WLADIMIR OLIVIER
MARULHOS POÉTICOS — IV
(50 SONETOS MEDIÚNICOS)
ESPÍRITOS DIVERSOS
ÍNDICE
1. Abrindo a porta ..................................
2. Refúgio moral ....................................
3. Razões do músculo cardíaco .......................
4. Printemps ........................................
5. Roteiro de vida ..................................
6. Ao pó voltarás ...................................
7. Nem sempre tem pão quente ........................
8. Caminhos tortuosos ...............................
9. Consciência tirana ...............................
10. Com medo do resultado ............................
11. Loucura a dois ...................................
12. Em ponto morto ...................................
13. Por fora, bela viola... ..........................
14. ... por dentro, pão bolorento ....................
15. Subindo mais um degrau ...........................
16. Sem lamento e sem lamúria ........................
17. Reunião ..........................................
18. Contato radioso ..................................
19. Falta de inspiração ..............................
20. Confissão ........................................
21. Felicidade, afinal... ............................
22. Espantado ........................................
23. Superando o perigo ...............................
24. Quente mas não sufocante .........................
25. No topo do mundo .................................
26. Minha casa, nosso lar ............................
27. Cansado mas ativo ................................
28. Noite adentro ....................................
29. De braços cruzados ...............................
30. Vetusto e arcaico ................................
31. Com o coração palpitando .........................
32. Águas passadas ...................................
33. Sempre incompleto ................................
34. Parada forçada ...................................
35. Malhando o Judas .................................
36. Quem avisa... ....................................
37. No auge da compreensão ...........................
38. Falando muito sério ..............................
39. Quando havia tarde ...............................
40. A trova interrompida .............................
41. Responsabilidade espiritual ......................
42. Rastilho de pólvora ..............................
43. Gozando a vida ...................................
44. Perto do fim .....................................
45. Amizade e conforto ...............................
46. Enaltecendo a existência .........................
47. Simplicidade acima de tudo .......................
48. Prece agradecida .................................
49. Espero você ......................................
50. Adeus ............................................
1. Abrindo a porta
As aves, quando voam pelo céu,
Buscando renovar seu alimento,
Alinham-se e se movem com o vento,
Jamais causando males de escarcéu.
As almas que aqui trazem seu tormento
Procuram disfarçar com nobre véu
As lágrimas sentidas, seu troféu,
Na compreensão da dor, do sofrimento.
Por isso, o meu leitor vai perdoar
Que o vate já se achegue a seu bom lar,
Trazendo do mistério rimas pobres.
A Deus é que elevamos nossa prece,
Pois falta-nos a luz que resplandece
E os dons dos mais perfeitos, raros, nobres...
17.09.03.
2. Refúgio moral
Muitos aqui disseram que a poesia
Lhes serve de refúgio e lenitivo,
Que o sofrimento grande é bem mais vivo,
Se um só momento alegre se enfastia.
Porém, devo ser ágil, criativo,
P’ra formular a trova a cada dia,
Porquanto outros deveres haveria
De abandonar, se os versos incentivo.
Agora que produzo este soneto,
Ainda que feioso, em branco e preto,
Me julgo aquinhoado de talento.
Estou co’a bola toda e mais me animo.
Se a rima calha bem, é bom arrimo,
Para enfeixar de luz meu sentimento.
3. Razões do músculo cardíaco
Envolvo os sentimentos com a rima
E deixo o coração bater mais forte.
Assim, não perderei jamais o norte
E chegarei à luz que reanima.
Espero sempre em Deus ter muita sorte,
Para encontrar leitor com justa estima,
Não só pela poesia, que ele mima,
Também por seu autor, de pouco porte.
Por isso a minha mente satisfaz
Os bons princípios de quem quer a paz,
Orientando moralmente o tema.
O compromisso é de fazer o bem,
Tornando alegre o coração também,
Sem que se tenha uma emoção suprema...
4. Printemps
No etéreo, nós não temos calendários
Que marquem estações, como na Terra,
No entanto, quando um ciclo aí se encerra,
Sabemos ser com todos solidários.
