WLADIMIR OLIVIER
Enfim, a Caminho!
E Mais Cento e Oitenta Sonetos
(POESIA MEDIÚNICA)
315. Aquele que deixou trabalhos de arte ou de literatura conserva pelas suas obras o amor que tinha durante a vida?
— Segundo sua elevação, julga-as de outra maneira e freqüentemente reprova o que mais admirava.
(Allan Kardec — O Livro dos Espíritos.)
ESPÍRITOS DIVERSOS
Edição da CASA DO MÉDIUM
Rua Cinco de Julho, 1184
Indaiatuba — SP
Saiba, Irmão, que estes versos
provieram da Espiritualidade!
Índice
1. Um bom começo ................................ 5
2. Apanhado prevenido ........................... 5
3. O meu drama .................................. 5
4. Acusado atrás da trova... .................... 5
5. A verdade nua e crua ......................... 5
6. Quase por obrigação .......................... 5
7. Expressão vs. impressão ...................... 6
8. Desperdício .................................. 6
9. Rindo de mim mesmo ........................... 6
10. Sem repercussão .............................. 6
11. Eu, pecador, me confesso ..................... 6
12. Em dia sem inspiração ........................ 6
13. Envolvendo o médium .......................... 7
14. Em águas rasas ............................... 7
15. No meio do caminho ........................... 7
16. Por falar em mim... .......................... 7
17. Ouça quem tem ouvidos ........................ 7
18. Uma mão lava a outra ......................... 7
19. Cedo ou tarde, a verdade ..................... 8
20. Palavras, só palavras ........................ 8
21. Não há como ser simples ...................... 8
22. Para falar de versos ......................... 8
23. Último alento ................................ 8
24. É justo ...................................... 8
25. Não haja precipitação ........................ 9
26. Reflexão oportuna ............................ 9
27. Fuja do mal .................................. 9
28. Arrastão frustrado ........................... 9
29. Procura inconsistente ........................ 9
30. Argamassa preciosa ........................... 9
31. Instigante perspectiva ....................... 10
32. Subtileza sem b .............................. 10
33. Dos deveres e competências ................... 10
34. Sem ilusão ................................... 10
35. Sem enfado, por favor! ....................... 10
36. Arrufos ...................................... 10
37. Contratempos ................................. 11
38. Em menos de cinco minutos .................... 11
39. Com suave alegria ............................ 11
40. Com suave censura ............................ 11
41. Com suave contrição .......................... 11
42. Nem sempre vale a intenção ................... 11
43. A intenção é fundamental ..................... 12
44. Reconhecendo as intenções .................... 12
45. Versos assim não se improvisam ............... 12
46. Nem estes .................................... 12
47. O egoísmo revelado ........................... 12
48. A maldição cultural .......................... 12
49. A sorte requerida ............................ 13
50. Misteriosa trova ............................. 13
51. Mistura irrefragável ......................... 13
52. Navegando em segurança ....................... 13
53. Enfim, a caminho! ............................ 13
54. Diferenças notáveis .......................... 13
55. Preocupação perene ........................... 14
56. Controle e disciplina ........................ 14
57. Direto do bolso do colete .................... 14
58. Recordações terrenas ......................... 14
59. O disfarce poético ........................... 14
60. A revelação poética .......................... 14
61. Um dia eu chego lá ........................... 15
62. Com alguma bonomia ........................... 15
63. Provocativo .................................. 15
64. Guarda os teus comentários ................... 15
65. Não julgues pelo resultado ................... 15
66. Não podemos tudo ............................. 15
67. Refrigério aparente .......................... 16
68. Incólume não saio ............................ 16
69. Seguindo o padrão ............................ 16
70. Nem forçando ................................. 16
71. Um pouco de otimismo ......................... 16
72. Da esperança ................................. 16
73. Reestruturando o tempo ....................... 17
74. Estuda, cara! ................................ 17
75. A trave e o cisco ............................ 17
76. Mexendo com o intelecto ...................... 17
77. Castigando o estilo .......................... 17
78. Lição de pachorra ............................ 17
79. Sem atropelo ................................. 18
80. Eu sofro, tu sofres... ....................... 18
81. Sublime decisão .............................. 18
82. Resignado tema ............................... 18
83. Algum lucro .................................. 18
84. Poética promessa ............................. 18
85. Em confiança ................................. 19
86. Estribilho salvador .......................... 19
87. Voltado para o outro ......................... 19
88. Muito trabalho para nada ..................... 19
89. A solução sem soluços ........................ 19
90. Desconsidere os defeitos ..................... 19
91. Sem arreliar ................................. 20
92. Objetivo especificado ........................ 20
93. Prevenindo acidentes ......................... 20
94. Cheio de dedos ............................... 20
95. Salada espírita .............................. 20
96. Ouça quem tem ouvidos ........................ 20
97. Não há como fugir ............................ 21
98. Na antevéspera do Natal ...................... 21
99. Por não temer a morte ........................ 21
100. Contrastante visão ........................... 21
101. Para confundir ............................... 21
102. Solene requisição ............................ 21
103. Preciso melhorar ............................. 22
104. Eu bem que avisei... ......................... 22
105. Feliz ano novo! .............................. 22
106. Não podia ser diferente ...................... 22
107. Não podia mesmo ser diferente ................ 22
108. O que deveria estar no princípio ............. 22
109. Lamento sem dor .............................. 23
110. Com a mente aberta para o bem ................ 23
111. Vamos lá, companheiro! ....................... 23
112. Reação perceptível ........................... 23
113. Descontente? Por quê? ........................ 23
114. Reminiscências úteis ......................... 23
115. Bendita confissão! ........................... 24
116. Sem censura .................................. 24
117. Lenir cantando ............................... 24
118. De volta ao ofício ........................... 24
119. Explicação necessária ........................ 24
120. Esforço-me, contudo... ....................... 24
121. Espremendo as rimas .......................... 25
122. Quase um agradecimento ....................... 25
123. Pegando gosto ................................ 25
124. Toda ajuda é bem-vinda ....................... 25
125. Sem olhar para o relógio ..................... 25
126. Poesia e mistério ............................ 25
127. Navegar é realmente preciso .................. 26
128. Cheio de medo ................................ 26
129. A pressa explica a imperfeição ............... 26
130. Impropriedade conjuntural .................... 26
131. Desafio improdutivo .......................... 26
132. Sem sal mas com pimenta ...................... 26
133. Superando a dor .............................. 27
134. Sem injunções misteriosas .................... 27
135. Brincadeiras à parte... ...................... 27
136. Agora é tarde... ............................. 27
137. Versos cadavéricos ........................... 27
138. Sinceridade, sim, mas não muita .............. 27
139. Sazão de rimas ............................... 28
140. Contra-senso aparente ........................ 28
141. Que não se perca por esperar ................. 28
142. Reconhecidamente fraco ....................... 28
143. O dom da simpatia ............................ 28
144. Vai a prima pomba... ......................... 28
145. Catequese bilaquiana ......................... 29
146. Para ler como se fosse o primeiro ............ 29
147. Encantando o médium .......................... 29
148. Com ilusões .................................. 29
149. Atrevimento permitido ........................ 29
150. Sempre falta alguma coisa .................... 29
151. Às vezes falta muita coisa ................... 30
152. Por que insistir? ............................ 30
153. Com o tempo contadinho ....................... 30
154. O morto-carregando-o-vivo .................... 30
155. Convite à reflexão ........................... 30
156. Rimar também ajuda ........................... 30
157. A poesia é privilégio dos bons? .............. 31
158. Preferes dar ou ensinar? ..................... 31
159. Lembrando Raul Pompéia ....................... 31
160. Onde ficou a inspiração? ..................... 31
161. Halo de felicidade ........................... 31
162. Poesia e fé .................................. 31
163. É preciso ter calma .......................... 32
164. Desafio ...................................... 32
165. As asas da razão ............................. 32
166. O poeta é um sofredor ........................ 32
167. Confundo o tal sentido ....................... 32
168. O que não parece bem ......................... 32
169. O caminho, a verdade e a vida ................ 33
170. Interrogando o etéreo ........................ 33
171. Sofrível e sofrido ........................... 33
172. Desencontro e desencanto ..................... 33
173. Garimpando a dor ............................. 33
174. Sempre o Mestre .............................. 33
175. Uma mão lava — e a outra? .................... 34
176. Preponderância da razão ...................... 34
177. Alegria sem entusiasmo ....................... 34
178. Mais que filosófico .......................... 34
179. Com ares de improviso ........................ 34
180. Derradeiros alentos .......................... 34
181. Adeus, amigos! ............................... 35
1
Um bom começo
Estamos trabalhando com afinco,
Pois fazer feio aqui não é conosco.
Aí, a melhor rima está no enrosco
Com que me enleio todo, quando brinco.
Mas como o verso sai tão rude, tosco
E o número das provas chega a cinco,
A porcelana aqui contém um trinco
E o meu cristal, apenas vidro fosco.
É que o meu pessimismo já deslancha,
Na esfera em que sofri falta de amores,
E agora, se em minh’alma vejo a mancha
Que provoquei nas iras e furores,
Percebo, ao transmitir, que tenho cancha,
Que, um pouco mais, vou burilar as dores.
2
Apanhado prevenido
Estranho, sobremodo, o meu compadre
Que quer que eu faça um verso de improviso.
E, como não lhe cabe ter juízo,
Requer que seja rápido e me enquadre.
Mas tenho de inventar, pois é preciso
Não escutar um cão, um só, que ladre,
Pois despertar amor é co’a comadre,
Que nos perdoa artigo, alínea e inciso.
Também não posso vir com verso tolo,
Pois tenho a inteligência a meu favor.
Então, me favorece o vir compô-lo,
Se a rima aqui disponho com louvor,
E, quando o mestre vê que rola um rolo,
Ajuda este estafermo sem valor.
3
O meu drama
O pouco que conheço cá do etéreo
Pretendo pôr em versos, pouco a pouco.
Espero que não faça ouvido mouco
O amigo que me toma muito a sério.
Bem sei que este roteiro é muito louco,
Que a voz que aqui ressoa é só mistério,
No canto destes hinos do saltério,
Que mais parece um coaxar tarouco.
Mas vou pedir um tanto de paciência,
Pois uma das virtudes, a clemência,
É que provoco mais para que vençam.
Então, o compromisso que assinei
Faço valer, sabendo que é de lei
Rogar a Deus amor e luz, em bênção.
4
Acusado atrás da trova...
Não tenho pressa agora e já termino
— Contraste de um poema que não fiz,
Porque, para fazê-lo e ser feliz,
Precisa que haja luz no meu ensino.
Mas como reconheço que se diz,
Ao término do verso, que me inclino
A tudo transformar em canto e hino,
Também vou formulando a diretriz.
Se tenho como fácil a poesia,
Nos quadros da estrutura em que se apóia,
Então, que o meu leitor, em harmonia,
Encontre, neste entrecho, a melhor jóia
Para adornar a mente, pois teria,
Por nos ouvir, tremenda paranóia.
5
A verdade nua e crua
Eu sei que é bem mais fácil flautear,
Buscando as rimas que se dão opacas,
Para, ao final, dizer que são tão fracas,
Porquanto hesito, sem jamais ousar.
Mas se as logrei, conforme tu destacas
É que cheguei, ao vir tão devagar,
A ponto deste amigo, em meu lugar,
Cuidar de suprimir as grossas cracas.
Não falo à toa, que o meu mal se espalha
Em versos broncos, sim, sem conteúdo,
Pois reconheço ser fogo de palha
Deixar assinalado que sei tudo:
Em pondo em risco a forma, que vem falha,
Não há de sobrar nada deste estudo.
6
Quase por obrigação
Na pressa de fazer um belo verso,
Repito a mesma rima tantas vezes
Que os temas me parecem vis, soezes,
Embora o metro tenha um dom diverso.
É que, ao pensar que são tão-só fregueses
Os nossos bons amigos, deixo imerso
No fundo da consciência e assim disperso
O assunto que cantei nos entremezes.
Mas tento ainda um bom motivo pôr
Nestes tercetos, p’ra valer a rima,
Que só sofrer os males traz mais dor
Àquele a quem requeiro doce estima.
Então, me comprometo e digo amor,
Apenas por dizer, que o gajo anima.
7
Expressão vs. impressão
Mas me envergonho tanto com a trova
Que acabo de ditar, honestamente,
Que tudo o mais que faço só comprova
O quanto perturbada tenho a mente.
De que me vale a dor de toda a gente,
Se a minha que me emprenha se renova,
A ponto de dizer que então se agüente
Quem quer vir me cascar tremenda sova.
Mas meu leitor não deve perturbar-se:
Apenas confrontar estas palavras
Com algo bem melhor, feliz catarse
De quem é mais feliz nestas mensagens,
Que eu tenho a chave para abrir tais lavras
E penso em melhorar estas imagens.
8
Desperdício
Vou melhorar dizendo que perdi
De dez a zero, para o meu amigo
Que fez o verso em metro mais antigo,
Que mal e mal vou copiando aqui.
Na minha idade, estou tão a perigo
De vir a confundir-me e já senti
O quanto pernicioso sou p’ra ti,
Que segues, no meu verso, cá comigo.
Se estou insinuando que sou mau,
Nem precisava tanto desta métrica,
Porque o sentido fora do normal
Há de causar a reação elétrica
De quem, por um princípio natural,
Bem sabe ser a minha idéia tétrica.
9
Rindo de mim mesmo
Ao construir o verso, tenho medo
De ser expulso logo para o Umbral,
Porquanto aqui cheguei de forma tal
Que conquistei a chance muito cedo.
É que treinei na Terra tal e qual,
De sorte que o que faço é um arremedo,
Contando simplesmente, em cada dedo,
As sílabas que tenho impresso mal.
Mas o meu mestre diz-me que sossegue,
Que tudo quanto faço na poesia
Há de se recolher sem ser entregue
Ao povo, que requer mais harmonia
Que um relinchar que lembre um pobre jegue,
Conquanto pouca gente igual faria.
10
Sem repercussão
Acomodado está quem me acompanha,
Dizendo que melhor jamais faria,
Embora preferisse a companhia
De quem, com mais talento, a trova amanha.
Mas põe mais fé em mim que a melodia
Se deixa ingurgitar e mais se assanha,
Se os termos que disponho o belo arranha,
Sem que se dê o contrário, todavia.
Então, estou dispondo o melhor tom
Para burlar de vez a perfeição,
Que o trato deste assunto me confunde.
Não quero que me digam simplesmente:
— Agora vamos ver quem é que sente! —,
Porquanto da maldade eu sou vimbunde.
