WLADIMIR OLIVIER
SONETISTAS ANÔNIMOS
ESPÍRITOS DIVERSOS
ÍNDICE
1. Destemido e ousado ..................................
2. Pureza latente ......................................
3. Meu canteiro de rosas ...............................
4. Sem nenhuma caloria .................................
5. Artes do demônio ....................................
6. Emagrecendo o texto .................................
7. Carnificina .........................................
8. Recado de amor ......................................
9. A linha do horizonte ................................
10. Aflição inoportuna ..................................
11. Despertar para as dúvidas ...........................
12. Malferido coração ...................................
13. Nós, os pecadores... ................................
14. A arrecadação .......................................
15. Pedindo socorro .....................................
16. Azedo e embolorado ..................................
17. Falência por insolvência ............................
18. Conhece-te a ti mesmo ...............................
19. Sem perdão ..........................................
20. Noctívago ...........................................
21. Na corda bamba ......................................
22. Notícias do etéreo ..................................
23. Com o dedo no gatilho ...............................
24. Planeta imóvel ......................................
25. O caminho das pedras ................................
26. Jesus triunfa! ......................................
27. Ácido retrato .......................................
28. Divagando aqui no etéreo ............................
29. Aquisições no setor plástico ........................
30. Pesquisando o ego ...................................
31. Costurando a aproximação ............................
32. Operação poesia .....................................
33. Saída em grande estilo ..............................
34. Decepcionado ........................................
35. Candidato certo .....................................
36. Destemido e franco ..................................
37. O casaco de couro ...................................
38. Reavivando o presente ...............................
39. Querendo progredir ..................................
40. A natureza espiritual ...............................
41. Atinjo o infinito ...................................
42. Sinos de festa ......................................
43. O vinco das calças ..................................
44. Um caso mui sério ...................................
45. Corolários da dor ...................................
46. Na retaguarda .......................................
47. Conviver fraternalmente .............................
48. Ouropéis ............................................
49. Sem tensão ..........................................
50. A salvação ..........................................
51. Boa disposição ......................................
52. Lágrimas ............................................
53. Saída pela tangente .................................
54. Sem luz mas saudável ................................
55. Atirei no que vi... .................................
56. O contador de histórias .............................
57. Sem sofrimento não se vive ..........................
58. O bem ...............................................
59. Danadinho... ........................................
60. Regime espiritual ...................................
61. Preciso... ..........................................
62. Lindo, lindo, lindo... ..............................
63. A morte da pombinha .................................
64. De última hora ......................................
65. Com conhecimento de causa ...........................
66. Obtendo alvará de poeta .............................
67. Vôo rasante .........................................
68. A ave-do-paraíso ....................................
69. Frases ..............................................
70. À espera de um milagre ..............................
71. À sombra dos bons ...................................
72. Formalismo poético ..................................
73. Não espere demais ...................................
74. A poder de memória ..................................
75. Deteriorado pelo uso ................................
76. Cascavel ............................................
77. Profícuo e circunspecto .............................
78. Angelical ...........................................
79. Superficial e complexo ..............................
80. Jubiloso, exultante... ..............................
81. Acendrado amor ......................................
82. O maior prêmio ......................................
83. A armadilha .........................................
84. Babalorixá ..........................................
85. Uma súplica simplória ...............................
86. Fidelíssimo .........................................
87. Hagiolatria condenável ..............................
88. Persuasivo até certo ponto ..........................
89. Refinamento vocabular ...............................
90. Não me sinto esquecido ..............................
91. Sons que se repetem .................................
92. Trabalho de fôlego ..................................
93. Firmeza e estabilidade ..............................
94. Adepto da verdade ...................................
95. Razões para crescer .................................
96. O pó do caminho .....................................
97. Significado e poesia ................................
98. Flagrante desrespeito ...............................
99. Força moral .........................................
100. Oferta pessoal .....................................
101. Em forma de parábola ...............................
102. Sentimento do belo .................................
103. Faculdades e retórica ..............................
104. Lucros incessantes .................................
105. O alfarrábio .......................................
106. Espantando o Belzebu ...............................
107. Nem simples nem direto .............................
108. Falando mal da vida alheia .........................
109. A candeia ..........................................
110. Meu senso crítico ..................................
111. Consagrado ao amor .................................
112. Receitas e despesas ................................
113. Negócio fechado ....................................
114. Água de beber ......................................
115. O sol da verdade ...................................
116. Otimismo sob controle ..............................
117. A natureza .........................................
118. Arrebatado pelas idéias ............................
119. Vertentes da fé ....................................
120. Concórdia ..........................................
1. Destemido e ousado
Não quero asseverar que sou poeta,
Mas devo afiançar que estou tentando.
Alguém há de dizer: — Mas até quando
Iremos ter de ouvir este pateta?...
É claro que meu público comando
Por meio desta rima que acarreta
Alguma reflexão que sempre veta
As falsas diretrizes do meu bando.
Mas vou fazendo força e dando duro
Para tornar o verso algo mais puro,
Polindo e castigando o pobre estilo.
Talvez consiga, um dia, algo formoso
Que dê ao bom leitor e a mim um gozo
Estético e moral, sem qualquer grilo.
19.11.01.
2. Pureza latente
Meu ânimo se eleva quando cunho
Um verso mais formoso, mais bacana,
Mas logo o pensamento se embanana,
Se o termo que ditei vem no rascunho.
É claro que este exemplo só engalana
A trova que demonstra o testemunho
De quem quer escrever de próprio punho,
Mas pede que corrijam se se engana.
Divirto-me assim mesmo e já componho
A estrofe que me alerta para o sonho
De vate mui frustrado e quase azedo.
E logo presencio o meu tormento
Ao ver que a brincadeira que apresento
A nada vai levar, pois tenho medo.
3. Meu canteiro de rosas
Aspiro livremente o bom perfume
Dos feitos que relato na poesia.
Se fossem mui perversos, não traria
À vista do leitor que a luz presume.
Espero que meu riso de alegria
Não seja transformado no negrume
Irreverente e tolo do azedume
De quem deseja amar sem parceria.
Enfronho-me em minh’alma e logo nego
Que esteja cultivando as belas rosas,
Porque para os deveres estou cego.
Inverto a diretriz destes meus temas,
Achando as rudes flores horrorosas.
Oh! Quanto eu quero abrir estas algemas!...
4. Sem nenhuma caloria
Ao ler o meu poema, tenha em mente
Que só contém amor e vitamina.
É claro que esta tese conjumina
A vida cá no além e um bem latente.
Não quero esmiuçar toda a doutrina,
Bastando para mim estar presente
A vibração augusta que se sente,
Ao revelar o quanto aqui se ensina.
Por isso o desmazelo do meu verso,
Que traz um tom amargo, vil, perverso,
Ao lado de lições de alguma luz.
Ocorre que a tristeza se desfaz
Ao ver o gajo que já existe paz
Tão-só por mencionar Cristo Jesus.
5. Artes do demônio
Esfrego o meu nariz por toda a parte
Em busca dos matizes mais diversos.
Encontro as escansões dos tons imersos
Em todas as virtudes de tal arte.
É claro que pretendo que se enfarte
De luzes e de cores, nestes versos,
A rima felicíssima, pois tersos
São os ricos ardis, modéstia à parte.
Não posso repreender quem não aceite
A trova que redijo tão bisonho.;
Nem todos vão sentir aqui deleite.
Por isso, eu perco tempo, mas disponho
Os brincos da poesia como enfeite,
Enquanto a perfeição mora em meu sonho.
6. Emagrecendo o texto
Estou notando que esta rima é pobre
E meu poema sempre sai torcido.
Talvez devesse dar melhor ouvido
Ao mestre, que me diz que não me cobre.
Bem longe, num passado hoje esquecido
Dos homens que me pedem que redobre
Os vãos esforços, embora não soçobre,
Compus poesias simples, comovido.
Agora o sentimento dá lugar
A quanta idéia nobre se apresente,
Meditação constante e devagar.
Ocorre que é preciso que se sente
O meu caro leitor, no próprio lar,
Examinando a vida mais consciente.
7. Carnificina
Tão longe da poesia, este meu tema
Exige que me esforce além da rima.
Será que hoje terei a tua estima,
Se demonstrar vigor no mal que extrema?
Aqui onde aportei muito me anima
O fato de escandir sem ter problema.
O duro é me obrigar a ver que rema
Contra a corrente o gajo que vindima.
Ser responsável, sim, é o que requer
O mestre que me assiste com amor,
Dizendo-me que faça o que quiser,
Mas restringindo às normas do compor
O pensamento sério, onde estiver
A tal grandeza justa do labor.
8. Recado de amor
Descuido dos problemas que me afligem,
Para pensar nos temas dos meus versos.
Houvesse de varar os universos,
Talvez tivesse medo de fuligem.
Mas trago os meus poemas bem imersos
Nas dúvidas atrozes da vertigem,
Que os dramas da existência sempre exigem
Que se esclareça a dor, posto perversos.
Então, não me atribulo se não tenho
Facilidade e luz para o compor,
Pois sei que alguém irá franzir o cenho,
Por mais que seja a tese superior:
A compreensão se dá se o desempenho
Está na mesma altura do leitor.
9. A linha do horizonte
Navego pelas águas turbulentas,
Mas vejo que o perfil d’altas montanhas
Projeta neste mar sombras estranhas
Que lembram como as coisas andam lentas.