O tempo bom das flores se descerra,
Enchendo os corações mais solitários
De luz, de amor, de festa, sendo vários
Os que daqui declaram paz à guerra.
Por isso, este soneto que hoje invento
E venho dar ao povo no momento
Em que se exime o mestre de orientar.
Exige que mantenha a disciplina,
Conforme as normas que na escola ensina
E que devem florir dentro do lar...
5. Roteiro de vida
Fazer o bem é norma superior,
Conforme o ensino magistral do Cristo.
Mas o evangelho por aqui é visto
Como sistema de criar amor.
Pois, sem amor, eu mesmo não insisto
E deixo o tema intato, sem compor
Os versos sóbrios que me causam dor,
Porquanto o bem assim não tem registo.
Se a rima torce a idéia e compromete
O texto arquitetado cá no etéreo,
Alguém pode dizer que pinto o sete,
E deixo a trova sem teor mais sério,
Mas tudo que não quero é vão confete,
Pois profissão de vate é refrigério...
6. Ao pó voltarás
Não sei se meu leitor vai aturar
A trova que lhe trago tão matreira.
Não vejo aqui, porém, outra maneira
De dar notícia alegre deste lar.
Ensina o velho livro que à soleira
Do etéreo, o corpo sempre hão de deixar
Aqueles que viveram, pois no altar
Em que repousa o Pai a luz se inteira.
Mas como lamentar que se perdeu
A fórmula da vida, se a existência
Prossegue tão faceira e no apogeu?!...
Mas isso que aqui digo se restringe
Àqueles que cumpriram com paciência
As provas alvitradas pela esfinge...
7. Nem sempre tem pão quente
Augusto, este momento de poesia
Se esvai a cada dia mais feliz.
É certo que não faço, por um triz,
Poemas superiores de alegria.
A rima foge às vezes da matriz
Que trago engatilhada e que eu queria
Dispor em versos francos, na agonia
De quem sofre ao compor, sem diretriz.
No auge do terceto é que descubro
Que a cor de obrigação me deixa rubro
O texto repassado ao professor.
Ocorre que o sistema se completa,
Porque tenho recursos de poeta
E o povo que me lê tem muito amor...
8. Caminhos tortuosos
As sendas que trilhamos cá no etéreo
Para subir a esferas mais perfeitas
Obrigam a estudar, sabendo estreitas
As tais passagens cheias de mistério.
As luzes que acendemos são suspeitas,
Porque não nas tornamos refrigério
Às dores do leitor que leva a sério
Saber as nossas rimas não eleitas.
Espremo cada verso que cultivo
De forma arrevesada e muito franca,
Para poder mostrar que inda estou vivo.
Ao menos tal certeza destravanca
O medo que se torna negativo,
Ao refrear a fé, se a trova é manca...
9. Consciência tirana
Ao enxergarmos claros os problemas,
Sabendo o que fazer p’ra resolvê-los,
Havemos de crescer em nossos zelos,
Que as tais medidas são assaz extremas.
Nossa algibeira tem todos os selos
E as dores que se amainam são supremas,
Porém, como saber quais são os temas,
Se aos poros tremelicam os seus pêlos?!...
Restauro na harmonia a trova ardente,
Contendo o meu ginete que debate,
Chispas tirando ao solo impunemente.
E faço este terceto de arremate,
Pedindo ao Pai que cure tal demente,
Que o verso fique bom, sem disparate...
10. Com medo do resultado
Escrevo todo dia e me comovo
Diante da poesia que componho.
Parece o texto antigo simples sonho
E o que me vem brotando é sempre novo.
Por isso é que depois eu me envergonho,
Ao ver-me exposto nu perante o povo.
Que os versos são tão pífios que o renovo
Não vejo como vinga, assim bisonho.
No entanto, sigo lépido e concluo,
Já que conduzo a trova sendo honesto.;
E vil seria aqui qualquer recuo.
Mas tendo de dourar o bem e o resto,
Reclamo deste mestre, pois cultuo
A forma e o conteúdo que lhe empresto.
