Não interessa ao leitor porque em um sabado de azul leveza fui lá parar. Parar na UTI DE UM HOSPITAL NO HUMAITA. Eram sete leitos todos ocupados. TINHAM QUE ESTAR OCUPADOS! O dono da clinica com esta cota
ganha de R$80.000.00 a 100.000,00 por mês. Sem fazer nada, salvo remeter para a UTI pacientes terminais de càncer.(Ele é oncologista). Os coitados dos plantonistas seguem o ritual em que alucinam salvar pessoas. "Hoje dei alta de dois pacientes" fala feliz um deles. Sim, deu alta para que a morte abrace -o no máximo em 2 meses. Permita-me o leitor falar sobre rituais. No meu pensar o ritual é um procedimento que em qualquer contexto quer religioso quer médico soberanamente impõe uma condição para se presentificar. Pode tudo, menos refletir sobre ele. Sim é mister cumpri-lo para NÃO PENSAR. SE O CARO LEITOR FOR PENSAR SOBRE A INSENSATEZ DO RITUAL NA UTI, morrerá de rir ou de chorar o que é mais provável. Uma parafernália de máquinas que controlam a dose certa da dopamina ou da glicose. Descontrolam também
os nervos do marimbondo que se tiver o azar de estar fora do coma assiste aquela peça de teatro nonseence. Respondo a um simpático mulato que deve sair em breve desta ultima estação da vida. "Mermão tu vai sair se deixar de ser flamengo" digo jocosamente. Sim neste ambiente onde não se ri, torna-se urgente brincar, e dar uma boa risada. Responde o bom crioulo: "Seu doutó passo até a torcer pelo Vasco na torcida barra pesada, onde vez ou outra se morre também, mas ficar aqui é dose! Eles vão morrer né?" Tangencio e vou apanhando suas roupas. Deu sorte, era apenas um inicio de coma diabético. Vai viver. Mesmo porque ocupa um leito que será preenchido por um paciente particular. Este rende mais. Neste mercado da morte vale tudo. É urgente que saia. Que o crioulo saia com seu sorriso. Que entre o canceroso que ficara nesta estação uns 15 dias para depois partir. Tempo suficiente para o dono ficar ainda mais rico.
Acho que já escrevi aqui que uma pesquisa em Edimburgo comprovou que pacientes que escapam desta estação sobrevivem entre os seus muito mais tempo. Aqui o paciente esta só. E sozinho morrerá. Aliás, como todos nós um dia. Só que levará consigo aquele silencio mortal junto com o barulho infernal daquelas máquinas. Voltando para casa com meu filho, só reparei que a primavera estava chegando, trazendo vida, alegria, flores no campo, quando ele jurou que não permitiria que eu fosse um dia parar nesta estação que lembra aquelas outras nazistas. Aí então o céu voltou a ter aquele azul leveza.