Quem quisesse ver Anastácia, era só ir ao pé da montanha. Todos os dias, a menina estava lá, observando o céu, sentindo o vento e alimentando seu sonho. Aventureira, ela queria voar, mas sabia que se pulasse, não restaria nem um fio de canelo para contar a experiência.
Durante anos foi assim. Amanhecia, Anastácia estava na montanha. Saía de lá para ir à escola, mas voltava no final da tarde. Os amigos e as família já sabiam onde procurá-la, se ela sumisse. E como era comum ela sumir! Tudo era motivo para subir à montanha.
Ela cresceu, virou moça, e o sonho continuava mais forte do que nunca. Mas teve de se mudar da cidade para continuar os estudos, e a montanha ficou. Quando alguém perguntava como ela iria viver sem subir até o pé da montanha, ela respondia brevemente que a montanha poderia esperá-la.
Branquinha, quase amarela, magra como um varapau e de cabelos cacheados, Anastácia parecia uma maritaca quando contava aos amigos da cidade grande sobre a montanha mágica e sobre o sonho de voar. Poucos acreditavam que aquela moça fraca conseguiria voar um dia, e talvez ela mesmo duvidava, em alguns raros momentos, da capacidade de voar.
Depois de muitos anos longe da terra natal e do sonho de voar, Anastácia conheceu um rapaz, esbelto, dedicado a um estudo que poucos conheciam. Nem mesmo a moça sabia o que era. E ela dividia com ele o sonho de criança, e dizia que um dia voltaria ao pé da montanha onde seu sonho estava guardado.
Finalmente, quando Anastácia conseguiu terminar a faculdade, foi em busca de seu sonho. Na cidade da montanha, alguns amigos ainda estavam lá, e se surpreenderam quando a menina disse que tinha voltado para ir em busca de o grande sonho.
Ela voltou com asas, e estava pronta para voar. O rapaz, que durante um bom tempo de sua estadia na cidade grande lhe ajudou, ficou para trás, mas tinha certeza de que Anastácia saberia dar asas ao sonho que por muito tempo foi a razão de da vida da menina.
Os primeiros dias no pé da montanha foram de nostalgia. Lembrava-se da infància, da juventude e dos dias de solidão naquele lugar que era só dela, lugar que ela escolhera para ser um recanto, um abrigo de paz e tranquilidade.
Quando viu que chegara a hora, com olhos cheios de lágrimas, Anastácia subiu até o pé da montanha. Admirou o céu, sorriu para o sol e pulou. E voou. Nas costas, ela tinha uma asa que ganhou do rapaz da cidade grande, asas tão fortes que conseguiram manter a moça no ar por muito tempo. Asas de pássaros, feitas de sonho.