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Contos-->Difícil de esquecer -- 31/05/2004 - 15:29 (Isabel Fontes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
-Joana!
-Joana, estás a ouvir, chega aqui! Preciso da tua ajuda!
-Estás parva? Chega aqui não consigo chegar ao pé da toalha, tenho a janela aberta ainda me constipo!
Lá saiu da banheira com muito cuidado, enrolou-se na toalha e foi direito ao quarto para refilar com a Joana.
-Joana! Não acredito ainda estás deitada?
-Joana! Acorda, já são horas de irmos ao médico!
Tocou-lhe nos ombros ,mas a Joana estava inerte, não se mexia ,abanou-a mais um pouco, e nada. Sentou-se na beira da cama, colocou as maõs na cabeça e começou a chorar, a Joana estava morta.Foi dormir para outro lugar.
O mundo do Francisco estava perdido, sem ninguém onde se apoiar ,sem nada para lutar . A única coisa que conta agora, é quando chega a vez dele, quando poderá voltar a ver a Joana. Ele e a mulher não tinham tido filhos, por opção, os familiares dela estavam todos mortos, e os que viviam ele não os conhecia. Da parte dele só existia o filho do irmão mais velho, o Gonçalo, bom rapaz, mas com imensos problemas. Não podia contar com ninguém, a reforma é muito pouca, vai fazer muita falta o dinheiro que a Joana ganhava com as costuras que fazia para as vizinhas, e para as lojas do Centro Comercial da rua de baixo. De um momento para o outro tudo ficou cinzento, tudo estava baço. Que fazer para pagar a renda, a alimentação, a luz, a água, o telefone e outras coisas mais? Depois de uns dias de reclusão, o Francisco decidiu ir procurar trabalho, por muito árduo que fosse ele não se importava, queria era ganhar uns trocados para conseguir sobreviver. Na segunda semana após a morte da mulher, saiu de casa para ir comprar o jornal de classificados, foi a mais dura e longa descida de escadas em 20 anos. Todos na rua lhe prestavam os pêsames, choravam, davam-lhe palmadinhas nas costas, ninguém se apercebia o quanto toda aquela situação lhe estava a ser muito dolorosa. Nunca tinha sentido, pelo menos nestas últimas semanas, um tal alívio de entrar em casa como sentia naquela altura. Revirou o jornal de alto a baixo e só conseguiu tirar dois anúncios onde aceitavam inscrições a pessoas até aos 70 anos. Decidiu ir tentar a sua sorte.
A primeira entrevista foi um suplicio. Além de se ter deslocado ao outro lado da cidade para ir á suposta reunião sobre uma vaga nos quadros de uma empresa multinacional, ainda lhe pediram três mil escudos para a inscrição, empresa da qual não sabia o nome nem a que se destinava. Como era novato nestas andanças de procurar emprego, ainda mais na terceira idade, resolveu aceitar as condições e inscreveu-se. A segunda entrevista, foi de mal a pior, foi um desespero, o jornal tinha imprimido mal o limite de idade, foi uma vergonha, se tivesse um buraco tinha-se enfiado nele. Lá foi o pobre Francisco para casa, com a vida a andar cada vez mais para trás. Pelo menos ainda tinha esperança na primeira entrevista ,já que tinha pago, esperava uma resposta positiva, ia esperar. Chegou a casa, mal colocou a chave á porta o telefone começou a tocar, atendeu, reconheceu logo a voz do Gonçalo, queria saber se estava tudo bem com o tio e que ia para fora na próxima semana em trabalho e não sabia quando voltava. Mais uma vez se encontrava sozinho. Bem, ainda restava a espera do telefonema, a televisão, os retratos da Joana, e as lembranças. Neste momento nada o impedia de recordar uma vida cheia de sol e água, cheia se sorrisos. Hora de jantar, mas ultimamente a fome tardava em aparecer.
Passaram-se dias, semanas, nada de telefonemas, nada do Gonçalo. O Francisco já sem esperança de emprego, ou até de alguma preocupação do sobrinho, deixou-se esperar, as coisas talvez ainda aconteçam. Os dias em frente á televisão eram uma constante, e o silêncio da noite já fazia parte da rotina, estava cansado de esperar queria dormir, nem as recordações bastavam, estava decidido a deixar aquele corpo, sentia-se preparado. Afinal a Joana esperava por ele. Uma certa noite tirou o telefone do auscultador, apagou a televisão, destrancou a porta, foi buscar a manta preferida ao quarto, aconchegou-se no sofá e fechou os olhos. Começou a pensar no dia em que conheceu a Joana, no dia do casamento deles, nas pessoas amigas que foram ficando para trás e chorou. Deixou o corpo levitar, sentiu-se mais tranquilo, mais em paz, naquele momento tudo fazia sentido, não tinha que recear nada. A espera tinha sido longa, mas valia a pena, a Joana estava no início da porta á espera dele. O começo é difícil esquecer, mas o fim é agradável para se viver.

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