11. Loucura a dois
Se ponho sentimento nestes versos,
Respeito a minha dor de vate oculto,
No entanto, ao transmitir, pareço inculto,
Pois só transcrevo os termos mais perversos.
Ao meu leitor, sugiro-me insepulto,
Nas vascas da agonia, pois dispersos
Os temas se apresentam, universos,
Nas mãos dos hábeis, com poder de vulto.
Agora que restrinjo o meu assunto,
Pedindo que me cuidem bem da rima,
Mui rubra fica a face do defunto,
Mais viva do que nunca, como acima,
Ao revelar que sofro, quando junto
O meu sorriso alegre à sua estima...
12. Em ponto morto
Vagueio pelo versos sem destino,
A nortear os temas pela dor.
É um bom sistema, se quiser compor
Algo de bom, de sólido, argentino.
Mas como a rima exige mais do autor,
Que a métrica me obriga à disciplina,
Eu penso em vir trazer da sã doutrina
As teses evangélicas do amor.
Jesus compreendeu que o povo estima
As narrativas lúdicas, morais,
Tecendo tais histórias nesse clima.
Por pobretão, o vate degringola,
Julgando superior ou algo mais
O texto do exercício cá da escola...
13. Por fora, bela viola...
Ensebo as lindas cordas deste arpejo
E busco decifrar-lhe a melodia.
É claro que concluo esta poesia
Mas entusiasmo no leitor não vejo.
O som que aqui disponho não daria
Idéia dos trabalhos que cotejo,
Porque, se prendo o tema, é só motejo,
Que o bem não mais produz sua alegria.
Disfarço o quanto posso esta fraqueza,
Desenvolvendo os versos com rigor,
Até ao vir ditá-los junto à mesa,
Para servir melhor ao professor,
No entanto, chego ao fim da minha empresa,
Rogando o seu perdão e o do Senhor...
14. ... por dentro, pão bolorento
Por mais que deprecie esta poesia,
Alegra-me torná-la aqui presente.
É como me defino eternamente,
Esperançoso e pronto a cada dia.
Não temo que as pessoas que eu enfrente
Me acusem de falsário, pois se adia
A luta da verdade, em nostalgia
Do tempo de criança, inda latente.
Se faço muito esforço e encontro a rima,
A trova que concluo mais me anima,
Ainda que o teor seja sofrível.
Se tudo vem p’ra revelar que existo,
Eu peço amor e paz a Jesus Cristo,
Buscando melhorar do verso o nível.
15. Subindo mais um degrau
Nostálgica esperança de minh’alma,
O texto que construo se transforma,
Seguindo do roteiro a melhor norma,
A demonstrar que o bem aqui se espalma.
Não busco refletir a luz pro forma,
Se me cobrem as trevas nesta calma
Que cerca o verso alígero que ensalma
O cântico da dor e da reforma.
Empunho este cajado e abro caminho
Por entre a multidão empedernida,
Que foge da poesia pois duvida
Que o vate tenha dó e dê carinho:
O mal é conduzir para o meu ninho
A farsa desta dor esclarecida...
16. Sem lamento e sem lamúria
Se trago sentimentos de piedade,
Pretendo demonstrar que estou feliz,
Porque, quando rebelde, jamais quis
Acreditar no bem que ora me invade.
Talvez não tenha o vate a diretriz
De vir tocar no âmago da idade
Que vive o povo aí, mas, sem vaidade,
Registro a minha forma como o fiz.
Depois irei pensar mais um pouquinho,
Para trazer um texto bem formoso,
Com muito amor e luz e com carinho,
A sugerir que nutro a minha verve,
Haurindo do perdão seu nobre gozo,
Julgando que o meu verso ainda serve...
17. Reunião
Os versos que componho têm a ajuda
De alguns dos meus amigos cá do etéreo,
Porque refletem bem o jeito sério
Da turma que comigo muito estuda.
Espero que o leitor jamais se iluda,
Pensando no melhor, no refrigério
Da dor que nos comove com critério,
Já que o castigo é rude e o mal transmuda.
