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Contos-->Cantiga de Rio -- 15/08/2005 - 20:11 (Luis Gonçalves) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Cantiga de Rio
Luís Gonçalves
No requinte da generosa sombra de uma mangueira faceira; no regalo de uma rede preguiçosa passo adiante a treler com meus botões as doces notas que emana do peito.
Encharcado numa moção de aplauso vejo gotejar pela frente o saudoso passado da música que é a dança e a vida da minha gente.
Moramos logo ali aonde o rio se bifurca ao lado daquele grande remanso onde nunca falta peixe. Ao contrário do que dizem no auge do verão chuvoso a força da água é tão grande que engole a terra inteira.
Entre céu e água pescamos o nosso jantar trepados na varanda de casa.
O ranger de uma viola lavrada no açoite de um verso franchado de dor rebenta na feição do caboclo um sabor de terra banhada pelas lágrimas da fé.
É canto do rio que passa lacrimando de mansinho; das águas e das magias dos cabelos ondulados; das faceiras fustigadas sob o luar prateado. Desde que o mundo da música perdeu o juízo nas belas curvas desse rio garboso a vida pariu essa dança.
Chega, chega meus irmãos! E dali por diante chega toda a irmandade porque vamos falar da música da nossa terra.
De frente para o pôr-do-sol se ergue imponente um altar para as orações.
Por detrás daquela serra onde passa boi e passa boiada, também, passa um violeiro com sua viola à tira colo entoando uma canção.
Em cima daquele rio de lombo arrepiado, também, passa uma chalana carregada de paixão. Ali vai correnteza abaixo mais um seresteiro do sertão.
Quando a chuva de molhar bobo se desmancha no vazio dessa gostosa ilusão os pingos seguem e se misturam na dança do povo humilde que assiste o rio passar.
Nem que eu tenha de viver o tempo inteiro a sonhar quero guardar na lembrança o canto bom do meu lugar.
O canto do rio que passa na varanda da cozinha; saindo da porta do meio ao lado da camarinha dá comichão de saudade e uma danada coceira no calcanhar.
Correndo vista pela rebarba da vida, por cima do peitoril do saudoso tempo bom que não volta mais; gastamos as horas minguadas pensativos nos idos que ali se vão. Brados lamentos bolinados pela orquestra divina de onde cheira cravo e rosa e, pois bem, a branca flor de laranjeira.
Embalada na garupa dessa doce melodia parte a voz rouca de minha nobre oração. Somos matutos de porte trazendo bem zelado junto ao peito o segredo das canções.
O canto do coração dessa gente que ainda dança ao relento das faceiras noites de luar. Esses acordes são testemunhas do lamento do sertão. Aonde a vida faz a curva embalada pelo destino de uma modinha qualquer. A ladainha predileta deste meu cobiçado bem querer.
Num ligeiro repente poético me desdobro a matutar: na lida de uma toada vi poucas e boas violas chorarem. Rios de águas cristalinas que semeiam segredos pelas entranhas das belas planícies verdes do nosso amado Pantanal.
Simples harmonia atada pelo cangote de um cancioneiro servil. Somos partes dessa orquestra viva de concerto para uma só voz.
Esbelta, nessa brisa até as árvores dançam e as folhas cantam. Com voz rouca e barulhenta que sai da garganta do mato. E os galhos alegres balançam, mas não caem.
São apenas remos de canoa de um pau só. É por isso que canto. Que o nosso povo canta. Que nós cantamos. A nossa vida é a nossa música.
Um belo dia um pantaneiro descobriu que não poderia viver sem essa tal melodia.
De um tronco fez a sua viola-de-cocho e com tripa de Ouriço fez as cordas. Desde então o rio possui um ritmo e o sertão o seu encanto. Quem não toca, canta; quem não canta, dança; quem não dança segura a criança.
Não há de quê?!
Risca a viola e rufa o bombo temperado com o ganzá; que a canoa virou e tornou revirá.
Rebellioni carnis.
Putucinho de menina rebojando no salão é remédio para a cegueira e sustância para a canção.
A brisa pantaneira é libidinosa e cruel abraça o tempo sensual que emana em nosso seio: amor, ternura e paz.
Commodurum corporis.
Dança do barro amassado; do cabelo negro ondulado; do vestido de chita rodado e da flor ribeirinha encarnada. Canto sagrado de amor.
Vida serena de um rio charmoso de ondas que vem e que vão; do tempo bom que não volta mais.
Vamos meu povo dançar o rasqueado limpa banco cuiabano!
Como não!
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