Pergunta o companheiro: — Como inventas
Os textos com tais rimas, se as patranhas
Não podem aqui constar, pois arrebanhas
Prosélitos sem metas, que atormentas?
É claro que não penso ser mentor
De quem não tem sossego nessa vida.
Eu quero simplesmente aqui compor,
Conforme estou sofrendo a minha lida,
Um verso só que seja superior,
Pois sei que a luz do amor jamais se olvida.
10. Aflição inoportuna
Não posso compreender por que foi rude
O efeito da partida para o além:
Se tinha lá consciência desse bem,
Não soube controlar minha atitude.
Cheguei aqui de volta em dor também,
Por ter deixado lá quem não se elude
Das armadilhas torpes que a virtude
Ajuda a evitar, por dom de alguém.
Porém, tempos depois, eu vi Jesus
A contemplar os bons pelo evangelho,
Que os cegos e os perversos não conduz,
Enquanto se mantenham em tormento.
Cheguei à conclusão, depois de velho,
Ao refletir na luz em que me oriento.
11. Despertar para as dúvidas
Acerto ao descrever minha vaidade,
Pois trago aqui comigo o sentimento
De haver pregado sempre grande aumento
Da luz do amor que jorra e que me invade.
Aviso ao bom leitor que estou sedento
Da glória destes versos, sem maldade,
Pois acho que a poesia persuade
A despertar os medos, sem tormento.
Não quero seja fácil a vitória,
Nem penso que será como esta rima,
Que vai perder-se à sombra enfim da história.
Também devo supor que a pantomima
Dos sentimentos dúbios da oratória
Conserve aqui p’ra sempre nobre estima.
12. Malferido coração
Não posso aqui dizer que estou sofrendo,
Que a festa cá no etéreo é permanente.;
Mas trago o coração impenitente,
Pois meu passado é triste, vil, horrendo.
Aos poucos, vou soltando a minha mente
De todas as algemas e aqui rendo
Um preito agradecido, que o remendo
Parece ser melhor, caso acrescente.
É nos tercetos que este povo adora
Elaborar a rima mais sagaz,
Ao perceber que logo irá embora...
Assim, para que eu faça jus à paz,
Eu peço a bênção a Jesus agora,
Enquanto o tosco verso se perfaz.
13. Nós, os pecadores...
Preciso relatar um caso triste,
Contudo, eu me envergonho e me recolho:
O dom deste soneto está de molho
E fico a imaginar se o bem existe.
O mestre, que me anima, está de olho
E, quando eu arrefeço, é quem insiste
Em que devo forçar, compondo um chiste,
Para dar-me uma folga desse escolho.
Mas, quando chega a vez de vir ditar,
Sabendo que serei o responsável
Por manter a virtude no lugar,
Medito em algo sério, bom, saudável,
Que dê ao meu leitor um bem-estar
Por não perder seu tempo, em sendo amável.
14. A arrecadação
Não tenho peias para a língua solta,
Mas, na poesia, obrigo-me a sustar
O verbo desairoso, junto ao lar
De quem possui a alma em paz envolta.
Por isso não componho devagar,
Fazendo do rascunho obra revolta,
Pois sei a minha rima já absolta,
Embora não expresse o meu penar.
Carrego nestas cores mas sem brilho,
Mostrando que a cabeça traça o trilho
Que o corpo também tem de percorrer.
Sagaz, o meu leitor mais comovido
Irá rogar por luz, mas eu duvido
Que o lucro seja meu por seu poder.
15. Pedindo socorro
Não posso afiançar que estou perdido,
Mas devo esclarecer que hoje me ausento
Do meu passado triste e do momento
Em que deixei p’ra trás o mal vivido.
Ocorre que feliz não me apresento:
Apenas tenho fé, porquanto lido
Com algo manifesto e, comovido,
Proponho ao meu irmão um novo alento.
Falece-me a esperança de obra-prima,
Pois tudo resumi de forma bronca.
No entanto, a caridade já me anima,
Pois sei que o meu amigo aqui destronca
O rude do poema e vê que a estima
Está por trás de tudo... e poupa a bronca!
16. Azedo e embolorado
Permito-me enfrentar este labor,
Sabendo ser difícil de criar
Um texto superior, algo exemplar,
Que siga as normas todas do compor.
— É simples, diz meu mestre, o bem-estar
Que sente o vate aqui, com muito amor,
Desfaz tal azedume e o vil bolor,
Que o tédio do marasmo faz brotar.
Aplique-se na forma, que seu tema
Irá surgir esplêndido na rima,
Sem que ao seu texto dê razão suprema.
O povo que nos lê e nos estima
Não quer a perfeição e não se extrema
Em crítica feroz, mas nos anima.
17. Falência por insolvência
Agrada-me escrever de forma livre,
Por isso é que me arrisco nesta rima.
Eu sei que é bem difícil, mas me anima
A idéia de mostrar meu savoir-vivre...
Alguém que me anuncia forte estima
Procura auxiliar p’ra que delivre
Os versos, mas se encontra em deus-me-livre
A solução final desta obra-prima.
Que tem de ver o texto que componho,
Se as teses da doutrina não assento
Em bases da moral, pois sou bisonho?!...
É claro que este terno sentimento,
Ainda que me ocorra como em sonho,
É tudo quanto tenho no momento.
18. Conhece-te a ti mesmo
Famoso, o tal conselho me atormenta,
Pois mudo o visual a cada hora.
Se hoje estou mais sóbrio é que vigora
A força do mentor, que o bem sustenta.
Mas tudo quanto penso aqui demora
Para formar a rima que apresenta
O sentimento d’alma que acalenta
A fé na caridade lá de fora.
Ocorre que tal susto me atropela,
Por não compor aqui o melhor verso
E fico na penúria da mazela,
Pensando se este dom não é perverso,
Pois monto esta estrutura jamais bela,
Querendo seja lida no universo.
19. Sem perdão
Empenho-me na lida desta rima,
Reproduzindo aqui versos tacanhos,
No entanto, meus defeitos são tamanhos
Que exijo do mentor matéria-prima.
O pobre desfalece, pois estranhos
São os meus dons e minha pantomima,
Mas, quando vê a prova, já se anima,
Que o resultado é bom, com fortes ganhos.
Ajuda-me esta turma que me assiste,
Trazendo algumas rimas mais formosas,
Pois sei que a graça é pouca mas resiste
Às cócegas que faço: — Por que gozas,
Ó coração malvado, sempre triste,
Com poucas e perversas, simples glosas?!...
20. Noctívago
Proponho-me a rimar com perfeição,
O verso aqui, porém, já não se ajeita:
O termo que aparece o povo aceita
Mas sabe que não cabe no refrão.
O som é duro e teso.; a forma eleita
Não segue os bons padrões desta escansão,
Nem surge nas palavras a razão
De vir p’ra sanear minha suspeita.
Agora que mantenho o verbo aceso,
No instante de ditar esta poesia,
Carrego em minhas costas grande peso,
Pensando em que um poeta comporia,
Com arte e com engenho , algo coeso,
Para nos dar mais luz, paz e harmonia.
21. Na corda bamba
Arrisco-me a compor um novo verso,
Sabendo ser preciso descrever
O sentimento puro do dever,
Para tornar o bem incontroverso.
Porém, logo duvido do poder
Que tenho em mim, um ser muito perverso,
Que quer as glórias todas do universo,
Sem dar aos semelhantes bem-querer.
Assim, já se estrutura a pobre trova
Eivada de defeitos, quase informe,
Com rimas recorrentes como prova
De que me pauto sempre pelo mal,
Sabendo que meu mestre nunca dorme
E que meu bom leitor tem cabedal...
22. Notícias do etéreo
Eu vejo todo dia que os mortais
Desejam novidades deste lado,
No entanto, quanto leio, desolado,
Evito transmitir-lhes algo mais.
Ocorre que o sistema utilizado
Não favorece muito estes jornais,
Porquanto estou ligado aos bens morais,
Nos temas que nos dão ou arrecado.
Assim, posso mostrar que estou melhor,
Que tenho as leis de Deus aqui de cor,
De forma equilibrada e bem sincera.
O gozo material pelas notícias
Há de ficar de lado, que as delícias
São diferentes cá na nossa esfera.
23. Com o dedo no gatilho
Repouso merecido é o que me espera
Depois de vir ditar terrível trova:
Em tudo que apresento se renova
A visão do leitor quanto a esta esfera.
Às vezes, vai pensar que, após a cova,
Instala-se o temor da besta fera,
Que o medo, quando é forte, logo gera
A correria estulta como prova.
Aqui, porém, os versos me dão paz,
Que as costas folgam quando o açoite sobe
E todo compromisso se refaz,
Se o bem que reproduz a rima esnobe
Eu incorpore ao sonho meu voraz
De passear à noite envolto em robe...
24. Planeta imóvel
Não vou menosprezar o sal da terra,
Pois me tempera a vida quando penso
Que estou neste lugar bem menos denso
Porque lá sofri muito... e o verso emperra...
Em lágrimas, descubro que meu senso
Está mais desenvolto e já não erra,
Ao vir conceituar o bem da guerra
Que luto contra o mal e que já venço.
É claro que a poesia é só um fruto
Que colho nesta tarde quando em folga,
Peregrinando alegre enquanto escuto
Os rumorejos d’alma, que se amolga
À luz deste ambiente, quase em luto,
Que a dor já não me atrai, já não me empolga.
25. O caminho das pedras
Não posso acreditar-me aqui de novo
Para enfrentar a luz de quem me lê.;
Então peço que atente p’ro porquê
Deste arrepio que arrasta e não me movo.