Portanto, juntos vamos na jornada
Que nos promete a luz que reconforta,
Que o sofrimento agora é quase nada.
Jesus nos orienta para a porta
Que dá p’ro paraíso, embora invada
O medo os corações que o mal entorta.
18. Contato radioso
Parece menosprezo a esta arte
Os textos anteriores que compus,
No entanto, ao carregar do verso a cruz,
Exponho-me aos rigores do descarte.
Mas devo afiançar que se traduz,
Em forma de poesia, boa parte
Dos sentimentos a que dou encarte,
Na fórmula corrente, à meia-luz.
Depois que firo as teclas melodiosas
E expresso os pensamentos na poesia,
Eu vejo que os colegas, muito prosas,
Se põem de orelha em pé, pois não daria
Um passo só a mais, já que antegozas,
Ó coração teimoso, esta alegria.
19. Falta de inspiração
Agrego aos versos meus mais esta trova
Em que pretendo unir-me ao meu destino.
Bem sei não ser tal tema peregrino,
Porém, como me sinto se comprova.
À falta de talento, disciplino
O meu poder verbal, que é coisa nova
Neste universo pobre, que desova
O mote mais pernóstico e ladino.
“É crime”, penso, enfim, “que esta verdade
Se mostre por inteiro na poesia.;
Ou posso solfejar sem alegria?”
O mar de indecisão que já me invade,
A refletir angústias de saudade,
Afoga-me de dor e o bem se adia...
20. Confissão
Não quero aqui deixar simples registo
Da dor que me incomoda desde a cova:
Pretendo demonstrar que a morte inova
As penas da consciência.; e mais que isto.
Estou, porém, restrito a dar a prova,
Em verso pouco extenso, que conquisto
De forma ainda troncha, como o Cristo
Nem tudo disse à cruz, após a sova.
Por isso, eu me abandono a este lamento,
Solicitando preces ao leitor,
Que é como o sofrimento ainda agüento.
Não veja, em minhas rimas, eu dispor
A perfeição da estrofe, com talento:
É como esqueço o tempo e sinto amor...
21. Felicidade, afinal...
Não pense o bom leitor que foi assim
Que consegui alçar-me à estratosfera,
No etéreo superior, após espera,
Fazendo versos brutos mas sem fim.
O sofrimento é outro nesta esfera,
Aquele que provém e fica em mim,
Sem ter como escapar, porquanto vim
Em busca do sossego que me onera.
O tronco que contorce desde o chão
Demonstra quanta falta faz-lhe o sol:
É como aqui sentimos a paixão.
Levados pelos ares, sempre em trevas,
Rodopiamos, lesma e caracol,
Sabendo existir luz para os malevas...
22. Espantado
Atrevo-me a reler versos antigos,
Em busca da verdade de outra era.
Não posso controlar-me nesta espera
De achar a melhor norma aos meus amigos.
Aí, eu vejo bem como é que opera
A alma empedernida ante os perigos
De expor-me aos rigores dos castigos
Da auto-punição, em minha esfera...
Ao me sair tão bem em cada rima,
Em vez de me alegrar, me desanima
A transparência destes versos loucos.
Convoco o mestre a me explicar a norma,
Sabendo que o dever não se transforma,
Apenas por narrar com dons tão poucos...
23. Superando o perigo
Atuo em várias áreas de serviço
E ajudo os companheiros na tarefa
De organizar o curso, pois não blefa
O professor que julga o compromisso.
Assim, vou relevando a sinalefa
Que encontro muitas vezes cá sem viço
E deixo o verso troncho, já que atiço
Do meu leitor sagaz força-tarefa.
Se bastam poucos versos p’ra dizer
Como me sinto aqui e quanto faço,
Encontro na esperança o meu poder.
Não sei se tenho fé, mas meu cansaço
Indica que não tremo, se o dever
Concluo desta forma, neste espaço...
24. Quente mas não sufocante
Preciso compreender melhor a vida,
Pois sinto calafrios cá no etéreo.
As coisas andam quentes, caso sério
Quando a lembrança aperta comovida.
