Estou tentando parar de fumar. Mas os anti-tabagistas não devem comemorar ainda. Por enquanto, apenas estou reduzindo a quantidade de cigarros consumidos. Seria um processo relativamente simples, se a relação entre o dia-a-dia e o vício não mantivesse uma complexa dinàmica de interdependência. Ou seja, sou um viciado barra pesada e para vencer o vício vou precisar de muita força de vontade.
Saibam que não estou contando isso para pedir a solidariedade de vocês. É que estou descobrindo um curioso mecanismo de reflexão por conta desse esforço em parar de fumar. Do gesto obsessivo à pausa específica para as tragadas, mudei minha relação comigo mesmo. Aproveito que só tenho aquele momento para fumar e paro tudo o que estou fazendo. Vou para um local arejado, de preferência, acendo o nicotilento e penso na vida. Engraçado, porque só agora percebo que não pensava em mim mesmo há um bom tempo.
Parece letra de bossa nova. Um cantinho, um cigarrinho e um pouquinho de mim para mim mesmo. Reflexões tabagísticas. Espero que não esteja criando um novo vício. Se estiver, dos males, o menor. Afinal, minha média diária estava batendo a casa dos três maços de Continental. É isso mesmo, eu confesso. Continental, Preferência Nacional. E não pergunte se ainda existe porque eu não suporto ser olhado como um dinossauro. Existe sim e eu sou um dos milhares de consumidores fiéis à marca.
Pois bem, nos últimos quatro dias venho conseguindo manter a média aproximada de um maço por dia. E é por dia mesmo. Abro um novo maço e marco na embalagem a hora em que abri, para acompanhar a evolução do meu esforço. Poxa, só essa redução é motivo de orgulho. Nem eu estou acreditando. E não tem sido tão difícil quanto imaginava. Vou vencendo o vício gradualmente a partir de uma curiosa constatação: enjoei do cheiro de cigarro e do cheiro dos ambientes enfumaçados.
É claro que pratico alguns macetes para vencer as artimanhas do vício. Tento fumar só quando dá vontade, mesmo. Percebo que boa parte dos cigarros era acendida por puro hábito. Outro truque: não deixo os cigarros no bolso da camisa. Ponho na gaveta, deixo sobre o computador, enfim, literalmente tiro do lugar-comum. Com isso, venço o hábito. Frequentemente me pego fazendo o gesto automático de buscar o cigarro no bolso quando ele não está lá. E como não está lá, acabo não acendendo.
É evidente que posso muito bem ir até onde estão os cigarros, pegar um e acender. Mas é aí que entra a gloriosa força de vontade e a vergonha na cara. "Se deu para aguentar até agora, porque não continuo aguentando?", me pergunto. E consigo controlar a vontade. Algumas balinhas e uns bons copos de água têm ajudado.
Por falar nisso, o paladar está mudando e talvez esse seja o grande problema daqui para a frente. A fome aumentou. Alguns amigos dizem que é sugestão, mas eu realmente sinto uma vontade louca de comer. E a comida está me parecendo mais gostosa, saborosa, perfumada. Hummmmmm!!! Dá água na boca só de pensar. Bom, mas depois eu resolvo isso. Fazer regime, a esta altura dos acontecimentos, seria muita crueldade. Puxa, justo agora que estou me amando! Não, não, não... Deixa o regime para depois. Um prazer da cada vez, senão eu morro!