11
Eu, pecador, me confesso
Preciso concentrar-me nas virtudes,
Pois tudo que escrevi foi muito opaco:
Se o mal é superior e aqui destaco,
Talvez seja querendo que tu mudes.
Mas, como vou fugir de um termo fraco,
Se o pensamento gira em lassitudes,
Conforme tu me vês, sem que me estudes,
Que é fácil distinguir um bom dum caco?!
Aí é que a fumaça mostra o fogo
Que me incendeia a alma e me tortura,
Pois tudo quanto escrevo é só um jogo
Em que se esconde sempre a criatura
Que se arrepia, ao se lembrar do rogo
Que deve ao Pai, p’ra se tornar mais pura.
12
Em dia sem inspiração
Tendo chegado a vez deste humilde poeta,
Me ponho a versejar, fazendo muita força.
Então, não passa a rima azada, sem que a torça,
Para fazer da trova a tela mais completa.
Aí, hão de pedir-me que o final destorça,
Pois são poucos os sons que vêm cumprir tal meta.
E, para que dê certo, o médium já resseta,
Na forma anglicizante, em que o meu mal contorça.
Ainda que agonize o metro vil do assunto,
Que é fácil descrever, se tenho algum ouvido,
Disparo o verborréico anelo dum defunto,
Querendo aqui salvar o verso, mas duvido
Que o pobre tenha um ar que lhe livre o bestunto
P’ra imaginar saída ainda com sentido.
13
Envolvendo o médium
Peço, em nome da turma, ao escrevente
Que assuma o compromisso da poesia,
Que faça bem melhor a melodia,
Pois tudo se repete aqui co’a gente.
É claro que esta mesma não daria
P’ra melhorar, que o tema, simplesmente,
Se põe imperativo, sem que agüente
A perfeição da forma, todavia.
As idéias, o fundo, o conteúdo
Não sofrerão castigo desta vez,
Que a bizarria é própria deste estudo,
Mas, quando alguém vier como freguês,
Não deseje tão-só dar-lhe um cascudo:
Faça por ele o que por mim já fez.
14
Em águas rasas
Eu rogo que me deixes prosseguir
Ditando estes meus versos sem sabor:
Preciso de algum tempo p’ra compor
De modo que se alegre o Wladimir.
Então, este soneto é sem valor,
Se tudo aqui prometo no porvir.
Mas tenho o compromisso de fugir
De provocar, no mestre, a mesma dor.
Atiro lá p’ra cima o pedregulho,
Rezando p’ra que caia no deserto,
Mas sinto, em minha mente, certo orgulho
Que faz com que a tal pedra caia perto.
Mas como, cuidadoso, eu não me embrulho,
O seixo foi pequeno, fraco, esperto.
15
No meio do caminho
O treino já faz tempo que passou:
Agora quem compõe conhece a rima.
É claro que não tem talento e clima,
Mas, com respeito, vem para o seu show.
Afirmo que esta turma mais se anima
Ao ver o resultado que deixou
Impresso na telinha em que espelhou
O metro que se encontra em quem mais prima.
Agora que domino a forma extensa
Da cálida poesia que me aflige,
O pobre que me lê não gosta e pensa,
No que terá razão, que, como estrige,
Eu venho aqui sugar a vida densa
De quem só contensão de si exige.
16
Por falar em mim...
Parece obrigatório vir mexer
Com quem cá se apresenta p’ro trabalho.
É que este povo sabe que agasalho
Lhe dá o caro médium, por dever.
Assim, eu vou compondo, mas espalho,
Aos quatro ventos sempre, que o poder
Está nas mãos de quem, com bem-querer,
Evita que o meu verso esteja falho.
Ao lhe passar a idéia, não permito
Que exerça o seu direito de vetar-me,
Mas, como é bem sutil o nosso atrito,
Não posso aqui bradar em sério alarme.
Agradecido estou, feliz, bendito,
Fazendo ao bom leitor um certo charme.
17
Ouça quem tem ouvidos
Preparo a minha tese e ponho em verso,
Rezando p’ra que o moço que me serve
Conheça a rima que contenha a verve,
P’ra que o leitor se veja aqui imerso.
É como se o poema já se inerve
E se estruture em corpo bem diverso
Daqueles que compus, por ser perverso,
Aí na Terra, em forma assaz enerve.
Mas vejo que mantive a mesma linha,
Pois busco o efeito lídimo do belo,
Quando devia ver que se avizinha
A monstruosa criação que anelo,
Insatisfeito sempre, pois se apinha
A série dos vocábulos que atrelo.
18
Uma mão lava a outra
Hipócrita seria se fizesse
Um texto em que as virtudes exaltasse,
Mas, vendo o médium livre, dou-lhe um passe,
Para marcar um gol, sem que se estresse.
Os meus amigos todos desta classe
Desejam vir colher versos da messe,
Sabendo que o leitor jamais se esquece,
Se se agradar da rima, sem impasse.
Por isto é que faculto ao bom amigo
Que venha aqui compor junto comigo,
Movimentando as teclas sempre rápido,
Para evitar que a trova se apresente
Um pouco claudicante para a gente
Que desejava um poemeto sápido.
19
Cedo ou tarde, a verdade
Não devo desviar-me do roteiro,
Pois perco-me na estrada, se desvio:
Os versos muito pobres que lhe envio
Aí devem chegar como requeiro.
Não posso refazer, pois não confio
Na inspiração da hora, por inteiro.
É bem melhor, se rascunhar primeiro,
Que o resultado há de expressar meu brio.
Também fica exultante este meu médium,
Por não causar-lhe a trova nenhum tédio,
Pois tudo é rapidinho e já termino.
Então, a conclusão perfaz sentido,
Ainda que o leitor diga: — Duvido
Que tudo se escreveu com descortino.
20
Palavras, só palavras
Estranha o bom leitor que este meu tema
Se torne corriqueiro junto ao grupo.
De tanto repetir-se, a rima apupo,
Princípio universal do estratagema.
Mas sempre sou autêntico e me ocupo
Em prevenir as glosas do sistema,
Pois poucas têm virtude tão suprema
E muitas são aquelas que eu engrupo.
Mas onde estão os termos inefáveis,
Com o sabor poético da trufa?
Ao menos, cá na Terra são amáveis,
Enquanto o sentimento não se entufa,
Enlanguescendo as trovas improváveis
De quem, por muito menos, já se arrufa.
21
Não há como ser simples
Não venho como vinha antigamente
Em tempos de poesia em bela rima.
Agora, este poeta não se anima,
Porquanto é tão patético o que sente.
Ao menos, quem me lê também me estima,
Conquanto o nosso encontro raramente
Lhe dê prazer, que o tema não desmente
O mesmo tom da dor que não sublima.
O sofrimento é tanto que versejo
Apenas p’ra tornar meu dia amargo,
Que o verso, para mim, é benfazejo:
Desanuvia a mente, sem embargo
De realizar o meu maior desejo
Que é de esquecer os dolos deste encargo.
22
Para falar de versos
Às vezes, eu consigo aqui expressar-me,
No rastro deste verso tão sutil,
Mas um, e apenas um, dentro de mil
Não causa no leitor qualquer alarme.
Recordo-me dos hinos do Brasil,
A provocar nas mentes seu desarme,
Que a lira que acompanha este meu carme
Também tem sons de aspeto juvenil.
E assim vou prosseguindo sempre impávido,
A desbastar as selvas de minh’alma,
A requerer amor sempre mais ávido,
Mas dando muito pouco pois me perco
E o tema não progride, gora, espalma,
Livrando-se do assédio do meu cerco.
23
Último alento
Requeiro que descanse o meu amigo:
Não tente ser apenas serviçal.;
Evite que se saia o gajo mal.;
Afaste-se da mesa e do perigo.
Neste improviso pouco natural,
Sustente a melhor rima, que eu consigo
Deixar um bom soneto, pois, comigo,
Você há de atrever-se, e coisa e tal.
Não posso registrar um tema sério,
Que a rima que apresento é bem comum,
Despreparada até p’ro refrigério
De quem exala odores de bebum.
Eis que revelo, enfim, o meu mistério,
Rogando que me ajude no jejum.
24
É justo
Não posso bendizer minha saudade
Do tempo em que na Terra fui feliz:
Verdade é que, na crosta, eu sempre fiz
O que surgia em mim como vontade.
Prejudiquei alguém que não me quis
E dei-lhe um corretivo sem piedade,
Porém, não me importei com a maldade,
Até que vi o capim pela raiz.
Agora, eu curto a dor e me estremeço,
Porque devo partir de novo ao mundo
E pôr em dia o carma do começo.
Quisera progredir mas é profundo
Aquele meu remorso e bem mereço
Sentir a sensação que me contundo.
25
Não haja precipitação
Desejo postergar a decisão,
Pois tenho a liberdade de escolher,
Porém, ausente está do meu poder
Fazer valer o dom que tenho em mão.
Aqui, quem não cumprir o seu dever
Não pode argumentar que seja em vão
O bom trabalho em prol de seu irmão,
Pois tudo o que se almeja é bem-querer.
Assim, devo levar o meu projeto,
Ainda que não seja tão completo,
Até reconciliar-me, finalmente.
Já recebi o perdão pelas ofensas
Mas o meu mestre diz: — É bom que venças
As duras condições de tua mente.
26
Reflexão oportuna
Eu posso me indispor com meu amigo,
Se desejar fazer-me de palhaço.;
Mas, se ofender-me, é triste isso que faço,
Porque não sei agir segundo o artigo.
A lei me compromete co’o fracasso,
Se revidar o dolo mais antigo.;
Se perdoar, contudo, já consigo
Iluminar em torno o meu espaço.
A decisão é falha, se perdôo
Pensando em recompensas superiores.
No fim, hei de sofrer tremendo enjôo,
Porquanto a consciência sente as dores,
Que a liberdade às asas desse vôo,
Por força, não lhe dão os bons mentores.
27
Fuja do mal
Não penso em transtornar o meu leitor,
Contando o que se passa aqui comigo.
Mas sempre eu vou falar-lhe do perigo
De desprezar os outros com rancor.
Os termos que disponho como abrigo
São sempre os mais severos para a dor
De se sentir o gajo inferior,
Quando quer dar de si, mas sem castigo.
Por isso, esta poesia já fracassa,
Porquanto a minha verve não comove
Quem tenha prevenção, que a idéia escassa,
E mais rareia o verso, sem que prove
O quanto sofre o cara, na desgraça,
Para que o carma seu não se renove.
28
Arrastão frustrado
O resultado é pífio como provo,
Que o verso segue o verso e fica nisso.
Mas tenho de cumprir meu compromisso
De vir mostrar que a trova cá renovo.
Depois de terminar, eu mais me enguiço
E deixo a rima torta, pois desovo
O sentimento chulo e desencovo
Uma tristeza tola, sem derriço.
De qualquer modo, vou levando a vida
Do jeito que componho o próprio verso.
Se tanta imperfeição não te convida
A vires nestas glosas mais imerso,
Meu caro e bom leitor, está falida
A mostra que te trouxe, tão perverso.
29
Procura inconsistente
Cantei, cantou, cantamos, toda a gente,
Que o verbo eu não conjugo sem um fim.
Mas tudo quanto digo é tão ruim
Que, quando o verso encerro, estou contente.
É que chegou alguém perto de mim
E disse bem baixinho: — Finalmente,
A vida do poeta segue em frente,
Depois de saciar-se em bom capim.
— Perdão, Senhor, vos peço, no arremedo
Dum verso antigo, rico e inoportuno,
Que é rico para o autor, que não tem medo
De ver que o bom leitor fica jejuno,
Se eu despertar p’ros versos muito cedo,
Enquanto as tais virtudes não reúno.
30
Argamassa preciosa
Empetequei a rima e me aprumei
P’ra solfejar o verso junto à mesa.
Queria era causar, com tal beleza,
A inveja das pessoas desta grei.
O sentimento mau virou proeza,
Na guerra da consciência, pois errei
Por me julgar no reino o grande rei,
Pois ser vassalo sempre, que dureza!
Eu não sabia, então, que era importante
Levar o compromisso mais adiante,
Embora em trovas pobres, sem prestígio.
Agora que este tema desenvolvo,
São muitos os tentáculos do polvo,
Alguns dos quais do bem trazem vestígio.
31
Instigante perspectiva
Inolvidáveis dias tenho tido,
Pois nunca me senti tão à vontade
Para dizer ao povo que se agrade
De ter da vida a dor co’algum sentido.
O sofrimento é carma resolvido,
Depois que o mal passou como verdade.
Quem tem juízo, então, se persuade
Que deve melhorar.; — eu não duvido.
Nem tudo claro está na minha trova,
Pois claro o pensamento inda não tenho.;
Mas, como a imperfeição o mal comprova,
Qualquer que seja agora o desempenho,
O amigo que me lê também renova
A dúvida que traz cerrado o cenho.
32
Subtileza sem b
Não posso aqui perder-me em vã promessa
E devo desde já montar a rima
Com que vou adornar a minha estima,
Nas velas que acendi, essa por essa.
Passagem que me obriga porque anima,
O verso deve ser feroz à beça.;
Então, vou formulando a bela peça,
No simbolismo chocho em que se arrima.
Eu sei, porque estudei, ser bem gongórico
Trazer sutil o tom sempre alegórico,
De sorte que se espante o bom leitor.
Mas o meu mestre ri, pois sou singelo
E digo tudo quanto em mim revelo,
Nas formas enrediças do compor.
33
Dos deveres e competências
Não posso preocupar-me co’o ditado,
Que a trova tenho pronta há vários dias.
Se o médium rejeitar minhas poesias,
Eu volto aqui de novo preparado.
São tantas estas rimas que darias,
Meu bom leitor, um grande e forte brado,
Se todas duma vez fossem de agrado
Que te obrigasse o mestre às melodias.
O sofrimento vem para o mistério
De se saber cumprida a tal missão,
Que o verso que aqui deixo é refrigério,
Embora dê trabalho ao bom irmão.
O duro é relembrar o cemitério,
Momento em que vigora a obrigação.
34
Sem ilusão
Rejeito que o cansaço teu desculpe
O fato de esquecer minha mensagem.
Eu venho, sim, de longe, em má viagem,
Enquanto o verso meu o mestre esculpe.
Mas levarei, no fim, séria vantagem,
Ao afirmar meu médium puro, inculpe,
Porquanto, em sã consciência, já me insculpe,
No mármore da tela, a bela imagem.
Não creio que estes versos ganhem mundo,
Que os sentimentos deles não garanto
Que possam ter prestígio assim profundo
No coração das gentes, mas meu pranto
É mui sincero e franco, pois inundo
As páginas que escrevo, sem encanto.
35
Sem enfado, por favor!
