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cronicas-->A PONTE -- 21/07/2003 - 21:17 (DANIEL CARRANO ALBUQUERQUE) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Há quase duas décadas, atravesso-a pelo menos duas vezes por semana. Curiosamente, demorei a perceber que sempre me ocorria uma estranha sensação, assim que chegava ao seu ponto mais elevado. Muito sutil. Talvez por isso o retardo na percepção. É provável, que com o incremento natural da sensibilidade que acompanha o envelhecimento, ela passara a vir se revelando gradualmente, até o momento em que tenha me chamado à atenção o bastante para pensar e escrever sobre ela. É um aperto no peito, leve, como disse quase imperceptível, seguido por um nozinho na garganta e de uma impressão de levitação. Pode ser que seja a exteriorização de emoções estimuladas pelas sinfonias que costumo ouvir pela MEC sintonizada pelo rádio do carro como
músicas eruditas muito melodiosas. Uma explicação insuficiente ainda, porém, para estabelecer um nexo com o que ocorre no cume daquela edificação. Por outro lado, a beleza natural da Baia da Guanabara poderia muito bem se coadunar com aquele pequeno transe. Aquela imensidão azul, de ponta a ponta e de lado a lado comungada, principalmente nos dias de sol, com o céu maravilhoso das manhãs do Rio de Janeiro, respingada de embarcações de tipos e de tamanhos diversos. Imponentes navios, pequenos barcos de pesca parecendo ter sido propositadamente colocados para compor um belo quadro paisagístico. Aeronaves auxiliando naquela "pintura" com seus vóos baixos, chegando e deixando o vizinho Aeroporto Santos Dumont. À frente e do lado esquerdo, a imensa cordilheira de prédios, num prateado emprestado pela reflexão solar, se estende desde a Explanada do Castelo, numa continuação das enseadas de Botafogo e do Flamengo, escoltada pelo longo e serpenteado viaduto da Perimetral e vem percorrer a Praça XV, a Praça Mauá e o Cais do Porto. À direita, numa súbita regressão do requinte, o Caju e as habitações pobres da Maré e da Praia de Ramos, numa faixa que vai se perder pela orla e oleodutos da Petrobrás, num caminho para o antigo Contorno, onde os municípios de Caxias, Magé, Itaboraí e São Gonçalo eram atravessados, quando não tínhamos a Ponte e queríamos evitar as barcaças de transportes de veículos - grandes demais e lentas - para que pudéssemos atravessar a baia. A Ilha do Governador oculta aquelas paragens mais longínquas ao fundo. Mais atrás daquele cinturão, os bairros de São Cristóvão, Benfica e Olaria no outro lado da Avenida Brasil, um vasto conjunto de casas baixas tendo acima, o Morro do Corcovado e outros adjacentes, circundados pelo grande complexo de favelas vizinhas. A Serra do Mar é o limite da vista da frente e para trás, deixamos Niterói, a rejuvenescida cidade que foi gratificada com a fusão política dos dois estados e que possui peculiaridades que a tornam diferente de sua metrópole vizinha, o Rio de Janeiro, por ser mais provinciana, embora bem desenvolvida.
Um visual que de fato pode sensibilizar os mais emotivos, por certo, mas ainda pouco para me convencer. Fosse eu um adepto de esoterismos, acreditaria numa forte influência dos chamados fluidos e outros tipos de ondas magnéticas que se irradiariam de tantos espíritos numa direção centrípeta, atingindo-me em cheio, situado que estou, então, bem no meio daquela baía, rodeada por aquele imenso cercado humano. Acreditaria que estaria vulnerável àquela imensa mistura de pensamentos, sentimentos, dos mais brandos aos mais turbulentos. Amores, ódios, alegrias, desventuras, desesperos, paixões, compulsões as mais diversas. Quantas explosões de fúria e de histeria, quantas acaloradas manifestações de amor devem, fatalmente, estarem acontecendo naquele teatro gigantesco? Quantas contradições, quantas situações de intensa dramaticidade podem estar abrindo caminho para os gritos de almas em desespero, em estrondosas revelações da miserabilidade dos espíritos? Quanta dor, quanto gozo, quanto conflito, quanto remorso? Quanta injustiça porventura cometida e revoltando corações inconformados? Quanta saudade atormentando, torturando, em segredo ou não, corações aflitos? Quanta vingança planejada ou consumada? Quanto mistério hermética e desesperadamente guardado? Quanta trama inconfidente? Quanto passado irrevelável e quanto fato inconfessável? Todo um caldeirão onde almas em ebulição se atormentam, quem sabe? Que rotina de angústias e de temperadas paixões acontece dentro e fora das casas, podemos imaginar? E um cenário maravilhoso de sol, luminosidade, água, movimento, vida e poesia. Se for verdade que existe energia mental e espiritual que se propaga em ondas, é possível que um encontro delas aconteça e que colidam, afetando-nos, estrategicamente, bem no meio e no sítio mais alto da magnífica Ponte Rio-Niterói. Seria uma hipótese razoável, fosse eu crente em esoterismos.

Julho de 2001
Daniel Carrano Albuquerque
e-mail: notdam@bol.com.br


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