Por isso é que requeiro o refrigério
De uns versos bem batutas. Quem duvida
Que alcanço ser feliz na dura lida,
Embora o sofrimento em despautério?!...
Se trago uma esperança ao meu leitor,
Então a brisa fresca me transforma
E esqueço plenamente a triste dor.
Bem sei tal reação não ser a norma,
Porém, se sou capaz de algum amor,
Registro os versos meus, sem ser pro forma.
25. No topo do mundo
Existo nesta esfera muito além
De tudo o que na terra faz sentido.
Neste ambiente agito e sempre lido
Com minhas próprias sombras em vaivém.
Serenamente escrevo e não duvido
Que o meu leitor se sinta assim também,
Que os versos só provocam para o bem,
Estimulando a paz e o amor rendido.
No entanto, a dor aqui jamais fascina,
Que a conseqüência é brava e mui pungente,
Conforme há de prever quem se imagina
No topo desse mundo, sem que invente
A represália atroz que disciplina
A rima deste autor, candidamente...
26. Minha casa, nosso lar
No etéreo, a propriedade é dividida
E todos se aproximam pelo amor.
Por isso é que o exercício de compor
Ressalta sentimentos de outra vida.
No entanto, quanto freme o superior,
Os versos não lhe dão sempre guarida,
Que a gente se reúne e já duvida
Compreender o mal desse valor.
Estamos tão felizes sempre juntos
Que esquecemos a luz que vem de cima,
Formando neste time só conjuntos
De seres inferiores, que reanima
A trova que inteiramos nos transuntos
Das dores mais comuns, conforme a rima...
27. Cansado mas ativo
Entendo que o leitor já se aborreça
De achar os mesmos versos repetidos.
Ocorre que são ecos bem vividos
Do cérebro que tenho na cabeça.
Assim, eu lhes proponho, meus queridos
Amigos cá do etéreo, que se esqueça
A fórmula normal e se forneça
Um pouco mais de brilho aos escolhidos.
Vagueio pelas rimas sem destino,
A demonstrar meu mundo interior,
Que é coisa sem grandeza e até sem tino,
Contando com você, caro leitor,
P’ra perdoar o vate e não declino
Da honra de uma prece a meu favor...
28. Noite adentro
Bizarro, este meu verso sacrifica
O que melhor eu tenho dentro em mim.
Não sou, tenho certeza, um querubim,
Mas posso demonstrar que a rima é rica.
Talvez sejam firulas, mas, enfim,
O verbo aqui disposto santifica
O texto que mantenho e que autentica
O gajo que hoje escreve, mesmo assim...
Insisto em que meu tema é compromisso
Que juro aqui manter pelos colegas,
Aos quais não dou prazer mas dou serviço.
São tantas artimanhas que tais pregas
Me deixam ocupado, pois atiço
A prática do bem, mas não às cegas...
29. De braços cruzados
Entendo muito bem que fazer nada
É menos que marcar passo na vida.
A turma passa ao largo e nos convida,
Porém, eles vão longe na parada.
Assim eu me senti e não me agrada
Falar sobre o fracasso sem a lida,
Que o sofrimento é vão quando invalida
A atividade próspera irmanada.
Bem sei que o meu poema já desmente
A idéia que aqui deixo, pois rebrilha
A mente poderosa, finalmente.
Ocorre que as palavras vão na trilha
Dos pensamentos sãos.; e não somente:
Também vão prevenir tal armadilha...
30. Vetusto e arcaico
Meus versos me incriminam pois não faço
As rimas de hoje em dia aí na terra.
A estrofe é muito clássica e não erra
Quem veja no soneto pouco espaço.
Também, sempre me esforço contra a guerra
Que travo dentro d’alma, pois rechaço
A idéia mui vulgar do estardalhaço,
Que reina nos escritos.; mas me emperra...
Por isso é que suspeito com razão
De estar a incomodar o pobre irmão
Que traz este poema face a face.
No entanto, quanto rimo me estimula
A achar que meu leitor não se encabula,
Iluminando o texto deste impasse...
