ZÉ BEBELO
segundo Riobaldo
(em homenagem ao cinquentenário do GRANDE SERTÃO: VEREDAS de Guimarães Rosa)
Délcio Vieira Salomon
Olhos esbugalhados
O vaqueirinho apareceu:
- Eu vi ... eu vi!
- O que viu menino?
Tremendo balbuciou:
- Eu vi o Homem!
É mais baixo do que alto
não é velho, não é moço
nem cavalo ele não tem,
mas sozinho matou
cinco judas
e pôs trinta cavaleiros
a correr.
Ele desceu o Rio Paracatu,
numa balsa de buriti.
Falou que vai reformar isto tudo.
Para vingar Joca Ramiro
sucedeu Medeiro Vaz.
Vingar para ele
era lamber frio
o que outro
quente demais
cozinhou.
Logo se alevantou
Depois trovejou:
- Vim por ordem e por desordem.
Esse cá é meus exércitos:
Riobaldo, Diadorim,
Marcelino Pampa,
João Concliz, Fafafa,
Sesfredo, Quipes,
Joaquim Beiju, Coscorão,
Dimas Doido,
Acauã, Mão-de-Lixa,
Marruaz, Crédo,
Marimbondo, Rasga-em-Baixo,
Jiribibe, Jõe Bexiguento
dito Alparcatas,
seguido de Alaripe,
tomador de burros cargueiros,
com petrechos e mantimentos,
Quim Queiroz,
guardador dos volumes de balas
Jacaré, o cozinheiro,
Doristino, ferrador de animais
E Raimundo Lé,
que entendia de curas e meizinhas,
tomava conta do surrão de remédios.
Quando a gente acampava,
o acampamento parecia uma cidade.
Desse trovôo
de alto e rasto
já a cavalo,
montado
Zé Bebelo
chefe se revelou.
Depois do feito
pedia sal e farinha
Ele era assim:
Aleluia! Aleluia!
Carne no prato,
farinha na cuia.
Podia nada ter,
Mas valentia ele tinha
Homem igual aquele
Afirmo ao senhor:
-nunca vi.
Um dia lhe perguntei
qual o caminho certo da gente?
- Nem para frente, nem para trás.
Só para cima!
Viver é perigoso!
Se tiver de parar,
parar curto e quieto.
Montado declarou:
- Zé-bebelos, companheiros
Meus amiguinhos,
Meu nome, d’ora por diante
Vai ser Zé Bebelo Vaz Ramiro
(em verdade, causa que, de nome
Era José Rebelo Adro Antunes).
- Melhor, dou surpresa,
só com boa surpresa
é que rende.
Na hora de ver só um algum judas
de cada vez, mirar bem e atirar.
O resto maior é com Deus.
Para um trabalho que se quer,
sempre a ferramenta se tem.
Na beira do Soninho
Zé Bebelo assim se mostrou.
Hoje eu digo: - Ver Zé Bebelo
Era agarrar uma esperança.
“Viver é perigoso”!
Mas quem tem esperança
Tudo alcança.
Zé Bebelo me ensinou.
No regular
Zé Bebelo pescava
caçava
dançava as danças,
exortava a gente,
indagava de cada coisa,
laçava rês
ou topava a vara.
Entendia dos cavalos,
tocava violão,
assoviava musical.;
só não praticava de buzo nem baralho
declarando ter receios
por atreito demais
o vício e riscos de jogo.
Choveu, louvava a chuva.;
trapo de minuto depois,
prezava o sol.
Ah! Se não conheceu esse homem
deixou de certificar:
qualidade de cabeça de gente
a natureza dá,
mas raro de quando em vez.
Por isso repito
p’ra todo mundo ouvir:
Homem igual aquele
afirmo ao senhor:
- nunca vi.
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