Minha terra goiana (publicada em 17/10/03)
Leonardo Teixeira
escritorleo@ibest.com.br
Nasci e fui criado em Goiània, cravada no bioma mais rico do planeta, que é o cerrado. Do verde excessivo de mangubas, araucárias, pindaíbas, buritis, gameleiras, todas cercadas de poeira ruiva em pós granulados e insolúveis, brotaram altos edifícios cercados de cimento e asfalto. Algumas praças conseguem brilhar o excesso de flores multicores.
Parente - ainda que distante - de Pedro Ludovico, em Goiània obtive minha formação cultural, musical, linguística e pessoal, para tornar-me, como diria Nietzsche, humano, demasiado humano. Aqui moram meus amigos, aqui construí minha família. Andei, por muitas horas, nas ruas estreitas do Jardim Novo Mundo, Bairro Feliz, Centro, cruzando Campinas, Coimbra, Oeste, Marista e Serrinha, quando a violência brasileira ainda não atingia as atuais proporções. É bem verdade que a violência - posso dizer como escrivão de polícia - de um mês em Goiània não chega perto dos patamares de um dia no Rio ou em Sampa.
Colhia nas antigas ruas os doces frutos selvagens da mata, só que a mata já não suporta mais a fumaça da civilização. Entretanto, Goiània transformou-se em uma cidade agradável de se morar.
A região planáltica é cercada por montanhas e vales, trazendo maior umidade para a região. O João Leite e o Meia Ponte contam inúmeras histórias aquáticas, imortalizadas em lendas goianas, na forma de aventuras apaixonadas ou catastróficos crimes de pistolagem ou vingança.
Um povo mestiço, urbano-interiorano, meio mineiro, quase nada de baiano, com fala pausada e "r" puxado; as pessoas são hospitaleiras, cordiais, ainda mantêm sorrisos de sertanejos ancestrais. Muitos são estudiosos e intelectuais. A megalópole de Goiás atrai centenas de pessoas de todo o Brasil para cursar principalmente o ensino médio e cursos pré-vestibulares. Muitas delas permanecem por aqui, até mesmo após a graduação, contribuindo para a miscelànea.
Na Praça Cívica, os prédios permanecem baixos, com as cores e os postes conforme a idéia original. Não há quem não saiba e respeite a soberania das três raças, dos coretos, do relógio da Goiás, doBosque dos Buritis, Vaca-Brava, Areião, do trem inativo, e do novo avião suspenso. A idéia do novo metró parece agradar a população.
A cidade entupida de carros, motos, ónibus e vãs já estranha as carroças, as bicicletas e o velho carro de boi que rangia os cocões. Ninguém nega o conforto da tecnologia, mas a memória ainda se lembra das figuras isoladas, dos desbravadores do sertão, do gosto de fogão à lenha, do pequi, da guariroba, do milho assado e da pamonha.
Temos competentíssimos escritores, músicos e estudiosos que fazem pioneirismo e encantam o mundo. Por aqui ecoam novos talentos com a força e eloquência inspirada no saudoso Jerónimo Geraldo de Queiroz. Por aqui permanecem guerreiros ideológicos e pessoas humildes que andam em diferentes caminhos, mas chegam numa mesma estrada, todos orgulhosos por serem goianos. A lágrima saudosa aperta os olhos dos que partiram e umedece a esperança nos olhos dos que acabam de chegar.
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