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Contos-->Vida e Obra de José de Abreu da Silva -- 30/12/2004 - 09:47 (José Ernesto Kappel) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
A poalha

José de Abreu da Silva, era filho único de uma família suburbana, porém estabilizada. Não eram abastados, mas o que o pai ganhava dava para o sustento da mulher e do filho. Tinham casa própria, com todo conforto. Sócios de vários clubes e participantes ativos de entidades filantrópicas. Seu pai era advogado e sua mãe havia se formado em filosofia. Durante algum tempo lecionou, porém com o nascimento do primeiro filho, parou em definitivo.

Excelente aluno José de Abreu da Silva, completou sem dificuldades, o curso de contabilidade. José, aos 20 anos já era um rapaz corpulento, moreno,alto, costas largas. Tinha os olhos esverdeados que puxara da mãe e a altura do pai. Sempre usava tenis e calça jeans - em casa, nas festas, nos bares, ou aonde fosse.

Aos 21 anos arrumou trabalho numa firma de contabilidade e passou a usar terno e gravata - coisa que odiava pois se sentia sem prumo naquela roupa que, para ele, era desgonçada e não representava nada o que ele sentia.

Falante, logo conquistou amizade na firma multinacional. Ainda titubeava em algumas coisas, mas sua leveza de pensamento,força de vontade, sempre o fazia passar aquelas primeiras dificuldades. Com dois anos de firma já havia conquistado até sua própria sala.

Todas as noite sai com os amigos, sempre flamejantes nos bares da orla do mar, deixavam-se levar pela brisa e nada conversavam de importante. Bebiam e riam, sempre varando as madrugadas, chegando em casa manhãzinha. Era tempo só de tomar banho, se arrumar e partir para o trabalho.

Estava com 25 anos; o pai já se aposentara e passava os dias no clube enquanto a mãe cuidava da casa.

ELEMENTO BÁSICO: AFETIVIDADE

Uma noite, José de Abreu da Silva , quando varava as madrugadas tomando cerveja com os amigos, conheceu Antônia da Conceição Pinheiro, de 22 anos, que terminava o curso de biologia. Começavam a conversar dispostos e sobre coisas vagas. Com o passar das semanas as conversas se tornavam mais sérias e a atração entre os dois aumentava.

Primeiro, grandes amigos, depois namorados e fervorosos amantes. Agora ele começava a mudar de vida. Ao invés de sair com os amigos, ia direto para a casa de Antônia que já o esperava sôfrega. Iam ao cinema ou ao teatro, mas sempre terminavam as noites nos bares ou em algum motel.

A vida já mudava. Estavam apaixonados e comunhavam pequenas e grandes coisas comuns. Afeitos, íntimos e atiços já traçavam planos para o futuro. Os amigos começavam a ficar mais de lado. Às vezes se reuniam em grupos, mas logo terminavam sozinhos - como gostavam. Ela preferia terminar a faculdade antes de casar. Ele já estava bastante estabilizado no emprego e ganhava bem.

AMOR HABILITADO

Em meados de 1950 eles se casaram numa cerimônia bastante simples, numa igrejinha de subúrbio, perto de onde moravam.Vieram muitos amigos e houve muita festa.

Passaram a lua-de-mel em várias estações de águas em cidades mineiras.

Alugaram um apartamento de dois quartos, perto da casa dos pais de José. Os pais de Antônia moravam no sul e sempre telefonavam ou escreviam para saber como ia a filha.Às vezes faziam uma viagem de surpresa.

Antônia, apesar de formada, nunca exerceu a profissão. Engravidou um ano depois do casamento e passou a cuidar da rotina do apartamento e a cuidar do filho, já que não tinham empregados. José trabalhava mais e com mais dedicação. Assim mesmo seus pais ainda o ajudavam com algum dinheiro.

MORTES LATENTES

O primeiro filho de José de Abreu da Silva nasceu no início da primavera de 1954, bem forte, com boa saúde, lembrando muito mais Antônia do que o pai. José escolheu o nome: Antonio Pinheiro da Silva.

A roda da vida começava a se mover lentamente. Dois anos após o nascimento de Antonio o pai de José morre de infarto. Foi um grande choque para todos. Ele tinha 68 anos e parecia forte bem disposto naquela manhã de outono quando se dirigia ao clube e, antes de tirar o carro, caiu no chão morto. A mãe de José meses depois veio morar com eles.

Sentindo que era a hora de mudar, José de Abreu, juntou suas economias com as do pai e comprou um apartamento de três quartos, dois grandes banheiros e um quintal. Tinha um hall grande e confortante, bem acarpetada e com uma tevê em preto e branco importada.

