O decreto federal que permite fracionar os medicamentos e vendê-los na quantidade exata das necessidades de cada paciente é uma boa idéia, visto que caminha no sentido de evitar o desperdício e defender o bolso do cidadão brasileiro. Com efeito, não faz sentido comprar uma cartela com trinta comprimidos, quando o tratamento receitado indica a utilização de apenas dez.
Todavia, a execução da medida, no meu entendimento, possui "interações medicamentosas" que a torna impraticável; ou, quando menos, de duvidosa eficácia. Há um erro de origem na composição política da fórmula proposta. Mais uma vez, o governo planta idéias no campo teórico, porém não trata, com o devido rigor, das implicações de ordem prática, na hora de colher os frutos.
Ao transferir a responsabilidade pelo fracionamento à s farmácias, os riscos são muitos. A começar pela quebra de qualidade, seja pelas condições ambientais desfavoráveis - temperatura ambiente, luz e falta de higiene na manipulação - seja pelos riscos advindos da possibilidade de confusão e troca de cápsulas/comprimidos parecidos, ou mesmo de alteração de dosagem de um mesmo remédio, durante o processo de venda e armazenamento desses produtos. Sem falar na falta de segurança em relação aos prazos de validade, que exigirão um controle a parte. No caso de eventuais intoxicações, agravamento do quadro clínico ou mesmo de óbitos, decorrentes de superdosagens ou ingestão trocada de medicamentos, quem seria o responsável?
Por tudo isso, entendo que a medida deveria merecer exame mais acurado, envolvendo governo, classe médica e laboratórios. Desse modo, acredito, seria possível estabelecer padrões de fabricação de fármacos em quantidades mais próximas do receituário médico. Mais do que o aspecto meramente de ordem económica, está em jogo a saúde do cidadão brasileiro
Para tanto, a partir da experiência colhida no dia-a-dia das clínicas e consultórios, há farto material para subsidiar estudos que permitam aos laboratórios optarem pela produção de remédios em quantidades mais próximas dos interesses e necessidades propostos pelo governo.
É possível, portanto, produzir remédios, como os antibióticos, por exemplo, em caixas contendo a quantidade mínima usualmente indicada pelos médicos.
O governo precisa acabar com essa mania de jogar a solução dos problemas para o lado errado. Dois casos semelhantes: a questão do pagamento de meia entrada para cinemas, teatros e eventos afins, e a gratuidade em ónibus interestaduais para idosos.
Em ambos os casos, há custos que deverão ser absorvidos pelos empresários, que se vêm obrigados a aumentar seus preços ou descumprir à s determinações legais. Resultado disso: o tiro sai pela culatra. Ao invés de estimular, inibe-se a produção artístico-cultural e aumenta-se a frustração dos pretensos beneficiários dessas medidas.
Mandar fazer as coisas, sem colaborar com recursos ou isenções fiscais, não dá certo. É bater continência com o chapéu alheio.