próximo apenas seus pecados,
Achar o homem pérfido e o mundo fétido.
Vejo o outro como um espelho, mostra-me meu legado.
Não sou nada, mas tenho em mim os sonhos do mundo.
De igualdade, fraternidade, amorosidade, de ver o fundo
Da alma do meu próximo, reconhecê-lo como pessoa
Com defeitos e virtudes. Aceitá-lo, perdoá-lo e amá-lo,
Sabendo-o semelhança do divino, a grande parte boa.
Tereza da Praia
serie: Cenas Insanas
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