Bem sei que vou pedir para você
A prece mais sentida, que o corcovo
Da rima vai lançar-me junto ao povo,
A festejar a glória em miserê.
Ao Pai, que sempre escuta a triste cisma,
E que abençoa o vate com amor,
Eu volto o pensamento que se abisma
Em penas colossais, tremenda dor,
De quem só fez o mal e que sofisma,
Pensando que se salva ao vir compor...
26. Jesus triunfa!
Na busca por mais paz, por mais amor,
Senti-me muito preso à melhor rima.
Não quero aqui perder a tua estima,
Por isso é que burilo o meu compor.
Mas como desfazer a trova acima
Que revelou ao mundo a minha dor?
Pedindo por paciência a ti, leitor,
Que todo o mal que trago se sublima.
Então, vou caprichar nestes tercetos,
Sabendo que o meu verso só traduz
Os sentimentos torpes, vis e pretos,
Que acabam de expulsar a tua luz,
Que iluminar não podes estes guetos
Em que triunfa só Cristo Jesus!...
27. Ácido retrato
Aturo-me tão-só ao montar versos,
Pois desafio as rimas com vigor.
Eu sei que nada faço superior,
Mas sei também que poucos são perversos.
Quem sabe, se deixasse de compor,
Vagando pelos dons incontroversos,
Sentisse florescer nos universos
Os bens que recomponho com amor.
Mas tolo, pobre, tonto, vil, inútil,
O texto repercute dentro d’alma,
Enquanto quero a túnica inconsútil,
A que Jesus levava sobre os ombros,
Enlevo da virtude que me acalma,
Embora aqui retrate só assombros...
28. Divagando aqui no etéreo
Não sinto os meus poemas imperfeitos.
Talvez tenha noção tão-só das falhas,
Pois tu, meu coração, muito atrapalhas
Reconhecer dos versos os eleitos.
Recolho dos meus sons as vis farfalhas
Que trazem sentimentos não aceitos,
Que os tons e semitons dos preconceitos
Merecem ser levados em mortalhas.
No entanto, essas tais rimas que componho
Ressoam, nos ouvidos, agradáveis,
Levando-me nas asas do meu sonho,
Fugindo dessa forma aos predicáveis ,
O que resulta em texto tão bisonho
Que peço aos bons amigos: — Sede amáveis!...
29. Aquisições no setor plástico
Não nego que meu verso tem seus quês
Que dão ao pensamento formosura.
Não é que a forma seja toda pura.;
Ocorre que hoje vibro em português.
Assim, o meu ditado se estrutura
Segundo as normas cultas e já me lês,
Ó douto e bom Amigo, sem porquês,
Que as leis eu cumpro aqui d’alma segura.
Não sei se a informação causa respeito,
Se a tese se desfaz pelo caminho,
Se tudo o que componho tem efeito.
Contudo, sempre prezo e louvaminho
O meu final feliz, num texto eleito,
Que a chave d’ouro é p’ra evitar beicinho...
30. Pesquisando o ego
Parece-lhe que irei expor minh’alma?
Pois simplesmente dou uma só dica:
Quem muito se atrapalha aqui claudica
E perde o bom humor e não se acalma.
Quem tem por compromisso (e não critica)
Mostrar que o bem do amor logo se espalma
Nos corações dos bons também ensalma
A trova que peleja p’ra ser rica.
Aos poucos, vou mostrando como estou,
Pondo-me a revelar nas entrelinhas,
Querendo dar ao povo um lindo show.
Como, porém, as rimas não são minhas,
As ofereço ao povo que adotou
O dom da luz tratando nas palminhas...
31. Costurando a aproximação
Sagaz, o nosso médium se prepara
Sem ceticismo mas com muito medo
De ver que alguém lhe aponte um grave dedo,
Julgando descobrir a gema e a clara.
No entanto, quando chego muito cedo
E encontro o meu lugar, ninguém separa
A tese que me move.; e o verso vara,
A demonstrar que posso e que não cedo.
Se tu, perverso amigo que me escutas,
Não deres atenção a quanto digo,
Vais ver que irás perder algumas lutas,
Pois quem de bem está hoje contigo
Talvez te sopre que se dão corrutas
As rimas que disponho quando brigo...
32. Operação poesia
Nem sempre, quando escrevo estes poemas,
Os versos só traduzem sentimento.
Quisera elaborar com mais tormento,
P’ra revelar as falhas e os problemas.
O tópico moral, quando acrescento
Idéias pessoais e vis dilemas,
Empacam nesta rima e tu me algemas,
Ó coração de ferro, ao sofrimento.
Mas venço pouco a pouco cada pena,
Levando para frente o mau soneto,
Enquanto a turma toda se asserena,
Diante desta calma que prometo
Levar até o fim, pois é pequena
A luta no papel pelo terceto...
33. Saída em grande estilo
O verso derradeiro que componho
Irá mostrar, por certo, grande estilo.
Não há de ser agora, pois asilo
Males no coração e sou bisonho.
A fera que transita e que aniquilo
Um pouco aqui por vez, em meio ao sonho
De efetivar a trova que hoje ponho
Sob o teu olhar, ruge em meu cochilo.
Não faço por maldade nem careço
Vencer a dor nos versos da jornada,
Mas tudo tem um fim se tem começo.
Por isso o coração já não se aflige
Pois tudo quanto sofro não é nada
Que a luz do Salvador não cure e alije...
34. Decepcionado
Acreditei que havia terminado
O ciclo das mensagens e dos versos
Mas como foram vis, ruins perversos,
Estou voltando ao metro em meu recado.
Corri, imaginando os universos
Com muitas alegrias, sem cuidado,
Mas tenho de estudar e sem enfado,
Para me ver expondo os bens imersos.
Por isso é que me esforço nesta rima,
Sem alcançar, é claro, seja prima
A obra que ofereço ao povo humano.
Os que pelejam junto cá no etéreo
Bem sabem que o labor é muito sério
E dão-me os seus conselhos, se me engano...
35. Candidato certo
Eu não pretendo agir aqui sozinho,
Mas tenho a minha história p’ra contar.
Talvez seja mui curto este penar,
Talvez mantenha o mal de ser mesquinho.
No caso de compor algo exemplar,
Terei por sorte o bem de ter padrinho
Que leve quanto sou, quanto escrevinho
Aos termos do encarnado, neste lar?...
Assim que refrescar minha memória,
Terei também por certa a fé notória
Que deposito em mim quando estou só?
Não sei se agüentarei meu infortúnio,
Distante do sol forte ou plenilúnio,
Que a luz não me clareia em meio ao pó...
36. Destemido e franco
Não valho uma só letra escrita aqui
Mas trago mesmo assim o meu recado.
Estou a demonstrar que deste lado
Também vai ter valor quem crê em si.
Por isso é que me alegro e não me enfado,
Se vejo que a poesia pinga o i
E dá mais força ao gajo que sorri,
Sem lamentar a dor que aqui translado.
O termo mais certeiro e temeroso
Vai dar-me o bom sentido desse gozo
Que vem desta vitória sobre o pobre.
Quanta riqueza exulta a minha rima,
Se o texto se traduz na tua estima,
Ó meu caro leitor, augusto e nobre!
37. O casaco de couro
O frio que não sentia em minha pele
Passou-me pela espinha, certo dia.
Queria proteger-me e não sabia
Que um ser foi desprovido, fraco, imbele.
Notei que o compromisso, todavia,
De me manter mui cônscio já me impele
A refletir voraz que o crime dele
Toda intenção de amor e de poesia.
As vibrações de dor eram só minhas,
Pois vi como são pobres, são mesquinhas,
As reações do corpo que resguardo.
Se para mim o bem era fugaz,
Ao animal não trouxe qualquer paz
O mal que lhe causei, p’ra meu retardo...
38. Reavivando o presente
Não posso condenar o meu passado
Mas tenho que viver o meu presente.
Por certo o meu leitor hoje pressente
Que o mal de antigamente gera o fado.
Mas eu quero vencer, embora tente
Deixar os sofrimentos já de lado,
A desfilar os fatos sem agrado,
O que me força a pôr-me descontente.
Viver este momento aqui, portanto,
É como reviver a vida inteira,
Somando sem cessar sorriso e pranto.
Se tudo vem de novo, inda que queira
O gajo reavivar o fogo santo,
É bom utilizar voraz peneira...
39. Querendo progredir
Ativo e diligente, me ofereço
Para compor uns versos, nesta hora.
Cansei de ver que o povo todo chora
Ao ler que de tais males não padeço.
É certo que meu tipo se deplora,
Ninguém pedindo aqui meu endereço.
Eu mesmo já não sei por que me esqueço
De sustentar virtudes, muito embora...
Mas devo superar tantas mazelas,
Que o risco de mostrar algumas delas
Me enche de temor e de respeito.
Ao meu leitor amigo, eu peço a prece
Que nunca me negou, quando oferece
A Deus seu compromisso sempre aceito.
40. A natureza espiritual
Socorro-me dos textos dos amigos
Que bem melhor que eu já discorreram.
Transformo em vil poesia o que escreveram,
Querendo atualizar feitos antigos.
Eu sei que já perdi os que morreram
E não deixaram versos nem artigos,
Concentrando-se assim em seus umbigos,
Que o mal é não doar aos que nasceram.
Pois faço esta poesia e dou de mim
O máximo que posso por agora,
A caprichar na rima cá no fim.
Por certo o tema-título demora
Por ter este poeta por ruim
A idéia natural que joguei fora...