José de Abreu tinha 31 anos quando foi promovido à Gerente Administrativo da firma. A estabilidade financeira aumentava e eles já tinham empregados e tempo para se divertir horas nos clubes. Nos fins-de-semana, faziam grandes almoços ou churracos no quintal ou iam à casa de algum amigo.

Maria da Conceição estava grávida de novo e lhe nasceram gêmeos: dois belos meninos: José Carlos Pinheiro da Silva e José de Abreu da Silva Júnior.

Em meados de 1959 a mãe de José morreu de câncer e dois anos depois morreram os pais de Maria. Foram meses de aflição que lhe tomavam, e uma forte depressão se abateu sobre a casa de José. Foi um período difícil de superar. Por algum tempo passavam os domingos em casa, esqueciam os amigos e as coisas eram só lembranças que muito lhe pesavam. Mas o forte amor de José por sua mulher e filho servia de acalanto para a dor.

Mas o tempo, cuidadoso, tratou de plainar as coisas. Com o passar dos meses as lembranças eram apenas lembranças suportáveis. A rotina voltou.

Os filhos de José estavam prontos para iniciar os estudos no pré-vestibular. Um queria fazer medicina, outro administração e o outro queria seguir a mesma carreira do pai.

VIVENDA DO PASSADIÇO

No inverno de 1968, enquanto Antônia fazia compras num supermercado e a empregada preparava o jantar, José estava ao largo de uma confortável poltrona repassando as notícias dos jornais, quando começou a passar mal.

A princípio foi uma pequena dor no peito que se aguçou crescente invadindo todo o corpo. Ele se contorcia sem fala e da poltrona se arriou no chão, com as mãos contristas no jornal, num tom de agonia, acabando por se largar completamente no tapete. Até que minutos depois, um segundo ataque acabou por matá-lo. Não houve tempo de socorro. Quando a empregada percebeu, ele já tinha morrido. Vieram ambulância e médicos, mas nada puderam fazer.

Quando Antônia voltou das compras e viu o corpo do marido estatelado no chão teve um desmaio e foi logo socorrida pelos médicos que ainda estavam em sua casa.José estava arqueado no chão, enlvolto em folhas de jornais e com olhos arregalados.

Ele morreu aos 57 anos de idade e Antônia e seus três filhos muito relutaram para aceitar a perda. Ele foi sepultado no cemitério municipal com o acompanhamento de muitos amigos. Houve muitas lágrimas e sofrimento quando o caixão baixou à terra e foi logo encoberto por flores. Antônia mandou construir um mausoléu de mármore habilmente trabalhado por quem conhece a macieza e o poder do gradim. Meses mais tarde, Antônia mandou fazer uma placa, com bordas floreadas onde dizia: "Aqui jaz José de Abreu da Silva, saudades eternas de sua amada mulher,filhos e amigos". Logo abaixo vinha a data de nascimento e da morte.

TÊMPORAS DE OURO

Oito anos mais tarde, ela com 54 anos, mas muito bem apessoada, guardando traços marcantes da juventude, conheceu um rico industrial que semanas depois lhe pediu em casamento. Os filhos de José estavam acabando de se formar e cada um morava num ponto da cidade, levando suas vidas e pensando no futuro. Antônia morava só, apenas com uma empregada. Os filhos visitavam a mãe em épocas especiais, como no natal ou páscoa. O nome de José de Abreu da Silva nunca mais foi mencionado, mesmo nestas reuniões se evitava falar em seu nome.

Antônia , vendeu a casa, repartiu o dinheiro com os filhos. Casou com o industrial que tinha 64 anos de idade e foram morar do outro lado da cidade, numa zona mais nobre. E passaram a viajar para o exterior cada vez com mais frequência. Maria conheceu vários lugares exóticos, belos, ricos, pobres e admiráveis e ficava maravilhada com aquele mundo novo. A lembrança de José de Abreu da Silva , finalmente se espaireceu.

O VÔO DO PROGNE

José de Abreu da Silva , viveu durante 57 anos.Passou pela periferia da vida, como uma ave que parecia nunca encontrar pouso. Um ano depois de sua morte ninguém mais falava nele. Nem no escritório onde trabalhou toda sua vida, nem por Maria e nem pelos filhos. Foi instântaneo. Como se uma luz tivesse sido acesa e imediatamente apagada. Em 1990 - apesar de terem avisado à Maria e seus filhos -, ninguém apareceu no cemitério para acompanhar os translados de seus restos para o ossário, devido a ampliação do cemitério. E nunca mais ninguém falou dele. Ele tinha conseguido fazer um vôo para o nada.
(Dedicado à memória de Carlos Roberto de Almeida)
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