Não posso e não pretendo transgredir
A norma da poesia que me obriga
A respeitar a casa que me abriga
E o coração do médium Wladimir.
É fraca esta escansão mas não periga,
Que o verso que aqui faço é sem porvir.
Portanto, já não chora e põe-se a rir
Aquele poetastro duma figa.
Mas o meu mestre, sério, dá tal bronca
Na irreverência minha que componho
Os últimos tercetos sem farronca,
Agradecendo ao Pai estar risonho,
Que a rima que progride apenas ronca
Como o trovão sem luz, dentro do sonho.
36
Arrufos
Vamos dar mais tempo ao drama,
Porque tudo é mui recente:
O furor que hoje se sente
É fagulha que se inflama.
Se tal fato é mais freqüente,
Se provar que alguém não ama,
Que se apague então a chama.;
Quem sofrer que mais agüente.
Mas se a palha se apagar
Sem que as cinzas apareçam,
Que se volte para o lar,
Que as briguinhas já se esqueçam:
Vamos todos aguardar
Que as pazes se estabeleçam.
37
Contratempos
No trato que mantemos entre nós,
Aqui no etéreo, sempre proveitoso,
Apenas compreendemos como gozo
Estar o nosso amigo mais veloz.
É que a partilha deste bem ditoso
Há de tornar quem tenha a melhor voz,
Para ditar o verso, embora atroz,
Que imaginou o gajo em dia ocioso.
Por isso, a boa rima se desfaz
Em temas de profunda redundância,
Querendo e não querendo que haja paz,
Que é tão terrível de pintar a ânsia
De quem se sabe muito bem capaz,
Mas que se perde aqui pela ganância.
38
Em menos de cinco minutos
Acato a decisão do caro médium
De suspender agora este trabalho:
Apenas vou quebrar este seu galho,
Porque não tenho aqui outro remédio.
Então, posso dizer-lhe que não falho
Na prestação cerrada deste assédio,
Que tudo o que se passa vai sem tédio,
Mas toma a forma triste de espantalho.
Se cá disser o tempo que gastei,
Para ditar-lhe os versos do soneto,
Talvez consiga impressionar a grei,
Que sempre considera tudo preto:
É que nestas poesias eu sou rei
Mas nunca uma obra-prima aqui prometo.
39
Com suave alegria
Não gosto quando o amigo desconfia
De que não há ninguém para o poema.
É certo que utilizo o estratagema,
Para emprestar motivos p’ra poesia.
Mas, quanto a repetir o mesmo tema,
É justo que suspeite que faria
Melhor, se desse ouvido à melodia,
Para esquecer que o mote assim se estrema.
E como desenvolvo o meu discurso,
Querendo que me prestem tal serviço,
Não seja mais amigo lá do urso
E abrace a minha rima e o compromisso
De me facilitar este percurso,
Levando-ma ao leitor com muito viço.
40
Com suave censura
Nem sempre a solução que trago agrada,
Que o verso é bronco, rústico, capenga:
Além de se propor em lengalenga,
Estabelece um prisma que me enfada.
Mas tal tristeza é lúdica e parlenga,
Intérmina, a sofrida alma penada,
Pois tudo o que dispõe é quase nada,
Que o gajo que solfeja é mui molenga.
E vou levando a trova a um bom final,
Desempenhando a rima, proficiente,
Mostrando como estou.; é tal e qual
Aquele que se iguala com a gente,
Querendo que perdoe Deus o mal.;
No entanto, ao perdoar, o cabra mente.
41
Com suave contrição
Agora que dispus minha figura,
Em versos mui sofridos, meu amigo,
Procura concordar hoje comigo,
Pois quem pena de dor também me atura.
Quisera um verso lindo e não consigo,
Que tudo o que arrecado não se apura
E o mestre que me ajuda já não jura
Que as rimas mais me afastam do perigo.
Então, cabe ao leitor, e a ti somente,
Depositar em mim a fé que peço:
Que a tenha na memória mui freqüente,
Porquanto, se algum dia o meu sucesso
Puser o melhor verso em tua frente,
É que compus a prece em que me expresso.
42
Nem sempre vale a intenção
Jesus, traze-me a paz dos mais devotos,
Ao menos para os versos que componho.
São tantas as virtudes com que sonho
Que sinto envergonhar-me com seus votos.
Não quero produzir nada medonho,
Porém, não vou quedar-me entre os ignotos,
Pois devo aqui exibir as minhas fotos,
O que não me permite ser bisonho.
Então, eu vou rezar as minhas preces
Em prol desta escansão, mas sem pensar
Que devem vir colher das pobres messes
Os meus leitores, quando, devagar,
Eu sinto cada rima que forneces,
Senhor, p’ra que o soneto eu possa atar.
43
A intenção é fundamental
Estendo o meu tapete que caminhe
O bom amigo que me lê por ora
E passo-lhe o meu lenço, quando chora,
Caso na dor o coração se aninhe.
É pouco o que forneço, muito embora
Pretenda rica a rima e que se alinhe
Entre as melhores, sem que o vate apinhe
Os temas, sem critério e sem demora.
Por isso é que forneço um texto sério,
Rogando, ó bom Jesus, teu refrigério,
Nas luzes dos irmãos que me auxiliam.
No etéreo, o que se faz, em bom conjunto,
Reflete o pensamento, em nobre assunto,
Se em nossas intenções todos confiam.
44
Reconhecendo as intenções
Se queres repousar, meu bom leitor,
Que as rimas se sucedem tão ingratas,
Procura, na amplidão, nossas fragatas,
Pois vamos, vento em popa, aqui compor.
Se julgas que o teu tempo malbaratas,
Ao veres quanto a trova é inferior,
Suspende o pensamento, por favor,
E vê se tu consegues duplicatas.
Depois de muito teres solfejado
E posto em versos os melhores temas,
Relê p’ra nós o que te for de agrado,
Porquanto, ouvindo os cantos e os poemas,
Iremos aprender do nosso lado
Quais são os diapasões em que te extremas.
45
Versos assim não se improvisam
Eternamente é pouco para alguém
Que julgue que o sofrer não tem função.
Enquanto não mudar seu coração,
Não dá um simples passo mais além.
Por isto é que capricho na escansão
E faço os meus versinhos cá também:
Para mostrar ao povo que se tem,
Na caridade, amor e salvação.
Se compreenderes tu meu compromisso,
Verás que estou prestando um bom serviço,
Ao demonstrar as dores que me ferem.
Enaltecendo o brio de quem palpita
Em prol do seu irmão e já não grita,
Perdoa, tu, também os que malquerem.
46
Nem estes
Pretendo negociar mais um soneto,
Que a quota permanece em dois ou três.
Mas devo demonstrar tal lucidez
Ao gajo que me ajuda no dueto.
Então, suspendo o verso de uma vez
E espero que se escreva outro quarteto.
Mas, sem se definir este esqueleto,
Nada logrei, que o texto não se fez.
Assim, também na vida o companheiro
A quem mais probidade aqui requeiro
Há de perder-se sempre, pois não sabe
Como é que se compõe o tal assunto.
É bem melhor seguir com ele junto,
Que adivinhar as rimas não lhe cabe.
47
O egoísmo revelado
— Não venho concordar com teu pecado,
Ó tu, que não pretendes melhorar.
Se queres merecer estar no altar,
Humilha-te e perdoa o meu recado.
Assim dizia eu, a praguejar
Contra a malícia minha deste lado,
Que tudo o que fazia era de agrado
De quem me ofereceu vir divagar.
Mas, nesse mundo, apenas eu comigo
Pensava como pensa com umbigo
Aquele que dá voltas no seu quarto.
É que, ao sair de mim, é perigoso
De se perder da vida o melhor gozo,
Embora se surpreenda um dia farto.
48
A maldição cultural
Nas franjas da memória se guardou
O que mais fiz de bom na vida minha:
A humanidade assim se descaminha,
Na fé de que o passado deu seu show.
Mas quem pensar: “Onde é que agora estou?”,
Sentindo que o futuro se avizinha,
Há de lembrar que medo sempre tinha
De alguém de dedo em riste: “Por quem sou?!”
É que, ao fazer o bem visando a grei,
Alegre o gajo fica e na esperança
De que, na aplicação justa da lei,
O amor do Pai o filho sempre alcança,
Ao responder-lhe ao tema: “Onde errei?”,
Que o Dom Quixote fez de Sancho Pança.
49
A sorte requerida
Se trouxe cá comigo o preconceito
Que tive contra os pobres lá na Terra,
Eu sei agora que a virtude encerra
A miserável condição do eito.
Então, eu peço ao mestre, nesta guerra,
Que, ao regressar à vida, seja eleito
Débil mental ou algo desse jeito,
P’ra reforçar o amor que agora emperra.
Mas, ao dormir, eu quero seja linda
Minha estadia em terras cá do etéreo,
Para manter acesa mais ainda
Minha vontade de voltar mais sério,
Que a sucessão dos fatos, sendo infinda,
Vai aumentar bem mais meu refrigério.
50
Misteriosa trova
Não devo e, mais, não posso prosseguir,
Pois, ao forçar o médium, prejudico
O meu desejo dum poema rico
Que deixe alegre o amigo Wladimir.
Mas, ao fazer as rimas, já claudico,
Julgando que o melhor está p’ra vir,
Que o tema desta tralha, no porvir,
Irá glorificar quem pague o mico.
Assim, o desconforto desta rima
Vem só p’ra demonstrar a minha estima
Àquele que me ajuda no trabalho.
Se o tema se perverte mais um pouco,
Não pense, bom leitor, que esteja louco
Quem se perdeu no jogo do baralho.
51
Mistura irrefragável
Não vamos esperar que haja surpresa
No público que ler as nossas rimas:
Podemos aguardar muitas estimas,
Porém, não haverá qualquer proeza.
Se tu não te contentas e sublimas,
Dizendo que é difícil que a pobreza
Encontre os tais caminhos da beleza,
Então, não fugiremos destes climas.
Embora aqui façamos o impossível,
Espera-se de nós que haja milagre.
Mas isso, cá no Umbral, é inatingível.
Então, vamos pedir que se consagre
O autor que poetar ao mesmo nível
De quem gosta do açúcar com vinagre.
52
Navegando em segurança
Ajuda-me, colega, que eu perdôo
A tua irreverência p’ra comigo.
Se apoio não me deres, não consigo
Bailar em pleno ar neste meu vôo.
É meu desejo, já bastante antigo,
Avaliar o ponto em que me enjôo
E apuro os meus ouvidos p’ro ressôo,
Pois algo há de avisar-me do perigo.
Mas tudo permanece tão o mesmo
Que as frases cá disponho meio a esmo,
Pedindo ao Pai perdão pela imprudência.
Porém, o bom amigo dá-me um jeito
De pôr no verso um tom d’algo bem feito
Que eu posso agradecer sem penitência.
53
Enfim, a caminho!
Preciso terminar minha poesia,
Por espremer-se o tempo, se demoro.
O verso fica lindo, se o decoro
E trago a rima em límpida harmonia.
Utilizando os termos, rememoro
Os trechos que estudei na Terra, um dia.
Bem sei que aqui melhor jamais faria.;
Por isso, mal-e-mal o tema afloro.
Se o pensamento torno tão simplório,
À forma dou, contudo, mais vigor,
P’ra que o leitor não siga no velório,
Queimando vela boa ao recompor
O texto, quando vê que o peditório
É por perdão, por luz, por mais amor.
54
Diferenças notáveis
Estive a contemplar o bom trabalho
Da turma que aqui vem p’ra prosear.
Os versos é que ficam mais no ar,
Porquanto com tais metros me atrapalho.
Assim, não dou seqüência popular
Aos textos que elaboro e logo espalho
Para mostrar que tenho este espantalho,
A fim de me manter neste lugar.
Se o texto dos irmãos vem num segundo
E o meu chorado pranto se afigura,
É que o modelo prima neste mundo
Em que vagueia triste a criatura:
O pensamento é bom, mas não profundo.;
O sentimento brilha, mas não dura.
55
Preocupação perene
Não tenha compaixão para o meu verso
E desça a ripa nele, sem piedade.
Eu quero que a poesia muito agrade,
Ó caro leitor meu incontroverso.
Porém, se não fizer por vil vaidade,
Qual há de ser o sentimento imerso
No egoísmo do texto que alicerço,
Pensando nesta dor que já me invade?
É que o roteiro extraio de minh’alma.
P’ra refletir depois, com muita calma,
Nas emoções que tive ao confirmá-lo.
As tais palavras soltas vou uni-las,
Para deixar as rimas mais tranqüilas
No espírito de quem vem p’ro regalo.
56
Controle e disciplina
Estúpido e boçal é pôr no gozo
Do verso em si tal prisma da virtude:
É que a vaidade o mestre quer que eu mude
Em algo mais feliz e proveitoso.
A história diz que é minha essa atitude
De regular o texto cavernoso
Por algo mais melífluo, formoso,
Na hora de enfeixar a crise rude.
Serenamente, eu trago o meu poema,
Porquanto a caridade manda orar,
P’ra que o leitor entenda que é suprema
A forma em que disponho aos pés do altar
A prece para abrir a dura algema:
Um grito, simplesmente, sem gritar.
57
Direto do bolso do colete
Poesia é tão-somente um complemento
Do dia de trabalho aqui na Terra.
Às vezes, o ditado cá se encerra,
Restando para nós um só momento.
Então, não desejando estar em guerra,
Que é triste a frustração do sentimento,
Pedimos que este médium diga “Agüento
Ficar com um soneto”, pois não erra.
Por isso, vou tornando ao meu retiro,
Alegre por compor este recado
Que tanta conferência estimulou.
Sem perguntar quem vem, eu não atiro.;
Nem ponho, no poema, um desagrado.;
Nem dou, no palco alheio, um falso show.
58
Recordações terrenas
As ânsias do perfeito pairam n’alma
De quem conhece as rimas e as pratica,
Mas, antes de fazê-las, quer mais rica
A decisão de pôr na trova a palma.
É que a vaidade prima e justifica
Que venha poetar, estando em calma,
O gajo que, no verso, o bem ensalma,
Porque não soluciona e mais complica.
Aqui somente o exemplo prevalece,
Que o pensamento é pobre e sem pudor.
A forma, enquanto terço, mais fenece,
Nos termos de caráter superior,
Que não combinam, se os coloco em prece.;
Que fazem mal, quando lhes peço amor.
59
O disfarce poético
Ativo o meu processo e já poeto,
Lucrando algumas rimas preciosas.
Mas tu, que não te iludes, antegozas
A imperfeição do texto no concreto.