41. Atinjo o infinito
Atinjo o infinito mas não sei
Se existe aqui limite para a trova.
O homem que trabalha sente nova
Aspiração e amor, se entende a lei.
Estou a revirar-me em minha cova.
Se em trono aqui estiver, como estarei,
Também irei sentir o mal do rei.
E assim seria o mesmo em grossa sova.
Atino com as falhas, mas componho
O texto aos seus princípios duma vez,
Porque mais vale a rima do que o sonho...
Agora que compreendo o que se fez
Da minha hesitação de ser bisonho,
Respiro aliviado e já freguês...
42. Sinos de festa
Alegro-me bastante, se a poesia
Termina com a prece que imagino.
Assim, faço este esforço pequenino,
Perante o teu amor e companhia.
Quem lê e se desperta para o hino
Que escondem as palavras deste dia
Aprende a soletrar, com nostalgia,
As vozes da emoção que dissemino.
As vibrações sonoras trazem paz,
Se reconheço o tema e se refaz
Minha esperança em Deus e sua bênção.
Viver tão esquecido da virtude,
Querendo que este bem mais se amiúde,
Irá forçar os dons, para que vençam...
43. O vinco das calças
Importa-me saber qual importância
Terá para um mendigo aquele vinco.
Aqui também me alegro e sempre brinco
Com as idéias parvas da elegância.
Expus o pensamento a mais de cinco,
Nenhum quis discordar, mas a ganância
De estar o vate certo deu-me a ânsia
De tudo pôr na trova com afinco.
O resultado é este que está vendo
Aquele que se atreve a vir comigo,
A desejar, embora, algum remendo,
Porquanto a rima exige um bom castigo,
Idéia que hoje aprovo e referendo,
Mas quanto o que disponho é o que consigo...
44. Um caso mui sério
Não posso concordar que seja sério
O tema que me traz tão ocupado:
Não só estou mui fraco e com enfado,
Como também não sei pôr-lhe mistério.
A vida transcorreu-me mui de agrado
E a morte surpreendeu-me mui aéreo:
O dia estava claro e o refrigério
Da luz que me extasiava hoje traslado.
Então, como alegrar-me a penitência
De ver estes maus versos que componho
Azucrinarem tanto a minha ausência,
Nos anos que servi, como num sonho,
Aos males deste mundo, sem ciência,
Perverso mais ainda, vil, bisonho?...
45. Corolários da dor
Não sinto mui profundo o meu pesar
Por ter chegado aqui recentemente,
Pois trago dessa vida bem presente
Todo o conforto alegre do meu lar.
Eu sei que lá mais sofre algum parente
Que tem saudade agora e vai chorar,
Se acaso esta notícia lhe chegar,
Embora esteja o texto transparente.
Ocorre que não trago o compromisso
De dar o meu aviso como em drama
De desespero e dor, pois o meu viço
Se põe por sobre a esfera que se aclama
Como de perenal horror.; e atiço
Os cães da incompreensão a quem não ama.
46. Na retaguarda
Soluço permanente em minha rima,
Esqueço quando estou desanimado
E venho registrar algum enfado,
Sem medo de perder a tua estima.
Por isso é que redijo com agrado,
E dou como sabida a estrada acima,
Pois todos vão saber quanto se anima
O gajo que perfaz este quadrado.
Agora que o terceto se apresenta,
Exijo mais cuidado do meu médium,
Que sofre, ao perceber que não se agüenta
O vate que precisa de remédio,
Não só para esta estrofe que arrebenta,
Também para o remendo do meu tédio...
47. Conviver fraternalmente
Não posso atribuir-me a perfeição,
Mas dou de mim no verso com amor.
Talvez o que apresente ao vir compor
Pareça surpreendente aos que lerão.
Trabalho com sentido superior
Os homens noutros vates acharão,
Porém, lhes peço aqui muita atenção,
Para entender que verso com vigor.
Gongóricas temáticas misturas
Idéias muito simples e banais
Para enfeitar a tarde com tais juras,
Ó coração, que não suportas mais
Quedar distante dessas criaturas
Que amas sem sossego e a quem te vais...
48. Ouropéis
Sustento que esta rima seja rica,
Mas tiro a minha mão dessa fogueira.
Talvez compor melhor o mestre queira,
Porém, a trova estrago e o verso embica.
Então, vou recorrer à macieira,
Ao seu vermelho vivo que me enrica
O texto mais sutil que aqui se aplica,
Embora sem a eira e sem a beira...
De todos os enfeites que disponho
Um deles vai servir-me no improviso:
Ocorre que marejo neste sonho,
Sofrendo por deixar sem bom aviso
Aquele que me lê e que, risonho,
Entende que mantenho o meu juízo...
49. Sem tensão
Navego pelas águas transparentes,
Iluminado ainda pelo amor
Que todos me dedicam, ao compor
Os versos mais felizes e candentes.
Apenas eu me sinto inferior
No modo de rimar, pois descontentes
Ainda vão ficar muitos doentes,
Que sentem bem mais forte a rude dor.
Alívio aqui não trago a todo o povo,
Embora chegue à mesa hoje de novo,
Sem qualquer tensão na rima pobre.
Ocorre que perdôo o desperdício,
Sabendo que trovar não chega a vício
E que um soneto a mais é bom que sobre...
50. A salvação
Retrato a minha angústia e desfaleço,
Sabendo tão ruins os versos meus.
Queria aqui deixar bênçãos de Deus.;
Não sei postar a carta no endereço.
A falha desta trova entre os plebeus
Se encontra em mui sutil rima do avesso,
Pois se diverte o gajo, se me esqueço
E ponho no plural, ao dar-lhe adeus.
São esquisitas, sim, as minhas rimas,
Mas quero, coração, que te redimas,
Ao menos no final da pobre peça,
Orando pelo amor dos companheiros,
Que sabem que esta paz nos faz inteiros,
Na integridade além do bom à beça...
51. Boa disposição
Não penso que terei algum sucesso,
Se terminar aqui este poema.
Ocorre que não sei se o bem se emblema
Em rimas, devagar, conforme peço.
As coisas são demais e o mal me algema
Às coisas mais fugazes, pois opresso
Eu trago o coração, neste regresso
Às lides da cultura, como tema.
A reclamar virei de qualquer jeito,
Embora, com a trova, seja eleito
Alguém com seriedade e compostura.
Espero firmemente que o meu verso
Transforme os meus limites do universo
E traga para nós a luz mais pura.
52. Lágrimas
Convulso pranto encheu-me o coração
De medo, por cumprir esta tarefa.
Ao concluir, alguém dirá que blefa
O vate, por saber falsa a emoção.
No entanto, quando aplico a sinalefa,
Usando para o metro esta escansão,
Eu tremo e testemunho que a razão
Conduz este pensar-multitarefa.
Entendem por que estou impressionado?
Ocorre que não sei se há luz no verso
Ou se será aceito ou desprezado.
Porém, o meu intento vem imerso
Nas águas mais serenas que transnado,
Sem me afogar em pranto mau, perverso.
53. Saída pela tangente
Não passo este rascunho sem temor
De vê-lo mui perverso, em rima chula.
O bom amigo que me lê calcula
Que estou botando banca superior.
Não quero aqui gabar-me, mas a bula
Dos remédios que tomo com rigor
Informam como devo vir compor
A trova em que me exponho até à medula.
É certo que preciso melhorar,
Que devo descrever mais devagar
As falhas de caráter que me oprimem.
Mas, como ainda não tenho a perfeição,
Termino este meu verso com um não,
Querendo que, no fim, os termos rimem.
54. Sem luz mas saudável
Não venho lamuriar nesta escritura,
Mas devo demonstrar que estou bem forte.
As rimas que componho vêm da morte
E trazem pensamento mui seguro.
Ocorre que não sei qual é o norte
Que imprimo já sem luz, pois estruturo
Um texto sem sentido justo e puro,
Apenas com palavras deste porte.
Se pensam que sorrio enquanto escrevo,
Esbarram na mentira desse enlevo
De desbravar a mente deste autor.
Eu disse estar saudável logo acima,
Mas nem por isso vou montar a rima
Apenas no prazer de vir compor.
55. Atirei no que vi...
Assumo os meus defeitos mas prometo
Que irei modificar-me dentro em breve.
O gajo que me escuta e agora escreve
Espera que eu termine meu soneto.
O tema poderia ser mais leve,
Mas como vou dizer que tenho preto
O coração sofrido e o esqueleto
A desfazer-se em pó, como se deve?...
Por isso, deixo a norma da poesia
Levar-me mundo adentro em agonia
De quem se sabe tolo e sem vergonha.
Mas, como prometi boa melhora,
A lágrima secou e já não chora
Aquele que rimou e agora sonha...
56. O contador de histórias
Atrevo-me a dizer que estou feliz,
Pois tenho o dom de vir aqui dispor
Os metros mais formosos deste amor
Que sinto pela vida, como eu quis.
Porém, não satisfaço o professor,
Que quer que o meu soneto mais nutriz
De alegres esperanças, diretriz
Que todos vão seguir com muito ardor.
É claro que componho a pobre rima,
Querendo conquistar a tua estima,
Ó caro coração dentro do peito!
Exponho-me a contento, um vil mendigo,
Solicitando a prece que bendigo,
Pois meu leitor se agrada, se o empreito.
57. Sem sofrimento não se vive
Não quero que estas lágrimas que verto
Estraguem o poema que transmito:
Não vale deste lado qualquer grito
Que possa estremecer com tal aperto.
