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Contos-->Dia e Noite -- 24/02/2000 - 00:19 (Pedro Carlos de Mello) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Meu nome é Lauro. Tenho 44 anos. Trabalho numa Financeira, em Curitiba. Faço análise de cadastros. Tenho a atribuição de decidir quem vai ter crédito (e o quanto) ou não. Passam pelas minhas mãos as biografias financeiras de muitas pessoas. Embora de grande responsabilidade, o trabalho é rotineiro e cansativo.

Minha mulher se chama Dalva. Tem 36 anos. Não por coincidência, trabalha na mesma Financeira. Conheci-a lá, há 9 anos. É responsável pelo controle da cobrança dos inadimplentes. Sua produtividade no serviço é das maiores, mas, em compensação, tem o gênio muito difícil. Irrita-se com muita facilidade com tudo e com todos. Às vezes, tenho a impressão que os colegas somente a aturam em consideração a mim.

Ontem, por exemplo, o sistema de cobrança ficou fora do ar por cerca de duas horas. Dalva saiu do sério. Xingou todo mundo, responsáveis, irresponsáveis e não responsáveis. No final, descobriu-se que o problema era externo à empresa. Tinha ocorrido uma falha no sistema de comunicação no centro da cidade, onde a Financeira está localizada.

Como se não bastasse, qualquer problema que ocorre no setor de controle da cobrança, Dalva julga indispensável discutir o assunto comigo. Diz que eu devo saber tudo que ocorre com os devedores para fazer constar dos cadastros. Acontece que nem sou o responsável pelos cadastros, sou apenas o analista de crédito. Mas, lá vem a Dalva, como se o seu assunto fosse o mais importante do mundo. E ai de mim se não lhe dou atenção.

Vejo no rosto dos meus colegas que eles não entendem como e porque sou casado com uma chata. Acontece que eles só conhecem a Dalva do trabalho, a Dalva ranzinza, mal-humorada, cobradora, exigente e possessiva. Eles não conhecem a Dalva que levo para a cama. Às vezes, tenho vontade de fazê-los engolir seu risinho sardônico, contando como é a Dalva da noite, a Estrela Dalva da noite, que toda noite ilumina meu quarto, com o seu corpo em fogo.

Ao final do dia, quando voltamos para casa, Dalva já dá sinais de que existem coisas mais importantes para tratar do que os seus inadimplentes. Começa se aconchegando a mim, enquanto estou dirigindo o carro. Passa a mão de leve em minha nuca, beija carinhosamente minha orelha e brinca de mudar a marcha do carro com a alavanca errada, ou melhor, a certa (a certa para eu botar uma quinta – na certa -- e voar para casa).

Ao entrarmos em casa e no caminho até o quarto, as roupas vão sendo abandonadas peça por peça, indicando o rumo seguro para uma noite de prazer, como as pedrinhas na floresta indicavam a João e Maria o caminho da salvação.

Oh Dalva, quanto prazer me dás! Que tens de diferente, que me seduz, que me enfeitiça, que me faz esquecer os aborrecimentos do dia? Como podes ter tal capacidade de me receber em tua morada com tanto conforto? Será que fostes feita sob medida para o meu deleite? Será que a combinação de nossos gozos funciona como um alucinógeno poderoso? Será que o torpor que toma conta de nossos corpos depois do amor e nos envolve em um sono gostoso funciona como uma anestesia para as agruras do dia seguinte?

Não sei. Só sei que é minha sina viver como se minha vida fosse uma sucessão ininterrupta de prêmio e castigo ou castigo e prêmio (não sei o que veio primeiro). Será que cada dia seguinte é o pagamento que devo pela noite passada? Oh Dalva! Oh meus colegas! Por que o dia é composto de dia e noite? Por que o dia não é só noite?
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