Então, eu te surpreendo em minhas glosas,
Deixando um pensamento mais completo,
Na escolha deste léxico em que afeto
O prisma da verdade em que te algozas.
Mas, nesta escolha dúbia, nunca venço
A principal virtude cá do etéreo
E aceno, esperançado, com o lenço
Que trouxe amarfanhado de mistério,
Que o meu soneto monto, em contra-senso
De quem quer o melhor p’ro refrigério.
60
A revelação poética
Devo dizer que o lucro que hoje alcanço
Não posso vir contar como vanglória,
Que a rima, por ser rica, é mui simplória
E o pouco de virtude chega ranço.
Um dia, vão saber de toda a história,
Que agora este poeta quer descanso.
Também, se suspeitarem que hoje danço,
Vão logo descobrir-me a trajetória.
O meu trabalho é forte e contundente,
Na análise que faço de mim mesmo:
Se o verso que componho sai a esmo,
O texto é que sugere que não mente
Quem tem a sua sina e denuncia
As lágrimas que oculta na poesia.
61
Um dia eu chego lá!
Queria exorbitar a minha trova,
Para atingir o cerne dos problemas.
Então foi que pensei que são extremas
As teses que se põem a quem comprova.
Pedindo permissão para alguns temas,
O mestre perguntou: — Que rima nova
Irás já demonstrar, se estás na cova
E lutas por abrir tuas algemas?
Senti no coração um forte aperto,
Mas o meu mestre riu do desconforto
E disse-me que agisse com acerto,
Falando, simplesmente, que está torto
O verso que pretende dar concerto,
Enquanto as impressões são as de um morto.
62
Com alguma bonomia
Pulando miudinho, dei de mim
O mais que pude, nestes versos rudes.
Então, eu descobri como as virtudes
Não davam cobertura ao que é ruim.
Espero, meu leitor, que tu não mudes,
Porque foi com amor que aqui eu vim:
Se tudo te parece tão chinfrim,
Precisa que outros textos mais estudes.
O refrigério d’alma que te espera,
Ao cabo do soneto e do suspiro,
É próprio de quem vive nessa esfera
E raro pelo etéreo dá-lhe um giro.;
Mas, como já conheces quem opera,
Eu peço o teu perdão e me retiro.
63
Provocativo
— Notável! — vai dizer o bom leitor,
Sabendo o pouco tempo que aqui tenho,
No entanto, este meu médium franze o cenho,
Achando que improviso ao vir compor.
Mas tarde, ao recordar o meu empenho,
Encara o resultado com amor
E julga o meu soneto superior,
Melhor do que ninguém no ardor ferrenho.
A crise deste tempo me deprime,
Que o verbo mais pelejo por valer,
Na busca da palavra que aqui rime,
Juntando esta notícia ao bem-querer,
Para que o texto a dor e o mal sublime,
Que tanto eu peço ao Pai por tal poder.
64
Guarda os teus comentários
Se queres que te faça uma homenagem,
Ó alma que suportas tanta trova,
Esquece o preconceito que reprova
O texto resultante da mensagem.
Enterra essa vaidade e o mal na cova
Em que começarás tua viagem
Por terras cá do etéreo, em que a coragem
Consiste em enfrentar a coisa nova.
— Poesias de defuntos sem talento! —,
Estás a meditar com teus botões,
Mas peço-te que estejas bem atento,
Que vão, nas entrelinhas, os sermões.
Depois não há dizer: — Eu não agüento
O fato de ter visto só senões...
65
Não julgues pelo resultado
A gente cá do etéreo mui se esforça
Para ditar uns versos mais modernos,
Mas, ao grafar as rimas nos cadernos,
Notamos quanta gente as mede à orça.
No entanto, aqui se querem bens eternos
Os textos em que a métrica reforças,
Ó coração indômito, que introrsas
A tal visão dos males dos infernos.
Mas sempre que concluo algum soneto
E dou por terminada a tal tarefa,
Eu noto um ponto denso, rude e preto,
Na tela em que se põe a sinalefa,
Que a trova compromete este dueto:
O médium não aceita quem mais blefa.
66
Não podemos tudo
Prefiro que me invoquem noutra hora
Para falar a quem me pede ajuda:
O tempo da poesia a quem estuda
É que se determina, sem demora.
Espero que o leitor jamais se iluda,
Que é fácil de enganar-se quem deplora
O fato de não ter resposta agora,
Pois tudo quer de pronto e nunca muda.
As peripécias várias deste tema
Não cabem num soneto, simplesmente.
Mas posso resolver este problema,
Dizendo a quem me acusa que não mente
Quem pede por favor que não mais tema,
Porquanto é do Senhor a luz ausente.
67
Refrigério aparente
Estando muito fácil vir compor,
Desprendo-me dos vícios, por instantes,
E sinto-me feliz, bem mais que antes,
Que esqueço, por momentos, minha dor.
Se me disserem que o quartel d’Abrantes
Não dá guarida a nada superior,
Pois que na mesma fica o tal valor,
Aí vou requerer alguns calmantes.
É que atropelo o verso e desconjunto
O tema com que vinha aparelhado.
Então, apelo ao mestre e ao meu bestunto,
Porquanto do soneto eu não me agrado,
Porque não fui capaz de seguir junto
De quem, quando cheguei, estava ao lado.
68
Incólume não saio
Prefiro ouvir antigas ladainhas,
No lengalenga inútil dos pedidos,
A vir estimular os teus ouvidos,
Com cânticos que logo tu espezinhas.
Mas como sou molesto e são perdidos
Os versos que componho p’ras modinhas,
Eu peço que me deixes com as minhas
Perversas produções, nos dois sentidos.
Não posso controlar o resultado
Depois de impressa a trova e divulgada.
Então, vou prevenir-me deste lado,
Dizendo como tudo é quase nada.
Mas algo faço bem: não retrogrado,
Que os males não aumento na parada.
69
Seguindo o padrão
— Respeita toda a Lei e os seus profetas —,
Recomendou Jesus ao pobre rico.
Eu mesmo não compreendo e justifico,
Tentando algumas trovas mais discretas.
Então, vou descobrir como é que aplico
As leis do amor que são as mais completas,
Passando a porfiar com os poetas
Que amaram mais a si, o que eu critico.
No entanto, p’ra que serve esta poesia,
Senão p’ra demonstrar como é que estou?
Didática expressão melhor daria
Em prosa sentenciosa e não num show
De sons para montar a melodia,
Que assim é que este amor hoje medrou.
70
Nem forçando
Requeiro ao leitor meu que mais te animes,
À vista deste texto superior,
E deixa desfrutar de teu amor,
Que as rimas que componho estão sublimes.
Eu digo por ser teu tanto valor,
Na apreciação das teses dos regimes
Com que toda a virtude em mim imprimes,
Porque me privo aqui de te indispor.
Ao provocar-te a fúria literária,
Apelo, sem pudor, para a sandice,
Deixando sem critério e mui precária
A trova em que pretendo a bizarrice
De dar-te o tema como a luminária
Que traz a luz conforme o Cristo disse.
71
Um pouco de otimismo
Entendo que o compadre esteja tenso,
Na ânsia de saber o que se passa,
Mas crê em que no Pai terás a graça,
Se tudo aí fizeres como penso.
O gesto da justiça senta praça
No amor, quando do bem mais me convenço.
Aborrecer-te agora é contra-senso,
Porquanto a bela rima rui, fracassa.
O espírito que gera a caridade
Precisa compreender o que Jesus
Sofreu, porque, se o verso persuade,
É que a maior virtude já conduz.;
No entanto, a fé, que o coração invade,
Mantém certa esperança em minha luz.
72
Da esperança
É rico o meu filão de rimas, sim,
Pois tudo quanto escrevo se aproveita.
No entanto, é muito pouco o que se aceita,
No instante em que o leitor não pensa assim.
A porta da poesia é bem estreita,
Que a fama prepondera, mas não vim
Querendo que trabalhes para mim,
Mas que me dês amor, que o bem se ajeita.
O tema da fortuna permanece,
Porém, aqui não vale o teu dinheiro,
Que o dom que os anjos colhem, nesta messe,
Resulta do favor que mais requeiro:
Que rezes por quem sofre alguma prece,
Que a luz será p’ra ti, se és verdadeiro.
73
Reestruturando o tempo
Eu bem sei não ser fácil para o médium
Passar da prosa ao verso de imediato,
Mas devo repetir que logo acato
Ser o descanso agora o seu remédio.
Então, fiquemos nós no primo ato,
Deixando p’ra amanhã um novo assédio,
Sem carregar no coração o tédio
De ver de volta a rima do contrato.
Não vale a quantidade mas o bem
Que desta trova o povo usufruir.;
Nem quero que se canse ele também
Ao ler meus textos tolos no porvir.
Vamos orar, que a luz que o mal retém
Irá dar vida e força a quem me ouvir.
74
Estuda, cara!
A dúvida que trago dentro ao peito
Não tem o compromisso da resposta:
Às vezes me parece que se gosta
De cultivar o pejo tão sem jeito.
Por certo, o gajo logo em mim se encosta,
Na ânsia que lhe dê todo o respeito,
Mas pensa dentro d’alma: — Eu mais suspeito
De que meu coração aqui se enrosca.
É que não participo da premissa
De que o valor se encontra na intenção:
P’ra mim, o não pensar gera a preguiça
Que invade a mente mole desse irmão
E digo, francamente, que se enguiça
Quem quer tudo beijado, ali, na mão.
75
A trave e o cisco
Não venho arreliar a tua praia
Nem quero pôr tumulto na poesia:
O que desejo mesmo é ver-te em fria,
Ao intentares dar-me a tua vaia.
Como é que o gajo aqui se sairia,
Sabendo que o pensar logo desmaia,
Pois a íris do etéreo, quando raia,
Tem muitas outras cores que o teu dia?
Mas, ao falar da luz, que eu não pretenda
Discriminar no verso o meu amigo,
Fazendo com que a raiva logo acenda
O dissabor que traz sutil perigo:
É que é difícil retirar a venda
Que trago desde a Terra cá comigo.
76
Mexendo com o intelecto
Atrevo-me a ditar uns versos mais,
No dia em que a galinha criou dentes:
Alguns estão muitíssimo descrentes,
Que os temas que descrevo não são tais.
A perfeição do texto não intentes,
Ó tu, alma imortal, que chora em ais:
Sonega a informação e segue em paz,
P’ra que os leitores fiquem mais contentes!
— Mas como, irás dizer, se o compromisso
Existe de prestar um bom serviço,
Na métrica impoluta do soneto?
Então, ponho na rima a minha ausência,
Para mostrar ao povo que a clemência
Também se dá na trova que prometo.
77
Castigando o estilo
Não freio a língua que me põe em crise
E dou aos sentimentos fluidez.;
Assim verá o leitor como se fez
Para que o verso nunca paralise.
O tópico das rimas outra vez
Requer que o meu melhor se realize:
Não há como fugir desta reprise
Que cansa o bom leitor, se for freguês.
Se o pensamento exaure a convivência,
Na sutileza aguda destas trovas,
Transforma, coração, tua paciência
Em métricas poéticas mais novas
E dá a quem te ler total consciência
De como são tremendas tuas sovas!
78
Lição de pachorra
— De novo, não! — reclama o caro amigo
Que atende ao compromisso de servir,
Sabendo muito bem o que há de vir,
Nos versos tardos, mancos, sem perigo.
Agora, eu já não posso, Wladimir,
Deixar de demonstrar como castigo
O estilo, quase sempre muito antigo
Mas desejoso e pronto a progredir.
Nos dois tercetos, primo numa prece
E apelo para os mestres, sem vergonha
De retirar do escuro, em que enegrece,
Para mostrar ao povo, a carantonha:
Jesus me ajude agora que não cesse
A fé de terminar sem vil peçonha!
79
Sem atropelo
Disponho de algum tempo p’ra poesia
E levo muito a sério o compromisso:
Talvez possa compor melhor que isso
Que pensa o bom amigo, em fantasia.
Mas tudo quanto faço é meu serviço,
Ofício e obrigação em harmonia,
Já que, por ter talento, não daria
P’ra dispensar, em nome do castiço.
Assim, a velha forma em que componho
Me põe bem à vontade junto ao médium:
Fazer uma obra-prima eu já não sonho,
Como também não quero nenhum tédio.
Então, peço ao meu povo que, risonho,
Co’amor reze uma prece: o bom remédio.
80
Eu sofro, tu sofres...
A rapidez do verso me permite
Seguir adiante um pouco mais na prova,
Realizando o tema numa trova
Que tem o desvendar como limite.
Talvez a rima não se julgue nova,
Nem minha idéia no total transmite,
Mas que fazer se o texto que se omite
Vem declarar que estou em funda cova?
Por isso é que te peço, bom amigo,
Que faças já por mim grande favor,
Fugindo de criar maior perigo,
Dizendo que me lê com tal pavor,
Que a tua vibração é o meu castigo,
Quando de ti desejo paz e amor.
81
Sublime decisão
Não queres perder tempo cá comigo?
Devolve à prateleira o livro já:
O pó que cobre os outros não está
Querendo ser banido desse abrigo.
E se tiveres uma idéia má,
Querendo ver no cesto o humor antigo,
Escuta, então, primeiro, o que te digo:
Para enterrar bem fundo, eis minha pá!
Se te agradar, porém, o texto louco
E te deixar propenso a ler bem mais,
Suspende esta leitura por um pouco
E reza uma oração pedindo paz:
Nenhum bom protetor, enquanto espouco,
Há de dizer que tu te perderás.
82
Resignado tema
Não vou participar muito à vontade,
Sabendo quanto é feio o verso meu.
Mas, pelos bons conselhos que me deu,
O mestre quer que teça algo que agrade.
Então, vou repetir que o bom Judeu
Ensina, exemplifica, persuade,
Mas nunca por escrito, pois não há-de
Permitir que lhe zombe algum ateu.
Por isso, quanto escrevo me arrependo,
Porque deixei na Terra a minha argúcia,
Em trovas de labor mais que estupendo.
Agora, eu já me perco em vil minúcia
Da rima que me traz mau dividendo,
Distante de causar maior fidúcia.
83
Algum lucro
Quisera deixar claro que me alegro
Com o que faço aqui, meio à surdina.
O povo que me lê nem imagina
Os males que, nas rimas, desintegro.
Então, mais me contento, se termina
O texto co’as palavras com que regro
O tema que se funde, quando enegro
Os versos pela dor que se examina.
É que também a forma me consola,
Embora o resultado venha tardo
P’ra quem não trabalhou e mais se amola,
Porquanto, ao ver a trova, inda mais ardo
De retirar coelhos da cartola,
Amenizando assim meu grosso fardo.