31. Com o coração palpitando
Ouvimos muitos versos deste grupo,
Julgando quais merecem figurar
Nos álbuns que ditamos, neste lar,
Embora alguns recebam grande apupo.
É claro que sofremos ao passar
Os sentimentos maus de que me ocupo.
(Alheia inspiração jamais eu chupo,
Pois a verdade assim dá-se exemplar.)
Mas gasto o meu latim sem grande esforço,
Que os versos seguem sempre em grande corso,
A preencher as telas todo dia.
Cotejo os meus poemas co’a lembrança
Que trago aí da Terra e não se cansa
O povo a me escutar — santa poesia!
32. Águas passadas
No etéreo, o que passou fica presente
No coração pesado e na consciência,
Se o mal que praticamos sem prudência
Feriu alguém, por força de acidente.
Se fomos nós o alvo da inclemência,
Sem o perdão de amor convalescente,
Aí fica mais clara e resistente
A dor que inda se sente em conseqüência.
P’ra depurar noss’alma existe o bem
De todas as lembranças positivas,
Se o saldo do passado nos mantém
No lucro dessas coisas sensitivas.
O gajo que não sofre fica aquém
Daquele que refresca os seus convivas...
33. Sempre incompleto
Não tenho pretensões à melhor rima
Nem posso oferecer trova perfeita:
Meus versos, eu sei bem que o povo aceita,
Mas não por eles é que alguém me estima.
No entanto, se não der minha receita
De como superar a dor que ultima
O desespero d’alma e desanima,
Não fico aqui feliz e o mal se enfeita.
Reponho as velhas teses da doutrina,
Na forma pessoal como soneto,
Mas digo de antemão que a disciplina
Exige um sentimento mais correto,
Que traga uma alegria casta e fina,
Aquela que revela amor discreto.
34. Parada forçada
Quiséramos seguir sempre p’ra frente,
Mas como progredir sem ter consciência
Dos fatos mais perversos, sem audiência
Da voz que nos acusa e amor não sente?!...
Revolta-me tal força em conseqüência
Da liberdade tola que, imanente,
Julgamos de direito estar presente
Na vida após a morte — impertinência...
Então, nós refletimos todos juntos,
Sabendo que não somos só defuntos
A lamentar perdidas nossas chances.
O despertar da fé e da esperança
É como a caridade que se alcança
Da parte do Senhor, nestes relances...
35. Malhando o Judas
Exponho ao bom leitor o meu problema
E peço que me ajude a superá-lo.
É muito ainda querer um tal regalo,
Que a prece que me faça é força extrema.
Não quero lhe causar qualquer abalo,
Que a dúvida, bem sei, sempre me algema
Aos versos que lhe trago, estratagema
Que usam os mais fracos — e me calo.
Mas tenho algumas rimas que compor,
Depois de referir a triste dor
Da condição no etéreo destas almas.
Insisto no perdão aos inimigos,
Porque vou me livrar destes perigos.
E tu, meu coração, vê se te acalmas!...
36. Quem avisa...
Espero que meus versos tragam luz
Aos pensamentos tíbios do leitor.
Quem lê Kardec e entende a própria dor,
Recorre à prece linda de Jesus.
Assim, esta poesia é inferior,
Conforme a tal premissa que traduz
O bem da caridade, que compus
Na mais pura intenção de dar amor...
Se a estrada fica aberta à nossa frente
Mas medo nós sentimos de enfrentá-la,
Oremos por ajuda, que se agüente
O coração que busca, nesta escala,
A posição que ocupa, pois, clemente,
O Pai nos abençoa e o medo cala...
37. No auge da compreensão
Sustento a minha rima e me impressiono:
Alcanço vir compô-las junto ao médium.
Se falham, cabe a ele dar remédio,
Porém, com meu afeto e meu abono.
Por isso é que me importo, se este assédio
Resulta mui difícil, que ambiciono
Deixar um bom registro com carbono
Do texto preparado já sem tédio.
Começo desde sempre entusiasmado
E chego a enfatizar que mais me agrado,
Se o fim trouxer mais luz ao meu leitor.
