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Contos-->O ESTUPRO DE PATRICINHA -- 01/12/2003 - 12:43 (ADELMARIO SAMPAIO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
PATRICINHA


Eu brincava com meu caminhãozinho na porta de casa. Era um desses carrinhos bonitos que toda criança quer ter: uma caçamba automática, e as rodinhas que giram e além de tudo o cavalo mecânico desses que se pode tirar e colocar... Era mesmo um brinquedo muito bonito, mas já estava um pouco velho, porque eu tinha ganhado no dia das crianças, mas já era o final de novembro.
Pra ganhar aquele brinquedo eu tive que trabalhar como um ator diante dos meus pais. Eles queriam comprar um outro porque era mais barato, mas eu não quis depois que vi esse. Dei a maior birra... Já tinha aprendido que os meus pais não suportavam me ver chorando alto por muito tempo. Então quando queria uma coisa, abria o berreiro, e fazia a maior cena. Chorava muito alto, e funcionava, principalmente quando estávamos num lugar público, ou perto de pessoas estranhas...
Eu ia contar que nesse dia brincava na porta de casa, e vi de longe o meu amiguinho que devia vir brincar comigo. Entrei correndo em casa, e pedi pra brincar com ele na rua, mas minha mãe não gostou da idéia. Disse que não e não, e não. Então eu comecei a dar um dos meus espetáculos de choro, e saí para a porta chorando. Meu amiguinho já tinha chegado e me chamou pra brincar, mas eu parei de chorar e disse que minha mãe não deixava. Então ele me pediu o meu brinquedo, e eu disse que se fosse emprestado eu deixava. Quando ele saiu, eu entrei novamente em casa e fiz o maior escândalo, chorando na maior altura dizendo pra minha mãe que um menino havia levado o meu brinquedo. Minha mãe saiu pra procurar comigo, mas não vimos mais ninguém. Foi aí que eu abri mesmo o berreiro... Gritei com toda a força dos meus pulmões.
Ouvi quando o telefone tocou. Minha mãe atendeu, e eu aproveitei e fui pra mais perto chorando alto. Eu tinha essa tática que sempre funcionava... Era o meu pai e minha mãe disse que queria falar comigo. Então ele perguntou:
“Que foi com você filhinho?...”
Eu disse entre soluços como só eu sabia fazer:
“Um menino roubou o meu carrinho!...”
“Você já procurou por onde brinca? Deve ter esquecido em algum lugar...”
“Eu vi um menino pegar e sair correndo.”
“Não chora, filho, eu vou comprar outro pra você no natal.”
“No natal, eu não quero!... Quero agora!...”
“Falta pouco mais de mês pro natal.”
“Mas eu quero agora.”
“Está bem!... Vou comprar pra você parar de chorar.”
“Vai comprar agora?”
“Vou. Eu compro...”
“Mas eu quero é uma bicicleta...”
“Filhinho, não dá pra comprar bicicleta agora...”
“Mas eu quero!...”
Meu pai teve que prometer.
Desliguei o telefone e já saí pulando de alegria, dando a notícia pra todo mundo. Fui correndo pra porta de casa, e meu amiguinho vinha chegando com meu carrinho. Precisava dar um fim no brinquedo, senão eu não ganharia a bicicleta. Quando meu amiguinho chegou, eu dei a notícia da bicicleta pra ele. Então ele me pediu o meu carrinho. Eu vacilei um pouco se daria ou não, mas resolvi que não. Tomei o brinquedo da mão dele, e ele saiu contrariado comigo...
Assim que meu amiguinho sumiu, eu quebrei o carrinho, coloquei num saco plástico, e joguei no lixo da porta, e entrei em casa.
Na tarde do mesmo dia, meu pai teve que ir comigo comprar a bicicleta. Ele disse que já era o meu presente de natal, mas eu tinha sempre os meus truques pra ganhar outro presente um mês depois...

Essa é uma das histórias que conto hoje pros meus companheiros de cadeia... Aqui não adianta dar birra nem chorar... Aliás, quem se faz de criança aqui recebe uma punição muito dura que não gosto de lembrar. Já recebi essa punição. Fui chamado de marica, e estuprado... Não vamos falar disso que é uma parte muito difícil de suportar dentro das prisões...
A correção que faltou, estou recebendo agora... Os “não” que deveria ter recebido, são muito fortes aqui. Em casa eu era chamado de “filhinho”. Aqui o diminutivo continua, mas não é carinho. É gozação. Ele me chamam de “Patricinha”.

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Adelmario Sampaio
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