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Cartas-->SOLDADO DA PAZ -- 14/04/2003 - 03:26 ( Andre Luis Aquino) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
É tão bom estar em casa depois de todos esses meses fora, sonhei tanto com esse momento que chego a ter medo de estar em mais de um dos meus sonhos, ao fechar os meus olhos as imagens da guerra ainda estão vivas e assim vão permanecer durante muito tempo em minha mente.
Você deveria ter me visto quando desci do ônibus que me trouxe até a rua de minha casa, ao pisar no chão e a caminhar em direção ao meu lar, as lágrimas escorriam pelo meu rosto e a cada passo me sentia mais seguro e me sentia a salvo de toda aquela dor e aquele ódio, parecia que estava voltando a ser a mesma pessoa que eu sempre fui e quando bati na porta e minha mãe abriu, cai em seus braços e tombei no chão da sala, o mesmo corpo que não tombou no campo de batalha eu era um soldado voltando para casa vivo, com as mãos e a alma sujas com o sangue de inocentes, à vontade de voltar para casa foi o que me manteve vivo.
Lutar é algo que liberta um homem, lutar é algo que faz você se sentir vivo, você luta pela sua vida ou por uma vida melhor, você luta pelos seus ideais,mas quando você apenas luta sem saber o porque, apenas luta porque acha que deve lutar o sentido da luta acaba e a liberdade não liberta, o perdão não perdoa, a vida não vive apenas mata, ao entrar numa guerra um ser humano deixa de ser humano e passa a ser predador de si mesmo, algo que fica sem sentido para seres da mesma espécie.
Quando eu me alistei no exército era apenas um garoto que amava os Beatles e que gostava de jogar pedras no lago para ver as ondinhas se formarem, que andava por ai sem destino e sem razão, ao entrar para as forças armadas eu pensava estar dando um rumo e um sentido para minha vida, estava em busca de ideais e de coragem e reconhecimento, para me sentir vivo, para ser alguém.
Fiquei lindo naquela farda, eu realmente me sentia bem ao andar pela rua ,ser respeitado e ser reparado,a disciplina no quartel era rígida e dura no começo, mas eu me adaptei com o tempo e até passei a gostar, fiz grandes amigos e aprendi lições para a vida toda, sendo elas experiências doloridas ou prazerosas.
Nunca pensei que seria chamado para uma guerra de verdade, nunca pensei que teria que matar alguém para me defender, nunca pensei que teria que matar alguém para atacar ou para defender idéias duvidosas, mas uma vez dentro de algo em movimento fica muito difícil saltar antes da estação ou do ponto final.
Naquele deserto eu defenderia o país das estrelas e listras brancas e vermelhas com a minha própria vida, assim eu tinha sido treinado, para atirar primeiro e perguntar depois, para ser duro e suportar a dor, o frio, a fome a tortura, sentir medo era algo que não deveria fazer parte dos meus pensamentos, o inimigo seriam todos aqueles que não fossem da minha raça, que não falassem a minha língua e que não usassem a mesma farda que a minha.
Trazíamos em nossas armas a liberdade e a libertação de um povo oprimido por um regime que esmagava as minorias e impunha suas vontades e o seu poder pelo medo e pelo cerceamento dos direitos do povo.
Naquele momento eu era um soldado a serviço do senhor da guerra, ao cruzar a fronteira tínhamos tanta confiança em nossos ideais que pensávamos poder transformar água em vinho.
Um Sargento dizia-nos que ninguém deve ser elogiado pela sua bondade quando não tem forças para ser mau, marchávamos sobre a areia e fazíamos prisioneiros, soldados inimigos com caras de assustados, eu podia ver um misto de medo e de alivio em seus olhos.
Mas a guerra me fez prisioneiro da minha própria dor, numa das esquinas do tempo, numa cidade miserável, numa terra arrasada pelas nossas bombas eu me deparei com lágrimas misturadas com gotas de sangue, com homens chorando a morte de parentes e desejando a própria morte em outras línguas, naquele momento percebi que aquela guerra não fazia mais sentido, um ditador estava caindo, mas almas estavam sendo perdidas e vidas sendo dilaceradas e o pior era que estavam sendo ceifadas com a minha lâmina.
A coragem alimenta as guerras, mas é o medo que as faz nascer, o homem tem medo de si mesmo, tem medo do desconhecido, da sua luz e da sua sombra.
Aquela farda era a minha segunda pele, mas naquele momento me sentia como se não fosse mais um soldado e sim um bicho, um desfigurado, um monstro alimentado-se da sua própria carne, não sei como será a Terceira Guerra Mundial mas a Quarta será a paus e pedras.
Nas esquinas daquele deserto, daquela terra arrasada eu vi um menino sem braços implorando para que aliviassem a sua dor, seu corpo todo queimado fedia a morte, eu estava apodrecendo, queria nadar na areia e lavar as minhas mãos sujas de sangue e de pecado na água suja de uma poça.
Depois de uma guerra ninguém se salva, ninguém escapa de uma guerra vivo, quem mata alguém está também matando a si mesmo, voltei daquela guerra tão morto quanto os meus colegas que voltaram embalados em sacos negros, entregues a suas famílias com honras militares e enterros cercados de pompa.
Agora de volta a minha casa, sou um soldado da paz, as armas foram depostas e um vazio me encheu completamente, depois de uma guerra para nós soldados tanto faz ser culpado ou ser capaz, o fato de ter sobrevivido as batalhas não nos garante a paz, a guerra estará para sempre em mim, sou um soldado da paz sem paz.
Ganhamos aquela guerra, mas perdemos para sempre a nossa paz...
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