Contudo, é permanente esta suspeita
Que a trova que este vate sempre empreita
Se oprime pela falta de valor...
38. Falando muito sério
Entrego o coração ao meu leitor,
Achando que hoje estou falando sério.
Talvez seja mui simples, sem mistério,
A trova em confissão da minha dor.
Porém, quando termino, um refrigério
Se esparge pela turma do compor,
Porquanto um pouco sobra deste amor
Que traz a vibração do bem etéreo.
Soluços, só depois que encontro a rima
Que sei que vai ser boa, pois me anima
O empenho dos colegas p’ra que acerte.
Assim, a minha prece se ergue e voa,
Feliz por seu alcance, pois ressoa
Com sentimento puro, em tom solerte...
39. Quando havia tarde
Às vezes, a saudade que me assalta
Me leva a repensar a minha vida.
Havia tanta coisa e a triste lida
Tolhia-me fugir de rude malta.
Aqui, onde a bondade convalida
Os atos caridosos, hoje em alta,
O mestre que me ensina já ressalta
Que o gajo que sofreu jamais duvida.
Às vezes, quando a noite se aproxima,
Encontro mais feliz a nobre rima,
P’ra perfazer a trova em perfeição.
Assim, eu vou levando este soneto,
Sabendo que a tendência para o preto
Se esvai, quando consigo o meu perdão...
40. A trova interrompida
Não gosto de ditar fora de hora,
Conforme esteja o tempo a terminar.
É claro que escrevi, neste lugar,
A trova que interrompo e que demora.
Sabendo que terei como saldar
Os débitos da vida, em bota-fora,
Aguardo esse momento, já na aurora
Do dia que desponta salutar...
Preciso, este poema traz a marca
Daquele que solfeja e desembarca
Com rimas, sinalefas e elisões.
Termino abençoando os mestres meus,
Pedindo, em doce prece, p’ra que Deus
Perdoe as faltas todas e os senões...
41. Responsabilidade espiritual
Quem morre e chega aqui arrependido
Das coisas que aí fez sem solução
Recebe dos amigos compreensão,
Sabendo que nem tudo foi perdido.
No entanto, se à verdade ele diz não,
Aumenta a sua dívida e, pendido,
Arrosta o desafeto, que ofendido,
Requer que o gajo sofra punição.
Por isso, é que hoje rezo e me estremeço,
Lembrando o que passei lá no começo
De minha estada aqui após a morte.
Agora estou feliz e em prece peço
Que cada irmão que chegue do decesso
Encontre o amor de Deus e seja forte.
42. Rastilho de pólvora
Se o gajo que me lê não me acredita,
Julgando ser mentira o que aqui digo,
Talvez deva pensar seja castigo
A dor desta poesia tão aflita.
Ocorre que não sofro mais comigo,
Na hora de compor, pois é bendita
A fórmula do bem que aqui se agita
E o texto fica enxuto e ao mais não ligo.
Mas pode o meu leitor achar estranho
Que peçam ao do etéreo uma poesia,
Se sabem ser o vate mui tacanho.
Então, por todos peço — nostalgia
Do tempo em que vivi —, e não me acanho
De aqui deixar a chave da alegria...
43. Gozando a vida
Estive cai-não-cai dentro das trevas,
Mas o que fiz de bom me segurou.
Não é que tenha dado um grande show,
Também não figurei entre os malevas.
Os bons que vão mui longe de onde estou
E que formam alegres, doces levas
Costumam aplaudir quando me enlevas,
Ó coração fremente com que vou...
As coisas que me agradam, neste caso,
Provêm dos atos bons da minha vida
E não do que ocorreu por mero acaso.
Se tenho a consciência estremecida,
O gozo se empobrece e não dou azo
Aos versos mais formosos desta lida...
44. Perto do fim
Preciso preparar-me p’ro final
Das descrições que faço de minh’alma.
Agora estou tranqüilo e o que me acalma
É ver que cumpro a meta original.
Enquanto os temas vão, o amor se espalma
E vibra o coração longe do mal.
