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Infantil-->O CRAVO E A ROSA -- 29/12/2002 - 08:25 (LUIZ ALBERTO MACHADO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Não seria esta a última
Muito menos a primeira
Pois, por qualquer besteira
Brigavam o cravo e a rosa

Se por razões mais tolas
Ou por motivos tão fúteis
Pelas coisas mais inúteis
Brigavam o cravo e a rosa

Pelo ferrolho da janela
Por munganga ou zombaria
Entravam da noite pelo dia
Arengando o cravo e a rosa

Era muxôxo pelos cantos
Era careta pelas costas
Era retrucando resposta
Que se entendiam o cravo e a rosa

O cravo era orgulhoso
Não desprezava contenda:
Não há muro que eu não suba
Nem peso que eu não suspenda
Dou resposta absurda
A demente que não se emenda

Todo nó-cego eu desato
Todo nó no dente eu trinco
Com dez amostrados debato
E deles desfaço o vinco
Toda tacada eu rebato
Derrubo prá mais de cinco

Tome cuidado comigo
Debande para outra roça
Que eu boto avesso no umbigo
Não se areie, nem faça troça
Por precaução eu lhe digo:
Dance fora da minha bossa!

Quando invoco meu jeitão
Mudo com força o leme
Piso em riba da serra
Que o lajeiro embaixo treme
Mudo o rumo dos ventos
E o vento de ruim que reme

Junto tudo num molho
Água quente não me péla
Levo sereno de noite
Que a lua se descabela
A porta que não tem tranca
A tranca dela é tramela

Levo tudo na munheca
Não levo desaforo na venta
Arrudio o dia sapeca
Para ver se a vida agüenta
Seguro o destino na beca
De jeito que a morte afugenta

A rosa, não, mais quietinha
Queria príncipe encantado
Fazia de dia meizinha
Para arrumar namorado
De noite ficava sozinha
Sonhando o seu reinado

Tudo era muita ternura
Tudo era em nome do amor
Reinava sua candura
Brilhando seu explendor
Amava toda criatura
Do alto do seu alcandor

E da rosa tão menina
Deu-se do cravo conhecer
Uma que da flor se ilumina
Que outro não quer entender
E é mais forte que a rima
Que o poeta escrever

"É um sapo dentro de um saco
o sapo batendo papo
e o saco com o sapo dentro..."

Cantarolava o Cravo quando viu a Rosa passar...

- Ei, Rosa menina, para onde vai?
- Vou ver o passarinho avoar!
- Virgem, que coisa mais besta!
- Mas besta é ver você cantar:

Ai, d-a dá!
O bicho quando emburra
É nó-cego desatar!

O Cravo não gostou da resposta,
Ficou injuriado:

Aqui só canta um galo
Que sou eu neste terreiro
Aquele que jogar estalo
Termina maior berreiro
Não venha meter badalo
Eu sempre assopro primeiro!

A Rosa não se dando por vencida
Olhou com ar de reprovação,
Aquele Cravo insultava a sua tranqüilidade.
Ela, então, botou as mão na cintura e largou:

No lugar onde habito
Tudo pode transitar
Seja nego com apito
Seja porco, mangangá
Os insolentes evito
Porque não sabem brincar!

O Cravo não perdendo a majestade, assuntou:

Sou cravo branco na lapela,
Sirvo até de homenagem
Os que sairam pela janela
Da vida noutra viagem
Sou rei no jardim dela
Balanço com toda aragem

Falo com firmeza de zinco
Enfrento bicho algum
Arrebento qualquer trinco
Ilustro qualquer álbum
É oito, é sete, é seis, é cinco
É quatro, é tres, é dois, é um!

Nessa hora passa um passarinho que se atrepa num galho de árvore. A tudo presencia das diferenças do Cravo e da Rosa.
E os dois continuavam:

É um dedo, é um dado, é um dia,
É um dado, é um dia, é um dedo.

É mais fácil um boi avoar
Um cururu ficar belo
Aruá jogar basquete
E cobra calçar chinelo
Que esses dois num acordo
Assinar a paz do libelo.

O passarinho logo entendeu toda aquela discussão e, num piado ritmado, deu seu parecer:

Quem tem seus olhos bem vê
Se se engana é porque quer
Presses dois se entender
Tem que entortar a colher
Ou então é o amor a remover
O coração do homem e da mulher!

Ouvindo o que o passarinho cantou, o Cravo deu língua para Rosa e se pôs de costa.
A Rosa, disfarçando, pediu para o passarinho cantar mais uma.
A ave, então, descompromissada com aquela arenga, logo destemperou:

"Eu fui lá não se aonde
visitar não sei a quem
sai assim não sei como
morrendo não sei por quem

não sei se vá ou se fique
não sei se fique ou se vá
partindo, não fico aqui
ficando aqui, não vou lá!"

O Cravo não disfarçando sua chatice, alegou que a cantoria do passarinho era muito fraca, era cantiga dos cantadores, dos nossos bons cantadores de repentes, de coco e de embolada. Por isso, não seria qualquer passarinho aventureiro que puxaria o mote sem se dar conta de que é das melhores do cancioneiro popular.

