Noite quente e solitária. Bia deixa-se conduzir pelas lembranças, névoas de saudades que se avolumam, fazendo-a compreender que seu coração ficou a pulsar no peito daquele homem. O que teria ele de tão especial? Parece que fora criado para estar nela, cabendo exatamente na proporção dos seus desejos e encaixando-se perfeitamente na forma que ela compreende o amor. Quando tenta sombreá-lo dos seus pensamentos, o coração a desconhece...Aprendeu a estar com ele, mesmo que continue ausente. Aprendeu a senti-lo, embora nunca o tenha tocado...Parece que as mãos dela reconhecem seus caminhos, embora os carinhos dela, jamais tenham provado do corpo dele. Paulo faz parte dos sonhos que a acompanham, mesmo quando acordada está...Sonhos que brincam de colorir um passado que ficou agonizando na porta de um presente que não pode ser real; sonhos que com olhos de futuro, acalentam seus horizontes, ninando um porvir que sempre parece muito distante e improvável; sonhos que se abrigam na eternidade de outras vidas e acariciam a face dela com uma doçura que lhe arranca lágrimas; e quando elas caem, há um vento que sopra e pousa em seus lábios, dizendo que não existem pontos finais para a vida...Tudo se reveste em recomeço, quando o amor canta em qualquer tom ou nota!
Conclui que não compreende as forças que se movem dentro dela e nem como estas emoções subsistem. O tempo e a distância são por demais pequenos para o ritmo do sentir de seu coração! Os silêncios, as reticências de Paulo denunciam-se translúcidos dentro dela...Sonoros, explicitam-no em letreiros de néon e tudo que ele cala, reverbera nos olhos de Bia que o enxerga em seus espelhos. Ele é transparente nos mapas que as mãos dela trilham, quando o desenham...As formas de Paulo adquirem vida, quando ela toca-o sinestesicamente. Sente sua pulsação e o vibrar de cada estímulo a que seu corpo responde, quando a alma dela o invade. Ela machuca-se com os disfarces que Paulo veste para o mundo...As lágrimas e os mascarados sorrisos dele derrama-se na face dela. Bia o protege, ainda que à distância, guardando-o, quando ele imerge em desertos; banha-o em seus oásis, quando o sente sedento, tombando em miragens...Oferece-lhe em silêncio, o manjar da sua fortaleza, quando nele parece fenecer a fome pela vida.
Se as palavras pudessem fotografar esse instante, talvez ele entendesse, mas outras tantas luzes iluminam este momento e é através delas que as mãos de Bia deslizam para a ele chegar...
O sono chega sorrindo, fazendo-a perceber que a eternidade não é suficiente para que ela o esqueça e que os sonhos continuam a estrelar os céus na madrugada. Uma estrela pisca cúmplice...Talvez a mesma estrela, em que os olhos de Paulo debruçam-se, buscando alento naquela noite de saudades...
Eles sabem que ainda querem mais, muito mais...Um anjo insone e traquina continua a fitá-los pelas frestas das nuvens.