Olhando do futuro p’ro infinito,
Eu sei que encontrarei melhor acerto
Para enfeixar nos versos bom enxerto
De dons e de virtudes, sem conflito.
Agora, aqui, porém, os encarnados
Precisam sopesar os duros fados
De quem deve sofrer um dia a morte.
A própria não constrange tanto assim,
Mas toda criatura tem seu fim:
Feliz de quem tem luz que o mal conforte...
58. O bem
Alheio ao desempenho junto à mesa,
Dedico os meus sonetos ao leitor.
Bem sei que meu desejo de compor
Esbarra em seu anseio por beleza.
Mas tudo o que fizer terá valor,
Se me esforçar sem muita profundeza,
Porquanto estou penando nesta empresa
E devo demonstrar-me superior.
É claro que o poema aperfeiçoa
A alma que demonstra que a pessoa
Está enfeitiçada pelo bem.
A luz que tomo do melhor trabalho
Reponho sem esforço e já não talho
O pensamento augusto que contém.
59. Danadinho...
Espero que meu texto não surpreenda,
Que seja só mais um dentre os comuns.
Talvez a minha rima só alguns
Terão como explorar, que o bem acenda.
Não quero mais ouvir os zunzunzuns
Do povo que arrelia quem desvenda
A alma mais singela desta agenda,
Sentindo que fará duros jejuns.
O tom bem mais alegre deste dia
Não pode derrapar, pois não daria
P’ra refazer os versos nesta hora.
Então, fique este aviso de prudência
A quantos não se cansam da inferência
De que tudo que sou na rima aflora...
60. Regime espiritual
Elaborar um tema de poesia,
Em um soneto simples mas honesto,
Talvez não seja bom, porém, lhe empresto
Valor e tom de voz, como queria.
É certo e permanente que, de resto,
Irei chegar ao fim com galhardia,
Mantendo os sons rimados, todavia,
Não sei se agradará meu manifesto.
É simples o soneto e traz perfume
Inebriante até, sem azedume,
Que profligar os crimes não me atrai.
Bem leve hei de tornar o verso amigo,
Sabendo que não vão brigar comigo,
Se alçar meu pensamento para o Pai...
61. Preciso...
Não posso duvidar que seja Deus
Quem tenha prometido a perfeição:
No ato superior da criação,
Não quis o Pai perder nenhum dos seus.
Por isso, já não creio que o meu não
Virá a repetir-se, pois ateus
Não hão de ser meus versos, que o adeus
Aos sonhos hoje eu dou de coração.
Real e mui concreto, este poema
Vem resolver de vez o meu dilema,
Pois toda a minha cisma ele traduz.
Se tenho a compreensão do meu amigo,
Então eu vou levar sempre comigo
Os dons do amor do ensino de Jesus.
62. Lindo, lindo, lindo...
Maravilhosa idéia me ocorreu,
Assim que pus no verso a bela rima.
Queria impressionar com obra-prima,
Para compor o texto do apogeu.
Mas o bom mestre disse que sublima
O mal o verso que se quer coreu,
Pois devo aqui mostrar o que é meu,
Melhor até do que já fiz acima.
Depois de refletir nas duas quadras,
Que estão mui longe de cumprir a tese,
Busquei sonhar sobre sutis almadras,
Mas disse-me a consciência p’ra que reze,
Pois as ruindades são hostis e ladras,
Mui lindas e formosas, para a ascese...
63. A morte da pombinha
Não tenho mais dizeres especiais
Nem fórmulas, nem dons, para compor:
Aspiro simplesmente a ter valor
Que possa demonstrar como jamais.
Por isso, este meu verso superior,
Mas longe dos poderes imortais
Dos que velam por nós, com cabedais
Da suma perfeição do bem do amor.
Agora que expressei meus sentimentos,
Mostrando quanto estou maravilhado,
Preciso reagir contra os tormentos,
Pedindo a Deus a bênção do sagrado,
Para rimar na trova, nos acentos
Da prece que aqui disse e que traslado.
64. De última hora
Consagro-me à poesia desta feita
E dito o resultado mau da trova.
Queria renovar mas não é nova
A idéia que redijo e não se ajeita.
E vou levando a rima, que desova
A mente encabulada e contrafeita,
Porque escolhida foi sem ser eleita,
P’ra castigar o dom, dando-lhe sova.
Como é que o belo pode prosperar
Em tema corriqueiro e tão vulgar,
Sem alma emocionada e paz interna?
Ocorre que este vate titubeia
E acaba dando forma muito feia
À luz que pretendia fosse eterna...
65. Com conhecimento de causa
Não percebo as mudanças que me atingem,
Mas noto que meu verso já melhora:
No breu do sofrimento, não vigora
A morte cerebral aos que não fingem.
Porém, se sinto a luz que vejo agora
Iluminar-me o coração, me cingem
As ânsias deste amor que tingem
De cores o meu pranto, noite afora.
Perturbo a descrição de um ser feliz
Que tem tudo na morte, porque quis
Enaltecer o belo nestas lavras.
Mais alto aqui, no entanto, se mostrou
O dom do sofredor, em pobre show,
Que os versos, Aprendiz, só escalavras...
66. Obtendo alvará de poeta
Preciso acostumar-me com o verso,
Pois dizem que me dou como poeta:
A fórmula que emprego já completa
O ciclo dos poemas mais perverso.
Também, se aqui desando, logo veta
O atrevimento o mestre que conversa
E me esclarece a lógica reversa
Que me legou a trova que a projeta.
Assim, estimulado, aqui fabrico
O texto onde descrevo a bela fonte
Em que mato esta sede com o bico.
Quem canta lá na mata e sobre o monte
Também há de compor, em verso rico,
A trova que nos abre este horizonte...
67. Vôo rasante
Aboletei-me à cauda do avião
Que circundava o espaço, temerário.
Achei tremenda graça, enorme otário,
E prometi causar-lhe estremeção.
Porém, quando partimos, solitário
Estava no arremedo da paixão,
Que os gajos, como todos saberão,
Exorbitavam senso extraordinário.
Fiquei a ver navios, que a estrepolia
Levou-me a espatifar-me neste solo.
Sofrer a tal desdita eu não queria,
E logo me senti em fértil colo,
Que a mãe tem pelo filho a nostalgia:
Em sonho tive a queda e me consolo...
68. A ave-do-paraíso
Não tenho condições de descrever
As plumas coloridas nem seu canto,
Porque não sei quais cores dão-lhe encanto,
Se é bela e melodiosa em seu poder.
Pensei no paraíso nem sei quanto
E ali deixei a imagem do dever,
Pois tudo que aprendi por bem-querer
Me obriga a derramar honesto pranto.
Pernalta, esguio, me safo pela rima,
Desconhecendo o mal que deixo atrás,
Pois creio, ó Coração, que em nobre estima
Irão dizer as preces para a paz
Que o mundo necessita e não colima,
Que a vida material é mui voraz...
69. Frases
Não devo melhorar muito este verso,
Que o tema não protege a mão do vate:
Só na rima o sabor de chocolate
Demonstra a sensação deste universo.
Preciso, assim, dispor melhor o mate,
Pois, no xadrez, me empolgo e fico imerso,
Enquanto, no poema, eu me disperso,
Buscando uma escansão que o mestre acate.
Desfaço-me da trova e sigo adiante,
Que o trecho concluído me garante
Que as coisas já se ajustam nesta esfera.
Depois de martelar a mesma frase
De forma diferente, eu penso: “Quase
Me perco no soneto que a encarcera...”
70. À espera de um milagre
Resolvo prosseguir compondo trovas,
Desafiando as rimas mais terríveis.
Por isso, o pensamento alcança níveis
Que não imaginei durante as provas.
As quadras que hoje dito são horríveis
E os versos se repetem desde as covas.
Queria fossem bons mas não são novas
As almas que redigem, mais sensíveis.
Por isso é que trabalho com denodo,
Acreditando ser preciso a rodo
Trazer sonetos para exp’rimentar-me.
Um dia eu chego lá e dou perfeito
Um verso trabalhado aqui no eito,
Da pretensão do mal gentil desarme...
71. À sombra dos bons
Queria ter a luz dos mais perfeitos,
Por isso é que segui meu mestre e amigo.
Um dia, a praticar muito comigo,
Falou-me dos melhores, dos eleitos.
Surgiu ao nosso lado — eu já consigo
Dizer quem era ele — um dos bem-feitos,
Que abençoou aos dois, sem preconceitos,
Dizendo que nos punha em bom abrigo.
Eu temeroso estava e me agachei
Atrás do benfeitor que me ajudava,
Achando que atraía o fel da lei.
Por isso é que não vi que iluminava
Tal ente superior, pois, hoje eu sei,
Da sombra era minh’alma ainda escrava.
72. Formalismo poético
Atrevo-me a cantar em verso e prosa
As minhas alegrias neste plano.
Talvez não sejam muitas, pois me engano
Pensando estar feliz, que o dom se dosa...
Com tudo o que acontece eu me engalano,
Pois sei que o coração transcende e goza,
Alçando-se ao Senhor, por ser formosa
A rima que elegi de cunho humano.
Esqueço o sofrimento neste instante
De glória em que me encontro em meio à luz
Que desce lá do céu e segue adiante,
Iluminando os homens, pois seduz
Os que querem o bem e lhes garante
Que as bênçãos deste amor vêm de Jesus.