84
Poética promessa
Ao retirar-me, sinta, companheiro,
O quanto benefício me prestou:
Não é que tenha dado um belo show,
Mas tudo quanto faço é o que requeiro.
O tempo muito rápido escoou
E fiz um verso lépido e ligeiro.
Bem sei que aqui não fui, no amor, primeiro,
Mas quero acreditar que bem estou.
A trova toca fundo e me assegura
Que posso progredir em meu trabalho,
Embora a rima esteja tosca, impura,
Tornando o meu leitor, tolo espantalho.;
Minh’alma, todavia, crente, jura,
Que o verso não será só quebra-galho.
85
Em confiança
Navego pelas águas mais profundas
Dos meus conceitos tolos e cediços,
Portanto, ao enfrentar meus compromissos,
É justo que me acertes nas carcundas.
Espero vir prestar alguns serviços,
Ainda que não queiras nem refundas
Os versos, no temor de fortes tundas,
Que os termos eu expresso com feitiços.
Mas, se tiveres tu melhor conduta
E me julgares mesmo um pouco sério,
Atiça o teu espírito que a luta
Começa, assim que chega ao cemitério
O gajo que resiste, à força bruta,
A doce inspiração de um refrigério.
86
Estribilho salvador
Duvido que te traga, um dia, paz
O verso que se mostra tão aflito,
O qual me soa agora como um grito
Mui pouco próprio, sério, bom, audaz.
Eu fico a circular e nunca agito
A estética figura com que irás
Me atribuir a posse de eficaz
Recurso ascensional de um nobre rito.
Mas, mesmo assim, prossigo nesta trova,
Sabendo que o ideal sempre renova
A fé com que componho os versos meus.
É quando tudo está pegando fogo
Que eu lanço pelo espaço este meu rogo,
Pedindo proteção e luz a Deus.
87
Voltado para o outro
Conheço muito bem os meus limites,
Espero que me entendas, caro amigo,
E sigas na poesia assim, comigo,
Para que aqui no etéreo tu me imites.
Mas não no inteiro esforço, pois consigo
Apenas ser sofrível nos sorites,
Passando estes meus versos por convites,
Pois corre quem compõe grande perigo.
Assinalar a crise é ponto falho,
Se for para tornar o amigo triste.
Assim, quando a alegria mais espalho,
Bem vejo que o leitor não me resiste.;
Portanto, esteja atento, que embaralho,
Quem ri e quem me põe o dedo em riste.
88
Muito trabalho para nada
Eternamente é pouco p’ra quem sofre
Pensando que jamais irá salvar-se.
É que a noção celeste da catarse
Parece presa em forte e triste cofre.
Quem vem para a poesia sem disfarce
E tenta que o seu verso desenxofre
As mágoas que armazena, sem que gofre
As nítidas nervuras, não vai dar-se.
E quando é misterioso o seu dizer,
Na busca alucinada pela rima,
Resulta que não cumpre o bom dever
E não demonstra aos outros sua estima:
O máximo que alcança é ter poder
De sugerir na trova que sublima.
89
A solução sem soluços
Não quero pôr em dúvida a esperança,
Nem vou deixar a trova sem resposta.
Eu sei que existe sempre alguém que gosta
De examinar um verso em que se cansa.
Mas como melhorar quem mais se encosta
Nos lídimos prazeres desta dança
De pensamentos vãos de Sancho Pança,
A reclamar do mal que o Mestre arrosta?
Assim é que prefiro me esbaldar
Nas rimas mais felizes destes cantos
Em que todo o serviço é devagar
E ficam mais distantes os meus prantos:
Estive orando ao Pai aos pés do altar,
Enquanto ganha a rima seus encantos.
90
Desconsidere os defeitos
Iluminado estou e já não sinto
O sofrimento atroz da escuridão,
No entanto, este meu verso, dir-me-ão,
Leva a pensar o povo que lhe minto.
Então, ponho na rima o coração
E digo as minhas frases por instinto,
Para provar que tenho mui sucinto
O tema desta luz, que trago em vão.
Padeço p’ra compor um verso leve,
Que a trova que complica me enternece.
Mas tudo vem provar como se deve
Colher o fruto doce desta messe.
E, se não for agora, é para breve
O resultado azul da minha prece.
91
Sem arreliar
Não posso interromper o meu ditado,
Depois que comecei a solfejar:
Embora tudo diga devagar,
Não quero ver-me posto ali de lado.
Eu sei que não é meu este lugar,
Porquanto é muito pobre o tal recado
Que trago já bastante preocupado
Co’a negritude densa em todo o ar.
Mas, como o verso pronto me estimula
A dar de mim bem mais, a cada rima,
Aumento o meu poder, porquanto azula
O toldo que protege quem me estima,
Crescendo as prescrições da minha bula,
Mas longe de se dar em obra-prima.
92
Objetivo especificado
Responsabilidade não se aprende
Senão com muita luta pela vida.;
No etéreo, quando o mestre nos convida,
No coração, o tema logo acende.
A obrigação estando já cumprida,
A gente vê que a lide muito rende
E, embora em traquinagens de duende,
A trova encontra a forma e convalida.
Assim, se de permeio o verso glosa
O labutar tremendo de quem deve,
A rima há de se pôr mais glamourosa
E o texto dá notícia sempre leve,
Para fazer quem leia mais a prosa
Um bom leitor da rima, dentro em breve.
93
Prevenindo acidentes
Não sei se trago à luz o ensinamento
De que mais necessita o meu leitor.
Esforço-me, contudo, ao vir compor,
Para evitar que falhe este momento.
Bem sei que devo a todos dar amor,
Porquanto o meu sentir assim aumento,
O que me faz à fonte vir sedento,
No bom desejo de mostrar valor.
Mas já critico a rima e me pergunto
Se devo vir tão cedo aqui ditar,
Por repetir na trova o mesmo assunto
Que faz a quem me leia divagar,
Pensando se se ocupa o meu bestunto
Das preces ao Senhor, aos pés do altar.
94
Cheio de dedos
Não peço que o meu médium fique mais,
Porquanto sofre a dor desta demora.
Não chega a lastimar, pois sabe agora
Que o bem se faz assim, o bom rapaz.
Mas desconfia muito que aqui chora
Quem vê que, nos seus versos, se desfaz
A simples esperança de ter paz,
Depois que tanto empenho aqui deplora.
É claro que não posso reclamar,
Para não ser injusto nem maldoso.
Se estou como um macaco no bazar,
A mim me cabe a culpa, pois a trova,
Que deveria dar-lhe apenas gozo,
Irá tornar-se a dúvida mais nova.
95
Salada espírita
Jesus já não separa mais, mas une,
No espírito imortal além da Terra.
O homem continua sempre em guerra,
Pensando, cá no etéreo, estar impune.
Ser sábio e ser injusto é quem mais erra,
Pois conhecer a dor não deixa imune
De resgatar os crimes, já que zune
No ouvido o grito atroz, que nunca emperra.
Então é trabalhar em prol do irmão,
Deixando falar alto o coração,
No cumprimento sério da doutrina.
Se conhecer se deve em profundeza,
Também o sacrifício junto à mesa
Compensa a insuficiência que azucrina.
96
Ouça quem tem ouvidos
Costumo progredir na minha rima,
Oferecendo tópicos de luz,
Mas por citar Kardec e assim Jesus,
Pois tudo quanto faço bem se arrima.
Enquanto este poema se reduz
A versos tão pequenos, mais me anima
O resultado alegre que me amima,
Nas ânsias de quem porta a sua cruz.
Um bom conselho tenho ao meu amigo,
Para evitar o que ocorreu comigo,
Que disparei, covarde, pelo etéreo:
É pôr no coração a prece amena
Que induz a mente trágica e serena
A culpa que escapou do cemitério.
97
Não há como fugir
Não quero esmorecer o meu leitor,
Mostrando-me perverso nesta trova,
Mas, como a rima nunca se renova,
Há de julgar ser fácil vir compor.
E mexe-se um cadáver lá na cova,
Mais outro, outro enfim, pois cada autor
Encontra algum motivo superior,
P’ra criticar a rima que corcova.
Aí, fico pensando ser melhor
Reproduzir os sons mesmo de cor
Que li nos textos bons enquanto vivo,
Porém, o mestre amigo impõe a forma,
Para fazer valer do etéreo a norma
De orar para pedir um corretivo.
98
Na antevéspera do Natal
Valei-me, Senhor, e me dai harmonia,
Que cante este nauta as estrofes do amor,
Que tenha piedade e respeito ao leitor,
Que aceite a justiça da dor que se adia.
O gozo do verso me faz criador.;
Em todo o meu ser, deposito alegria,
Mas tudo o que trago jamais poderia,
Sem vossa atenção, vivenciar e compor.
Natal que festejo nas graças do bem:
Os sinos repicam no meu coração
E posso abraçar este irmão que aqui vem
Juntar-se comigo nas bênçãos do pão
Que o Mestre Jesus ofertou a quem tem
A paz, entre os homens que se elevarão.
99
Por não temer a morte
Em vão clamei o nome do Senhor
E fiz promessas mil de perfeição.
Bem sei que muitos mais também dirão
O quanto o desespero os fez compor.
É que nós não soubemos como é vão
O sofrimento isento de pudor
E desprezamos, por não ver valor,
A lei que nos envolve o coração.
Assim, este poema já não prima
Em pôr à mostra o amor que tem Jesus,
Porque me preocupa mais a rima
E menos o levar adiante a cruz.
Mas sempre, no final, se reanima
O grupo que, no verso, vê a luz.
100
Contrastante visão
Vitrine das vitórias desta vida,
Os versos se transformam em poesia,
Mas quando o amor enfeita a melodia
E o bem à paz de Deus também convida.
Bem sei que já não tenho essa harmonia
Nem primo, na beleza comovida,
De emoldurar de luz minha sortida
Aos campos cá do etéreo, neste dia.
No entanto, tenho pronto o pensamento
E faço desta métrica o retrato
De alguém que se perturba, quando aumento
A fantasia e troco o espalhafato
Por um entrecho básico mais lento,
Impróprio para o tema que destaco.
101
Para confundir
Não quero perturbar o meu amigo,
Deixando em meio o verso que hoje faço.
Por isso é que aproveito o seu cansaço,
Para ditar-lhe rápido este artigo.
Capricho aqui, porém, no meu compasso,
Que a luta é permanente em seu castigo,
Que os homens que me escutam já fustigo,
Levando ao seu saber a dor que passo.
Então, vão perguntar como é que irão
Deixar de aqui sofrer, em rude verso,
À vista de quem rima à perfeição
Para tornar o etéreo mui perverso,
E não com mais amor ao pobre irmão
Que está na escuridão bem mais imerso.
102
Solene requisição
Querias desarmar tua barraca
E ir embora logo para os teus,
Mas não gostei de não dizer-te adeus,
Por isto esta poesia, embora fraca.
Espero pelas bênçãos já de Deus,
Porque meu coração na fé destaca
Que tens por nós amor que o bem emplaca
Ao dar-nos a feição de cireneus.
Prejulgo que terás algum trabalho
E ponho a funcionar a melhor rima,
Porém, um pouco ainda eu me atrapalho,
Pedindo-te que dês a tua estima
Em forma de oração, pois agasalho,
No fundo de minh’alma, a dor que intima.
103
Preciso melhorar
Sustento que o meu verso não critica
O bom leitor que vem para saber
Quais são seus compromissos de dever
E julga, desde logo, a rima rica.
Mas, se ficar na forma, a resolver
Se o mesmo cá faria pela dica
Dos temas que componho, aos quais se aplica
Um pouco do que sabe ter poder,
Então, vai concluir que é mui maneira
A vida de quem sofre e já se expressa
Trazendo o seu exemplo nesta esteira.
Depois, é só seguir, sem muita pressa,
Que o coração não manda que requeira
Que o seu leitor lhe faça a tal promessa.
104
Eu bem que avisei...
— Preciso completar mais um soneto? —,
Pergunto ao mestre quando deste aviso
De que mais um pouquinho de improviso
Não vai tornar o tom perverso ou preto.
Contudo, ao caro médium, mais juízo
Lhe peço, quase sempre no quarteto:
De pau há de ser sempre o rude espeto,
Na casa do ferreiro.; e o tom repiso.
Sinceramente, estou, neste alvoroço,
Lutando p’ra que a rima não destoe,
Lembrando que não tenho além dum osso,
Lamúria que não ouço, caso soe
A prece, num final mui curto e grosso,
Inda que o caro médium me abençoe.
105
Feliz ano novo!
Estampo nestas linhas meu sofrer
E digo a quem me lê que tenha fé.
Talvez inda eu não saiba como é,
Mas tudo se resume em ter poder.
Estive em permanente cré com cré,
Na escuridão dos males, pode crer.;
Agora me disponho a tal dever,
Trazendo o coração sem rapapé.
As coisas são perfeitas para os bons
Que põem nas atitudes o evangelho.
Os que repetem sempre os mesmos sons
Mais devem dar de si, na confiança
De transformar em novo o tema velho,
Sem medo de voltar a ser criança.
106
Não podia ser diferente
Não posso desandar em versos feios,
Na derradeira trova desta gente.
Bem sei que hão de dizer que, finalmente,
Virão outros poetas sem rodeios.
Mas devo agradecer e ir em frente,
Que as lágrimas promovem titubeios
E a turma se preocupa com os meios
De pôr junto ao leitor algo que alente.
Também não vou ferir o bom princípio
De sustentar que a rima é de respeito,
Embora esteja assim cheio de rípio
O livro que se fez e foi aceito,
Por descrever o nosso município
De construções rupestres sem defeito.
107
Não podia mesmo ser diferente
Não posso sugerir que o meu amigo
Dedique muito tempo aos versos meus.
Se vim dizer-lhe aqui meu triste adeus,
Agora retifico e a mais me obrigo.
Esperto, eu rogo a bênção já de Deus,
No aguardo do perdão ou do castigo,
Porquanto esta poesia ao modo antigo
Se presta a quem mais sofre e aos corifeus.
Se existe livre-arbítrio para mim,
Não há de ser no verso em que claudico,
Que a prece que inventei, por ser ruim,
Não digo, porque o mal não justifico.
Eu peço apenas que me digam sim,
Se lhes rogar que rezem por um tico.
108
O que deveria estar no princípio
Castiga o teu estilo e faze o bem
Em versos de perene criação,
Mas não pretendas pôr o coração,
Se não te entregas todo a mais alguém.
O amor nesta poesia é condição
Do permanente enredo que retém
A mente de quem lê, sem tal vaivém,
Na dúvida que traz o mau refrão.
