Aparição

Acreditar não é um mal.

Ao ser humano falta um não sei quê

Que lhe rouba o chão.

Mistura crença com ilusão.

Mesmo diante de uma aparição pouco

Ou nada muda esta condição.

Por isso os deuses nos estendem a mão.

Enchem-nos de luz.

Ajudam-nos a carregar a cruz.

Mas não a entregam em nossas mãos.

Não estamos prontos, ainda não aprendemos

a viver como irmãos.

E mesmo irmãos, os deuses sabem o mal que

corre em veias irmãs.

Irmãos de sangue a aumentar a dor do irmão.

Daquele irmão, mais fraco, carente.

Se o socorro chegar, raramente chega por mãos

de um parente.

Os deuses olham com piedade tanto para os que

sofrem, quanto para os que usam a força para

espalhar maldade.

Mesmo que Deus voltasse.

Frente a frente conosco ficasse.

Ainda assim não ia mudar a situação.

Iam colocá-lo num hospício.

Não conseguiriam enxergar, não seriam capazes

de absorver outra forma de viver.

Não estão prontos para a mudança.

O traçado está impregnado de pecado.

E pecado é não estender a mão ao irmão.

É mais: é deixá-lo mais fraco ainda.

Deitá-lo ao chão, pisar mais, até ter certeza de que

Aquele irmão nunca será um levantado do chão.

Lita Moniz