Os mestres dão as mãos e o seu fanal
Explode em luz divina, pura e alma...
É claro que a poesia ganha tons
Por causa da emoção que me domina.
Espero que estes versos sejam bons,
Pois frutos são de nossa disciplina.
Bem sei que caberiam outros sons,
Mas busco não fugir da sã doutrina...
45. Amizade e conforto
Nós temos de levar aos bons leitores
A idéia de que estamos muito bem,
Senão, como compor, estando alguém
Imerso nas penumbras inferiores?!...
Mas temos de dizer aqui também
Que são nossos irmãos merecedores,
Para evitar que sofram os horrores
De repetir os versos cá no além...
Não temos simpatia, simplesmente,
Por todos que nos lêem compreensivos:
Buscamos ter amor sempre crescente,
P’ra emoldurar a rima, pois os vivos
Suspeitam de que a turma já não sente
A imperfeição alheia e seus motivos...
46. Enaltecendo a existência
Que dores atribulam os mortais
Que não sejam curadas cá no etéreo?!...
Algumas duram mais, se o caso é sério,
Mas passam, pois não são um mal jamais.
Resultam as tais dores do mistério
Das dívidas que temos casuais.
Os bens que usufruímos perenais
Crescem em vibrações de refrigério.
Por isso é que existir é gozo eterno,
Nas terras do Senhor, nossa consciência,
Que a perfeição virá depois do inverno.
Assim, Jesus, com eternal clemência,
Transforma em luz o espírito fraterno.;
E só amor sentimos na existência!...
47. Simplicidade acima de tudo
Não quero registrar mais um poema
De vibração forçada e sem verdade.
Se ponho o coração, minh’alma invade
O medo de mentir sobre o meu tema.
Pretendo desfazer a caridade
Mui desleal e falsa que se extrema
Nos textos mais gentis, forma suprema
Da fé e da esperança p’ra que agrade.
O belo vai mostrar que estou contente,
Porquanto o meu leitor sabe ou pressente
Que entrego o coração de forma pura.
E a prece, que aqui deixo registrada,
Vai revelar que não existe nada
Que esconda do Senhor a criatura.
48. Prece agradecida
Senhor, aceite que agradeça o vate
Pelas poesias que compus aqui:
Talvez expressem o que mais senti.;
Talvez demonstrem só vil disparate...
No entanto, creio que desenvolvi
As teses importantes do debate
Que empreende a nossa turma, no resgate
Das dívidas terrenas que esqueci...
Por isso, eu quero agradecer a forma
Que nos impôs o mestre como norma
A ser seguida desde que cheguei.
Nem tudo rebrilhou fulgente em luz,
Mas sei que perdoou Cristo Jesus,
Pelo preceito justo dessa lei.
49. Espero você
Não devo dar um susto nesse amigo
Que lê o meu poema tão a sério,
Porém, quando chegar ao cemitério,
Verá que pode achar-se aqui comigo.
— Que bom! — há de exclamar ante o mistério.
— Aí, irei estar em rico abrigo,
Pois o poeta, longe do perigo,
Irá trazer-me paz e refrigério!
É essa a reação que lhe desejo,
Ó meu caro leitor, porquanto almejo
Trazer-lhe a paz agora envolta em luz.
E peço aos protetores que o pupilo
Alcance muito mais, bem mais que aquilo:
Que acorde no regaço de Jesus!...
50. Adeus
O que deixei lavrado na poesia
Espero haver coberto o meu passado.
Talvez sinta remorso: sou culpado
De dar pouca esperança à nostalgia.
No entanto, o meu futuro envolve um fado
Que espero ser de amor e de alegria,
Já que outra coisa aqui jamais diria,
Pois cumpro a sã doutrina e mui me agrado.
O amigo que me lê deve pensar
Que a luta pelo bem terá lugar,
Assim que a luz de Deus o revestir.
Não digo aí na Terra, pois bem sei
Que quem lê tal poesia segue a lei:
Eu penso nos deveres do porvir...
Indaiatuba, de 17.09 a 27.11.03.
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