No fim, aplica o verbo em doce prece,
Tornando a melodia prazerosa,
Que o bom, em sendo bela, não se esquece
Da forma que contém o dom da prosa
E a mais pura função de dar à messe
A luz do pensamento que se glosa.
109
Lamento sem dor
Não tenho condições de melhorar
O nível das poesias que componho:
São tolas as imagens com que sonho
Prover este soneto singular.
Aí, o meu irmão fica tristonho,
Ao ver que o meu desprezo não tem par
E se reflete bem neste bazar
De rimas, com que tremo e me envergonho.
Mas vou levando os versos mesmo assim,
Sem desespero ou dor pelo fracasso,
Porque nem sempre é tudo tão ruim.;
Nem por jogá-los fora me desgraço:
Se alguém orar feliz, pensando em mim,
Seguro o sentimento ali, no laço.
110
Com a mente aberta para o bem
Não devo desculpar-me pela rima,
Pois devo prometer fazer melhor:
A culpa dos meus crimes sei de cor,
Mas um verso bem feito mais me anima.
Assim é que procede, em tom maior,
Ficando para trás quem se lastima,
Aquele que deseja ver na estima
A mão de Deus, em cada pormenor.
Bendigo este momento de poesia
E peço aos bons amigos compreensão:
Por certo bem melhor aqui faria
Qualquer que se atrevesse no refrão,
Mas, como estou em fase de euforia,
Espero que os defeitos perdoarão.
111
Vamos lá, companheiro!
Nostálgica harmonia em minha trova
Se põe, pelo desejo de acertar.
Então, quando me aceitam no seu lar,
O amor das boas almas se comprova.
Há muitos que renegam meu cantar,
Dizendo mal saído cá da cova.
Há outros que o mistério, causa nova,
Desperta para o bem complementar.
Assim, vamos levando a nossa sina,
Pois a mediunidade serve aos bons,
No amparo dos mortais para a doutrina,
Que muitas vezes tem os nobres sons
E as luzes, que o poeta dissemina,
Em versos agridoces, quais bombons.
112
Reação perceptível
“Estúpido, imbecil, que mau poeta
Pretende vir pregar como Jesus?
Espero que carregue a negra cruz
P’ra longe dos mortais que ele alfineta.
Se ao menos nos trouxesse alguma luz,
Noção duma doutrina mais completa,
Quem sabe a algum leitor que se encasqueta
O sofrimento alheio ou seu traduz?”
Assim pensava alguém desprevenido,
Quando pegou na estante o meu soneto:
“Quem sabe esteja certo, mas duvido.”
E leu de cambulhada a trova esperta,
Sentindo que o rubor se tornou preto:
O sentimento mau se trai, desperta.
113
Descontente? Por quê?
Preciso vir compor com mais modéstia,
Que os termos eruditos muito assustam:
Se ler e interpretar bastante custam,
O que se irá dizer de sua réstia?!
As rimas que elegi na forma incrustam
Os elementos todos da moléstia
Que acuso mais acima, zé-da-véstia
Em que me transformei e os tons não sustam.
Agora ponho um fim e me retiro,
Descrente de ter dado o meu recado.
O mestre vai pedir-me dar um giro
P’ra saber o que escreve do meu lado
O companheiro triste, em seu suspiro,
Pois não consegue a rima, desolado.
114
Reminiscências úteis
As trouxas que carrego desde a Terra
São pesos da consciência maculada.;
No dia em que sentir não levar nada,
O tópico da morte o etéreo encerra.
Mas vou levando a trouxa amarfanhada,
Que a força que a sustenta não me emperra
Para travar, no coração, a guerra,
Que a evolução jamais cá retrograda.
Assim é que versejo e mostro a trova,
Para que o bom leitor já se previna,
Porque, durante a vida e além da cova,
Hão de valer-lhe os pontos da doutrina:
Aí, o coração no bem se prova.;
Aqui, toda a verdade se ilumina.
115
Bendita confissão!
Não tenho permissão para poesia
Que traga sofrimento em vez de amor.
Se a dor cá descrever em meu compor,
Não hei de repartir minha alegria.
No entanto, rogo a Deus bem mais valor,
Porque melhor qualquer aqui faria,
Bastando que se esqueça, neste dia,
De dar à trova o tom de seu palor.
Também, não devo refletir que minto
Para alegrar apenas quem me lê,
Mas devo confiar no bom instinto
De quem não vê mas assim mesmo crê:
Agarre minha mão no labirinto,
Que escreverei um verso p’ra você.
116
Sem censura
Conduzo o pensamento para Deus
E o sentimento fica em alvoroço:
É como se enfadasse o belo moço
E desse à namorada um triste adeus.
Saí muito molhado desse poço
Em que caí, ao desfazer nos meus:
O mesmo é imaginar como os ateus
Fariam sua prece sem endosso.
Mas vou levando a rima a um certo fim,
Porquanto co’as palavras tenho jeito.;
O sentimento, sim, é que é ruim,
Que o pensamento chega a ser aceito.
Então, peço que rezem mais por mim,
Por ter sido escolhido e não eleito.
117
Lenir cantando
Pretendo, ao vir trazer a minha trova,
Que o povo se desperte para o amor,
Mas, como sei mui fraco o meu compor,
O medo de ferir-me se renova.
Atrevo-me, porém, mesmo inferior
O verso que o meu mestre não reprova:
Se não castigo a rima, dou-lhe a sova
Que a deixa envergonhada, sem valor.
Contudo, alguém dispõe que tenho jeito
E diz que se emociona com meu verso.
Tolinho, me convenço e logo aceito,
Sem ver quanto este tema sai perverso:
O texto se mantém depois de feito.;
O coração na dor se põe imerso.
118
De volta ao ofício
Sofrer, sofri.; mais sofro quando penso
Que o texto que hoje trago não tem brio,
Que causa no leitor só calafrio,
Que é muito o suspeitar que alguém convenço.
Exige-se que aceite o desafio
Quem desejou no verso ver-se imenso.
Agora que percebo o contra-senso,
Não posso abandonar o passadio.
Aí, componho a trova, mesmo assim,
Mas sem mentir ao povo que me lê,
Porque seria, então, muito ruim
Acrescentar um mal em comitê,
Que tanto esforço, tenho para mim,
Qualquer esquecerá.; menos você.
119
Explicação necessária
A luz que me ilumina vem do amor
Que me dedica o mestre e companheiro,
A quem sempre perdão é o que requeiro,
Ao vir estes poemas recompor.
Ocorre que o sentir chega primeiro,
Para depois surgir este labor:
O tema há de ser sempre superior
Aos versos que se formam por inteiro.
Explico a minha idéia mui sutil:
É que a expressão do texto vira fóssil,
Enquanto os rebuliços vão a mil,
No coração de quem se põe à messe.
O sentimento chega a ser indócil.;
O bem se faz perene pela prece.
120
Esforço-me, contudo...
Estimo que os amigos que me lêem
Estejam preparados p’ra leitura,
Que o texto, quando rima, mais depura
O espírito de quantos não nos vêem.
Mas quando a trova vem muito insegura
E alcança uns olhos dúbios que não crêem,
Aí, devo pedir-lhes p’ra que dêem
Um pouco de esperança a quem cesura.
Assim é que fabrico os versos meus,
Pensando em que me lê e mais se agrada,
Pedindo a proteção do amor de Deus,
Que traga mais sentido à minha estada.
Ao lhes agradecer e dar adeus,
Não quero ouvir dizerem-me: — Por nada!
121
Espremendo as rimas
Espero, com paciência, este momento,
Mas, ao chegar aqui, fico nervoso:
Eu sei que é mais feliz quem sente o gozo
De transmitir o texto em bom assento.
Então, rascunho a trova em antegozo,
Despreocupado até co’o sentimento
Que deverei prever, pois não agüento
Imaginar-me afoito ou vitorioso.
Não vou deixar ao léu qualquer palavra,
Na busca que se faz ao dicionário:
Do que deixar escrito é minha a lavra.
Inda que o tema seja extraordinário,
Não quero suspeitar que se azinhavra
O derradeiro termo solidário.
122
Quase um agradecimento
Um certo humor se deve de imprimir
Quando o roteiro inteiro periclita,
Mas toda rima aqui se faz bendita.
Se estimular alguém no devenir.
O gajo que aqui glosa mais medita
Nos termos que prejulga reunir.
Aí, vem se encontrar com Wladimir
E põe em pratos limpos sua escrita.
Mas nunca está contente o caro médium,
Que quer fazer o máximo por nós:
Se a rima está doente, tem remédio
A oferecer a quem lhe pede a voz.
O que mostra de bom, em nosso assédio,
É registrar os sons sem nada após.
123
Pegando gosto
Exige-me este médium que lhe escreva
Mais um soneto amigo e promissor.
Então, porque se põe ao meu dispor,
Pede o instrutor que a um verso mais me atreva.
Assim é que trabalho com amor
E agarro firme do espigão na esteva,
A revolver o tema, sem que deva
Deixar transparecer o meu labor.
Após os dois quartetos, sinto a paz
De quem já superou os seus limites.
Registro nos tercetos que jamais
Poderei permitir-me outras sorites,
Além de borrifar, entre os meus ais,
Que aumenta este prazer meus apetites.
124
Toda ajuda é bem-vinda
Um dia, tudo vai ficar mais claro
Na mente do que agora inda duvida.
Seria mui legal fosse na vida,
P’ra dar aos feitos maus um bom reparo.
Mas doutro lado existirá guarida
E explicação completa e forte amparo
A quem não soletrar, o que é bem raro,
As letras do evangelho, a toda a brida.
Então se vai lembrar deste poema,
Que alerta e que dispõe como sistema
As normas de conduta e diretrizes.;
E todos vão saber como se deu
O efeito desta rima do amor meu,
Pois quero que se evitem duras crises.
125
Sem olhar para o relógio
“Preciso concentrar-me no trabalho”,
Há de pensar o médium quando cansa,
Pois sempre há de existir certa esperança
De receber do além um quebra-galho.
Mas, se o quarteto emperra e não avança,
E se transforma a trova em espantalho,
É justo que medite: “Agora eu falho,
Mas dou de mim bem mais, se o bem se alcança.”
Eternamente é pouco para o amor
Que Jesus Cristo pede a todos nós.
Então, quando ajudamos a compor,
Não deve o sacrifício ser atroz:
Vamos pedir a bênção ao Senhor,
Que os versos dão mais força à nossa voz.
126
Poesia e mistério
Existe uma palavra tão bonita
Para mostrar que estou muito feliz,
Mas como vou dizê-la, se não fiz
O texto em que a tal rima se habilita?
Fornece-me o mentor a diretriz,
Dizendo que a leitura fica aflita,
Se prometo e não cumpro, pois se agita
O coração que aguarda, vis-à-vis.
Por isso, mais me atrevo e vou em frente,
Ousado ao desvendar o meu segredo,
Mas peço ao bom leitor que, simplesmente,
Esqueça de enristar-me com seu dedo,
Que o termo que me agrada e me desmente,
Eu disse aí no meio, muito a medo.
127
Navegar é realmente preciso
Se o tema do soneto logo acima
Ficou meio encoberto e sem sentido,
Procure, bom amigo, mas duvido
Que encontre o tal conceito numa rima.
É que a expressão do amor não dá ouvido
A uma só razão, que o bem se estima
Não ser um compromisso, pois sublima
O todo, e não a parte com que lido.
Por isso, está escondida a tal lição
Que pôs meu coração a bater forte.
Talvez seja porque não disse não
Ao mestre, que me fez mais claro o norte.
Aí, os meus leitores saberão
A quem mostrar o visto e o passaporte.
128
Cheio de medo
Não vou inaugurar uma poesia
Que traga novos rumos literários.;
No entanto, os meus recursos, sendo vários,
De alguma forma inova esta agonia.
Espero revelar os meus calvários,
Expondo as dores que jamais diria
Na escuridão da noite em que jazia,
Dos versos a fazer confessionários.
E peço-lhe, leitor, que me compreenda,
No desespero mudo em que se encontra:
Ao vir gritar de dor, retiro a venda
E vejo o mundo todo sendo contra
O meu projeto métrico, que agenda
A peripécia fútil dum bilontra.
129
A pressa explica a imperfeição
Esqueça, caro amigo, que hoje vim
P’ra formular hipótese poética:
Bem sei que a turma toda, sendo cética,
Espera que esta trova chegue ao fim.
Mas não contenho a fúria catalética,
Terminação impávida e ruim,
Que fala mal do povo e mais de mim,
Rascunho muito feio, sem estética.
A dor duma poesia se compreende,
Expondo este mortal desprendimento,
Pois deverá passar como duende
Quem desejar tão-só fazer figura,
Que é como o verso pobre não agüento:
Faça um soneto só, que o mal não dura.
130
Impropriedade conjuntural
Mantenho a minha rima em alto nível
E dou de mim bem mais a cada trova,
No entanto, estando perto assim da cova,
O fato se comprova como incrível.
Não devo estimular a forma nova,
Ao vir tão ligeirinho, ultra-sensível,
Expor o que p’ra muitos é sofrível,
Dizendo que hoje leva rude sova.
A cada qual segundo o seu valor:
Assim se determina em justa lei.
Por isso me disponho a vir compor
Nos termos mais perfeitos para a grei,
Que sofre hoje comigo o dissabor
De ver quanto, nos termos, desandei.
131
Desafio improdutivo
Se pego no batente e me distraio,
Realizando a trova bem maneira,
Não é porque meu mestre assim requeira.;
Mas é porque tais versos muito ensaio.
Espalho pelo mundo a sementeira
Das dores improváveis num desmaio,
Porquanto a lógica dos textos vaio,
Se os benefícios chegam de primeira.
Então, complico as rimas e atrapalho
O bom leitor amigo que se enrola
Nos termos desconexos do espantalho.
E quem jamais irá passar-me a bola,
Porque não lhe dou pronto o quebra-galho,
Que passe alguns instantes nesta escola.
132
Sem sal mas com pimenta
Conheço os meus limites nestes temas
Que devo oferecer à luz do povo,
Porém, a planta é nova e sem renovo
Que possa elucidar os tais problemas.
Muita galinha eu tenho, e pouco ovo
A dar para a omelete dos sistemas,
Pois são as deficiências tão extremas
Que o couro não me serve de retovo.
Mas vou levando a trova mesmo assim,
Na ajuda que recebo de quem sabe
Que o verso se repete e é tão ruim
Que, mal-e-mal, na rima ainda cabe,
Na forma que diz tanto sobre mim,
Posto do conteúdo não me gabe.
133
Superando a dor
A média das estrofes que fabrico
Não passa de uma dez, a cada dia.
Se fosse dedicar-me mais, faria
Bem menos do que tenho e não publico.
