K.
Título? É a patente do fracasso!
A Emil Cioran
Escrever para quê?
Desde as cavernas se escreve
e o troglodita, feroz e imbecil,
somente trocou a clava
pela pena!
Não! Não mergulhar
nas profundidades mudas da literatura.
Manter-me naturalmente sujo,
vencido, sem desperdiçar uma só
de minhas decepções!
As palavras são sombras da realidade:
Platão, aquele espevitado, já o dizia.
E não existe universo mais falso
que o universo literário – fraseologia
em suspiros, clarões de imitação!
Eclâmpsia dos pleonasmos, a literatura
vive da exuberância de vocábulos
e neste mundo de espermatozóides verbosos,
um gramático esquizofrênico
vale mais que um Buda: morre-se
por uma vírgula!
O homem de letras é um charlatão
solitário - acorrentado ao laconismo
da interjeição, bocejo dos adjetivos.
Bem melhor seria ouvir flores
tagarelando sobre a morte.
Como é prazeroso observar
a esfinge, com sua loquacidade
silente que remonta o estupor alegre
de uma época anterior aos idiomas:
letra morta, vocábulos abortados...
O estilo? É impossível,
a não ser nos epitáfios!
O talento? O meio mais seguro
de falsear tudo, de deformar as coisas.
Qualquer estupidez vestida,
aqui e ali, de rimas, corre o risco
de se transformar numa obra-prima.
Então por que não recuar diante
do banal de escrever?
Ah! O desejo de ser lido
e de ver publicados os seus lamentos,
os seus gritos: demência enaltecida...
Volvamos, pois, nossa atenção aos gênios,
aos originais – na melhor das hipóteses,
uns decadentes honrados, embriagados
das vertigens de seus próprios abismos.
Nem mesmo aqueles que se entregaram
à insanidade, ao escândalo – tal qual um Sade ou um Lautremont – conseguiram ir além
de si mesmos. Tudo que foi escrito, até hoje,
não passa de masturbação de egos estiolados:
figuras débeis tentando construir impérios,
conquistar mundos plagiando o eco
de suas perturbações.
Poeta? Poeta? Amargo e insaciável,
lúcido e apaixonado, símio
imitador ou na vanguarda de sua solidão...
Arroga o direito de proclamar algo da vida, usurpa o delírio
dos místicos
em perscrutar os silêncios do nada:
de Homero a Tzara, tudo é um protesto
contra a verdade, provocação à nossa bílis!
Sonho com uma época fora do tempo,
em que bibliotecas serão museus
de nossa falta-do-que-fazer histórica,
monumentos à dilaceração voluntariosa:
brasão de um ser biologicamente falido - o verdadeiro escândalo
da Criação!
C
R
I
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