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Contos-->O intelectual -- 13/01/2005 - 02:06 (Érica) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O nobre intelectual, com obras publicadas em revistas especializadas, livros caprichados, sentou-se na poltrona Barcelona e cruzou as longas pernas. Vestia-se bem, o nobre intelectual, como indicava a moda: calças jeans, bem passadas, com vinco e tal, camisa de listinhas, blazer azul marinho. Sem gravata, gola aberta no gogó. Seus longos dedos da mão direita seguravam um cigarrilho marrom-escuro, semi-apagado, onde ele dava umas chupadas de vez em quando. Seu olhar, que forçava em ser penetrante e atraente, se fixava na moça loira, franzina e meio adocicada, que lhe fazia perguntas,com um gravador equilibrado nos joelhos.

- O que o senhor tem a dizer sobre seu último livro?

Ele sorriu, ó sorriso mais condescendente... mas respondeu, o charutinho à altura da boca, mas sem chegar aos lábios:

- Meu último livro... - e por um instante tirou os olhos da mocinha ou dos seus joelhos, para olhar para o teto, talvez em busca da iluminada sentença que se avolumava na sua garganta - meu último livro... - repetiu - ainda não foi escrito.

A moça se espantou. De repente, se lembrou de uma aulinha na escola de jornalismo - conectar palavras que façam sentido, evitar linguagem obscura, isto é, falar o idioma o mais corretamente possível. Deu-se conta do engano:

-- Isto é, quis perguntar, desculpe... quis perguntar, o que o senhor acha do seu livro mais recente? Digo, este que acaba de ser publicado... claro que não é o seu último livro. O senhor vai publicar mais, claro. Quis dizer... seu livro mais recente... o últ... o que saiu agora há pouco.

O nobre intelectual inclinou-se para a frente, forçando seu esqueleto a se apoiar nos seus próprios joelhos - mas olhando para os esteios ósseos da moça, que mantinham o gravador amparado. Agora parecia mesmo que ele iria estourar com uma sentença fulminante, daquelas que se poderia até escrever na primeira página do jornal de maior circulação do país. Fechou os olhos, visualizou a moça sem o gravador, sem a saia cobrindo seus joelhos, sem a caneta na mão, sem a caderneta, sem nada. Visualizou-a por dentro dos seus olhos, ah nirvana, sorriu, abriu os olhos, virou-se para ela, estendeu a mão como para agarrar o gravador, deixou-a no ar, o cigarrilho balançando, e proferiu suas gloriosas palavras:

-- Meu livro mais recente, flor de maracujá, é para ser lido, não é para ser comentado por seu autor. Se eu fosse comentar meus livros, pediria a Deus contas por seus atos na terra. Não, não que eu me coloque como um deus, longe de mim tal abuso! Mas quero lhe dizer, minha amiguinha, que um livro jamais deve ser comentado por seu autor. Falemos de outra coisa.

A mocinha, tão educadinha e tão delicadinha, levantou-se de um salto, desligou o gravador, esticou-se toda sobre o cavalheiro dobrado -que esticou a cabeça para o alto para melhor acompanhar aquele vulto dourado na sua frente - e disse, chegando bem perto do seu ouvido, evitando o calor e o odor do charutinho:

-- Sabe de uma coisa, seu... seu... vá à merda!

E saiu, batendo os tacos dos seus sapatos no assoalho espelhado daquele saguão de hotel cinco estrelas, para onde a editora mandou o nobre intelectual - para ser entrevistado por uma jornalista de um dos jornais mais lidos da capital.

Ele amassou a ponta do cigarrilho no vidro da mesinha, onde dois galos de prata entravam numa rinha violenta, os rabos eriçados, tentou levantar-se, mas seus ossos não o obedeceram. Estatelou-se então na cadeira Barcelona de couro quadriculado, esticou as pernas, mordeu o lábio inferior e pensou:

-- Uma leitora a menos, que fazer...
---
E.E.
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