É que são tantas trovas, todavia,
Que leio dos irmãos, um bem tão rico,
Que penso não poder deixá-lo um tico,
P’ra burilar nos versos a harmonia.
Mas a poesia aqui é diferente
Das que transmito ao povo que me lê:
São versos de intenções que a gente sente.;
São rimas do trabalho que se vê
No dom que gera amor, eternamente,
Assim como eu faria por você.
134
Sem injunções misteriosas
Costumo agradecer a cada rima
Que passo ao meu irmão aí na Terra,
Mas, no meu coração, tudo se encerra,
Ao receber de volta a sua estima.
Então, grave conflito a alma aferra,
No dúbio versejar, que não me anima,
Que as dores que o poeta mais sublima
São as que causam sempre triste guerra.
O que acontece em mim bem transparece
Nos hábitos que julgo esmaecidos:
É como vir colher de farta messe
E achar os bens de amor não devolvidos.
Aí, resta pedir excelsa prece,
Para ganhar a trova os seus sentidos.
135
Brincadeiras à parte...
Preciso resguardar certa postura,
Ao respeitar meu médium e parceiro.
Por isso, fique atento, eu lhe requeiro,
Enquanto dito a estrofe com lisura.
Porém, se não encontro por inteiro
O verso imaginado na estrutura,
Eu peço compreensão, porque me atura
Aquele que se vê leitor primeiro.
Assim, se lhe permito divagar,
Enquanto arranjo os versos na telinha,
Não posso vir ditar mui devagar,
Senão minha poesia não caminha:
Eu tenho permissão p’ra versejar,
Dês que lhe prove a trova sendo minha.
136
Agora é tarde...
Eu trago um só soneto p’ra ditar,
Em rimas muito fáceis e gostosas,
Pensando em nosso amigo, tu que glosas
O sentimento lúdico exemplar.
Bem sei que, quando é pobre, já não gozas
A métrica que imprimo ao versejar.
Então se torna triste este lugar
E as trovas que componho perigosas.
Mas hoje esta poesia não faz mossa
Nem prende o teu pensar nesta doutrina
Que surge do mistério e que se esboça
Como roteiro certo que ilumina
O meu caminho sórdido p’ra troça,
Tornando esta intenção menos ferina.
137
Versos cadavéricos
Aceita, bom amigo, que me vá
Deixando para trás um nobre aviso:
Se queres progredir em teu juízo,
Procura pelo bem no mundo já.
Mas, como tudo chega no improviso
De quem vem devagar de lá p’ra cá,
Arruma a cal, a cova e mais a pá
E joga no defunto, que é preciso.
Por certo, esta poesia não se ajeita
Entre o esplendor das rimas do meu povo
E morre de fraqueza ou de maleita,
Pois nunca sabe o morto, mesmo novo,
Que gosto tem a cal e se aproveita,
Deixando-se enterrar sem dar corcovo.
138
Sinceridade, sim, mas não muita
Na esfera em que reúno os meus amigos,
Encontram-se os desejos da verdade.;
Mas quem ouvir contar se persuade:
Conhece os seus percalços e perigos.
Por isso, são bem poucos os castigos
Aos versos em que o dom minh’alma invade
De resgatar do amor felicidade,
Conforme os sentimentos mais antigos.
Notícias todos temos dos caprichos
Que nos deixaram trôpegos no etéreo.;
Mas tudo queda claro nos pastichos
Em que o poeta torna o tema sério,
Querendo e não querendo os seus rabichos
Postos em rima rica e sem mistério.
139
Sazão de rimas
Olvido de um momento quase eterno,
Que a dor que já não sinto permanece
Nos termos em que digo a doce prece,
Por ter saído já daquele inferno.
Penumbra de minh’alma, a triste messe
Parece germinar no campo interno,
Semente que esqueci, no duro inverno,
E que, na primavera, reaparece.
Então, mesclo piedade e desafogo,
Na trova em que suplico compreensão.;
E os sons que já resultam do meu jogo
Aquecem e dão paz ao coração,
No aguardo dos bons frutos deste rogo,
No estudo que farei pelo verão.
140
Contra-senso aparente
É sério quando o médium participa
E põe o seu dedinho em cada rima:
Talvez a trova fique uma obra-prima,
Mas a consciência dele depois ripa.
Então, é bem melhor que a sua estima
Produza um coração da sua tripa,
Enquanto a mente sã o verso equipa
De termos que a bondade mais sublima.
Não fique a burilar, querido amigo,
Se o verso traduziu com mente aberta,
Sabendo que o melhor, tenho comigo,
É quando, ao se enganar, o gajo acerta,
Porquanto está fugindo do perigo,
Mantendo a alma presa mas alerta.
141
Que não se perca por esperar
Existe quem desista quando a rima
Não se apresenta boa desde o início.;
Há outros que mantêm aceso o vício
De tudo refazer, conforme o clima.
Eu peço humildemente, sem suplício,
Que a trova esteja isenta dessa lima,
Porquanto este poeta mais se anima
Ao ver o seu desejo em exercício.
É fácil desandar e pôr adendo
Onde parece frouxa a trova, e pronto!
Mas, se pedir o médium, logo atendo
E marco dia e hora para o encontro,
Pois tudo que acrescenta, num remendo,
Eu chego e, mudo, extraio o vil tolontro.
142
Reconhecidamente fraco
Não quero que me ouça quem falseia
A métrica dos versos desta esfera.;
Mas quero que não sofra quem nos leia,
Pois, ao chegar de volta, vira fera.
Então, quando se perde e se esperneia,
Dependurado e triste, já se espera
Que a trova que hoje existe, mesmo feia,
Um dia há de brilhar, jogando à vera.
Não tanto pelos versos que hoje faço
Se sente que o poeta sofre horrores,
Mas pelos sentimentos do pedaço
Em que me julgo preso aos tais amores.
Receba, então, confrade, aquele abraço
E pense em se inspirar noutros autores.
143
O dom da simpatia
Suporto muito mal a tua crítica,
Ó tu que não aturas minha trova.
Por ti, eu já voltava para a cova,
Debaixo de erosão pilotaxítica.
Mas como a rima é rica e se renova,
É bom que mudes tu a tal política,
Pois é duro sentir febre hemitrítica,
Ainda mais intensa como prova.
Eu digo porque sinto cá na pele
A crítica feroz que um dia fiz,
Sem compreender que o gajo não excele
Sem sofrimento atroz, caso, infeliz,
Se ponha a versejar crendo-se imbele,
Compondo a cada linha o que bem quis.
144
Vai a prima pomba...
Espero que o produto desta tarde
Agrade tanto o médium e o leitor.;
Que rezem para aqui vir mais compor
Este poeta que, de si, mui arde.
Se o resultado for inferior,
Eu peço que não façam muito alarde,
Porquanto não pretendo ser covarde,
Pois vou voltar com trova e com amor.
Assim, estando pronto o primo verso,
Ainda que esta rima se repita,
Não quero que o amigo fique imerso,
A refletir somente na desdita:
O bem, quando se faz incontroverso,
Obriga que se diga: — Obra bendita!
145
Catequese bilaquiana
“Ora, direis”, teu senso se perdeu
Nas dobras desse tempo que se esvai.
Quem não respeita o Filho nem o Pai
Nada apresenta certo como seu.
Em qual mistério se ocultou quem vai
Tornar mais crítico este texto meu?
Se não revelo aqui quem se excedeu,
Fica do avesso a colcha do meu ai.
Representar que estou bem de saúde
Talvez não ponha agrado em meu irmão.
Então, vou demonstrar não ter virtude
Apenas p’ra afagar meu coração,
Guardando para mim se o mal me ilude,
Deixando que o leitor faça o sermão.
146
Para ler como se fosse o primeiro
Considero-me, apenas, um poeta
Que escreve rimas sem estardalhaço,
Porém, em quase tudo quanto faço,
A prosa se desperta e o verso veta.
Às vezes, no conjunto do compasso,
Existe uma figura que completa
A idéia original, afim, correta,
E os sons não se dispersam pelo espaço.
Rimar, mesmo no etéreo, é forma artística:
Requer um bom estudo da estrutura.;
Possui virtude, dom, caraterística.
Assim, quando a poesia se faz pura,
Contendo no evangelho a beletrística,
Eu posso imaginar que alguém me atura.
147
Encantando o médium
Contenho-me nas lindes do programa
E passo ao médium meu mais segurança:
Sabendo que o soneto sempre avança,
Descansa a sua mente e não se inflama.
Não quer deixar morrer doce esperança
De se encontrar, talvez, com quem declama,
Porquanto o seu labor nos gera a fama,
Se alguém por nós orar feito criança.
Depois, resta cumprir o conteúdo,
Pois tudo na poesia é compromisso.
Por isso, o meu refrão jamais eu mudo,
Que o verso não se dá como um serviço
Encomendado a metro, espaço, estudo,
Conforme bem se vê quando enfeitiço.
148
Com ilusões
Preciso refrescar-me um pouco mais
Para sentir o gozo destes versos:
Não quero aqui fazê-los mui perversos.;
Não tenho o coração imerso em paz.
Percorro os mundos todos e universos
E ponho as dores nestes pobres ais,
Mas tudo o que consigo não me traz
A tal felicidade dos conversos.
Então, vou alegrar-me simplesmente
Por concluir a trova mui chinfrim,
Pois isto é que é se dar um bom presente,
Dizendo-me, nos íntimos de mim,
Que Deus é pai de amor, onisciente,
E deve de amparar-me, mesmo assim.
149
Atrevimento permitido
Jesus, meu grande amigo e companheiro
Nesta jornada grata aos pés de Deus,
Não ouça, se eu disser, algum adeus,
Na estrada em que meu dia vem primeiro.
Estou para pedir-lhe pelos meus
A quem a sua bênção mais requeiro.;
Depois, em tom modesto, já me abeiro
De lhe rogar amor aos fariseus.
Bem temo que o meu tema se desfaça
Na lógica dos doutos na doutrina,
Mas vou levar a termo esta ameaça
De desprezar os termos que me ensina
O mestre aqui da escola, pois a graça
Vem do perdão, no amor desta rotina.
150
Sempre falta alguma coisa
Estranha o nosso amigo que estejamos
Dispostos a ofertar-lhe o nosso verso,
Embora em tantos dramas venha imerso
Que os frutos pendem verdes destes ramos.
Mas tudo tem motivo no Universo,
De forma que o seu tempo não roubamos:
Apenas atendemos aos reclamos
De quem quer trabalhar sem ser perverso.
Devemos dar as graças por compor
A turma uma poesia tão astuta,
De modo a acreditar-se superior
Quem lê e não compreende a nossa luta:
Se tudo aqui fazemos por amor,
A trova é o pomo que hoje se desfruta.
151
Às vezes falta muita coisa
Duvido que se encontre um outro médium,
Na esfera da cidade em que hoje estou,
Que possa receber-me neste show
De trovas e de textos com tal tédio...
É claro que permito um simples ou,
Alternativa certa para o assédio,
Pois outro não seria o meu remédio,
Se diferente fosse do que sou.
Assim, burlo a aflição de vir ditar
Um tema que imagino no bestunto
E fico num contexto auxiliar,
P’ra denotar que existe um bom assunto,
Mui digno de assistir neste seu lar,
Depois que se enterrar este defunto...
152
Por que insistir?
Pareço desejoso de mais versos?
Então, apanhe aí uns de improviso:
Bem sei que desta trova não preciso,
Pois venho cá fazê-los tão perversos.
Pretendo demonstrar muito mais siso,
Conquanto ponha pontos controversos,
A ponto de apontar que vão imersos
Em brumas da consciência em prejuízo.
Por isso, deveria protelar
A vinda desta turma arruaceira,
Que traz inquietação para o seu lar,
Sabendo que tal feito, inda que queira,
Bem longe está de ser tão exemplar,
Mas perto de causar muita canseira.
153
Com o tempo contadinho
No dia em que falhar, não deve o médium
Ficar aborrecido ou mesmo triste:
Ninguém do nosso lado, dedo em riste,
Virá para acusá-lo, em louco assédio.
Devemos compreender que tudo existe
P’ra receber os dons do bom remédio.
É claro que dizemos não ao tédio,
Às vezes, a incluir na trova um chiste.
O amigo nos pergunta, muito ansioso,
Se tudo o que dissemos é verdade.
Então, como seria o nosso gozo
Se o texto refletisse só vaidade?
Precisa que haja amor neste antegozo
Do bem que o coração agora invade.
154
O morto-carregando-o-vivo
Não posso vir pedir que sejas puro,
Nem posso vir rogar que sejas bom,
Se não posso provar que tenho o dom
De pôr nos versos quanto estou seguro.
De tanto repetir o mesmo som,
Eu mesmo me convenço que o futuro
Há de me reservar um dia escuro
Em que trazer a trova é de bom-tom.
Assim é que o destino vence o medo,
Na relembrança viva do que foi
Apenas, no passado, um bom segredo,
Porque, no festival da dor que sinto,
A luta é por manter, bumba-meu-boi,
No renascer, também o amor extinto.
155
Convite à reflexão
Inspiro o teu desejo de melhora,
Amigo que me lê com atenção,
Ou simplesmente ouço que diz não,
Que o fato do crescer hoje demora?
Espero que compreenda o coração
De quem vem versejar longe da aurora,
Na escuridão do mal que oprime agora
A mente na inconsciência da razão.
Nem tudo está perdido para a trova,
Se incita o bom amigo a suspeitar
Que tudo quanto expresso é pura prova,
Falência e desconforto no seu lar.;
Porém, cada esperança se renova,
Se a rima que hoje faço não tem par.
156
Rimar também ajuda
Não nego o meu desejo de cumprir
As regras da poesia cá do etéreo,
Porém, devo dizer que o ministério
Se esconde lá nas dobras do porvir.
Recentemente, vim do cemitério,
Descrente do processo do servir,
Pois tudo quanto fiz p’ra evoluir
Se contrapôs, na Terra, a um mal mais sério.
Agora, tento estar bem prevenido,
Agindo em consonância co’a virtude,
Compondo apenas versos com sentido
Que não possa valer a quem os mude:
Assim, tenho consciência e não duvido
Que o bem que agora faço se amiúde.
157
A poesia é privilégio dos bons?
Cantar, cantei, e já me sinto rouco,
Que os cantos desencantam, se repito
O pensamento triste, tolo, aflito,
De quem vem duvidar do bem, um pouco.
O verso da poesia mais bonito
Afasta o pensamento muito louco
De quem se diz ouvinte e não amouco,
Pois quem deve de ouvir é quem mais cito.
E quem é que se dá a cada verso,
Na história permanente da poesia?