73. Não espere demais
Atreva-se a cantar, em próprio verso,
As dores e os amores dessa vida,
Porém, que seja a rima comedida,
Sem pieguice nem humor perverso.
Controle-se e tal trova não divida,
Querendo enfatizar um dom diverso
Dos que lhe dão à alma um universo
Apenas seu, uma emoção querida.
Depois de realizar alguns rascunhos,
Procure nos autores testemunhos
Do tema que elegeu e que versou.
Talvez o seu sucesso ali se tolha,
Mas, com amor, retire outra folha
E escreva novamente, sem dar “show”.
74. A poder de memória
Não me amedronta a trova que componho,
Pois sei que o mestre induz minha escansão.
O conteúdo, sim, vem da razão.;
A forma irá mostrar-me mais risonho.
Assim, se a rima calco e digo não,
Vou provocar o riso, pois, bisonho,
Fornecerei as pistas do meu sonho,
Conforme os prismas puros que se dão...
Esfinge, aqui me posto de improviso
E finjo ter as rédeas do comando,
Pois é do verso o fim a que mais viso.
Agito sem parar mas não desando,
Que o lucro há de ser grande para o ciso
De quem sabe entender pavor quejando...
75. Deteriorado pelo uso
Lobrigo o velho esquema e ponho tento
Em que devo compor um verso nobre.;
Mas como se hoje estou perdido e pobre,
O coração em fogo, sem talento?!...
Não me perdi na Terra, pois meu cobre
Comprou-me o céu em próspero convento.;
Mas tudo quanto fiz agora aumento:
Por mais que tenha aqui, não há que sobre...
Preciso controlar meu desespero,
Senão irão pensar que este exagero
É para causar medo e turbulência.
Não quero escurecer o breu do verso,
Pois sei que por ser claro é tão perverso
Que obriga a vergastar minha consciência...
76. Cascavel
Reflito sobre a vida e sinto pena
Daqueles que cresceram ao meu lado.
Eu sei que todo o mal que hoje arrecado
É pálida lembrança, mui amena...
E como vou sentir-me reencarnado,
Pensando que o passado inda me acena
Com juros de estafermo, pois, terrena,
Minh’alma há de mostrar-me o triste fado?
Irei serpentear por entre flores,
Buscar meu alimento material,
Ou simplesmente devo dar de amores
Aos que quiserem ver-me muito mal?...
Ajuda-me, Senhor, que sinto as dores
Da sede do furor que achei normal.
77. Profícuo e circunspecto
Bem sei que tenho a boa inspiração
Do mestre que me apanha este ditado.
Estou falando aqui do nosso lado,
Que ao médium simplesmente peço ação.
O professor aprova o tal translado
E logo me avizinho da escansão.;
Por isso é que hoje evito dizer não,
Pois belo deve ser o resultado.
As rimas vão saindo devagar,
A ponto de causar-me bem-estar
Saber que a minha trova se completa.
Talvez não tenha o dom de uma obra-prima,
Porém, ao terminar, sei que sublima
O verso o sentimento do poeta.
78. Angelical
Não traço muitos planos p’ra poesia
Nem armo uma escansão dificultosa:
Arrumo estas palavras, como em prosa,
E dou-lhes liberdade de harmonia.
Depois que o resultado desta glosa
Se deixa observar em claro dia,
Reflito que o refrão melhoraria,
Se desse mais vigor aos sons que entrosa.
Aí já é bem tarde e o compromisso
Me alija do trabalho e do serviço,
Que eu tenho muitas coisas p’ra fazer.
Sorrio ao terminar a trova manca
E vejo que meu tino mais desanca,
Por não notar no texto bem-querer...
79. Superficial e complexo
Não devo atribuir à inteligência
As rimas que componho junto à mesa,
Pois cabe ao sentimento a tal proeza
De tudo demonstrar para a consciência.
Depois que eu compreender que está acesa
A lâmpada do amor e da ciência,
Aí é que analiso a competência,
Para montar a trova com beleza.
O resultado é pífio, como sei,
Pois não domino deste verso a lei,
Mas vou botando banca mesmo assim.
Um dia, com certeza, atinjo a meta
E alguns vão ler o texto do poeta,
Orando a melhor prece para mim.
80. Jubiloso, exultante...
Preciso demonstrar que estou feliz,
Ao menos por compor estes poemas.
Depois devo enfrentar os meus problemas,
Bem mais sereno à vista do que fiz.
Por isso, não lastimo quando algemas,
Ó rude coração, minha cerviz,
Pois sei que fui eu mesmo que assim quis
Tornar-me bem melhor nos teoremas.
Rubrico esta escansão e dou de mim
Um pouco mais agora que me aturo,
Sabendo contornar o que é ruim.
Um dia, um sentimento inda mais puro
Irá comparecer no verso alfim
E poderei sorrir da fé seguro.
81. Acendrado amor
Não temo perturbar meu caro amigo,
Dizendo-lhe verdades, muitas vezes.
Assim, não quero crer sejam soezes
Os ditos com que aclaro o tal perigo.
São frases e expressões dos portugueses,
Que têm a língua solta do castigo,
Porém, não são maldosas, pois comigo
Se encontram resguardadas por paveses.
Eu quero registrar tal fato agora,
Porque dentro de pouco irei volver
Ao plano terrenal, onde vigora
A fórmula do amor, do bem-querer,
Que deverei ouvir a toda a hora
Dos lábios de quem tem vital poder...
82. O maior prêmio
Se estou mui satisfeito com a glosa,
Porque tenho notado que melhoro,
Às vezes, por sofrer, ainda choro,
Ao ver que algum amigo não se entrosa.
É como se acrescenta à água cloro,
Para limpar a caixa que afoloza.
É causa de moléstia perigosa,
Vir provocar no verso mal sonoro.
Mas, quando estou alegre e aqui componho,
Julgando que estou bem em cada rima,
Prevejo que o leitor se põe risonho
E o mestre já demonstra a sua estima.
Assim, ao acordar do belo sonho,
A trova ainda me diz que o bem sublima...
83. A armadilha
Estendo a minha teia, nesta trova,
Para apanhar amigos pelo amor.
Por isso é que me esforço ao vir compor,
Temendo as dores todas lá da cova.
Por mais que sofra aqui duro labor,
Os versos se amesquinham com a sova,
Pois torno a minha rima velha nova,
Na aspiração do bem e do valor.
Aí quem é que cai na dita teia?
Apenas o poeta, que permeia
Lamúrias e sorrisos, com afinco.
Quisera que meu verso fosse curto,
Porquanto, em sendo longo, eu não me furto
A vir dar de sabido, enquanto brinco...
84. Babalorixá
Importa ter um nome diferente
Daqueles que se põe no espiritismo?
Será questão apenas de batismo
Ou fica o nosso peito mais descrente?
É claro que as funções com que não cismo
Estão bem vivas quando o gajo sente
Que existe diferença, mas, contente,
Não se atrapalha já com ocultismo...
É claro que as virtudes são maiores,
Se o bem que se destaca prevalece
Na busca de tornarem-se melhores
Aqueles que praticam nossas normas,
Levados a rezar do Cristo a prece,
Enquanto ainda são poucas as reformas.
85. Uma súplica simplória
Não vejo como ater-me ao verso amável,
Que torna mais feliz o bom leitor.
O quanto necessito aqui compor
Pretendo seja logo descartável.
Por isso é que estas rimas de louvor
Não chegam a causar um bem estável.
No máximo, o que deixam lacerável,
Nas intenções, é o mal do gozador.
Aplico-me na forma, mais ou menos,
Porquanto o conteúdo desanima.
Entendo que aos leitores mais serenos
Meu sentimento rude não sublima
O quanto de grosseiros, vis venenos,
Destilo nestas trovas, sem estima...
86. Fidelíssimo
Arvoro conhecer o melhor metro,
Mas passo pela rima mais perneta.
Ao médium peço que não se intrometa,
Porquanto ao rei se dá coroa e cetro.
As coisas hoje correm sem que a peta
Exija do leitor um vade retro,
Pois a verdade é tudo que perpetro,
Ao ser fiel às dores do capeta...
Por isso é que pleiteio o teu amor,
Ó bem amado e lúcido leitor,
Em forma de oração dentro do peito.
Os meus amigos dizem que o sofrer
Tem lenitivo, sim, se o bem-querer
Obriga aos sacrifícios do respeito.
87. Hagiolatria condenável
Quem traz no coração a fé divina
Não pode idolatrar qualquer pessoa:
Por mais que seja ela um’alma boa,
Também está formada na doutrina.
Os santos são exemplos, como voa
O pássaro no céu, que dissemina
Alegres pensamentos, pois domina
A região aérea, a qual povoa.
Por isso é que tememos demonstrar
Que existem certos seres no lugar
Capazes de compor versos sublimes.
Quem tece esta poesia tem um mérito:
O de falar da dor já no pretérito,
Ao ministrar mais fé nestes regimes.
88. Persuasivo até certo ponto
Não troco figurinhas com o médium,
Que fica extasiado com meu verso.
Se digo, aqui, porém, que sou perverso,
Pretende ministrar-me bom remédio.
E qual a mistureba com que terço
Pela doutrina sã sem vil assédio?
Misturo esta esperança de que o tédio
Agora se desfaz e vai disperso.
Depois de algumas trovas junto à mesa,
Provando-me capaz de tal proeza,
Atiro-me nos livros da doutrina.;
E faço com que a rima se aproveite
Dos dons das tais virtudes e deleite
O bom leitor audaz, que se ilumina...