- Deixa de ser chato, Cravo branco!
- Eu não.
- Ficando assim, não vai poder brincar de boi balalão!
- Que besteira.
- Nem poderá puxar um cordão.
- Eu, hem!

"Vamos cantar o mourão
prestando bem atenção
que um mourão bem recitado
é obra de grande agrado
e causa satisfação!"

- Nada disso, melhor adivinhação!

Adivinhação que nada,
você só quer arengar
não presta nem atenção
na brincadeira que dá
uma hora quer garrafão
noutra só quer enrolar
assim não dá sensação
para a gente ir brincar
seu prazer é embromação
desfazendo o be-a-bá!

Com isso o Cravo engicou-se, ficando todo bicudo e de cara amarrada.
A Rosa, não, chamou o passarinho que pousou na sua mão e cantaram lalarilarilará.
E foi saindo para a beira do rio onde encontrou os peixes a pular. Pulavam alegres de ver o piu-piu do passarinho no ar.
O Cravo ficou sozinho, procurando com quem brincar. Ninguém queria nada, estavam todos com Rosa, na beira da lagoa de lá.
E na sua solidão, pensou...
- Ninguém me entende... ninguém me entende. Se explico como roda o mundo, ninguém quer saber. A formiga bem que sabe a folha que come. Eu não, ninguém me dá importância. Por isso a resposta prá ser boa, dá-se no pé da fivela. Às vezes as coisas não saem do jeito que a gente pensa. Não conheço quem sabe as voltas que o mundo dá. Definição de tudo: "Qual é a dor que mais dói, que mais atomenta a gente?".

Um voz distante dizia:
Saia de onde sair, venha de onde vier, se lembre sempre dos nove meses que sua mãe lhe carregou... da cabeça ao calcanhar, você tem que agradecer.
A flor na catingueira, quando murcha, cai no chão, perde o viço, perde a cor.
Que foi? Que foi? É o sol, é a lua, é a lua é o sol.

O Cravo ficou desconfiado. E não tendo o que fazer, foi até o rio. Lá chegando, viu Rosa com os peixinhos brincando, a cigarra zunindo, as abelhas brincando de esconde-esconde com os vagalumes, a coruja piando, os besouros zoando, e todos embalados na canção dos pássaros.

Já caía a tarde e o sol se despedia para que a lua reinasse altiva no horizonte.

O Cravo, com aquela festa, ficava se remoendo atrás da moita. Jurava para si, que ia atrapalhar aquela coisa mais sem propósito.
Foi então que ele se apossou de uma pedra e jogou no meio do festeiro.
Essa, acertou bem no passarinho que caiu quase morrendo.
Todos se assustaram e, com a aflição do pássaro, entristeceram.
O sol de tão tristonho, sumiu. A lua, também. Tudo parou. Precisavam salvar aquela ave.

Rosa mais alarmada que todos, colocou o passarinho agoniado entre as mãos. Suas lágrimas alimentavam-no.
Com um fiapinho recolhido, ela começou a imobilizar a patinha do ferido. Mas ele cada vez mais se agoniava. Estava com sede e precisava de água. Todos com as mãos na cabeça sem saber o que fazer para salvá-lo.

O Cravo estava satisfeito. Quando viu a aflição de todos, tentou correr, fugindo dali. Não consegiu, tudo estava muito escuro.

Foi quando apareceu-lhe um vagalume, clamando por socorro.
- O passarinho está morrendo, precisamos de sua ajuda!
- Eu, hem!
- Ele vai morrer se você não ajudar.
- Pouco importa...
- Você precisa ajudar!
- Ajudar em que?
- Buscando água no rio.
- E quem vê mais o rio esta hora.
- Eu ajudo a você chegar lá.
- Quem me garante?
- Eu. Venha, se você não ajudar ele vai morrer!

O Cravo seguiu o vagalume e chegou perto da Rosa chorosa.
Foi aí que ele se comoveu.
Correu para o rio e com as mãos em concha trouxe o bocado de água que pôde. Depois, seguiu de novo e mais água foi trazendo. Isso, retornando várias vezes, até que percebeu um riso da Rosa com o bichinho se restabelecendo.

A lua alumiou de alegria e todos puderam constatar a salvação do passarinho.
- Foi o Cravo que salvou o passarinho!
- Foi?
- Foi!
- Palmas para o nosso herói!

O Cravo encheu os olhos d´água, sentindo, pela primeira vez, o valor de uma boa ação.
Os vagalumes chamaram os peixes que pulavam no rio, a lua redobrou as forças alumiando cada vez mais, os passarinhos piaram e cantaram novas canções de festa, fazendo uma roda e todos participaram.

A Rosa dirigiu-se ao Cravo, dizendo:
- Você tem um bom coração!
- Obrigado. Você me ensinou uma lição!

Ela, então, beijou-lhe as faces em sinal de gratidão. Deram-se as mãos e começaram a brincar de roda.
Mãos nas mãos, não havia mais motivo para arengas, só alegrias de bailar e viver.

©Luiz Alberto Machado. Direitos reservados.

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