Aquele que verseja e vem imerso
Nas brumas deste tema que se adia,
Porquanto, se a suspeita é de perverso,
Não cabe nesta métrica e harmonia.
158
Preferes dar ou ensinar?
Pretendo que o soneto seja leve,
Porque não tenho muito que dizer,
Mas, como conquistar teu bem-querer,
Se tudo o que componho já prescreve?
Então, vou informar-te do poder
Que tem toda poesia quando, breve,
Comporta um pensamento que se deve
Deixar para o leitor desenvolver.
O belo, quando bom, é justo deixe
Algum trabalho alegre em teu bestunto:
Assim, a rima que te espera é peixe
E vem, sutil, p’ra completar o assunto.
Talvez possas pensar que é só desleixe,
Mas digo-te que o bem vai durar muito.
159
Lembrando Raul Pompéia
Polêmico, o estudante de Direito
Queria libertar da escravatura
As almas desse povo que enclausura
A fé no turbilhão do mal aceito.
Mas como há de tornar melhor, mais pura,
A turba que trabalha e sofre o eito
Da rejeição do branco, pois defeito
É como a cor da pele configura?
Então, volveu a raiva contra o rei,
Que descreveu tirano, em obra sua,
E deu ao povo ler, conforme a lei
De que, ferindo, o riso desvirtua.
Porém, depois que fez, chamou a grei,
E pôs, sem caridade, em vil cafua.
160
Onde ficou a inspiração?
Não vejo como possa vir ao posto
Sem demonstrar preparo p’ra poesia.
Mas, quando chego aqui, sei que devia
Ter estudado mais.; e vem desgosto...
Requeiro, então, ao povo que auxilia
Me dê sustento, amparo, luz, encosto,
Pois devo vir cumprir, sorriso ao rosto,
O tema meu sem não nem todavia.
O mais é só discurso e verso chocho,
Sem graça, fútil, vão, sem sentimento,
Conforme o som que espera não ser coxo,
Mas vem empertigado, se apresento
A minha fé na rima com muxoxo,
Para mostrar no verso o meu talento.
161
Halo de felicidade
É pena que não tenha o mesmo dom
De tantos que trouxeram suas rimas:
Eu sei que, bom leitor, tu desanimas
De sempre repetir-se o pobre som.
Queria demonstrar quantas estimas
Se encontram nestes versos de bom-tom,
Mas. como oferecer-te o meu bombom,
Se fazes teus regimes e sublimas?!
Preciso enveredar por outros temas,
Mostrando que Jesus nos deu lições
De como contornar estes problemas.;
Depois, devo ocupar a mente tua,
Enquanto juntos vão os corações,
Dizendo, com amor, que a trova atua.
162
Poesia e fé
Não quero negociar tua presença,
Fazendo algo que queiras ver escrito.
O mundo é muito vasto, é infinito:
Importa muito pouco que aqui vença.
Porém, se tu gostares, fico aflito
Ao ver quão pequenina diferença
Existe em cá trazer a benquerença
E assinalar o ponto como um rito.
Então, vou caprichar no meu versinho,
Mostrando que o refrão vem da pureza
De dar a cada ser bem mais carinho,
Na hora de sentir, cá junto à mesa,
Que estou trilhando certo o meu caminho,
Rogando ao bom Jesus por mais beleza.
163
É preciso ter calma
Convido o meu amigo a que me diga
Se tem algo melhor para fazer.
Receba aquele abraço e bem-querer
E vá para o trabalho a que se obriga.
No entanto, esta expressão não tem poder
De me afastar de vez da rude briga
Em que pelejo tanto, se periga
A trova que componho p’ra valer.
Jesus, o bem-amado, nos promete
Que o bem se espargirá por todos nós,
Porém, não diz jogando-nos confete,
Porquanto quer que ouçamos sua voz
O tempo todo em que, sem paz, se vete
O verso quando feito tão atroz.
164
Desafio
Preciso de mais tempo p’ra pensar
No texto desta trova que inicio.
Tivesse mais valor, progresso e brio,
Viria aqui compor algo exemplar.
Mas, como melhorar, se me avalio
De forma a todo bem depreciar?
Então, venho pedir que, neste lar,
As coisas não se deixem por um fio.
Jesus é quem eu vejo muito acima,
Estrela luminosa deste verso,
Composto p’ra rogar a tua estima,
Sem outro pensamento controverso,
Pois tudo quanto cabe em minha rima
Se encontra no infinito do universo.
165
As asas da razão
Não sei se o meu amigo me perdoa
O fato de não vir com soluções.
Se tudo se resume em tais senões,
Eu acho que a poesia inda está boa.
O sentimento pede às emoções
Que levem asas à razão que voa.
Qualquer promessa aqui é coisa à-toa:
Não pode pôr em guerra os corações.
Do modo pelo qual eu me apresento,
Suspeitará o leitor que tudo enxergo,
Mas devo de exprimir o pensamento
De que o meu verso traz o bem que albergo
No fundo de minh’alma, embora lento
Lhe chegue o meu refrão, que não postergo.
166
O poeta é um sofredor
Sensato, o nosso amigo nos espera
Co’o coração tranqüilo, a mente em paz,
Sabendo que a poesia que hoje faz
Há de ferir os temas doutra era.
Mas como este poeta é incapaz
De aqui trazer um texto muito fera,
Lhe pede p’ra aguardar que, doutra esfera,
Alguém possa surgir no metro um ás.
Não quer arredar pé de junto à mesa
E vai dispondo os versos que lhe dito,
Sabendo muito atroz esta certeza
De que tudo que faço é simples grito,
Resumo sem poesia e sem beleza
Da dor que já se estende ao infinito.
167
Confundo o tal sentido
Renego a dor que sinto e a nostalgia,
Ao perpassar o tempo para o verso:
Se tudo quanto faço é tão perverso,
No etéreo, então, é mau compor poesia.
O meu momento traz em si disperso
O bem do amor que aqui jamais faria,
Se persistisse a quebra da harmonia
Que põe meu Deus nas fímbrias do universo.
Jesus, me ajude, pois estou com medo
De não cantar a vida e sim a morte,
Que a morte me chegou bastante cedo!
Não quero desprezar a minha sorte,
Como também não vou guardar segredo:
É para o meu perdão da prece o aporte.
168
O que não parece bem
Sublime efervescência na poesia
Desperta do seu sono o bom leitor
Que pede ao seu amigo p’ra compor
Co’o sentimento nobre da alegria.
Tristeza é quanto existe sem valor,
Que o mal de aborrecer não se faria,
Se tudo nos brotasse em harmonia,
Juntando paz e luz e bem e amor.
Mas não ser falso aqui reduz a rima
A simples contenção do mal maior,
Que o gajo que verseja não sublima,
Sabendo, embora, os sons também de cor,
Para dispor na trova o quanto estima
Orar ao Pai a prece, em outdoor.
169
O caminho, a verdade e a vida
Contém o verso meu um quê de triste:
Poesia que não traz muita esperança
De que no sentimento já se alcança
Livrar-se da maldade, que resiste.
Porém, se a fé me invade, a trova avança,
Expondo ao meu leitor que o dedo em riste
Se guarda desde logo, quando existe
O bem, que a dor da rima torna mansa.
Soldado deste amor que contamina,
Versejo, mesmo assim, sem grande força,
Porquanto ao tema falta vitamina,
Embora o meu amigo, com mais luz,
Alegremente, reze e muito torça
P’ra no refrão lembrar-me de Jesus.
170
Interrogando o etéreo
O tempo que desgasto com poesia
Terá melhor proveito noutras formas?
Seguir dos metros as melhores normas
Não é o que Jesus aqui faria?
Perversas as perguntas que conformas,
Ó tu que tens o brilho e a fantasia,
Que emprestas os serviços da harmonia
Ao tema que promove as tais reformas.
Precisa que haja lucro sem beleza,
Em torno de sutis e bons pendores,
No trato de quem traz para esta mesa
O pensamento chão de vis horrores?
Por certo, nada chega sem surpresa,
Que é falso o poetar falto de amores.
171
Sofrível e sofrido
Preciso conformar-me em dar o troco
Às dores que senti estando vivo.;
Por isso é que a poesia tanto crivo
Das tétricas figuras do barroco.
Desconto uma por uma, em tom altivo,
Alegremente pondo no reboco
O espírito do bem, embora choco,
Que a luz que desperdiço é mal que ativo.
Seguramente, um dia irei tornar
À Terra, que desfaço e menosprezo,
E ali também terei um novo lar,
Não no sentido augusto que hoje peso:
Para ir aprendendo devagar
Que a prece que aqui faço ainda não rezo.
172
Desencontro e desencanto
Não gosto quando pensam que estou morto,
Porque tenho de mim a mesma idéia
Dos tempos de mortal, nesta odisséia,
Que, por ser livre agora, traz conforto.
Não posso respirar pela traquéia,
Nem tenho como ouvir que o som vem torto,
Mas sei como chegar ao mesmo porto,
Abelha desgarrada da colméia.
Preciso espairecer e já conflito
Com os desejos flácidos de glória.
Por isso, faço ouvir meu fraco grito,
Descrente de escrever uma outra história,
Que a perfeição se encontra no infinito
E hoje é que eu aspiro à tal vitória.
173
Garimpando a dor
Não tenho como ouvir o meu amigo
Que fica na penumbra da matéria.
Eu sei que o seu pedido é coisa séria:
Para atender, porém, é que é o perigo.
Se escondo algum fulgor, é da miséria,
Que insiste em reluzir junto comigo.
Também, a tal da rima mais fustigo,
No esforço de trazê-la pura, etérea.
Assim, este pasticho de quem erra,
Ó Alma envaidecida das palavras,
Refoge das virtudes lá da Terra
E põe junto a esta mesa alguém sem lavras
Daquelas da verdade que se encerra
Nos textos que tu mesmo descalavras.
174
Sempre o Mestre
Insisto junto ao médium que me aguarde,
Que os metros sou eu mesmo que lhe passo.
Não é que prejudique o meu compasso,
Mas nunca irá dizer que sou covarde.
Não queira recusar meu pobre abraço,
Nem pense que cheguei aqui mui tarde:
Bem sei que existe um fogo que não arde,
Embora espalhe amor com seu mormaço.
A crítica do verso fica em branco,
No prisma das virtudes que não tenho.
Aí, do coração o mal arranco
E exponho nestas linhas, como o lenho
Em que Jesus se pôs com dor no flanco,
Da cruz, que carregou com tanto empenho.
175
Uma mão lava — e a outra?
Não faço caridade com a rima,
Nem dou de mim aos pobres que me lêem:
Espero que haja pão para os que crêem,
Pois tenho pela gente grande estima.
E quando os olhos deles logo vêem
Que tenho um coração que já se anima,
Por pouco que lhes faça, se sublima
A dor que n’alma ainda se contém.
Por isso, eu peço ao povo que perdoe
A trova que componho e não lhe agrade,
Embora pelos ares já ressoe
O verso que presume esta saudade
De quando eu rogo ao Pai que me abençoe
E a quem me tem amor, mesmo que enfade.
176
Preponderância da razão
Redijo de manhã e à tarde venho
Trazer o resultado da poesia.
Não sei se alguém aqui também daria
Ao mestre que me atende o mesmo empenho.
Porém, quando o poema em harmonia
Reduz o meu temor, eu franzo o cenho,
E ponho todo o esforço e não desdenho
O amigo que me lê e acaricia.
Responsabilidade é o que se espera
De quem solfeja o verso que produz,
No embalo das virtudes desta esfera
Por natureza e força de mais luz,
Porquanto o amor se espraia e o bem se esmera,
Para cumprir o ensino de Jesus.
177
Alegria sem entusiasmo
Tão logo a rima exponho, fecho a trova
E dou ao companheiro que me serve
Toda a impressão que o verso meu me enerve,
Pois esta aqui seria a minha prova.
Mas continuo a demonstrar que ferve
O sangue em minhas veias, pois é nova
Esta expressão de dor que mais me sova,
Por refluir do amor em triste verve.
No entanto, o pessimismo desprezado
A lastimar se põe e me aparece
Na forma com que imprimo, do meu lado,
Esta escansão sem luz, de parca messe.;
Mas, ao final, componho e mui me agrado,
Por elevar a Deus sublime prece.
178
Mais que filosófico
Nem tudo está perdido neste mundo,
Porque o sofrer é próprio dos humanos.
É certo que haverá muitos enganos,
Porém, o despertar será profundo.
Então, o teu sorrir, ao fim dos anos,
Porá nos corações um bem fecundo
De amor e compaixão, conforme inundo
Os versos que aqui trago tão profanos.
A sorte que se tem, quando se aprende
A dar ao Pai maior benemerência,
É que o sentir da dor muito mais rende
Que toda a compreensão pela ciência
Das leis e dos profetas, pois se acende
A luz com que elevamos a consciência.
179
Com ares de improviso
A fábrica dos versos já fechou
E o médium tenta aqui fazer mais um,
Ouvindo, lá no fundo, um zunzunzum,
Aplausos que merece o nosso show.
Parece já lucrar algo incomum,
Por isso é que esta trova a mais lhe dou,
Apenas p’ra saber que sempre estou
Disposto a lhe quebrar o mau jejum.
Mas tolo é quem nos lê e nos aplaude
Pensando que isto é bom porque do etéreo.
Pois saiba que se tem terrível fraude
Nos versos que não vêm com a chancela
De alguém que leva a rima muito a sério,
Rogando ao Pai em prece seja bela.
180
Derradeiros alentos
Convido-te, querido, a me ajudar
No texto que produzo e te ofereço.
Talvez não saibas tu meu endereço,
Porém, vais encontrar-me no teu lar.
Agora que me vejo tão travesso,
Disposto a vir reinar em teu bazar,
Preciso referir que é devagar
Que crescem as virtudes deste apreço.
Estou p’ra concluir minha poesia
Ao lado deste mestre, que me ampara.
Se desse, nossa gente aqui viria
Tornar a nossa forma bem mais rara,
Porém, cabe a Jesus a melodia
Que tu deves cantar, que o amor se aclara.
181
Adeus, amigos!
Fazei, meu Pai, que seja muito honesta
A prece no final desta poesia,
Pois a felicidade não daria
Para rogar em rima tão modesta.
Então, dos pobres versos a alegria
Que seja o bom refrão de quem empresta
À trova o seu amor, em riso e festa,
Um misto de verdade e melodia.
Parece ao bom leitor que tudo finda?
Não há de ser assim aqui no etéreo.
Embora esta escansão possa ser linda,
O povo está diante do mistério,
Pois muito vamos caminhar ainda,
Mas com Jesus em doce refrigério.
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