89. Refinamento vocabular
Distância equivalente entre os mortais
E aqueles que daqui tecem poesias,
São dúbias posições, são alegrias,
Que não se medem nunca por meus ais.
Embora tu solfejes e te rias
Das trovas que disponho sempre mais,
Ó coração tremente, eu sei que vais
Elaborar mais versos como guias.
Assim, se trovo ainda sem motivo
Que justifique rima tão banal,
Precisam os leitores que cativo
Eliminar dos versos todo o mal,
Purificando a trova, pois é vivo
O sentimento d’alma, e natural.
90. Não me sinto esquecido
Não venho azucrinar tua paciência,
Ó companheiro médium e escrevente:
Bem sei que a minha obra se ressente
De tema superior e de ciência.
Mas tudo quanto escrevo o gajo sente
De forma tão benigna que a existência
Se torna apreciável e a cadência
Demonstra que me agito levemente.
Mas sou trazido, sim, por companheiros
Que sabem que medito enquanto escrevo,
Buscando haurir do belo de terceiros,
Pois ser original não sei se devo,
À vista dos percalços costumeiros,
Se tento dar ao texto algum relevo...
91. Sons que se repetem
Estudo as rimas todas que hoje emprego
E vejo que as repito, uma a uma.
Talvez, se em prosa desse rica suma,
Não passaria aqui por surdo ou cego.
Assim como componho, espalho espuma,
Que se desfaz no ar, enquanto rego,
Com lágrimas sofridas, o meu ego,
Que ao verso torpe já não se acostuma.
De qualquer forma a trova ganha brio,
Ao menos quanto aos sons que aí disponho,
Porquanto dos melhores eu recrio
Os textos mais bonitos, que, bisonho,
Declaro copiar — mas não copio —,
Embora o tema nasça sempre inconho...
92. Trabalho de fôlego
Por mais que seja simples minha trova,
Está bem mais além do que eu fazia.
Na vida, andava solto, na folia
Dos gozos e prazeres, casanova...
Depois que aqui cheguei, eu vi-me em fria:
A coisa que hoje enfrento, sempre nova,
Que estou tão defasado só comprova
E põe-me a orelha em pé, sem harmonia.
Por isso é que me exponho e dito a norma
Aos que se atrevem a pensar errado,
Que foi como pensei, na velha forma.
Se venho estruturar este soneto
E busco dar-lhe brilho e não me agrado,
Confesso que fiquei co’o mico-preto...
93. Firmeza e estabilidade
Não troco figurinhas com o médium
E vou dizendo logo por que vim:
Eu quero que se reze mais por mim,
P’ra que receba a alma o seu remédio.
Aí irão dizer que a trova, enfim,
Apenas desconcerta quanto ao tédio
E representa, ainda, forte assédio
Na rima repetida, em som ruim...
Enquanto as costas doem pelo castigo
Dos males que hoje aponto, tão perverso,
Avanço impunemente e já bendigo
A luz que deposito em cada verso,
Idéia que me traz junto ao perigo
De ver-me verme tolo em cova imerso...
94. Adepto da verdade
Não sinto muita força em minha prece,
Porque não sei dizê-la emocionado.
O bem que dessas bênçãos arrecado
Está na forma leve que aparece.
Eu digo em relação ao verso alado
Que solto ao vento e logo o povo esquece,
Porém, a perfeição me favorece,
Porquanto a trova jaz pronto de lado...
Apenas a leitura é que lhes peço,
Que é modo de me honrar neste momento,
Sabendo mui difícil ser impresso.
Um pensamento bom, um sentimento
De amor e compaixão por este egresso
É tudo quanto quero, quanto agüento.
95. Razões para crescer
Espero que o meu tema seja leve,
Que eu possa descansar daqui a pouco.;
No entanto, a minha rima deixa louco
O pobre que me ajuda como deve...
A voz que o gajo escuta tem som rouco,
Enquanto o acento agudo fica breve,
Na notação latina, que o almocreve
Se atreve a vir grafar junto ao cavouco.
Depois que dito a trova, me aborreço,
Pensando no que fiz sem muita vida,
Iluminado apenas do arremesso
Que burilei no espaço e dei guarida
No coração feliz, lá no começo.
Mas vejo que a ditei quase garrida...
96. O pó do caminho
O que levanta o pó no meu caminho?
Os passos dos colegas lá na frente.
São muitos e nos dizem p’ra que agüente
Aquele que inda sofre seu pouquinho.
Mas tudo tem seu dia diferente:
É quando de um parceiro me avizinho
E peço que me diga se, sozinho,
Alguém consegue arcar co’a dor que sente.
Eu penso que retardo a caminhada
De tão gentil pessoa, que me explica
Que logo encontrarei um camarada
Que irá seguir comigo, tanto é rica
A fonte da amizade, o que me agrada,
Pois tenho a minha rima da rubrica.
97. Significado e poesia
Pretendo melhorar meu desempenho
E fornecer aos leigos contributo,
Mas não a quem hesita, a quem, astuto,
Caminha lá na frente, enquanto venho...
Agora que mostrei que mais eu luto,
Fechando p’ra alegria o duro cenho,
Irão imaginar que o mal retenho,
Que o bem, nesta poesia, é que desfruto...
Ocorre que mantenho a mesma verve
De quanto bom poeta aqui conserve
Antigos ideais em velhas formas.
Porém, devo pensar que o meu leitor
Deseja descobrir que tem valor,
Por meio dos exames dessas normas.
98. Flagrante desrespeito
Encaro as normas da poesia e digo
Que são limitadoras do ideal,
Mas quando escrevo aqui, e escrevo mal,
Procuro estimular, mas não consigo.
Eu falo só de mim, que é natural
Desconhecer os outros, se maldigo
A forma tão perfeita com que o trigo
Fornece o pão a todos — carnaval.
Assim, vou descrevendo esta inquietude
E vou deixando claro que a virtude
Apenas se pratica quando é boa
A fórmula do bem, que a faz querida,
O que sofre mudanças inda em vida
E faz crescer o ânimo à pessoa...
99. Força moral
Preciso consagrar-me ao metro antigo,
Pois dá mais segurança o resultado.
Por isso é que esta rima retrogrado
E ponho-me à vontade mais comigo.
É claro que me exponho e não me enfado
Que o texto resultante do castigo
Irá trazer um ganho ao doce amigo
Que me ajudar a difundir tal brado.
É forte esta moral e nobre a tese
De que disponho o amor em rica rima,
Porém, o mestre quer que se reveze
A turma dos alunos, pois estima
Que a trova mais formosa leva à ascese
A quem pratica o bem e a dor sublima.
100. Oferta pessoal
Não primo pela rima mais simpática
Nem dou de mim de forma contundente,
Mas sei que o tema exige desta gente
Que o vate tenha brio, luz e didática.
Renovo, assim, meu tom constantemente,
Seguindo a sisudez desta gramática
De forma pouco audaz e pouco prática,
Tornando bem fraquinho o que se sente.
E o verso ganha foros de verdade,
Se chega cadenciado, em rica rima,
Pois tudo que hoje emprego persuade
Que tenho pelo verso grande estima,
No entanto, quando existe quantidade,
O fim, sem chave d’ouro, se aproxima...
101. Em forma de parábola
Um dia, o fofo linho se espantou
De ver a maciez da leve pena.
Achou que não cabia mais na cena
E, cabisbaixo e triste, se apartou.
“Querido, não desprezes mais a arena
Em que terçamos armas, rude show.”
O pobre ouviu a voz e então chorou:
“Bem vejo que este orgulho me envenena.
Não vou mais reclamar da minha sina,
Pois posso usufruir de boa sorte,
Que a luta pelo bem também ensina.”
Foi quando doce voz, de acento forte,
Pregou a paz na Terra e a disciplina:
“O coração dos bons sabe o seu norte!”
102. Sentimento do belo
Eu sei que a tal palavra é estesia,
Que devo mencionar, conforme a rima.
E soa muito bem e já sublima
A condição da dor que me afligia.
Ocorre que não dou para obra-prima
E vou levando o texto em nostalgia
Do enlevo que gozava e que sentia,
Ao ler e interpretar na pantomima.
Agora uma lição deve restar
Da trova, embora esteja muito fraca:
É como a luz que torna a noite opaca.
Se houvesse sol aqui neste lugar,
Aposto que era a sombra o tema eleito,
Pois é preciso um dom que eu não suspeito.
103. Faculdades e retórica
Não penso que inda esteja mui distante
O tempo de encerrar minha jornada.
Agora esta poesia é quase nada.;
Mais tarde há de valer um diamante.
Emprego o meu talento e se degrada
O texto que criei, embora adiante
A trova em mais um verso, tão pedante
Que a turma aqui segura a gargalhada...
É claro que me estimo e tenho brio,
Que sinto estar honrado junto à mesa,
Embora me perpasse um calafrio...
Eu gosto deste feito, que a proeza
Eleva o meu astral, pois desafio
As normas da poesia e da beleza.
104. Lucros incessantes
Não peco pelo tema em pobre rima,
Mas peco pela rima em nobre tema:
Embora a diretriz cause problema,
O tronco da doutrina mais me anima.
Ocorre que não vou mostrar suprema
Desenvoltura e luz que o mal sublima.
Apenas vou dizer que tenho a estima
De algum leitor perdido, o que me algema.
Se após milhões de versos eu me veja
Cercado de uns amigos pelas trovas,
Graças darei ao Pai quanto à peleja.
Por ora, vou trazendo esta alegria,
Que sempre, ó coração, tu me renovas,
Ao dar co’a chave de ouro que nos guia...
105. O alfarrábio
Estranhei que o bem houvesse
Resistido nas palavras,
Em formato dumas lavras
De alfarrábio que se esquece...
Ó coração, que azinhavras
O livro que ali padece,
Por que não ergues a prece
Em vez do dom que escalavras?!...
O meu texto terminei,
Cumprindo a mais nobre lei,
Mas isto foi há mil anos.
Hoje encontrei o alfarrábio,
Que me pareceu de um sábio,
O maior dentre os humanos...
106. Espantando o Belzebu
A lírica do verso que hoje escrevo
Não cabe na emoção que me arrebata,
Por isso é que dos termos ando à cata,
Embora perguntando o quanto devo.
Os nós da minha escrita o amor desata,
Pois firo o preconceito e mais me atrevo,
Deixando o meu parceiro sem enlevo,
Apenas no resguardo da bravata.
Então os meus leitores vão embora,
Sabendo que este vate ainda chora
O pranto mais sentido e mais profundo...
O Belzebu, contudo, mais se anima,
Pois sabe que me perco nesta rima:
No fim acaba em lágrimas, jucundo...
107. Nem simples nem direto
Não gosto de escrever com tal clareza
Que logo se desperte para a dor.
No entanto, como ser superior,
Se tudo se desfaz junto a esta mesa?!...
Estimo que me ajudem a compor
Milhares de parceiros — que proeza!
Ocorre que esta história de beleza
Existe desde sempre, em seu valor.
Desminto neste verso o pensamento
E dou por encerrada a dócil obra,
Pois mais do que um terceto não agüento...
Mas o meu mestre amigo se desdobra
E põe sob meus olhos o argumento
De que o veneno não destrói a cobra...
108. Falando mal da vida alheia
Não queira surpreender o mau poeta,
Ao aspirar o encontro desse vício.
Não leia pelo título, que o início
Não pode dar idéia tão completa.
É de você que falo, ó estrupício,
Que toda idéia boa risca e veta,
Porque não se conforma que um esteta
Componha livremente este exercício.
Compreenda, por favor, que tenho gana
De aqui deixar o belo recheado
De teses doutrinárias, pois humana
É sempre a pretensão de ser de agrado:
Se a fórmula do verso se engalana,
É certo que também não retrogrado.
109. A candeia
Pretendo iluminar co’a minha rima
A estrada do leitor que me acompanha,
No entanto, esta emoção é tal, tamanha,
Que acabo perturbando este bom clima.
Então, componho versos e se acanha
O pobre que me lê e não se anima,
Achando que o que faço mais vitima
A trova tão confusa e tão tacanha.
Outrora eu me sentia bom poeta
Apenas por montar certos esquemas,
Jogando co’as palavras que hoje veta
O mestre que me assiste e me consola.
Ó coração, eu sei que não me algemas,
Mas, por favor, conforta este que chora...
110. Meu senso crítico
Não tenho de dizer como me sinto,
Mas tudo quanto escrevo leva a isso.
É sério quando existe o compromisso
De me deixar levar só pelo instinto.
Assim, a rima presta o seu serviço
Apenas comungando, quando pinto
As sensações de dor, por ser retinto
O verso que componho, mesmo omisso.
As rimas sempre em i são mais agudas,
De forma, coração, que hoje me acudas,
Facilitando a trova dessa forma.
As rimas se esparramam, quando aberto
Eu deixo o som e mostro quanto acerto,
Ao vir trazer as luzes de tal norma...
111. Consagrado ao amor
Não verto muita luz no meu poema,
Porque me falta a mim, que estou no escuro.
Mas tenho um pensamento muito puro,
E vejo com clareza o meu problema.
Se faço algo importante, eu logo juro
Que vou passar aos outros tal esquema.;
Mas se a dificuldade for suprema,
Contorno a falha minha, mais seguro.
Assim é que este verso se apresenta,
De forma bem sucinta e resumida,
Trazendo um conteúdo que se alenta
Pela presença muda desta lida,
Que exige bom trabalho e se acrescenta
Das luzes que recolho de vencida.
112. Receitas e despesas
Atribuo ao valor da minha rima
O mérito das trovas que componho.
Não sei deixar um verso mais risonho,
Mas busco conquistar a sua estima.
Poemas que se esperam, com que sonho,
Deixados sem a luz que o bem arrima,
Não chegam ao seu fim, pois desanima
O vate que os fabrica tão bisonho.
Assim, vamos chegando ao verso d’ouro
Que abriga a chave do mistério vago
De quem apenas tenta, sem desdouro,
Montar algum soneto, como eu trago,
Sem dons e sem primores de tesouro
Moral ou material, pois este eu pago.
113. Negócio fechado
Não quero perturbar o nobre amigo
Que busca compreender nossa doutrina,
Mas digo que ela exige disciplina,
O que meu mestre faz também comigo.
Se o verso que componho já se inclina
Por algo bem melhor, por seu castigo,
Assim vou revelar que já me abrigo
Dos males do improviso e da endorfina.
Sossego, calmaria e muita paz,
Na zona em que trabalho com amor:
Procuro melhorar, pois sou capaz
De demonstrar orgulho superior,
Não desses de quem se acha mais sagaz.;
Daqueles que permite o Bom Pastor.
114. Água de beber
Quisera ter a força duplicada,
Ao redigir os versos que castigo.;
Mas trago tanta dor aqui comigo
Que a lágrima que choro é quase nada.
Assim, por entre o pranto, já bendigo
A trova que componho e que me agrada,
Que os sons não se atropelam, posto aguada
Esteja a rima presa ao modo antigo.
Sedento, o caro amigo que me lê
Ainda sente o hálito do amor,
Na prece que recita sem porquê.
Às vezes, o sentir nos causa dor,
Enquanto aqui brincamos com você,
Na ânsia de agradar Nosso Senhor...
115. Ao sol da verdade
Pareço transigir com os maus versos?
É que não tenho agora minhas rimas.
Não quero aqui compor só obras-primas.;
Também não vou mostrar só dons perversos.
Sou médio e companheiro, se me estimas,
Amigo meu leitor, que tem imersos
Os sentimentos bons, incontroversos,
Nas chamas da bondade em que te animas.
Não faço por maldade este poema
Repleto de figuras compreensíveis,
Pois sei que o devem ler todos os níveis.
Apenas, favoreço que o sistema
Atenda as pretensões do bom amigo
Que reza sob a luz do bem comigo.
116. Otimismo sob controle
Quem quer compor um verso bem bacana,
Exagerando um pouco o próprio dom,
Alcançará fazer algo de bom,
Se avaliar toda a fraqueza humana.
Talvez não fique justo e belo o som,
Pois nosso ouvido às vezes mui se engana.;
Então, o pensamento se engalana
E leva para a rima o melhor tom.
Tudo o que trago aqui é verdadeiro:
É só contar as sílabas primeiro,
Examinando as pausas deste metro.
Por que não calaria alguma idéia
Que ofendesse a turma da assembléia,
Se apenas desejasse o nobre cetro?
117. A natureza
Não sei se é natural compor poesias,
Tornando o tema alegre e deleitável,
Mas venho aqui expor, de modo afável,
A dúvida que trago há vários dias.
Eu sei que existe fórmula agradável
De se aplicarem forças e energias,
Mas, caro coração, o que querias
Que aqui fizesse um vate deplorável?!...
No entanto, vou deixando um rastro amigo
De quem avisa os trancos do perigo
Da caminhada trôpega, insegura.
Ocorre que esta estrada tem ciladas
Que tu irás saber que são armadas
Na pretensão de auxiliar a cura...
118. Arrebatado pelas idéias
Não venho questionar o bom amigo
Que se atrever a dar um parecer
Respeito a este serviço e ao dever
Que cumpre o mau poeta sem castigo.
Reverto a informação, pois meu poder
É quase permanente neste abrigo
De fórmulas e métricas, perigo
Que vou vencer agora a bel-prazer.
Ateio a chama forte da virtude
E peço a quem não tem que mais estude
Os temas da doutrina espiritista.
Amar a Jesus Cristo não é tudo,
Mas digo que sem esse amor não mudo
A condição de ser feliz o artista...
119. Vertentes da fé
Não creio que meu verso lhe desperte
Os vezos da alegria deste mundo,
Porém, como hoje tenho um dom profundo,
Não posso contentar-me estando inerte.
Bem sei que a compaixão com que confundo
A mente atribulada mas solerte
Me faz discriminar quem mais acerte,
Valendo-me de um verso vagabundo...
Não quero estipular qualquer verdade
Que o medo de falhar minh’alma invade.;
Por isso, dito a rima explicativa.
Bem sei que trago a dor no compromisso
De vir prestar-lhe, amigo, um bom serviço,
De sorte que esta trova sobreviva.
120. Concórdia
Afeito a vir compor um simples verso,
Não trago o coração muito dorido.;
Por isso, com o tema sei que lido
De modo artesanal, quase perverso.
Repito a velha rima e não duvido
Que o faça sem cuidado, mui imerso
Nas dúvidas atrozes do universo,
Que o bem desta proposta aqui divido.
Antigamente, eu punha mais vontade,
Querendo mais artístico o poema.
Agora que esta paz minh’alma invade,
Não vejo na razão nenhum problema.
Então, peço a Jesus a caridade
De dar-me alguma luz, brandura extrema...
Indaiatuba, de 19.11.01 a 23.05.02
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